O reconhecimento e o tratamento imediatos da rabdomiólise são vitais porque a doença grave pode estar associada a risco de morte por lesão renal aguda (LRA) e desequilíbrios eletrolíticos.
Fisiopatologia
A função muscular esquelética normal depende da troca adequada de eletrólitos, metabolismo adequado da adenosina trifosfato (ATP) e membrana plasmática intacta dos miócitos. Na rabdomiólise, esses processos são interrompidos, resultando na ruptura do músculo esquelético. A destruição do tecido muscular esquelético leva à liberação dos componentes intracelulares dos miócitos no plasma, incluindo creatina quinase (CK), mioglobina e vários eletrólitos. Mioglobinúria e alterações eletrolíticas causam complicações nos órgãos alvo, incluindo lesão renal aguda.
Etiologia
Teoricamente, qualquer modalidade de lesão muscular pode resultar em rabdomiólise. As etiologias mais comuns são
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Trauma mecânico ou isquemia muscular (p. ex., lesões por esmagamento, choques elétricos, convulsões ou síndromes compartimentais)
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Fármacos e toxinas (p. ex., estatinas, antibióticos, ansiolíticos, antipsicóticos, cocaína, anfetaminas, álcool)
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Infecção (p. ex., influenza A e B, coxsackievirus, Staphylococcus aureus)
As etiologias menos comuns são
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Doenças de eletrólitos (p. ex., hipopotassemia, hipofosfatemia)
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Doenças endócrinas (p. ex., cetoacidose diabética hiperglicemia não cetótica)
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Doenças genéticas (p. ex., distrofia muscular de Duchenne, distrofia muscular de Becker)
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Exercícios extremos ou imobilização prolongada
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Temperatura corporal extrema (p. ex., hipotermia, hipertermia na síndrome maligna neuroléptica ou hipertermia maligna e insolação)
Sinais e sintomas
A tríade clássica dos sintomas na rabdomiólise é dor muscular, fraqueza e urina marrom-avermelhada. Entretanto, esse trio de sintomas ocorre em menos de 10% de todos os pacientes com rabdomiólise.
As manifestações clínicas são variáveis e cerca de 50% dos pacientes não apresentam qualquer queixa muscular (1). Quando ocorre, a dor muscular afeta os grupos musculares proximais, como ombros, coxas, região lombar e panturrilhas. Em uma concentração alta, a mioglobina excretada na urina muda de cor para vermelho ou marrom e pode ser avaliada com análise por tira reagente. Mas por causa da rápida excreção de mioglobina, não é possível excluir a rabdomiólise na ausência de mioglobinúria ou descoloração da urina.
Outros sinais e sintomas variam de acordo com o evento causador e as complicações (p. ex., febre ocorre nos pacientes com infecção e estado mental alterado nos casos de intoxicação).
Lesão renal aguda é relatada em 15 a 50% das complicações da rabdomiólise (1,2,3), e é mais alta em pacientes com presença associada de desidratação, sepse e creatina quinase acima de 15.000 UI/L (250 mckat/L).
Referências sobre sinais e sintomas
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Gabow P, Kaehny W, Kelleher S: The spectrum of rhabdomyolysis. Medicine 62:141-152, 1982.
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Melli G, Chaudhry V, Cornblath DR: Rhabdomyolysis: An evaluation of 475 hospitalized patients. Medicine (Baltimore) 84(6):377, 2005.
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Veenstra J, Smit WM, Krediet RT, et al: Relationship between elevated creatine phosphokinase and the clinical spectrum of rhabdomyolysis. Nephrol Dial Transplant 9(6):637, 1994.
Diagnóstico
Suspeita-se de rabdomiólise com base na anamnese, sinais e sintomas clínicos. A confirmação é por exame laboratorial da CK elevada. Embora um limiar de corte não tenha sido estabelecido, normalmente é necessário um nível de CK > 5 vezes o limite superior de normalidade para o diagnóstico.
Outro exame laboratorial corroborante é a presença de mioglobina na urina. Detecta-se mioglobinúria quando a mioglobina urinária excede 250 mcg/mL. Outras características laboratoriais são um aumento rápido nos níveis séricos de creatinina, hipercalemia, hiperuricemia, hipocalcemia ou hipercalcemia, hiperfosfatemia, acidose láctica e trombocitopenia.
Tratamento
Em geral, o tratamento é de suporte, juntamente com o tratamento da causa e de quaisquer complicações resultantes.
O tratamento de suporte inclui expansão intravascular com líquidos IV para prevenir lesão renal aguda, bem como outros tratamentos de suporte (p. ex., ventilação mecânica nos casos de insuficiência respiratória aguda). Não há evidências claras do benefício da alcalinização urinária com bicarbonato de sódio, o que é particularmente contraindicado nos casos de alcalose ou hipocalcemia.
Se o evento causador ocorrer por causa de síndrome compartimental, realiza-se inicialmente uma fasciotomia além da terapia de suporte. Tratar as infecções com os antimicrobianos apropriados. Quaisquer fármacos potencialmente causadores (p. ex., estatinas) são interrompidos. Corrigem-se os distúrbios eletrolíticos
Tratam-se complicações como lesão renal aguda com líquidos IV e às vezes hemodiálise. Trata-se coagulação intravascular disseminada com plasma fresco congelado.
Pontos-chave
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A tríade clássica dos sintomas (mialgias, fraqueza muscular e urina cor de chá) ocorre em < 10% dos casos.
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Normalmente, é necessário um nível de CK > 5 vezes o limite superior de normalidade para o diagnóstico.
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O tratamento é de suporte com hidratação IV bem como tratamento simultâneo da causa incitante e de quaisquer complicações resultantes.