Nefrite tubulointersticial

PorFrank O'Brien, MD, Washington University in St. Louis
Revisado/Corrigido: mar 2022
Visão Educação para o paciente

Nefrite tubulointersticial é a lesão primária de túbulos renais e interstício que resulta na diminuição da função renal. A forma aguda ocorre com mais frequência em decorrência de reação alérgica a fármacos ou a infecções. A forma crônica está associada a uma grande variedade de doenças, incluindo doenças genéticas ou metabólicas, uropatia obstrutiva e exposição a toxinas ambientais crônicas ou a certos fármacos e ervas. O diagnóstico é sugerido por história e exames de sangue e urina e geralmente confirmado por biópsia. O tratamento e o prognóstico variam de acordo com a etiologia e a reversibilidade potencial da doença na ocasião do diagnóstico.

(Ver também Visão geral das doenças tubulointersticiais.)

Etiologia da nefrite tubulointersticial

A nefrite tubulointersticial pode ser primária, mas um processo semelhante pode ocorrer devido a lesão glomerular ou a doenças renovasculares.

A nefrite tubulointersticial primária pode ser

Nefrite tubulointersticial aguda

Nefrite tubolointersticial aguda (NTIA) envolve um infiltrado inflamatório e edema envolvendo o interstício renal, que geralmente se desenvolve em dias a meses. Mais de 95% dos casos resultam de infecção ou de reação alérgica a fármacos.

NTIA causa lesão renal aguda; casos graves, retardo de tratamento, ou a manutenção do fármaco agressor podem causar lesão permanente e doença renal crônica.

Síndrome renal-ocular, nefrite tubulointersticial aguda mais uveíte, também ocorre e é idiopática.

Nefrite tubulointersticial crônica

Nefrite tubulointersticial crônica (NTIC) origina-se quando a agressão tubular crônica causa infiltração intersticial gradual e fibrose, atrofia tubular e disfunção e uma deterioração gradual da função renal, geralmente, ao longo de anos. O envolvimento glomerular concomitante (glomerulosclerose) é muito mais comum na NTIC do que na NTIA.

Causas da nefrite tubulointersticial crônica são múltiplas; incluem doenças de medicação imunitária, infecção, nefropatia de refluxo ou obstrutiva, fármacos e outras doenças. NTIC decorrente de toxinas, desarranjos metabólicos, hipertensão e doenças hereditárias resulta em doença simétrica e bilateral; quando a NTIC ocorre por outras causas, as cicatrizes renais podem ser desiguais e envolver apenas um dos rins. Algumas formas bem caracterizadas da NTIC são

Nefropatia de refluxo e mieloma podem causar lesão tubulointersticial, mas a patologia predominante nesses quadros é a doença glomerular.

Doenças renais císticas hereditárias são discutidas em outras partes.

Tabela
Tabela

Referências gerais

  1. 1. Yamaguchi Y, Kanetsuna Y, Honda K, et al: Characteristic tubulointerstitial nephritis in IgG4-related disease. Hum Pathol 43(4):536-549, 2012. doi: 10.1016/j.humpath.2011.06.002

  2. 2. Correa-Rotter R, Wesseling C, Johnson RJ: CKD of unknown origin in Central America: The case for Mesoamerican nephropathy. Am J Kidney Dis 63(3):506-520, 2014. doi: 10.1053/j.ajkd.2013.10.062

Sinais e sintomas da nefrite tubulointersticial

Nefrite tubulointersticial aguda

Os sinais e sintomas da nefrite tubulointersticial aguda podem ser inespecíficos e geralmente estão ausentes, a menos que ocorram sinais e sintomas de insuficiência renal. Muitos pacientes desenvolvem poliúria e noctúria (devido a defeito da concentração urinária e reabsorção de sódio).

O início dos sintomas da NTIA pode ser longo, até várias semanas após a exposição inicial ao tóxico, ou em até 3 a 5 dias depois da 2ª exposição; os períodos de latência extremos variam de 1 dia com rifampicina a 18 meses com um anti-inflamatório não esteroide (AINE). Febre e exantema urticariforme são características na fase inicial de NTIA induzida por fármacos, mas a tríade clássica descrita de febre, exantema e eosinofilia está presente em < 10% dos pacientes com NTIA induzida por fármacos. Dor abdominal, perda ponderal e aumento renal bilateral (causado por edema intersticial) também podem ocorrer e a febre pode enganosamente sugerir doença renal maligna ou doença renal policística. Edema periférico e hipertensão não são comuns, a menos que ocorra insuficiência renal.

Nefrite tubulointersticial crônica

Os sinais e sintomas estão geralmente ausentes na nefrite tubulointersticial crônica, a menos que ocorra insuficiência renal. O edema não costuma estar presente e a pressão arterial é normal ou levemente elevada nos estágios iniciais. Pode haver poliúria e noctúria.

Causas da nefrite tubulointersticial aguda

  • Fatores de risco

  • Na nefrite tubolointersticial aguda (NTIA), sedimento urinário ativo com piúria estéril

  • Algumas vezes, biópsia renal

  • Geralmente exames de imagem para excluir outras causas

Alguns achados clínicos e laboratoriais de rotina são específicos para nefrite tubulointersticial. Desse modo, deve-se suspeitar bastante da doença caso estejam presentes:

  • Sintomas ou sinais típicos

  • Fatores de risco, particularmente se houver uma relação temporal entre o início e o uso de um fármaco potencialmente causador

  • Exame de urina característico, particularmente piúria estéril

  • Proteinúria leve, geralmente < 1 g/dia (exceto com o uso de AINEs, que podem causar proteinúria de nível nefrótico, 3,5 g/dia)

  • Evidência de disfunção tubular (p. ex., acidose tubular renal, síndrome de Fanconi)

  • Defeitos de concentração desproporcional ao grau da insuficiência renal

Não é possível contar com a eosinofiluria para fazer ou excluir o diagnóstico. Outros exames (p. ex., de imagem) geralmente são necessários para diferenciar a NTIA ou nefrite tubulointersticial crônica (NTIC) de outros transtornos. Um diagnóstico clínico presuntivo da NTIA é muitas vezes feito com base nos resultados específicos mencionados acima, mas biópsia renal é necessária para estabelecer um diagnóstico definitivo.

Nefrite tubulointersticial aguda

Exame de urina que mostra sinais de inflamação renal ativa (sedimento urinário ativo) com presença de leucócitos, eritrócitos e cilindros de leucócitos, e a ausência de bactérias na cultura (piúria estéril) é típica; hematúria significativa e eritrócitos dismórficos são pouco comuns. Tradicionalmente considerava-se que a eosinofilúria sugerisse NTIA; mas a presença ou ausência de eosinófilos urinários não é particularmente útil no diagnóstico. A proteinúria geralmente é mínima, mas pode atingir níveis nefróticos quando combinada com NTIA e doença glomerular induzida por AINEs, ampicilina, rifampicina, interferona alfa, ou ranitidina.

Os achados em exames de sangue incluem hipopotassemia (defeito de reabsorção de potássio) e acidose metabólica não ânion-gap (defeito na reabsorção de bicarbonato tubular proximal ou excreção de ácido tubular distal).

Ultrassonografia, mapeamento radioisotópico, ou ambos podem ser necessários para diferenciar a nefrite tubulointersticial aguda de outras causas de lesão renal aguda quando a biópsia renal não é possível. Na NTIA, os rins podem estar muito aumentados e ecogênicos à ultrassonografia em razão da presença de células inflamatórias intersticiais e edema. Mapeamentos com radionuclídeos podem mostrar os rins absorvendo avidamente o gálio 67 ou leucócitos marcados por radionuclídeos. Mapeamentos positivos sugerem fortemente NTIA (e indicam que a necrose tubular aguda é menos provável), mas um mapeamento negativo não exclui o diagnóstico de NTIA.

A biópsia renal geralmente é reservada para pacientes com os seguintes achados:

  • Diagnóstico incerto

  • Lesão renal progressiva

  • Falta de melhora após suspensão da droga causal potencial

  • Resultados que sugerem doença precoce

  • NTIA induzida por fármacos para a qual a terapia com corticoides está sendo considerada

Na nefrite tubulointersticial aguda, os glomérulos geralmente estão normais. O achado inicial é o edema intersticial, tipicamente seguido de infiltrado intersticial por linfócitos, plasmócitos, eosinófilos e alguns leucócitos polimorfonucleares. Em casos graves, observam-se células inflamatórias invadindo os espaços entre as células do revestimento tubular da membrana basal (tubulites); em outras amostras, podem ser encontradas reações granulomatosas secundárias à exposição a antibióticos betalactâmicos, sulfonamidas, micobactérias e fungos. A presença de granulomas não caseosos sugere sarcoidose. A imunofluorescência e a microscopia eletrônica raramente revelam alterações patognomônicas.

Nefrite tubulointersticial crônica

Os achados na NTIC geralmente são semelhantes aos da NTIA, apesar de eritrócitos e leucócitos na urina serem incomuns. Como a NTIC tem início insidioso e a fibrose intersticial é comum, os exames de imagem podem mostrar rins pequenos com evidências de cicatrizes e assimetria.

Na nefrite tubulointersticial crônica, geralmente não se realiza biópsia para fins diagnósticos. Mas se há preocupação com diagnósticos alternativos, pode ser realizado. Os glomérulos variam de normais a completamente destruídos. Os túbulos podem estar ausentes ou atrofiados. O lúmen tubular varia de diâmetro, podendo mostrar dilatação significativa, com cilindros homogêneos. O interstício contém vários graus de células inflamatórias e fibrose. Áreas não cicatriciais parecem quase normais. Grosseiramente, os rins são pequenos e atróficos.

Prognóstico para nefrite tubulointersticial

Nefrite tubulointersticial aguda

Na NTIA induzida por fármacos, a função renal geralmente se recupera dentro de 6 a 8 semanas, quando o fármaco causador é interrompido, apesar ser comum algum grau de cicatrização residual. A recuperação pode ser incompleta, com uremia persistente acima de valores basais. O prognóstico é geralmente pior se a NTIA é causada por AINEs do que por outros fármacos. Quando a NTIA é causada por outros fatores, as alterações histológicas são geralmente reversíveis se a causa for reconhecida e removida; entretanto, alguns casos graves evoluem para fibrose e doença renal crônica. Independentemente da causa, a lesão irreversível é sugerida pelos seguintes itens:

  • Infiltrados intersticiais difusos, em vez de esparsos

  • Fibrose intersticial significativa

  • Retardo na resposta à prednisona

  • Lesão renal aguda que dura > 3 semanas

Nefrite tubulointersticial crônica

Na NTIC, o prognóstico depende da causa e da capacidade de responder e interromper o processo, antes da ocorrência de fibrose irreversível. Várias causas genéticas (p. ex., doença renal cística), metabólicas (p. ex., cistinose) e tóxicas (p. ex., exposição prévia a metais pesados) podem não ser modificáveis e, nesses casos, a NTIC geralmente evolui para doença renal em estágio terminal.

Tratamento da nefrite tubulointersticial

  • Tratamento da causa (p. ex., interrupção do fármaco causador)

  • Corticoides para nefrite tubulointersticial aguda mediada por processo imunitáro e algumas vezes quando induzida por fármacos

O tratamento tanto da NTIA como da NTIC é o das causas subjacentes.

Na nefrite tubulointersticial aguda de indução imune e, algumas vezes, na NTIA induzida por fármacos, corticoides (p. ex., prednisona 1 mg/kg por via oral uma vez ao dia com diminuição gradual ao longo de 4 a 6 semanas) podem acelerar a recuperação.

Para NTIA induzida por fármacos, os corticoides são mais eficazes quando administrados dentro de 2 semanas de parar os fármacos causadores. NTIA induzida por AINEs é menos responsiva do a corticoides do que NTIA induzida por outros fármacos. NTIA deve ser comprovada por biópsia antes de os corticoides serem iniciados.

O tratamento da nefrite tubulointersticial crônica geralmente é feito com medidas de suporte, como controle de pressão arterial e tratamento da anemia associada à doença renal. Em pacientes com NTIC e insuficiência renal progressiva, os inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA) e os bloqueadores de receptor da angiotensina II (BRAs) podem diminuir a progressão da doença, mas não devem ser usados em conjunto por causa do risco de vício da hiperpotassemia e progressão acelerada da doença.

Dicas e conselhos

  • Em pacientes com nefrite tubulointersticial crônica, os inibidores da enzima conversora de angiotensina (ECA) e os bloqueadores do receptor da angiotensina II (BRAs) não devem ser utilizados em conjunto por causa do risco cumulativo de hipercalemia e aceleração da progressão da doença.

Pontos-chave

  • Há numerosas causas da nefrite tubulointersticial crônica e são muito mais diversificadas do que para nefrite tubulointersticial aguda (NTIA), geralmente causada por uma reação alérgica a um fármaco ou por uma infecção.

  • Os sintomas muitas vezes estão ausentes ou são inespecíficos, particularmente na NTIC.

  • Suspeitar do diagnóstico com base em fatores de risco e sedimento urinário, excluir outras causas usando imagiologia latente e, às vezes, confirmar o diagnóstico por biópsia.

  • Interromper os fármacos causadores, tratar quaisquer outras causas e fornecer tratamento de suporte.

  • Tratar a NTIA imunomediada e às vezes induzida por fármacos depois da comprovação por biópsia com corticoides (2 semanas depois da interrupção de qualquer fármaco causador).

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