Distrofia muscular de Duchenne e distrofia muscular de Becker

(Distrofia muscular de Duchenne; distrofia muscular de Becker)

PorMichael Rubin, MDCM, New York Presbyterian Hospital-Cornell Medical Center
Revisado/Corrigido: jan 2022
Visão Educação para o paciente

São distrofias de transmissão recessiva ligada ao X, caracterizadas por fraqueza progressiva dos músculos proximais, causadas por degeneração das fibras musculares. A distrofia de Becker tem início mais tardio e ocasiona sintomas mais leves. O diagnóstico é sugerido clinicamente e confirmado por testes genéticos ou análise do produto proteico (distrofina) do gene mutado. O tratamento é voltado à manutenção da função por meio de fisioterapia e uso de talas e órteses. Pacientes com distrofia de Duchenne devem receber prednisona ou deflazacorte e, às vezes, terapias de salto de éxon utilizando oligonucleotídeos antissense.

Distrofias musculares são distúrbios musculares progressivos hereditários resultantes de defeitos em um ou mais genes necessários para a função e estrutura muscular normal; alterações distróficas (p. ex., necrose e regeneração das fibras musculares) são vistas nas amostras de biópsia.

As distrofias de Duchenne e de Becker são a segunda forma mais prevalente de distrofia muscular (depois da distrofia fácio-escápulo-umeral). São causadas por mutações do gene da distrofina, o maior gene humano conhecido, no locus Xp21.2. Cerca de 70% dos casos de distrofia de Duchenne são causados por deleção ou duplicação de um único ou múltiplos éxons. Na distrofia de Becker, 85% dos pacientes têm uma deleção, e 10% têm uma duplicação.

Na distrofia de Duchenne, essa mutação acarreta ausência grave (< 5%) da distrofina, uma proteína na membrana da célula muscular. Na distrofia de Becker, as mutações resultam na produção anormal de distrofina ou insuficiência de distrofina.

Distrofia de Duchenne e distrofia de Becker juntas afetam cerca de 1/5000 a 1/6.000 nascidos vivos do sexo masculino; a maioria tem distrofia de Duchenne. Mulheres portadoras podem ter níveis elevados assintomáticos de creatinoquinase (CK) e possibilidade de hipertrofia da panturrilha.

Sinais e sintomas

Distrofia de Duchenne

Esse distúrbio afeta cerca de 10/100.000 nascimentos vivos do sexo masculino e tipicamente se manifesta entre 2 e 3 anos de idade. A fraqueza afeta os músculos proximais, e no início, geralmente, os membros inferiores. Crianças frequentemente andam nas pontas dos pés e têm marcha anserina e hiperlordose lombar. Elas têm dificuldade de correr, saltar, subir escadas e levantar do chão. As crianças caem com frequência, muitas vezes causando fraturas nos membros superiores ou inferiores (em cerca de 20% dos pacientes). A progressão da fraqueza é constante, desenvolvendo-se contratura em flexão dos membros e escoliose em praticamente todas as crianças. Surge firme pseudo-hipertrofia (grandes grupos musculares são substituídos por gordura e tecido fibroso, principalmente panturrilhas). Aos 12 anos, a maioria das crianças precisa de cadeira de rodas e morre por complicações respiratórias aos 20 anos.

As consequências do envolvimento do miocárdio incluem cardiomiopatia dilatada, anormalidades de condução e arritmias. Essas complicações ocorrem em cerca de um terço dos pacientes com 14 anos de idade e em todos os pacientes com mais de 18 anos de idade; entretanto, como esses pacientes não são capazes de fazer exercícios, o envolvimento cardíaco é geralmente assintomático até o final da doença. Cerca de um terço manifesta leve inteligência deficiente, porém progressiva, o que afeta mais a habilidade verbal do que o desempenho de atuação.

Distrofia de Becker

Em comparação com a distrofia de Duchenne, a distrofia de Becker afeta < 8/100.000 nascidos vivos do sexo masculino, tipicamente torna-se sintomática muito mais tarde e é mais leve. A deambulação é geralmente preservada até pelo menos os 15 anos, e muitos assim permanecem até a vida adulta. A maioria dos afetados sobrevive até os 30 ou 40 anos.

Diagnóstico

  • Análise das mutações do DNA

  • Às vezes, biópsia do músculo com análise da distrofina por imunocoloração

A suspeita diagnóstica baseia-se em quadro clínico, idade do acometimento e história familiar sugestiva de herança recessiva ligada ao X. A eletromiografia mostra alterações miopáticas (potenciais de unidades motoras rapidamente recrutados, de curta duração e de baixa amplitude). Quando feita, a biópsia muscular mostra necrose e variação acentuado no tamanho da fibra muscular não segregada pela unidade motora. Níveis de creatinina quinase (CK) estão elevados em até 100 vezes o normal.

A análise de mutação do DNA de leucócitos no sangue periférico utilizando amplificação multiplex de sondas dependente de ligação (MLPA) é o teste confirmatório primário; pode identificar anormalidades no gene dystrophin. Se uma anormalidade não é detectada pela MLPA, mas se ainda há a suspeita de distrofia de Duchenne ou de Becker, pode-se realizar sequenciamento completo do gene dystrophin para detectar pequenas alterações genéticas, como mutações pontuais.

Se o teste genético não confirma o diagnóstico, deve-se fazer análise da distrofina por imunocoloração das amostras da biópsia muscular. A distrofina é indetectável em pacientes com distrofia de Duchenne. Em pacientes com distrofia de Becker, a distrofina costuma ser anormal (peso molecular mais baixo) ou está presente em baixa concentração.

Os pacientes com distrofia de Duchenne devem ser submetidos à avaliação básica da função cardíaca com ECG e ecocardiografia no momento do diagnóstico ou aos 6 anos de idade.

A averiguação de portadores e o diagnóstico pré-natal são possíveis utilizando-se estudos convencionais (p. ex., genealogia, avaliações da creatinina quinase (CK), determinação do sexo fetal) combinados à análise do DNA recombinante e distrofina do tecido muscular.

Tratamento

  • Medidas de suporte

  • Às vezes, correção cirúrgica

  • Algumas vezes, para cardiomiopatia, um inibidor da enzima conversora de angiotensina (ECA) e/ou betabloqueador

  • Para distrofia de Duchenne, prednisona ou deflazacorte e, às vezes, oligonucleotídeos antisense (terapias para pular o exon)

Não existe tratamento específico. Incentiva-se exercício ativo leve (isto é, submáximo) pelo maior tempo possível para evitar atrofia por desuso ou complicações decorrentes da inatividade. Os exercícios passivos podem alongar o período de ambulação. O objetivo das intervenções ortopédicas deve ser manter a função e prevenir contraturas. A ortose tornozelo-pé utilizada durante o sono pode ajudar a prevenir contraturas por flexão. Aparelhos nas pernas podem ajudar temporariamente a preservar a ambulação ou a permanência de pé. Às vezes, é necessária a cirurgia corretiva, particularmente para escoliose. Obesidade deve ser evitada; as necessidades calóricas são provavelmente menores do que o normal por causa da atividade física reduzida.

A insuficiência respiratória pode ser tratada com suporte ventilatório não invasivo (p. ex., máscara nasal — see page Estado asmático). A traqueostomia eletiva tem ganhado aceitação, permitindo à criança com distrofia de Duchenne viver até os 20 anos.

Para crianças com cardiomiopatia dilatada, um inibidor s da enzima conversora de angiotensina (ECA) e/ou um betabloqueador pode ajudar a prevenir ou desacelerar a progressão.

As terapias investigativas para distrofia de Duchenne e distrofia de Becker são a terapia gênica, creatina, inativação da miostatina, progenitores do músculo esquelético e o antioxidante idebenona.

Indica-se aconselhamento genético.

Opções farmacológicas para distrofia de Duchenne

Na distrofia de Duchenne, as diretrizes mais recentes recomendam fortemente prednisona ou deflazacorte diário para pacientes > 5 anos de idade que não estão mais ganhando ou têm habilidades motoras em declínio (1). O efeito desses fármacos ocorre tão cedo quanto 10 dias após o início da terapia; o pico da eficácia ocorre em 3 meses e persiste por 6 meses. O uso a longo prazo melhora a força, atrasa a idade em que perde-se a deambulação em 1,4 a 2,5 anos, melhora os testes funcionais cronometrados (mensuração da rapidez com que a criança completa uma tarefa funcional, como caminhar ou levantar-se do chão), melhora a função pulmonar, reduz complicações ortopédicas (p. ex., a necessidade de cirurgia para escoliose), estabiliza a função cardíaca (p. ex atrasa o início da cardiomiopatia até aos 18 anos de idade) e aumenta a sobrevida em 5 a 15 anos (1). Prednisona em dias alternados não é eficaz. Ganho de peso e fácies cushingoides são efeitos adversos comuns após 6 a 18 meses. O risco de fraturas vertebrais por compressão e fraturas de ossos longos também é maior. Deflazacorte pode estar associado a maior risco de catarata do que a prednisona. O uso de prednisona ou deflazacorte para a distrofia de Becker ainda não foi estudado de maneira adequada.

Terapias de salto de éxon não foram aprovadas para o tratamento da distrofia de Duchenne. Três dessas terapias são eteplirsen, golodirsen e viltolarsen. Esses fármacos são chamados oligonucleotídeos antissense e funcionam como adesivos moleculares para o gene dystrophin no qual um ou mais éxons estão ausentes (os éxons ausentes impedem que a proteína completa seja montada, causando sintomas graves). Os fármacos mascaram um éxon, de modo que sejam ignorados e ignorados durante a produção de proteínas. Isso possibilita a produção de uma proteína distrofina que, embora não normal, é funcional e pode diminuir os sintomas. Assim, os sintomas são mais parecidos com aqueles em meninos com distrofia muscular de Becker menos grave.

Eteplirsen pula o éxon 51. Dados limitados sugerem que o eteplirsen provoca aumento da distrofina nos músculos e aumento do desempenho em testes de caminhada cronometrados em 13% dos pacientes com distrofia de Duchenne que têm a mutação do gene dystrophin que é passível de salto do éxon 51. A aprovação do fármaco foi criticada porque se baseou em um pequeno estudo que considerava um desfecho alternativo (distrofina na biópsia muscular), e cujo benefício clínico ainda não foi comprovado. A dose recomendada de eteplirsen é 30 mg/kg por infusão IV durante 35 a 60 minutos, 1 vez/semana.

Golodirsen e viltolarsen pulam o éxon 53. Pode-se utilizá-la em 8% dos pacientes com distrofia de Duchenne que têm uma mutação no gene distrofina passível de salto do éxon 53. O benefício clínico ainda não foi comprovado. A dose recomendada de golodirsen é 30 mg/kg de infusão IV durante 35 a 60 minutos, uma vez por semana, e a dose de viltolarsen é 80 mg/kg de infusão IV uma vez por semana.

Atalureno (PTC124) é um fármaco administrado por via oral disponível na União Europeia e no Reino Unido para o tratamento de defeitos genéticos provocados por mutações nonsense (parada prematura). É uma opção para pacientes com distrofia de Duchenne com idade de 2 anos ou mais que deambulam e cuja doença é causada por mutações nonsense, que faz com que a produção da proteína distrofina na célula pare muito cedo, resultando em uma proteína que não é capaz de funcionar normalmente. O benefício clínico também não foi comprovado e ainda não foi aprovado nos Estados Unidos (2).

Referências sobre o tratamento

  1. 1. Gloss D, Moxley RT 3rd, Ashwal S, Oskoui M: Practice guideline update summary: Corticosteroid treatment of Duchenne muscular dystrophy: Report of the Guideline Development Subcommittee of the American Academy of Neurology. Neurology 86:465–472, 2016. doi: 10.1212/WNL.0000000000002337

  2. 2. McDonald CM, Campbell C, Torricelli RE, et al: Ataluren in patients with nonsense mutation Duchenne muscular dystrophy (ACT DMD): A multicentre, randomised, double-blind, placebo-controlled, phase 3 trial. Lancet 390:(10101):1489–1498, 2017. doi: 10.1016/S0140-6736(17)31611-2

Pontos-chave

  • As distrofias de Becker e Duchenne são doenças recessivas ligada ao X que causam queda nos níveis de distrofina, uma proteína nas membranas das células musculares.

  • Pacientes têm fraqueza progressiva significativa que causa incapacidade grave, incluindo dificuldade para caminhar, quedas frequentes, cardiomiopatia dilatada e morte prematura devido à insuficiência respiratória.

  • Exercícios ativos e passivos são úteis, juntamente com talas de membro inferior e órteses tornozelo-pé.

  • Na distrofia de Duchenne, prednisona ou deflazacorte diário melhoram a força e massa musculares, melhorar a função pulmonar e ajudar a atrasar o início da cardiomiopatia, embora efeitos adversos sejam comuns.

  • Para pacientes com distrofia de Duchenne com certas mutações, eteplirsen, golodirsen ou viltolarsen, apesar das evidências limitadas do benefício clínico, também podem ser utilizados.

  • Um inibidor da enzima conversora de angiotensina (ECA) e/ou um betabloqueador pode ajudar a prevenir ou desacelerar a progressão da cardiomiopatia.

  • Suporte ventilatório (não invasivo e, mais tarde, invasivo) pode ajudar a prolongar a vida.

Informações adicionais

Os recursos em inglês a seguir podem ser úteis. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo desses recursos.

  1. Muscular Dystrophy Association: informações sobre pesquisas, tratamentos, tecnologias e suporte para pacientes com distrofia muscular de Duchenne e distrofia muscular de Becker

  2. National Organization for Rare Disorders: informações abrangentes sobre distrofia muscular de Duchenne e distrofia muscular de Becker, incluindo terapias convencionais e experimentais e links para assuntos relacionados

  3. Muscular Dystrophy News Today: um site com notícias e informações sobre a distrofia muscular

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