Cardiomiopatia dilatada

PorTisha Suboc, MD, Rush University
Revisado/Corrigido: nov 2022
Visão Educação para o paciente

A cardiomiopatia dilatada é uma disfunção miocárdica que provoca insuficiência cardíaca, na qual há predomínio de dilatação ventricular e disfunção sistólica. A sintomatologia compreende dispneia, fadiga e edema periférico. O diagnóstico é clínico e por peptídeos natriuréticos elevados, radiografia de tórax, ecocardiografia e RM. O tratamento é direcionado para a causa. Se a insuficiência cardíaca é progressiva e grave, podem ser necessários terapia de ressincronização cardíaca, cardioversor-desfibrilador implantável, reparo de insuficiência valvar moderada a grave, dispositivo de assistência ventricular esquerda ou transplante de coração.

A cardiomiopatia é uma doença primária do miocárdio (ver também Visão geral das cardiomiopatias). A cardiomiopatia dilatada pode se desenvolver em qualquer idade, mas é mais comum em adultos com menos de 50 anos. Cerca de 10% das pessoas que desenvolvem cardiomiopatia dilatada têm mais de 65 anos de idade. Nos Estados Unidos, a doença ocorre em cerca de 3 vezes mais homens que mulheres e 3 vezes mais em afro-descendentes que em pessoas brancas. Cerca de 5 a 8 de cada 100.000 pessoas desenvolvem a doença a cada ano (1).

Referência geral

  1. 1. Dec GW, Fuster V: Idiopathic dilated cardiomyopathy. N Engl J Med 331:1564–1575, 1994.

Fisiopatologia da cardiomiopatia dilatada

Como doença primária do miocárdio, a disfunção do miocárdio da cardiomiopatia dilatada ocorre na ausência de outras doenças que causam dilatação do miocárdio, como a doença coronariana oclusiva grave ou as doenças que representam sobrecarga de pressão ou volume nos ventrículos (p. ex., hipertensão arterial sistêmica e doença cardíaca valvular). Em alguns pacientes, acredita-se que a cardiomiopatia dilatada comece com miocardite aguda (viral na maioria dos casos), seguida de fase latente variável, fase com necrose difusa dos miócitos miocárdicos (decorrente de reação autoimune aos miócitos alterados pelo vírus) e fibrose crônica. Independentemente da causa, o miocárdio dilata, fica mais fino e apresenta hipertrofia como compensação (ver figura Formas de cardiomiopatia), geralmente levando à regurgitação mitral e/ou à regurgitação tricúspide funcional e à dilatação atrial.

Na maioria dos pacientes, a doença compromete ambos os ventrículos; em alguns pacientes, a doença compromete apenas o ventrículo esquerdo e, raramente, compromete apenas o ventrículo direito.

Pode haver formação de trombos murais por causa da estase do sangue quando a dilatação e disfunção da câmara são significativas. Com frequência, taquiarritmias cardíacas complicam as fases de miocardites aguda e dilatada crônica tardia, da mesma forma que o bloqueio atrioventricular. À medida que o átrio se dilata, geralmente ocorre fibrilação atrial.

Etiologia da cardiomiopatia dilatada

A cardiomiopatia dilatada tem inúmeras etiologias conhecidas e, provavelmente, muitas indefinidas (ver tabela Causas da cardiomiopatia dilatada). Mais de 20 vírus podem causar cardiomiopatia dilatada; em zonas temperadas, o coxsackievirus B é o mais comum. Nas Américas Central e do Sul, a doença de Chagas, provocada por Trypanosoma cruzi, é a causa infecciosa mais comum.

Outras causas incluem taquicardia (crônica) prolongada, Infecção pelo HIVtoxoplasmose, tireotoxicose e beribéri. Muitas substâncias tóxicas, especialmente álcool, vários solventes orgânicos, ferro ou íons de metal pesado e certos quimioterápicos (p. ex., doxorrubicina) prejudicam o coração. Ectopia ventricular frequente (> 10.000 batimentos ventriculares prematuros/dia) foi associada à disfunção sistólica do ventrículo esquerdo.

Estresse emocional súbito e outros estados hiperadrenérgicos podem desencadear cardiomiopatia dilatada aguda que é tipicamente reversível (como a causada por taquicardia prolongada). Um exemplo é a cardiomiopatia por balão apical aguda (também chamada cardiomiopatia de Takotsubo, cardiomiopatia por estresse ou síndrome do coração partido). Nessa doença, afeta-se normalmente o ápice do ventrículo esquerdo e, às vezes, outros segmentos, causando disfunção da parede regional e, algumas vezes, dilatação focal (por balão).

Os fatores genéticos desempenham um papel em 20 a 35% dos casos; > 60 genes e lócus foram implicados.

Tabela

Sinais e sintomas da cardiomiopatia dilatada

Em geral, o início da cardiomiopatia dilatada é gradual, exceto na miocardite aguda, na cardiomiopatia aguda apical por balão e na cardiomiopatia induzida por taquiarritmia. Cerca de 25% de todos os pacientes com cardiomiopatia dilatada têm precordialgia atípica. Outros sintomas dependem de qual ventrículo está comprometido.

Disfunção ventricular esquerda causa dispneia aos esforços e fadiga decorrente da elevação da pressão diastólica ventricular e do baixo débito cardíaco.

Insuficiência ventricular direita causa edema periférico e distensão da veia do pescoço. Raramente o ventrículo direito é predominantemente afetado em pacientes mais jovens, sendo típicas as arritmias atriais e a morte súbita por taquiarritmias ventriculares malignas.

Diagnóstico da cardiomiopatia dilatada

  • Radiografia de tórax

  • ECG

  • Ecocardiografia

  • RM cardíaca

  • Biópsia endomiocárdica (casos selecionados)

  • Teste para a causa, conforme indicado

O diagnóstico da cardiomiopatia dilatada é feito por anamnese, exame físico e exclusão de outras causas comuns da insuficiência ventricular (p. ex., hipertensão arterial sistêmica, valvopatias primárias, infarto agudo do miocárdio — ver tabela Diagnóstico e tratamento das cardiomiopatias). Particularmente nos casos de cardiomiopatia dilatada sem causa clara, deve-se obter história familiar cuidadosa para identificar os familiares com possível cardiopatia de início precoce, insuficiência cardíaca ou morte súbita. Em muitos centros, testa-se os familiares de primeiro grau à procura de disfunção cardíaca (utilizando uma ecocardiografia, por exemplo). Como outras causas comuns de insuficiência ventricular precisam ser excluídas, são necessários radiografia de tórax, ECG, ecocardiografia e RM cardíaca. É feita biópsia endomiocárdica em casos selecionados.

Medem-se os marcadores cardíacos séricos se sintomas agudos ou dor torácica estão presentes. Embora tipicamente sejam indicativos de isquemia coronariana, ocorre elevação dos níveis de troponina na insuficiência cardíaca, especialmente se houver redução da função renal. Os níveis séricos de peptídeo natriurético são tipicamente elevados quando a insuficiência cardíaca está presente.

O diagnóstico das causas específicas presumidas é clínico (ver outros tópicos deste Manual). Se não houver nenhuma causa aparente, avaliam-se os níveis séricos de ferritina, capacidade de ligação do ferro e TSH.

Testes sorológicos para Toxoplasma, T. cruzi, vírus coxsackievírus, HIV e ecovírus podem ser realizados em casos apropriados.

A radiografia de tórax revela cardiomegalia, geralmente de todas as câmaras. O derrame pleural, particularmente à direita, geralmente acompanha a elevação da pressão pulmonar venosa e o edema intersticial.

O ECG pode revelar taquicardia sinusal e infradesnível inespecífico do segmento ST, com ondas T de baixa voltagem ou negativas. Às vezes, há ondas Q patológicas em derivações precordiais, simulando infarto do miocárdio prévio. BRE e fibrilação atrial são comuns.

A ecocardiografia mostra câmaras cardíacas hipocinéticas e dilatadas, além de excluir valvopatias primárias. Anormalidades segmentares da movimentação da parede também podem ocorrer na cardiomiopatia dilatada porque o processo pode ser irregular. A ecocardiografia também pode evidenciar trombo da parede.

RM-gated (sincronizada ao ECG) é cada vez mais realizada e é útil para fornecer imagens detalhadas da estrutura e função do miocárdio. RM com contraste de gadolínio pode mostrar textura anormal do tecido do miocárdio ou padrão de cicatriz (isto é, intensificação com gadolínio tardia, ou IGT). O padrão de IGT pode ser diagnóstico na miocardite ativa, sarcoidose, distrofia muscular ou doença de Chagas).

Mostrou-se que a Tomografia por emissão de pósitrons (PET) é sensível para o diagnóstico da sarcoidose cardíaca.

Angiografia coronariana pode ser necessária para excluir doença coronariana como a causa da disfunção do VE quando o diagnóstico é duvidoso após testes não invasivos. Pacientes com dor torácica ou vários fatores de risco cardiovascular e pacientes idosos são mais propensos a ter doença coronariana. Qualquer ventrículo pode ser submetido à biópsia durante o cateterismo em casos selecionados em que os resultados irão alterar a conduta.

Indica-se biópsia endomiocárdica se houver suspeita de miocardite de células gigantes, miocardite eosinofílica ou sarcoidose, uma vez que os resultados afetarão o tratamento.

Prognóstico para cardiomiopatia dilatada

O prognóstico para cardiomiopatia dilatada geralmente é ruim, embora tenha melhorado com os tratamentos atuais [p. ex., uso de betabloqueadores, inibidores de enzima conversora da angiotensina (ECA), antagonistas do receptor de mineralocorticoides, inibidores de proteína cotransportadora de sódio-glicose-2 (SGLT2), cardioversores desfibriladores implantáveis ou terapia de ressincronização cardíaca]. Cerca de 20% morrem no primeiro ano e cerca de 10% um ano depois; aproximadamente 40 a 50% das mortes são repentinas em decorrência de arritmia maligna ou evento embólico. O prognóstico é melhor para mulheres do que para homens; pessoas afro-descendentes sobrevivem cerca da metade do tempo em comparação a brancos.

O prognóstico é melhor se a hipertrofia compensatória preservar a espessura da parede do ventrículo, sendo pior se as paredes do ventrículo se afinarem acentuadamente e o ventrículo se dilatar. Pacientes cuja cardiomiopatia dilatada está bem compensada com o tratamento podem permanecer estáveis por muitos anos.

Tratamento da cardiomiopatia dilatada

  • Causa (se houver alguma), tratada

  • Terapia padrão para insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida

  • Anticoagulantes quando há fibrilação atrial ou outra indicação

  • Algumas vezes, cardioversor-desfibrilador implantável (CDI), terapia de ressincronização cardíaca (TRC), dispositivo de assistência ventricular esquerda ou transplante

  • Imunossupressão em pacientes com miocardite de células gigantes, miocardite eosinofílica ou sarcoidose

Corrigem-se as causas tratáveis (p. ex., toxoplasmose, doença de Chagas aguda, hemocromatose, tireotoxicose, beribéri). Deve-se administrar terapia antirretroviral (TARV) otimizada a pacientes com infecção pelo HIV. Deve-se limitar o tratamento com imunossupressão a pacientes com miocardite de células gigantes comprovada por biópsia, miocardite eosinofílica ou sarcoidose.

Do contrário, o tratamento é o mesmo que para a insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida: inibidores da ECA, betabloqueadores, bloqueadores dos receptores de aldosterona, bloqueadores dos receptores de angiotensina II, RAIN (inibidor do receptor da angiotensina/neprilisina), inibidores do cotransportador de sódio-glicose-2 (SGLT2), hidralazina/nitratos, diuréticos e digoxina. Estudos demonstraram que pacientes com cardiomiopatia dilatada idiopática respondem particularmente bem a tratamentos padrões para insuficiência cardíaca e geralmente têm melhor resultados do que pacientes com cardiopatia isquêmica.

São necessárias precauções especiais no tratamento da cardiomiopatia periparto. Muitos medicamentos devem ser evitados (como os inibidores da ECA e os bloqueadores dos receptores da angiotensina II) durante a gestação por causa do risco de comprometimento fetal. Além disso, esses medicamentos não são recomendados para as nutrizes.

Anticoagulação oral profilática foi utilizada no passado para prevenir a formação de trombo mural em outras formas de miocardipatia. O uso de anticoagulantes em pacientes com função ventricular esquerda reduzida e com ritmo sinusal permanece controverso, e o uso de anticoagulantes nessa situação não é de rotina. Recomenda-se varfarina ou um anticoagulante oral de ação direta (ACOD) quando há uma indicação específica (p. ex., embolia cerebrovascular prévia, trombo cardíaco identificado, fibrilação atrial e/ou flutter).

Tanto as diretrizes da American Heart Association como as da European Society of Cardiology recomendam considerar a anticoagulação para as pacientes com cardiomiopatia periparto com fração de ejeção muito baixa, pelo risco do estado de hipercoagulabilidade gestacional (1, 2). Heparina de baixo peso molecular tem sido utilizada. Entretanto, varfarina e provavelmente anticoagulantes orais de ação direta não devem ser utilizados durante determinados estágios da gestação devido ao risco fetal.

O tratamento médico da insuficiência cardíaca reduz o risco de arritmia, mas pode-se utilizar um cardioversor desfibrilador implantável para prevenir morte por arritmia súbita em pacientes que continuam a ter uma fração de ejeção reduzida apesar da terapia médica ideal. Como o bloqueio AV durante miocardite aguda geralmente desaparece, um marca-passo permanente normalmente não é necessário imediatamente. Mas um marca-passo permanente pode ser necessário se o bloqueio AV persistir ou surgir durante a fase crônica dilatada. Se os pacientes desenvolverem alargamento do complexo QRS com baixa fração de ejeção ventrículo esquerdo e sintomas graves apesar do tratamento médico otimizado, pode-se considerar terapia de ressincronização cardíaca.

Pacientes com insuficiência cardíaca refratária apesar do tratamento podem ser candidatos a transplante de coração. Critérios de seleção incluem ausência de doenças sistêmicas associadas, doenças psicológicas e elevação irreversível da resistência vascular pulmonar; como há escassez de doadores de coração, a prioridade é maior para pacientes mais jovens (em geral, < 70 anos). Pode-se também considerar dispositivos de assistência ventricular esquerda (DAVE) como uma ponte para o transplante de coração ou como terapia de destino em alguns pacientes (p. ex., pacientes que não são elegíveis ao transplante cardíaco). Na terapia de destino, usa-se um DAVE como uma terapia permanente para pacientes com insuficiência cardíaca refratária (em vez de como uma medida temporária antes do transplante cardíaco).

Referências sobre o tratamento

  1. 1. Bozkurt B, Colvin M, Cook J, et al: Current diagnostic and treatment strategies for specific dilated cardiomyopathies: A Scientific Statement From the American Heart Association. Circulation 134(23):e579–e646.2, 2016.

  2. 2. Regitz-Zagrosek V, Roos-Hesselink JW, Bauersachs J, et al: 2018 ESC Guidelines for the management of cardiovascular diseases during pregnancy: The Task Force for the Management of Cardiovascular Diseases during Pregnancy of the European Society of Cardiology (ESC). Eur Heart J 39: 3165–3241, 2018.

Pontos-chave

  • Na cardiomiopatia dilatada, o miocárdio se dilata, diminui e se hipertrofia.

  • As causas podem ser infecção (geralmente viral), toxinas, distúrbios metabólicos, genéticas ou do tecido conjuntivo.

  • Realizar radiografia de tórax, ECG, ecocardiograma e RM cardíaca para avaliar a extensão da doença e biópsia do endomiocárdio em pacientes selecionados.

  • Procurar outras causas da insuficiência cardíaca.

  • Se possível, tratar a causa primária e utilizar medidas padrão de tratamento da insuficiência cardíaca [p. ex., inibidores da enzima conversora de angiotensina (ECA), betabloqueadores, bloqueadores do receptor de aldosterona, bloqueadores do receptor da angiotensina II, inibidores do receptor da angiotensina/neprilisina (IRAN), inibidores de sodium glucose cotransporter 2 protein (SGLT2), hidralazina/nitratos, diuréticos, digoxina, cardioversor-desfibrilador implantável e/ou terapia de ressincronização cardíaca].

  • Usar anticoagulantes orais e imunossupressores em pacientes selecionados.

Informações adicionais

Os recursos em inglês a seguir podem ser úteis. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo desses recursos.

  1. American Heart Association guidelines on dilated cardiomyopathies: Bozkurt B, Colvin M, Cook J, et al: Current diagnostic and treatment strategies for specific dilated cardiomyopathies: A Scientific Statement From the American Heart Association. Circulation 134(23):e579–e646.2, 2016.

  2. European Society of Cardiology guidelines on cardiomyopathy in pregnant patients: Regitz-Zagrosek V, Roos-Hesselink JW, Bauersachs J, et al: 2018 ESC Guidelines for the management of cardiovascular diseases during pregnancy: The Task Force for the Management of Cardiovascular Diseases during Pregnancy of the European Society of Cardiology (ESC). European Heart Journal 39: 3165–3241, 2018.

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