Demência

(Transtorno neurocognitivo maior)

PorJuebin Huang, MD, PhD, Department of Neurology, University of Mississippi Medical Center
Reviewed ByMichael C. Levin, MD, College of Medicine, University of Saskatchewan
Revisado/Corrigido: fev. 2025 | modificado abr. 2025
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Visão Educação para o paciente

Demência é a degeneração crônica, global e geralmente irreversível da cognição. O diagnóstico é clínico; testes laboratoriais e de imagem geralmente são utilizados para identificar as causas tratáveis. O tratamento é de suporte. Medicamentos adaptados ao tipo específico de demência podem às vezes melhorar a função cognitiva.

(Ver também Visão geral do delirium e da demência.)

A demência pode ocorrer em qualquer idade, mas afeta principalmente idosos. É responsável por mais da metade das internações em casas de saúde.

Demência pode ser classificada de várias maneiras:

  • Tipo Alzheimer ou não Alzheimer

  • Cortical ou subcortical

  • Irreversível ou potencialmente reversível

Demência não deve ser confundida com delirium, embora haja comprometimento da cognição em ambos. Os seguintes ajudam a distingui-los:

  • Demência afeta principalmente a memória, costuma ser causada por alterações anatômicas no encéfalo, tem início mais lento e, geralmente, é irreversível.

  • O delirium afeta principalmente a atenção, costuma ser causado por enfermidade aguda ou toxicidade por fármacos (às vezes com risco de morte) e, geralmente, é reversível.

Outras características específicas também ajudam a distinguir esses 2 distúrbios (ver tabela Diferenças entre delírio e demência).

Etiologia da demência

As demências podem resultar de distúrbios primários do cérebro ou de outra condição (ver tabela Classificação de algumas demências).

Os tipos mais comuns de demência são

A demência também ocorre em pacientes com doença de Parkinson, doença de Huntington, paralisia supranuclear progressiva, doença de Creutzfeldt-Jakob, síndrome de Gerstmann-Sträussler-Scheinker, outras doenças priônicas, neurossífilis, infecção por HIV, traumatismo cranioencefálico (p. ex., encefalopatia traumática crônica) ou certos tumores cerebrais localizados em áreas cerebrais corticais ou subcorticais envolvidas na cognição. Os pacientes podem ter > 1 tipo (demência mista). O tipo mais comum de demência mista é a doença de Alzheimer combinada com demência vascular.

Alguns distúrbios estruturais do cérebro (p. ex., hidrocefalia de pressão normal, hematoma subdural), distúrbios metabólicos (p. ex., hipotireoidismo, deficiência de vitamina B12) e toxinas (p. ex., chumbo) causam uma deterioração lenta da cognição que pode ser solucionada com o tratamento. Essa deficiência é às vezes chamada de demência reversível, embora alguns especialistas restrinjam o termo "demência" à deterioração cognitiva irreversível.

A depressão pode simular a demência (e era denominada pseudodemência); em geral, os 2 distúrbios coexistem. Entretanto, a depressão pode ser a primeira manifestação da demência.

Comprometimento da memória associado à idade refere-se a alterações na cognição que ocorrem com o envelhecimento. Os idosos tem uma deficiência relativa de recordar, particularmente na velocidade da lembrança. Essas alterações não afetam o funcionamento diário e, portanto, não indicam demência. Mas as primeiras manifestações da demência são muito semelhantes.

Comprometimento cognitivo leve (CCL) causa maior perda de memória do que o comprometimento de memória associado à idade; memória e, às vezes, outras funções cognitivas pioram em pacientes com comprometimento cognitivo leve do que controles pareados para idade, mas tipicamente o funcionamento diário não é afetado. Por outro lado, a demência prejudica o funcionamento diário. Até 50% dos pacientes com comprometimento cognitivo leve desenvolvem demência em 3 anos.

Define-se o declínio cognitivo subjetivo (DCS), como um declínio persistente autoexperimentado na capacidade cognitiva, mas desempenho normal em testes cognitivos padronizados utilizados para classificar o comprometimento cognitivo leve (1). O risco de comprometimento cognitivo leve e demência é maior em pessoas com declínio cognitivo subjetivo.

Várias doenças podem exacerbar os deficits cognitivos em pacientes com demência. Delirium geralmente ocorre em pacientes com demência.

Medicamentos, especialmente benzodiazepinas e anticolinérgicos (p. ex., alguns antidepressivos tricíclicos, anti-histamínicos, antipsicóticos, benzotropina), podem causar ou agravar temporariamente os sintomas da demência, assim como o álcool ou drogas recreativas, mesmo em quantidades moderadas. Insuficiência renal ou hepática, nova ou progressiva, pode reduzir a depuração do medicamento e causar toxicidade após anos de administração de doses estáveis do medicamento (p. ex., propranolol).

Mecanismos de propagação do tipo priônico parecem estar envolvidos na maioria ou em todas as doenças neurodegenerativas que se manifestam primeiro em idosos. Uma proteína celular normal, de forma esporádica ou devido a uma mutação herdada, sofre dobramento anômalo e transforma-se em uma forma patogênica, ou príon. O príon então age com um modelo, fazendo com que outras proteínas de modo semelhante se tornem mal enoveladas. Esse processo ocorre ao longo dos anos e em muitas partes do sistema nervoso central (SNC). Muitos desses príons tornam-se insolúveis e, como amiloides, não pode ser prontamente eliminados pela célula. Evidências corroboram príons ou mecanismos semelhantes na doença de Alzheimer (2), bem como na doença de Parkinson, doença de Huntington, demência frontotemporal e esclerose lateral amiotrófica. Esses príons não são tão infecciosa como aqueles na doença de Creutzfeld-Jacob, mas podem ser transmitidos.

A demência rapidamente progressiva (DRP) é um grupo de distúrbios cognitivos heterogêneos que progride mais rapidamente do que outras síndromes demenciais, geralmente em 1 a 2 anos (3). A manifestação clínica mais proeminente é o declínio cognitivo (p. ex., perda de memória, déficits visuoespaciais e de linguagem, disfunção executiva). Entretanto, também ocorrem outros sintomas neuropsiquiátricos (p. ex., transtornos de comportamento, mudança de personalidade, transtornos de humor, psicose, distúrbios do sono, alteração do estado de alerta e/ou consciência, movimentos involuntários como tremor e mioclonia, distúrbios da marcha, atividades semelhantes a convulsões, ataxia, características parkinsonianas). A doença priônica é a causa mais comum da DPR. Outras causas comuns são encefalite autoimune e paraneoplásica. A progressão de outras demências também pode ser atipicamente rápida; estas incluem a doença de Alzheimer, a demência com corpos de Lewy, a demência frontotemporal e a demência por causas potencialmente reversíveis (p. ex., infecciosas, tóxicas/metabólicas, neurovasculares, psiquiátricas).

Tabela
Tabela

Referências sobre etiologia

  1. 1. Jessen F, Amariglio RE, Buckley RF, et al: The characterisation of subjective cognitive decline. Lancet Neurol 19 (3):271–278, 2020. doi: 10.1016/S1474-4422(19)30368-0

  2. 2. Crestini A, Santilli F, Martellucci S, et al: Prions and Neurodegenerative Diseases: A Focus on Alzheimer's Disease. J Alzheimers Dis 85(2):503–518, 2022. doi:10.3233/JAD-215171

  3. 3. Hermann P, Zen I: Rapidly progressive dementias — aetiologies, diagnosis and management. Nat Rev Neurol 18 (6):363–376, 2022. doi: 10.1038/s41582-022-00659-0

Sinais e sintomas da demência

(Ver também Visão geral dos sintomas comportamentais e psicológicos da demência.)

A demência afeta a cognição de forma global. O início é gradual, embora os membros da família possam perceber os deficits subitamente (p. ex., quando ocorre comprometimento de função). Em geral, o primeiro sinal é a perda da memória de curto prazo. Inicialmente, os sintomas precoces podem ser indistinguíveis daqueles do comprometimento da memória associado à idade ou comprometimento cognitivo leve mas então a progressão torna-se aparente.

Embora exista uma variedade de sintomas da demência, eles podem ser divididos em

  • Precoce

  • Intermediária

  • Tardio

Alterações de personalidade e distúrbios de comportamento podem aparecer cedo ou tarde. Deficits motores e outros deficits neurológicos focais ocorrem em diferentes fases, dependendo do tipo de demência; ocorrem inicialmente na demência vascular e tardiamente na doença de Alzheimer. A incidência de convulsões está relativamente aumentada durante todas as fases.

A psicose, que se apresenta como alucinações, delírios ou paranoia, pode ocorrer em aproximadamente 20% a 50% dos pacientes com demência, dependendo do tipo de demência e da gravidade da doença (1).

Muitos distúrbios clínicos gerais concomitantes, particularmente durante exacerbações, podem agravar os sintomas da demência. Esses transtornos incluem diabetes, bronquite crônica, enfisema pulmonar, infecções, doença renal crônica, doenças hepáticas e insuficiência cardíaca.

Ingerir álcool, mesmo em quantidades moderadas, também pode piorar os sintomas da demência e contribuir para sua progressão (p. ex., reduzindo o volume encefálico), e a maioria dos especialistas recomenda que os pacientes com demência parem de ingerir álcool.

Sintomas de demência precoce (leve)

A memória recente é afetada; há dificuldade de aprendizado e em reter novas informações. Ocorrem problemas de linguagem (especialmente em encontrar palavras), alteração rápida de humor e mudança de personalidade. Os pacientes podem apresentar dificuldade progressiva com atividades independentes da vida cotidiana (p. ex., controlar o saldo no talão de cheques, caminhar até algum lugar, lembrar-se de onde colocou alguma coisa). O pensamento abstrato, a percepção ou o julgamento podem ser afetados. Os pacientes podem responder à perda da independência e da memória com irritabilidade, hostilidade e agitação.

A capacidade funcional pode ser limitada ainda pelo seguinte:

  • Agnosia: capacidade prejudicada de identificar objetos apesar da função sensitiva intacta

  • Apraxia: capacidade prejudicada de realizar movimentos previamente apreendidos apesar da função motora intacta

  • Afasia: capacidade limitada de compreender ou utilizar a linguagem

Embora a demência precoce possa não comprometer a sociabilidade, os familiares podem relatar comportamento estranho acompanhado de instabilidade emocional.

Sintomas de demência intermediária (moderada)

Os pacientes tornam-se incapazes de aprender e evocar novas informações. A memória para eventos remotos é reduzida, mas não totalmente perdida. Os pacientes podem necessitar de auxílio em atividades básicas da vida cotidiana (p. ex., banhar-se, alimentar-se, vestir-se, higienizar-se).

As alterações da personalidade podem evoluir. Os pacientes podem se tornar irritados, ansiosos, egocêntricos, inflexíveis ou exasperados mais facilmente. Eles podem se tornar mais passivos, com um afeto embotado; podem desenvolver depressão, podem se tornar indecisos, perder a espontaneidade ou afastar-se de situações sociais em geral. Os traços ou hábitos de personalidade podem se tornar mais exagerados (p. ex., a preocupação com o dinheiro torna-se uma obsessão por ele).

Distúrbios comportamentais podem se desenvolver: os pacientes podem perambular ou tornarem-se repentina e inadequadamente agitados, hostis, não cooperativos ou fisicamente agressivos.

Nessa fase, os pacientes perdem todo o senso de tempo e local, pois não podem utilizar as pistas ambientais e sociais de modo eficaz. Muitas vezes, os pacientes se perdem e podem ser incapazes de encontrar o próprio quarto ou o banheiro. Continuam capazes de andar, mas com risco de quedas ou acidentes secundários à confusão.

A sensação ou percepção alterada pode culminar em psicose com alucinações e delírios paranoides e persecutórios.

Em geral, os padrões de sono são desorganizados.

Sintomas da demência tardia (grave)

Os pacientes não são capazes de andar, alimentar-se ou realizar outras atividades da vida diária; eles podem se tornar incontinentes. A memória recente e remota é perdida por completo. Os pacientes podem ser incapazes de deglutir. Apresentam risco de desnutrição, pneumonia (especialmente em decorrência de aspiração) e úlceras de pressão. Pelo fato de dependerem completamente dos outros, geralmente é necessária a internação por um longo período em casas de saúde. Por fim, os pacientes ficam mudos.

Como esses pacientes não podem relatar sintomas ao médico e pacientes idosos frequentemente apresentam resposta febril ou leucocitária diminuída a uma infecção, os médicos devem valer-se da experiência e perspicácia sempre que o paciente parecer doente.

A demência terminal resulta em coma e morte, geralmente decorrente de infecção.

Referência sobre sinais e sintomas

  1. 1. Cressot C, Vrillon A, Lilamand M, et al: Psychosis in Neurodegenerative Dementias: A Systematic Comparative Review. J Alzheimers Dis 99(1):85–99, 2024. doi:10.3233/JAD-231363

Diagnóstico da demência

  • Diferenciação de delirium e demência por história ou exame neurológico (incluindo estado mental)

  • Identificação das causas tratáveis, com base na avaliação clínica e exames laboratoriais selecionados e neuroimagem

  • Algumas vezes exames neuropsicológicos formais

Diferenciar o tipo e a causa de demência pode ser difícil; em geral, o diagnóstico definitivo requer exame patológico pós-morte. Assim, o diagnóstico clínico enfoca a diferenciação de demência e delirium das outras doenças, bem como a identificação das áreas cerebrais afetadas e as causas potencialmente reversíveis.

A demência deve ser diferenciada do seguinte:

  • Delirium: diferenciar entre demência e delirium pode ser difícil, mas é crucial, pois o delirium geralmente é reversível com tratamento imediato. Inicialmente avalia-se a atenção. A desatenção é mais consistente com o diagnóstico de delirium, embora a demência avançada também prejudique gravemente a atenção. Outras características que sugerem delirium (p. ex., curta duração da deficiência cognitiva) são determinadas por história, exame físico e testes para causas específicas.

  • Comprometimento da memória associado à idade: esse comprometimento não afeta o funcionamento diário. Quando essas pessoas têm bastante tempo para aprender novas informações, seu desempenho intelectual é bom.

  • Comprometimento cognitivo leve: memória e/ou outras funções cognitivas são prejudicadas, mas o comprometimento não é grave o suficiente para interferir nas atividades diárias.

  • Sintomas cognitivos relacionados à depressão: este distúrbio cognitivo desaparece com o tratamento da depressão. Pacientes idosos deprimidos podem sofrer declínio cognitivo, mas, ao contrário dos pacientes com demência, há tendência ao exagero em relação à perda de memória e raramente se esquecem de eventos atuais importantes ou assuntos pessoais. O exame neurológico é normal, exceto pelos sinais de lentidão psicomotora. Quando testados, os pacientes com depressão esforçam-se pouco para responder, mas aqueles com demência esforçam-se mais, porém respondem de forma incorreta. Quando coexistem depressão e demência, o tratamento da depressão não restaura totalmente a cognição.

Critérios clínicos

Existem vários critérios clínicos disponíveis para ajudar a diagnosticar a demência e os subtipos específicos (1). Um dos sistemas mais utilizados inclui o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5-TR). O DSM-5-TR classifica a demência na categoria mais ampla de transtornos neurocognitivos, que podem ser subdivididos dependendo da etiologia presumida (p. ex., doenças neurodegenerativas como a doença de Alzheimer). O diagnóstico de demência baseia-se principalmente em sintomas cognitivos, comportamentais e funcionais (2).

Para atender aos critérios, os pacientes apresentam evidências de declínio cognitivo significativo em relação a um nível anterior de desempenho em ≥ 1 dos seguintes domínios cognitivos:

  • Atenção complexa

  • Funções executivas

  • Aprendizado e memória

  • Linguagem

  • Cognição perceptivo-motora

  • Cognição social

Evidências de declínio cognitivo podem vir do indivíduo ou de um contato informado ou médico, e o comprometimento foi documentado, de preferência por testes neuropsicológicos padronizados ou, se não estiverem disponíveis, outra avaliação clínica quantificada.

Além disso, os déficits cognitivos interferem na independência nas atividades diárias, não ocorrem exclusivamente no contexto de um delirium e não são mais bem explicados por outro transtorno mental (p. ex., transtorno depressivo maior, esquizofrenia).

Se o comprometimento cognitivo for confirmado, história e o exame físico devem se concentrar nos sinais de doenças sistêmicas tratáveis que causam deficits cognitivos (deficiência de vitamina B12, neurosífilis, hipotireoidismo, depressão — ver tabela Causas do delírio).

Avaliação da função cognitiva

O miniexame do estado mental (ver quadro Exame do estado mental) ou o Montreal Cognitive Assessment (MoCA) é frequentemente utilizado como um teste de triagem no leito (3). Quando o delirium está ausente, a presença de múltiplos deficits sugere demência. O melhor teste de triagem para memória é um teste de memória de curto prazo (p. ex., indicar 3 objetos e lembrar-se deles depois de 5 minutos); os pacientes com demência não passam nesse teste. Outro teste do estado mental avalia a capacidade de identificar múltiplos objetos em uma categoria (p. ex., listas de animais, plantas ou mobília). Os pacientes com demência esforçam-se muito para nomear poucos objetos, enquanto os pacientes sem demência nomeiam vários com facilidade. O nível educacional do paciente deve ser considerado na interpretação dos resultados de testes cognitivos. Pacientes com menos anos de escolaridade tendem a pontuar mais baixo em testes cognitivos, o que pode levar a um possível diagnóstico incorreto de comprometimento cognitivo.

Testes neuropsicológicos devem ser feitos quando a história e teste no leito do estado mental não são conclusivos. Eles avaliam o humor, bem como vários domínios cognitivos. O teste é realizado ou supervisionado por um neuropsicólogo e pode levar de 1 a 3 horas para ser concluído. Esses testes ajudam a diferenciar principalmente o seguinte:

  • Prejuízo da memória associado à idade, comprometimento cognitivo leve e demência, particularmente quando a cognição está apenas discretamente afetada ou o paciente ou membros da família estão ansiosos por uma certificação

  • Demência e síndromes focais de comprometimento cognitivo (p. ex., amnésia, afasia, apraxia, dificuldade visuoespacial, comprometimento da função executiva) quando a distinção não é clinicamente evidente

Os testes também podem ajudar a caracterizar deficits específicos devido à demência, e podem detectar depressão ou transtorno de personalidade que contribui para o desempenho cognitivo ruim.

Exames laboratoriais

Os exames devem incluir dosagem dos níveis de TSH e vitamina B12. Hemograma completo (HC) de rotina e testes de função renal e hepática são às vezes recomendados, mas seu rendimento para identificar doenças subjacentes é muito baixo.

Se os achados clínicos sugerirem uma doença específica, outros testes (p. ex., testes para HIV sorologia para sífilis) são indicados. Punção lombar deve ser considerada se houver suspeita de infecção crônica ou neurossífilis ou em pacientes com demência rapidamente progressiva para avaliar possível doença priônica ou doença autoimune.

O teste de biomarcadores pode ser útil em pacientes selecionados com suspeita de doença de Alzheimer. Por exemplo, o nível elevado de tau fosforilada e o nível reduzido de beta-amiloide no líquido cefalorraquidiano (LCR) constituem marcadores típicos da doença de Alzheimer.

O teste genético de rotina para a presença de alelos épsilon-4 (ApoE4) não é recomendado como parte da investigação diagnóstica para demência. Embora os dados sugiram que o gene da apolipoproteína E aumenta o risco de desenvolver a doença de Alzheimer (4), ele não é necessário nem suficiente para causar a doença de Alzheimer.

Neuroimagem

Deve-se realizar TC ou RM na avaliação inicial da demência e após qualquer alteração inexplicável na cognição ou no estado mental. Neuroimagens podem identificar doenças estruturais potencialmente reversíveis (p. ex., hidrocefalia de pressão normal, tumores encefálicos, hematoma subdural) e certas doenças metabólicas [p. ex., neurodegeneração associada ao pantotenato quinase, doença de Wilson e doenças irreversíveis (p. ex., acidente vascular cerebral, leucodistrofia, doença de Creutzfeld-Jacob).

Ocasionalmente, o eletroencefalograma (EEG) é útil (p. ex., para avaliar lapsos episódicos de atenção ou comportamento bizarro).

PET com desoxiglicose marcada com flúor 18 (18F) (fluorodeoxiglicose, ou FDG) ou TC por emissão de fóton único (SPECT) pode fornecer informações sobre os padrões de perfusão cerebral e ajudar a diferenciar doença de Alzheimer de demência frontotemporal e demência com corpos de Lewy (5).

Marcadores amiloides radioativos que se ligam especificamente a placas beta-amiloides [p. ex., fluorina-18 (18F) florbetapir (18F), flutemetamol (18F), florbetaben] foram utilizados com a tomografia de emissão de pósitrons (PET) para produzir uma imagem das placas amiloides em pacientes com comprometimento cognitivo leve ou demência. Esses testes devem ser utilizados quando a causa do comprometimento cognitivo (p. ex., comprometimento cognitivo leve ou demência) é incerto após uma avaliação abrangente e quando a doença de Alzheimer é uma consideração diagnóstica. Espera-se que a determinação do estado amiloide via PET aumente a certeza do diagnóstico e o tratamento. A PET com flortaucipir (18F), utilizando um marcador radioativo tau, pode ser utilizada para estimar a densidade e distribuição dos emaranhados neurofibrilares de tau agregados em adultos com comprometimento cognitivo e que estão sendo avaliados para doença de Alzheimer (5).

Referências sobre diagnóstico

  1. 1. NICE: National Institute for Health and Care Excellence: Dementia: assessment, management and support for people living with dementia and their carers. NICE guideline [NG97]. Published: 20 June 2018

  2. 2. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, 5th edition, Text Revision (DSM-5-TR). American Psychiatric Association Publishing, Washington, DC, 2022. pp 672-674

  3. 3. Nasreddine ZS, Phillips NA, Bédirian V, et al: The Montreal Cognitive Assessment, MoCA: a brief screening tool for mild cognitive impairment [correção publicada em J Am Geriatr Soc. 2019 Sep;67(9):1991. doi: 10.1111/jgs.15925]. J Am Geriatr Soc 53(4):695–699, 2005. doi:10.1111/j.1532-5415.2005.53221.x

  4. 4. Statement on use of apolipoprotein E testing for Alzheimer disease. American College of Medical Genetics/American Society of Human Genetics Working Group on ApoE and Alzheimer disease. JAMA 1995;274(20):1627-1629.

  5. 5. Fleisher AS, Pontecorvo MJ, Devous Sr MD, et al: Positron emission tomography imaging with [18F] flortaucipir and postmortem assessment of Alzheimer disease neuropathologic changes [correção publicada em JAMA Neurol. 2023 Aug 1;80(8):873. doi: 10.1001/jamaneurol.2023.1911]. JAMA Neurol. 77(7):829–839, 2020. doi:10.1001/jamaneurol.2020.0528

Tratamento da demência

  • Medidas para garantir a segurança

  • Fornecimento de estímulos adequados, atividades e tarefas bem como dicas para orientação

  • Eliminação de medicamentos com efeitos sedativos ou anticolinérgicos

  • Possivelmente, inibidores da colinesterase e terapia com memantina ou anticorpo monoclonal anti-amiloide

  • Assistência aos cuidadores

  • Arranjos para a assistência terminal

As medidas para garantir a segurança do paciente e proporcionar um meio ambiente adequado são essenciais ao tratamento, assim como assistência ao cuidador (1, 2). Vários métodos podem ser utilizados.

Segurança do paciente

Fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais podem avaliar a segurança em casa; os objetivos são

  • Prevenir acidentes (particularmente quedas)

  • Tratar transtornos de comportamento

  • Planejar alterações à medida que a demência progride

A função dos pacientes deve ser avaliada em vários ambientes (isto é, cozinha, automóvel) por simulações. Quando os pacientes têm déficits e permanecem no mesmo ambiente, medidas de proteção (p. ex., esconder facas, desligar o fogão, retirar o carro, confiscar as chaves do carro) podem ser necessárias. Alguns estados americanos requerem que médicos notifiquem o departamento de trânsito sobre pacientes com demência, pois, em algum momento, esses pacientes podem comprometer a segurança ao dirigir.

Quando há risco de deambulação, pode-se instalar sistemas de monitoramento por alarme ou registrar os pacientes em um programa de retorno seguro.

Enfim, podem ser indicados meios de assistência (p. ex., auxiliar em serviços domésticos, serviço de assistência domiciliar home care]) ou mudança de ambiente (residências adaptadas sem escadas, moradias assistidas, instituições de cuidados especializados de enfermagem).

Medidas ambientais

Pacientes com demência leve ou moderada geralmente funcionam melhor em ambientes em que estão familiarizados.

Tanto em casa como em uma instituição, o ambiente deve ser estabelecido para ajudar a preservar a sensação de autocontrole e a dignidade pessoal, proporcionando o seguinte:

  • Reforço frequente da orientação

  • Um ambiente familiar animado e alegre

  • Estímulos novos mínimos

  • Atividades regulares pouco estressantes

Relógios e calendários grandes e uma rotina para atividades diárias podem ajudar a orientar melhor os pacientes; os membros da equipe médica podem utilizar crachás grandes e se apresentar repetidas vezes. Alterações de ambiente, rotinas ou pessoas devem ser explicadas de forma precisa e simples aos pacientes, omitindo-se procedimentos não essenciais. Os pacientes precisam de tempo para se adaptar e se familiarizar com as mudanças. O ato de dizer ao paciente o que está acontecendo (p. ex., sobre um banho ou a alimentação) pode evitar resistência ou reações violentas. Visitas frequentes dos membros da equipe médica e familiares encorajam a manutenção da socialização dos pacientes.

O quarto deve ser razoavelmente alegre e conter estímulos sensoriais (p. ex., rádio, televisão, lâmpadas noturnas) para ajudar os pacientes a permanecerem orientados e concentrarem sua atenção. Salas silenciosas, escuras e isoladas devem ser evitadas.

Atividades podem ajudar os pacientes a funcionar melhor; aquelas relacionadas a interesses anteriores ao início da demência do paciente são boas escolhas. As atividades devem ser agradáveis, proporcionar algum estímulo, mas não envolver muitas escolhas ou desafios.

Exercícios para reduzir a inquietação, melhorar o equilíbrio e manter a aptidão cardiovascular e o tônus muscular devem ser feitos diariamente. Os exercícios também podem ajudar a melhorar o sono e reduzir os distúrbios de comportamento.

Terapia ocupacional e a musicoterapia ajudam a manter o controle motor fino e proporcionam estimulação não verbal.

A terapia em grupo (p. ex., terapia de reminiscência, atividades de socialização) pode ajudar a manter a prática da conversação e do relacionamento interpessoal.

Medicamentos

A eliminação ou limitação do uso de medicamentos com atividade no sistema nervoso central (SNC) muitas vezes melhora a função. Sedativos e medicamentos anticolinérgicos, que tendem a agravar a demência, devem ser evitados.

Os inibidores da colinesterase donepezila, rivastigmina e galantamina são relativamente eficazes para melhorar a função cognitiva em pacientes com doença de Alzheimer ou demência por corpos de Lewy e podem ser úteis em outras formas de demência. Esses medicamentos inibem a acetilcolinesterase, aumentando o nível de acetilcolina cerebral.

O antagonista de memantina, um NMDA (N-metil-d-aspartate), pode ajudar a diminuir a perda de demência moderada a grave e pode ser sinérgico quando utilizado com um inibidor de colinesterase.

Embora os inibidores da colinesterase e a memantina sejam considerados tratamento sintomático para a doença de Alzheimer e outras demências, o tratamento modificador da doença com anticorpos monoclonais antiamiloide também está disponível (ver Tratamento modificador da doença para a doença de Alzheimer).

Medicamentos para controlar distúrbios comportamentais (p. ex., antipsicóticos) têm sido utilizados.

Deve-se tratar os pacientes com demência e sinais de depressão com antidepressivos não anticolinérgicos, de preferência inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS).

Assistência aos cuidadores

Os familiares imediatos são amplamente responsáveis pelos cuidados de um paciente com demência (ver Cuidadores da família para idosos). Enfermeiros e assistentes sociais podem ensinar os cuidadores sobre como melhor atender as necessidades do paciente (p. ex., como lidar com os cuidados diários e administrar assuntos financeiros); o ensinamento deve ser contínuo. Outros recursos (p. ex., grupos de suporte, material educacional) estão disponíveis.

Os cuidadores podem sofrer estresse substancial. O estresse pode ser causado pela preocupação com a proteção do paciente e frustração, exaustão, raiva e ressentimento de ter que fazer tanto para cuidar de alguém. Os profissionais de saúde devem estar atentos aos sintomas iniciais de estresse e esgotamento dos cuidadores e, quando necessário, sugerir serviços de suporte (p. ex., assistente social, nutricionista, enfermeiro, auxiliar de cuidados domiciliares e internação temporária em uma casa de repouso para cuidados intermitentes).

Se um paciente com demência tiver uma lesão incomum, a possibilidade de abuso do idoso deve ser investigada.

Referências sobre tratamento

  1. 1. NICE: National Institute for Health and Care Excellence: Dementia: assessment, management and support for people living with dementia and their carers. NICE guideline [NG97]. Published: 20 June 2018

  2. 2. Alzheimer's Association: 2018 Alzheimer's Association Dementia Care Practice Recommendations. January 18, 2028. Accessed February 3, 2025.

Prognóstico da demência

Em geral, a demência é progressiva. No entanto, o grau de progressão varia bastante e depende da causa. A demência abrevia a expectativa de vida, mas a estimativa de sobrevida varia. Em um estudo prospectivo nos Estados Unidos, em pacientes com doença de Alzheimer, a sobrevida mediana desde o diagnóstico inicial foi de 4,2 anos para homens e 5,7 anos para mulheres (1). Em uma metanálise envolvendo mais de 5 milhões de pessoas acompanhadas por no mínimo 1 ano após um diagnóstico de demência, a sobrevida mediana foi de 4,8 anos e o tempo mediano para internação em uma casa de repouso foi de 3,3 anos; a sobrevida foi maior para mulheres e um pouco maior para pacientes com doença de Alzheimer, em comparação com outros diagnósticos (2).

Questões sobre o fim de vida

Considerando que ocorre degeneração da percepção e do julgamento em pacientes com demência, pode haver necessidade de designar um familiar, tutor ou advogado para supervisionar as finanças. No início da demência, antes de o paciente ficar incapacitado, seus desejos sobre os cuidados devem ser esclarecidos e realizados planejamentos financeiros e legais (p. ex., procuração para cuidados de saúde). Quando esses documentos são assinados, deve-se avaliar a capacidade do paciente e registrar os resultados da avaliação. O ideal é tomar decisões sobre alimentacão artificial e tratamento de doenças agudas antes que tais medidas sejam necessárias.

Na demência avançada, as medidas paliativas podem ser mais apropriadas que as intervenções altamente agressivas ou internações hospitalares.

Referências sobre prognóstico

  1. 1. Larson EB, Shadlen MF, Wang L, et al: Survival after initial diagnosis of Alzheimer disease. Ann Intern Med 140(7):501–509, 2004. doi:10.7326/0003-4819-140-7-200404060-00008

  2. 2. Brück CC, Mooldijk SS, Kuiper LM, et al. Time to nursing home admission and death in people with dementia: systematic review and meta-analysis. BMJ388:e080636, 2025. Publicado em 2025 Jan 8. doi:10.1136/bmj-2024-080636

Pontos-chave

  • Demência, ao contrário da perda de memória associada à idade e comprometimento cognitivo leve, provoca prejuízo cognitivo que interfere no funcionamento diário.

  • Estar ciente de que os membros da família podem reportar o início súbito dos sintomas apenas porque reconheceram que os sintomas se desenvolvem gradualmente.

  • Considerar as causas reversíveis do declínio cognitivo, como doenças cerebrais estruturais (p. ex., hidrocefalia de pressão normal, hematoma subdural), distúrbios metabólicos (p. ex., hipotireoidismo, deficiência de vitamina B12), medicamentos, depressão e toxinas (p. ex., chumbo).

  • Fazer testes do estado mental no leito e, se necessário, testes neuropsicológicos formais para confirmar que a função cognitiva está prejudicada em ≥ 2 domínios.

  • Recomendar ou ajudar a organizar medidas para maximizar a segurança do paciente, para proporcionar um ambiente familiar e confortável para o paciente, e prestar suporte para os cuidadores.

  • Considerar terapia medicamentosa adjuvante, e recomendar cuidados para o final da vida.

Informações adicionais

O recurso em inglês a seguir pode ser útil. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo deste recurso.

  1. Alzheimer’s Association

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