Incontinência urinária em adultos

PorPatrick J. Shenot, MD, Thomas Jefferson University Hospital
Revisado/Corrigido: set 2023
Visão Educação para o paciente

A incontinência urinária é a perda involuntária de urina; alguns especialistas consideram sua presença apenas quando o paciente acredita que seja um problema. A doença muitas vezes não é reconhecida e relatada. Muitos pacientes não relatam o problema a seus médicos e muitos médicos não questionam sobre incontinência especificamente. A incontinência pode ocorrer em qualquer idade, mas é mais comum em idosos e mulheres, afetando cerca de 30% das mulheres idosas e 15% dos homens idosos.

A incontinência reduz muito a qualidade de vida, causando constrangimento, estigmatização, isolamento e depressão. Vários pacientes idosos são institucionalizados, pois sua incontinência é uma carga para os cuidadores. Em pacientes restritos ao leito, a urina irrita e macera a pele, contribuindo para a formação de úlceras de decúbito sacrais. Idosos com urgência miccional apresentam maior risco de quedas e fraturas.

(Ver também Incontinência urinária em crianças e Visão geral da micção.)

Tipos

A incontinência pode se manifestar como gotejamento constante ou micção intermitente, com ou sem percepção da necessidade de urinar. Alguns pacientes apresentam urgência extrema (necessidade incontrolável de urinar) com pouco ou nenhum aviso e podem ser incapazes de inibir a micção até chegar ao banheiro. A incontinência pode ocorrer ou ser agravada por manobras que aumentam a pressão intra-abdominal. Gotejamento pós-miccional é extremamente comum e provavelmente uma variante normal em homens. A identificação do padrão clínico algumas vezes é útil, mas as causas se sobrepõem com frequência e a maioria dos tratamentos é igual.

Incontinência de urgência é a perda não controlada de urina (de volume moderado a grande), que ocorre imediatamente após uma necessidade urgente e incontrolável de urinar. Noctúria e incontinência noturna são comuns. A incontinência de urgência é o tipo de incontinência mais comum em idosos, mas pode afetar indivíduos mais jovens. Em geral, é precipitada pela utilização de diuréticos e exacerbada pela incapacidade de chegar rapidamente a um banheiro. Em mulheres, a vaginite atrófica, comum com o envelhecimento, contribui para o afilamento e a irritação da uretra e para a urgência.

Incontinência de esforço (ou de estresse) é a perda de urina decorrente de aumentos abruptos da pressão intra-abdominal (p. ex., tosse, espirros, risadas, curvar o corpo, ou erguer pesos). O volume perdido é habitualmente pequeno a moderado. É o 2º tipo mais comum de incontinência em mulheres, principalmente em decorrência de complicações de partos e de desenvolvimento de uretrites atróficas. Homens podem desenvolver incontinência urinária por estresse após procedimentos como a prostatectomia radical. A incontinência de estresse é tipicamente mais grave em indivíduos com obesidade em razão da pressão do conteúdo abdominal sobre a bexiga.

Incontinência por transbordamento é o gotejamento de urina de uma bexiga cheia demais. O volume habitualmente é pequeno, mas as perdas podem ser constantes, resultando em perdas totais grandes. A incontinência por transbordamento é o 2º tipo mais comum de incontinência em homens.

Incontinência funcional é a perda de urina decorrente de alterações cognitivas e físicas (p. ex., demência ou acidente vascular encefálico) ou de barreiras ambientais que interfiram com o controle da micção. Por exemplo, o paciente pode não reconhecer a necessidade de urinar, pode não saber onde está o banheiro, ou não ser capaz de caminhar até um banheiro localizado mais longe. Os mecanismos neurais e do trato urinário que mantêm a continência podem ser normais.

Incontinência mista é qualquer das combinações dos tipos citados anteriormente. As associações mais comuns são de incontinências de urgência e esforço e incontinências de urgência ou esforço e funcional.

Etiologia da incontinência urinária em adultos

A doença tende a diferir entre as faixas etárias. Com a idade, ocorre diminuição da capacidade vesical, a capacidade de inibir a micção diminui e contrações involuntárias da bexiga (hiperatividade do detrusor) ocorrem com maior frequência e a contratilidade da bexiga é alterada. Assim, a micção torna-se mais difícil de adiar e tende a ser incompleta. O volume residual pós-miccional aumenta, provavelmente para 100 mL (normal < 50 mL). Ocorre enfraquecimento da fáscia endopélvica.

Em mulheres na pós-menopausa, a diminuição das concentrações de estrogênio causa uretrite e vaginite atróficas e diminuição da resistência uretral, do comprimento e da pressão máxima de fechamento uretral.

Em homens, a próstata aumenta de tamanho, obstruindo parcialmente a uretra, causando enchimento incompleto da bexiga e forçando o músculo detrusor. Essas alterações ocorrem em muitos idosos normais e continentes e podem facilitar a incontinência devido a outra causa, mas o aumento do tamanho da próstata por si só não causa incontinência.

Em pacientes mais jovens, condições autolimitadas, como infecção do trato urinário ou vaginite, podem causar incontinência transitória. Nesses casos, com frequência começa de forma súbita, pode causar pequena perda e habitualmente é solucionada de modo rápido com pouco ou nenhum tratamento. Muitas vezes, a incontinência tem uma causa única em pacientes mais jovens, mas pode ter diversas causas em idosos.

Conceitualmente, a caracterização de causas de incontinência reversível (transitória) ou estabelecida pode ser útil. Entretanto, as causas e os mecanismos geralmente se sobrepõem e ocorrem associações.

Incontinência transitória

Existem várias causas da incontinência transitória (ver tabela Causas da incontinência transitória). Uma forma mnemônica útil para várias causas reversíveis é DIAPPERS: delirium (delírio), infection (infecção) (habitualmente infecções sintomáticas do trato urinário), atrophic urethritis and vaginitis (vaginite e uretrite atróficas), pharmaceuticals (fármacos) (p. ex., aqueles com atividade alfa-adrenérgica, colinérgica, ou anticolinérgica; diuréticos; sedativos), psychiatric disorders (doenças psiquiátricas) (em especial, depressão), excess urine output (excesso de débito urinário) (poliúria), restricted mobility (mobilidade restrita) e stool impaction (impactação fecal).

Tabela

Incontinência estabelecida

A incontinência estabelecida é causada por problema persistente que afeta nervos ou músculos. Os mecanismos utilizados habitualmente para descrever esse problema são hiperatividade e hipoatividade do detrusor, incompetência ou obstrução do colo vesical, dissinergia do esfíncter do detrusor ou uma associação dessas causas (ver tabela Causas da incontinência estabelecida). Entretanto, esses mecanismos também estão envolvidos em algumas causas reversíveis.

Tabela

Incompetência do colo vesical é uma causa comum de incontinência de esforço. Em mulheres, habitualmente decorre de fraqueza do assoalho pélvico ou da fáscia endopélvica. Essa fraqueza comumente resulta de vários partos vaginais, cirurgia pélvica (incluindo histerectomia), alterações relacionadas com a idade (incluindo uretrite atrófica), ou associações. Como resultado, ocorre descenso da junção uretrovesical, o colo vesical e a uretra tornam-se muito móveis e a pressão na uretra cai abaixo da pressão vesical. Em homens, uma causa comum de lesão no esfíncter ou no colo vesical e na porção externa da uretra é após prostatectomia radical.

Obstrução do colo vesical é uma causa comum de incontinência em homens, mas a maioria destes com obstrução não é incontinente. A obstrução em homens comumente resulta de hiperplasia prostática benigna, câncer de próstata, ou estreitamento uretral. Em ambos os sexos, a impactação fecal pode causar obstrução. Em mulheres, a obstrução do colo vesical pode resultar de cirurgia prévia para incontinência ou de cistocele prolapsada, que causa flexão na uretra durante o esforço miccional.

A obstrução causa a hiperdistensão crônica da bexiga, que perde sua capacidade de contração e então a bexiga não se esvazia por completo, provocando transbordamento. A obstrução também pode levar à hiperatividade do detrusor e incontinência. Se o músculo detrusor perde sua capacidade de contrair, pode ocorrer incontinência por transbordamento. Algumas causas de obstrução do colo vesical são reversíveis (p. ex., grande divertículo da bexiga, cistocele, infecção da bexiga, cálculos e tumores).

Hiperatividade do detrusor é uma causa comum de incontinência de urgência em idosos e jovens. O músculo detrusor se contrai de modo intermitente sem motivo aparente, geralmente quando a bexiga está parcial ou completamente cheia. A hiperatividade do detrusor pode ser idiopática ou pode resultar de disfunção do centro frontal inibidor da micção (comumente em decorrência de alterações relacionadas com idade, demência, ou acidente vascular) ou obstrução do colo. A hiperatividade do detrusor com alteração de contratilidade é uma variante da incontinência de urgência caracterizada por urgência, frequência (polaciúria), baixa taxa de fluxo, retenção urinária, trabeculação da bexiga e volume residual pós-miccional > 50 mL. Essa variante pode mimetizar prostatismo em homens ou incontinência de esforço em mulheres.

O termo bexiga hiperativa é às vezes utilizado para descrever a urgência urinária (com ou sem incontinência) que costuma ser acompanhada de aumento na frequência urinária e noctúria.

Hipoatividade do detrusor causa retenção urinária e incontinência por transbordamento em cerca de 5% dos pacientes com incontinência. Pode ser causada por lesão na coluna ou nos nervos que inervam a bexiga (p. ex., compressão por hérnia de disco, tumor, ou cirurgia), por neuropatia periférica ou autonômica, ou por outras doenças neurológicas (ver tabela Causas da incontinência estabelecida). Anticolinérgicos e opioides diminuem muito a contratilidade do detrusor; esses fármacos são causas transitórias comuns. O detrusor pode se tornar hipoativo em homens com obstrução crônica do colo vesical, pois o detrusor é substituído por fibrose e tecido conjuntivo, impedindo a bexiga de se esvaziar mesmo após a remoção da obstrução. Em mulheres, a hipoatividade do detrusor geralmente é idiopática. Fraqueza menos intensa do detrusor é comum entre mulheres mais velhas. Essa fraqueza não causa incontinência, mas pode complicar o tratamento se coexistirem outras causas de incontinência.

Dissinergia detrusor-esfincteriana (perda de coordenação entre a contração da bexiga e o relaxamento do esfíncter urinário externo) pode causar obstrução do colo vesical, resultando em incontinência por transbordamento. A dissinergia geralmente decorre de lesão da medula espinal que interrompe as vias para o centro miccional pontino, que coordena o relaxamento do esfíncter e a contração vesical. Em vez de relaxar quando a bexiga se contrai, o esfíncter se contrai, obstruindo o colo vesical. A dissinergia causa trabeculação intensa, divertículos, uma deformação da bexiga em “árvore de natal”observada na cistografia, com hidronefrose e insuficiência renal.

Alteração funcional (p. ex., alteração cognitiva, redução da mobilidade, perda de destreza manual, doenças coexistentes, falta de motivação), em particular nos idosos, pode contribuir para estabelecer incontinência, mas raramente é considerada a causa desta.

Avaliação da incontinência urinária em adultos

A maioria dos pacientes, constrangida em mencionar a incontinência, não informa voluntariamente sobre este quadro, apesar de poderem mencionar sintomas relacionados (p. ex., polaciúria, noctúria, hesitação). Dessa maneira, a triagem de todos os adultos deve conter perguntas como “você apresenta perda de urina?”.

Os médicos não devem considerar que a incontinência seja irreversível apenas pelo fato de ter longa duração. Também a retenção urinária deve ser excluída antes de se iniciar o tratamento para hiperatividade do detrusor.

Dicas e conselhos

  • A maioria dos pacientes tem vergonha de mencionar a incontinência, assim deve-se perguntar a todos os adultos sobre a incontinência.

História

A história se concentra em duração e padrões da micção, função intestinal, uso de fármacos e história de cirurgia pélvica e obstétrica. O diário miccional fornece pistas sobre as causas. Durante 48 a 72 horas, o paciente ou o cuidador registram o volume e a ocasião de cada micção e cada episódio de incontinência em relação às atividades associadas (em especial alimentação, ingestão de líquidos e uso de fármacos) e durante o sono. A quantidade de urina perdida pode ser estimada como gotas, pequena, média, ou volumosa; ou por testes com absorventes (medindo o peso de urina absorvida pelos absorventes femininos durante um período de 24 horas).

Se o volume das micções noturnas for muito menor do que a capacidade funcional da bexiga (definida como o maior volume urinário isolado registrado no diário), a causa é um problema relacionado com o sono (pacientes urinam em razão de estarem acordados) ou com anormalidade vesical (pacientes sem disfunção vesical ou com distúrbios do sono acordam para urinar somente quando a bexiga está cheia).

Entre homens com sintomas obstrutivos (hesitação, jato urinário fraco, intermitência, sensação de esvaziamento vesical incompleto), cerca de um terço apresenta hiperatividade do detrusor sem obstrução real.

Urgência ou jato de urina sem aviso ou sem aumento precedente da pressão abdominal (em geral denominada incontinência reflexa ou inconsciente) tipicamente indica hiperatividade do detrusor.

Exame físico

O enfoque está nos exames neurológico, pélvico e retal.

O exame neurológico envolve a avaliação do estado mental, do ato de caminhar e da função dos membros inferiores e a verificação dos sinais de neuropatia periférica ou autonômica, incluindo hipotensão ortostática. Devem ser verificados o pescoço e os membros superiores para avaliação de sinais de espondilose ou estenose cervical. Deve ser verificada a coluna para evidências de cirurgias anteriores e para avaliação de deformidades, escavações e tufos de pelos, sugerindo defeitos do tubo neural.

A inervação do esfíncter uretral externo, que compartilha as mesmas raízes sacrais do esfíncter anal, pode ser testada:

  • Pela avaliação da sensibilidade no períneo

  • Pela contração voluntária do esfíncter anal (S2 a S4)

  • Pelo reflexo da prega anal (S4 a S5), que é a contração do esfíncter anal desencadeada por toque leve da pele perianal

  • Pelo reflexo bulbocavernoso (S2 a S4), que é a contração do esfíncter anal desencadeada pela aplicação de pressão na glande do pênis ou clitóris

Entretanto, a ausência desses reflexos não é necessariamente patológica.

O exame pélvico em mulheres pode identificar vaginite e uretrite atrófica, hipermobilidade uretral e fraqueza do assoalho pélvico com ou sem prolapso do órgão pélvico. A mucosa vaginal pálida e fina com perda das rugosidades indica vaginite atrófica. A hipermobilidade da uretra pode ser visualizada ao tossir, quando a parede vaginal posterior é estabilizada com um espéculo. Cistocele, enterocele, retocele, ou prolapso uterino sugerem fraqueza do assoalho pélvico. Quando a parede oposta é estabilizada com um espéculo, o abaulamento da parede anterior indica cistocele e o abaulamento da parede posterior indica retocele ou enterocele. A fraqueza do assoalho pélvico não sugere a causa, a menos que haja uma grande cistocele com prolapso.

O exame retal pode identificar impacção fecal ou massas retais e, em homens, nódulos ou massas prostáticas. O tamanho da próstata deve ser avaliado, mas se correlaciona mal à obstrução do colo vesical. A palpação suprapúbica e a percussão para detectar distensão da bexiga são habitualmente de pouco valor, exceto em casos extremamente agudos de retenção urinária.

Testes de estresse urinário podem ser feitos na mesa de exame se houver suspeita de incontinência por esforço; esse método tem uma sensibilidade e especificidade de > 90%. A bexiga deve estar cheia; o paciente senta-se na posição ereta com as pernas afastadas, relaxa a área do períneo e tosse vigorosamente uma vez:

  • A perda urinária imediata que se inicia e cessa com a tosse confirma a incontinência de esforço.

  • Perda retardada ou persistente sugere hiperatividade do detrusor desencadeada pela tosse.

Se a tosse desencadear incontinência, a manobra pode ser repetida enquanto o examinador posiciona 1 ou 2 dedos no interior da vagina para elevar a uretra (teste de Marshall-Bonney); a incontinência que é corrigida por esta manobra pode responder a uma cirurgia.

  • Os resultados podem ser falso-positivos se o paciente tem um impulso abrupto de urinar durante o teste.

  • Os resultados pode ser falso-positivos se o paciente não relaxar, a bexiga não está cheia, se a tosse não é forte ou se há uma grande cistocele (em mulheres). Em mulheres com grande cistocele, o teste deve ser repetido com o paciente em decúbito dorsal e a cistocele reduzida, se possível

Exames

  • Exame de urina, cultura de urina

  • Nitrogênio da ureia sanguínea (BUN) e creatinina sérica

  • Volume residual pós-miccional

  • Às vezes, testes urodinâmicos

São necessários exame de urina, urocultura e determinação da ureia sanguínea e da creatinina sérica. Outros exames podem incluir concentrações séricas de glicose e cálcio (em associação à albumina para estimar as concentrações de cálcio livre), se o diário miccional sugerir polaciúria; eletrólitos, se o paciente apresentar confusão; e concentrações da vitamina B12, se os achados clínicos sugerirem neuropatia.

O volume residual pós-miccional deve ser determinado por sondagem ou ultrassonografia (preferível). O volume residual pós-miccional mais o volume miccional estimam a capacidade vesical total e auxiliam a avaliação da propriocepção vesical. Um volume < 50 mL é normal; < 100 mL é geralmente aceitável em pacientes > 65 anos de idade, mas é anormal em pacientes jovens; e > 100 mL pode sugerir hipoatividade do detrusor ou obstrução do colo vesical.

O exame urodinâmico é indicado quando o exame físico e os exames anteriormente citados não estabelecerem o diagnóstico, ou quando as anormalidades precisarem ser caracterizadas de maneira adequada antes da cirurgia.

Cistometria pode auxiliar o diagnóstico de incontinência de urgência, mas a sensibilidade e a especificidade são desconhecidas. Água estéril é introduzida na bexiga com incrementos de 50 mL utilizando-se uma seringa de 50 mL e uma sonda uretral de 12 a 14 Fr, até o paciente apresentar urgência ou contrações vesicais, detectadas por alterações na concentração de líquido na seringa. Se a urgência ou as contrações ocorrerem com < 300 mL, há probabilidade de hiperatividade do detrusor ou de incontinência de urgência.

A taxa máxima de fluxo urinário é utilizada para confirmar ou excluir obstrução do colo vesical em homens. Os resultados dependem do volume vesical inicial, mas uma taxa máxima de fluxo < 12 mL/segundo com volume urinário 200 mL e micção prolongada sugerem obstrução do colo vesical ou hipoatividade do detrusor. Uma taxa de 12 mL/segundo exclui a obstrução e pode sugerir hiperatividade do detrusor. Durante o exame, os pacientes são orientados a colocar a mão sobre o abdome e verificar a tensão durante a micção, em especial se houver suspeita de incontinência por esforço e se houver a possibilidade de cirurgia. O esforço sugere fraqueza do detrusor e pode predispor os pacientes à retenção pós-operatória.

Na cistometrografia, as curvas de pressão-volume e a sensibilidade vesical são registradas enquanto a bexiga é preenchida com água estéril; o teste provocativo (com betanecol ou água gelada) é utilizado para estimular as contrações da bexiga.

Eletromiografia do músculo perineal é empregada para avaliar a inervação e a função do esfíncter. Pressões uretral, abdominal e retal podem ser determinadas.

O estudo de vídeo de medidas de pressão de fluxo, geralmente realizado com a cistouretrografia miccional, pode se correlacionar a contração vesical, competência do colo vesical e sinergia detrusor-esfincteriana, mas este equipamento não está amplamente disponível.

Tratamento da incontinência urinária em adultos

  • Treinamento vesical

  • Exercícios de Kegel

  • Medicamentos

As causas específicas são tratadas e os medicamentos que podem causar ou agravar a incontinência são interrompidas, ou o esquema de dosagem é alterado (p. ex., a dose de diurético é administrada de modo que o paciente possa estar próximo ao banheiro quando ocorrer o efeito do medicamento). Outros tratamentos baseiam-se no tipo de incontinência. Independentemente do tipo ou da causa, algumas medidas gerais são habitualmente úteis.

Medidas gerais

Os pacientes são instruídos a limitar a ingestão de líquidos em certas ocasiões (p. ex., antes de sair, 3 a 4 horas antes de deitar), a evitar líquidos que irritem a bexiga (p. ex., líquidos que contenham cafeína) e a ingerir 1.500 a 2.000 mL de líquido por dia (pois a urina concentrada irrita a bexiga).

Alguns pacientes, em especial aqueles com diminuição da mobilidade ou alteração cognitiva, beneficiam-se de uma vasilha portátil (urinol). Outros utilizam absorventes ou roupas de baixo absorventes específicas. Esses produtos podem geralmente melhorar a qualidade de vida dos pacientes e de seus cuidadores. Entretanto, não devem substituir medidas que possam controlar ou eliminar a incontinência e devem ser trocados frequentemente para evitar irritação da pele e desenvolvimento de infecção do trato urinário.

Treinamento vesical

Os pacientes podem se beneficiar do treinamento vesical (mudança de hábitos miccionais) e de mudanças na ingestão de líquidos. O treinamento vesical geralmente envolve micções programadas (a cada 2 a 3 horas) enquanto o paciente está acordado. Ao longo do tempo, esse intervalo pode ser aumentado a cada 3 a 4 horas enquanto acordado. Micção imediata é utilizada para pacientes com deficiências cognitivas; são solicitados a urinar a cada 2 horas, com vontade ou não, se estiverem molhados ou secos. Um diário miccional auxilia a estabelecer o quão frequente e quando a micção é indicada e se o paciente apresenta sensação de bexiga cheia.

Exercícios de Kegel

Exercícios para a musculatura pélvica (p. ex., exercícios de Kegel) geralmente são eficazes, especialmente para a incontinência de esforço. Os pacientes devem contrair os músculos pélvicos (pubococcígeos e paravaginais) em vez de os músculos da coxa, abdominais ou da nádega. Os músculos são contraídos por 10 segundos, então relaxados por 10 segundos 10 a 15 vezes 3 vezes ao dia. Em geral, é necessária a reinstrução e o biofeeback costuma ser útil. Em mulheres < 75 anos de idade, a taxa de cura é de 10 a 25% e a melhora ocorre em 40 a 50% adicionais, em especial se a paciente estiver motivada; se realizar os exercícios de acordo com as instruções; se receber instruções por escrito, tiver consultas de seguimento para motivação, ou ambos. Frequentemente, pode-se fortalecer músculos do assoalho pélvico fracos ou disfuncionais por meio de programas de fisioterapia especializados orientados por profissionais com experiência nessa área.

A estimulação elétrica do assoalho pélvico é uma versão automática dos exercícios de Kegel; utiliza a corrente elétrica para inibir a hiperatividade do detrusor e contrair os músculos pélvicos. As vantagens incluem aumento da complacência e contração correta dos músculos pélvicos, mas os benefícios sobre as alterações comportamentais isoladas não são claros.

Fármacos

Medicamentos são frequentemente úteis (ver tabela Medicamentos utilizados para tratar incontinência). Esses fármacos incluem anticolinérgicos e antimuscarínicos, que relaxam o detrusor, e alfa-agonistas, para aumentar o tônus do esfíncter. Fármacos com efeitos anticolinérgicos intensos devem ser utilizadas criteriosamente em idosos. Inibidores de 5-alfa-redutase podem ser utilizados para tratar obstrução do colo vesical em homens com urgência ou incontinência por transbordamento. Alguns desses fármacos são utilizados de maneira que não segue as indicações homologadas para aquele fármaco (uso off-label).

Tabela

Incontinência de urgência

O objetivo do tratamento é reduzir a hiperatividade do detrusor; inicia-se por treinamento vesical, exercícios de Kegel e técnicas de relaxamento (1). O biofeedback pode ser utilizado com esses tratamentos. Também podem ser necessárias fármacos e autocateterismo intermitente (p. ex., quando o volume residual pós-miccional for grande). Mais raramente, utilizam-se estímulo do nervo sacral, tratamentos intravesicais e cirurgia.

O treinamento vesical ajuda o paciente a tolerar e por fim inibir as contrações do detrusor. Os intervalos de micção regulares são gradualmente ampliados (p. ex., 30 minutos a cada 3 dias depois de mantido o controle urinário) a fim de melhorar a tolerância das contrações do detrusor. As técnicas de relaxamento podem melhorar as respostas físicas e emocionais à urgência miccional. Relaxar, permanecer no local, ou sentar (em vez de correr para o banheiro) e contrair a musculatura do assoalho pélvico podem auxiliar o paciente a suprimir a urgência miccional.

Medicamentos (ver tabela Medicamentos utilizados para tratar incontinência) devem suplementar e não substituir as mudanças comportamentais. Os mais comumente utilizados são oxibutinina e tolterodina; ambos são anticolinérgicos e antimuscarínicos e podem ser utilizados por via oral uma vez ao dia. Oxibutinina está disponível como adesivo cutâneo trocado duas vezes por semana, bem como géis tópicos aplicados à pele diariamente.

Fármacos novos com propriedades anticolinérgicas e antimuscarínicas incluem a solifenacina e a darifenacina, tomadas por via oral, uma vez ao dia, e trospium, administrada uma ou duas vezes ao dia. Fármacos podem ser necessários para supressão de sintomas de urgência decorrentes de atividade excessiva (hiperatividade) do detrusor com contratilidade prejudicada. Os fármacos com início rápido de ação (p. ex., oxibutinina de liberação imediata) podem ser utilizadas profilaticamente se a incontinência ocorrer em momentos previsíveis. A associação de fármacos pode aumentar tanto a eficácia como os efeitos colaterais, possivelmente limitando essa abordagem em idosos. Onabotulinum toxina A é administrada via injeção cistoscópica no músculo do detrusor e é útil no tratamento da incontinência de urgência refractária a outros tratamentos em pacientes com causas neurológicas (p. ex., esclerose múltipla, disfunção da coluna). Vibegron é um agonista beta-3 adrenérgico utilizado para tratar bexiga hiperativa com sintomas de incontinência urinária de urgência, urgência e frequência urinária (2).

A estimulação dos nervos sacrais está indicada para pacientes com incontinência de urgência grave e refratária a outros tratamentos. Parece agir por meio de inibição central dos nervos aferentes sensoriais. O procedimento começa com estimulação percutânea das raízes nervas S3 por pelo menos 3 dias; se o paciente responder, um neuroestimulador é implantado de forma permanente sob a pele da nádega.

A estimulação do nervo tibial posterior (PTNS) é uma técnica semelhante de neuromodulação elétrica para o tratamento de disfunção miccional que foi desenvolvida como uma alternativa menos invasiva para a estimulação tradicional do nervo sacral. A agulha é inserida acima dos maléolos mediais perto do nervo tibial posterior, seguida pela aplicação da estimulação de baixa tensão em sessões de 30 minutos administradas semanalmente durante 10 a 12 semanas. A durabilidade da PTNS é incerta.

A cirurgia é o último recurso, geralmente utilizada apenas em pacientes jovens com incontinência de urgência grave, refratária a outros tratamentos. A cistoplastia para ampliação vesical, na qual uma seção do intestino é fixada à bexiga para aumentar sua capacidade, é a mais comum. O autocateterismo intermitente pode ser necessário se o paciente apresentar contrações vesicais fracas e não conseguir coordenar a pressão abdominal (manobra de Valsalva) com o relaxamento do esfíncter. A miomectomia do detrusor e a derivação urinária são outras opções. Como último recurso, um desvio urinário pode ser criado para desviar a urina fora da bexiga. A escolha do procedimento se baseia na presença de outras doenças, nas limitações físicas e preferências do paciente.

Incontinência por esforço

O tratamento é por treinamento vesical e exercícios de Kegel. Medicamentos, cirurgia (3) e outros procedimentos, ou, nas mulheres, dispositivos oclusivos, também são habitualmente necessários. O tratamento é geralmente direcionado à incompetência do colo vesical, mas também engloba os tratamentos da incontinência de urgência se houver hiperatividade do detrusor. Evitar esforço físico que provoque incontinência pode ajudar. A perda ponderal pode auxiliar a diminuir a incontinência em pacientes obesos.

Medicamentos (ver tabela Medicamentos utilizados para tratar incontinência) incluem pseudoefedrina, que pode ser útil em mulheres com incompetência do colo vesical; imipramina, que pode ser utilizada para incontinência mista de esforço e de urgência, ou para cada uma separadamente; e duloxetina. Se a incontinência de esforço decorrer de uretrite atrófica, o estrogênio tópico (estradiol) geralmente é eficaz.

Cirurgia ou outros procedimentos oferecem as melhores probabilidades de cura quando os tratamentos não invasivos são ineficazes. A suspensão do colo vesical é utilizada para corrigir a hipermobilidade uretral. Slings suburetrais, injeção de agentes para aumentar o volume periuretral, ou inserção cirúrgica de esfíncter artificial são utilizados para tratamento da insuficiência esfincteriana. A escolha depende da capacidade da paciente de tolerar a cirurgia, da necessidade de outras cirurgias (p. ex., histerectomia, reparo de cistocele) e da experiência local (2).

Os dispositivos oclusivos podem ser utilizados em mulheres idosas com ou sem prolapso uterino ou vesical e que apresentem risco cirúrgico alto ou em quem a cirurgia anterior foi ineficaz. Vários slings de malha podem ser utilizados. Pessários podem ser eficazes; elevam o colo vesical, corrigem o ângulo vesicouretral e aumentam a resistência uretral pressionando a uretra contra a sínfise púbica. Alternativas mais novas, possivelmente mais aceitáveis, incluem tampões de silicone sobre o meato uretral externo, dispositivos oclusivos intrauretrais inseridos com aplicador e próteses intravaginais de sustentação do colo vesical. Plugues intrauretrais removíveis estão em estudo.

Os esquemas de exercícios em que habitualmente se utilizam cones vaginais — nos quais cones progressivamente mais pesados são inseridos na vagina e mantidos por 15 minutos duas vezes ao dia, por meio de contração dos músculos do assoalho pélvico — também estão sendo estudados.

Incontinência por transbordamento

O tratamento depende da causa, se decorrente de obstrução do colo vesical, hipoatividade do detrusor, ou ambos.

A obstrução do colo vesical decorrente de hiperplasia prostática ou câncer é tratada com fármacos ou cirurgia; aquelas decorrentes de estreitamento uretral são tratadas com dilatação ou colocação de stent. As cistoceles em mulheres são tratadas com cirurgia ou podem ser reduzidas com a utilização de um pessário; remoção de sutura unilateral ou lise de aderências uretrais podem ser eficazes se a cistocele resultar de cirurgia. Se coexistir hipermobilidade uretral, a suspensão do colo vesical deve ser realizada.

A hipoatividade do detrusor requer a descompressão da bexiga (redução do volume residual) por autocateterismo intermitente ou, raramente, utilização temporária de sonda de demora. Várias semanas de descompressão podem ser necessárias para restaurar a função vesical. Se a função da bexiga não está completamente restaurada, manobras para aumentar a micção são utilizadas. Os exemplos incluem

  • Micção dupla (tentativa de esvaziar a bexiga uma segunda vez antes de sair do banheiro)

  • Manobra de Valsalva

  • Aplicação de pressão suprapúbica (método de Credé) durante a micção

Um detrusor completamente não contrátil requer autocateterismo intermitente ou utilização de sonda de demora. É controversa a utilização de antibióticos ou mandelato de metenamina para prevenir infecções do trato urinário em pacientes que necessitam de autocateterismo intermitente, mas provavelmente é indicada se apresentarem infecções do trato urinário sintomáticas frequentes ou próteses valvulares ou ortopédicas. Essa profilaxia não é útil para sondas de demora.

Tratamentos adicionais podem induzir contrações vesicais e promover o esvaziamento da bexiga, incluindo estimulação elétrica e o agonista colinérgico betanecol. Entretanto, o betanecol habitualmente não é eficaz e apresenta efeitos colaterais (ver tabela Medicamentos utilizados para tratar incontinência).

Incontinência refratária

Absorventes, roupas de baixo especiais e autocateterismo intermitente podem ser necessários. As sondas de demora são opções para pacientes que não conseguem andar até o banheiro ou que apresentam retenção urinária e não conseguem realizar o autocateterismo; essas sondas não são recomendadas para incontinência de urgência em razão da possibilidade de exacerbarem as contrações do detrusor. Se a sondagem for necessária (p. ex., para permitir cicatrização de úlcera de decúbito em pacientes com hiperatividade refratária do detrusor), uma sonda fina com um balão pequeno deve ser utilizada para minimizar a irritabilidade e, em consequência, a perda ao redor da sonda.

Para homens que podem aderir ao tratamento, as sondas com preservativos podem ser preferíveis em virtude da redução de risco de infecções do trato urinário; entretanto, esses catéteres podem causar rachaduras na pele e reduzir a motivação de permanecer seco. Novos dispositivos externos de coleta que utilizam sucção de baixa pressão para "absorver" a urina da paciente e colocá-la em um frasco podem ser eficazes para mulheres incontinentes. Se as contrações involuntárias da bexiga persistirem, oxibutinina ou tolterodina podem ser utilizadas. Se a mobilidade for restrita, as medidas para prevenir irritação e rachadura da pele em decorrência da urina são essenciais (ver Prevenção).

Referências sobre o tratamento

  1. 1. Lightner DJ, Gomelsky A, Souter L, et al: Diagnosis and treatment of overactive bladder (non-neurogenic) in adults: AUA/SUFU Guideline Amendment 2019. J Urol 202(3):558-563, 2019. doi: 10.1097/JU.0000000000000309

  2. 2. Staskin D, Frankel J, Varano S, et al: International phase III, randomized, double-blind, placebo and active controlled study to evaluate the safety and efficacy of vibegron in patients with symptoms of overactive bladder: EMPOWUR. J Urol 204(2):316-324, 2020. doi: 10.1097/JU.0000000000000807

  3. 3. Kobashi KC, Albo ME, Dmochowski RR, et al: Surgical treatment of female stress urinary incontinence: AUA/SUFU guideline. J Urol 198(4):875-883, 2017. doi: 10.1016/j.juro.2017.06.061

Pontos-chave

  • Como os pacientes muitas vezes não comentam abertamente que são incontinentes, perguntar sobre isso especificamente.

  • A incontinência não é uma consequência normal do envelhecimento e sempre deve ser investigada.

  • Os 4 tipos de incontinência urinária são urgência, estresse, transbordamento e funcional.

  • Mesmo algumas causas de longa duração da incontinência são reversíveis.

  • Fazer pelo menos exame de urina, cultura de urina, ureia e creatinina e medição do volume residual pós-miccional em todos os pacientes com incontinência.

  • Considerar o treinamento vesical e exercícios de Kegel.

  • Direcionar a terapia medicamentosa para corrigir o mecanismo da disfunção da bexiga.

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