Colestase neonatal

PorJaime Belkind-Gerson, MD, MSc, University of Colorado
Reviewed ByAlicia R. Pekarsky, MD, State University of New York Upstate Medical University, Upstate Golisano Children's Hospital
Revisado/Corrigido: modificado ago. 2025
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Visão Educação para o paciente

Colestase é a condição de secreção ausente ou reduzida de bilirrubina, o que resulta em hiperbilirrubinemia conjugada e icterícia. Há numerosas causas identificadas por exames de laboratório, imagem hepatobiliar e, às vezes, biópsia hepática e cirurgia. O tratamento depende da causa.

A colestase ocorre em 1/2500 neonatos (1). É definida como bilirrubina direta (conjugada) > 1 mg/dL (> 17,1 micromol/L).

A colestase nunca é normal e justifica a avaliação.

Referência geral

  1. 1. Amendola M, Squires JE. Pediatric Genetic Cholestatic Liver Disease Overview. 2022 Sep 15 [Updated 2023 May 25]. In: Adam MP, Feldman J, Mirzaa GM, et al., editors. GeneReviews® [Internet]. Seattle (WA): University of Washington, Seattle; 1993-2025.

Etiologia da colestase neonatal

A colestase (ver também Hiperbilirrubinemia neonatal) pode ser o resultado de disfunções intra ou extra-hepáticas, embora algumas condições possam se sobrepor.

Causas extra-hepáticas da colestase

A doença extra-hepática mais comum é:

  • Atresia biliar

Atresia biliar é a obstrução da árvore biliar motivada pela esclerose progressiva dos ductos biliares extra-hepáticos. Na maioria dos casos, a atresia biliar se manifesta várias semanas depois do nascimento, provavelmente após a inflamação e a cicatrização dos ductos biliares extra-hepáticos (e às vezes intra-hepáticos). Raramente está presente em neonatos pré-termo ou a termo ao nascimento.

A síndrome do ducto biliar espessado também pode ser uma causa de colestase neonatal extra-hepática, sendo mais comum nos lactentes com fibrose cística.

Cistos biliares raramente se manifestam como colestase neonatal; esses cistos são mais comuns nos pacientes com doença renal policística autossômica recessiva (1).

Causas intra-hepáticas da colestase

Causas intra-hepáticas podem ser infecciosas, aloimunes, metabólicas/genéticas ou tóxicas.

Infecções pode causar colestase. As infecções podem ser virais (p. ex., vírus do herpes simples, citomegalovírus, rubéola), bacterianas (p. ex., bacteremia Gram-positiva e Gram-negativa, infecção do trato urinário causada por Escherichia coli) ou parasitárias (p. ex., toxoplasmose). Sepse em neonatos que recebem nutrição parenteral também pode causar colestase.

A doença hepática aloimune gestacional envolve a passagem transplacentária de anticorpos IgG maternos que induz um complexo de ataque a membranas mediada pelo complemento que lesiona o fígado fetal.

Entre ascausas metabólicas há inúmeros erros inatos do metabolismo, como galactosemia, tirosinemia, deficiência de alfa-1-antitripsina, distúrbio do metabolismo lipídico, defeitos do ácido biliar, doenças mitocondriais e defeitos da oxidação de ácidos graxos. Outros defeitos genéticos são a síndrome de Alagille, a fibrose cística e a síndrome artrogripose-disfunção renal-colestase (ARC). Há também algumas mutações gênicas que interferem na produção e excreção normais da bile que causam colestase; as doenças resultantes são chamadas colestase intra-hepática progressiva familiar.

As causas tóxicas decorrem principalmente do uso de nutrição parenteral prolongada em neonatos extremamente pré-termo ou neonatos com a síndrome do intestino curto. Gerações mais recentes de emulsões lipídicas da nutrição parenteral (p. ex., com óleo de peixe e triglicerídeos de cadeia média) parecem ter diminuído o risco de colestase (2).

Síndrome da hepatite neonatal idiopática (hepatite de células gigantes) é uma condição inflamatória do fígado do recém-nascido. Sua incidência diminuiu, e está se tornando cada vez mais rara à medida que estudos diagnósticos melhores possibilitam a identificação das causas específicas da colestase.

Referências sobre etiologia

  1. 1. Fabris L, Fiorotto R, Spirli C, et al: Pathobiology of inherited biliary diseases: A roadmap to understand acquired liver diseases. Nat Rev Gastroenterol Hepatol 16(8):497–511, 2019. doi: 10.1038/s41575-019-0156-4

  2. 2. Guthrie G, Burrin D: Impact of Parenteral Lipid Emulsion Components on Cholestatic Liver Disease in Neonates. Nutrients 13(2):508, 2021. doi: 10.3390/nu13020508

Fisiopatologia da colestase neonatal

Na colestase, a principal falha é da excreção da bilirrubina, resultando em excesso de bilirrubina conjugada na corrente sanguínea e diminuição dos sais biliares no trato gastrointestinal (GI). Como resultado da presença de bile inadequada no trato gastrointestinal, há má absorção de gordura e vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K), levando a deficiência vitamínica, nutrição inadequada e deficit de crescimento.

Sinais e sintomas da colestase neonatal

A colestase tipicamente se manifesta nas primeiras 2 semanas de vida. Urina escura (contendo bilirrubina conjugada), fezes acólicas e hepatomegalia podem ajudar a distinguir colestase da icterícia fisiológica e outras causas de icterícia neonatal.

A colestase persistente provoca prurido crônico, assim como sinais e sintomas da deficiência das vitaminas lipossolúveis; a curva de crescimento mostra uma queda progressiva.

Se a doença de base causar fibrose hepática e cirrose, ela evoluirá com hipertensão portal, distensão abdominal resultante de ascite, varizes esofágicas resultantes de sangramento gastrointestinal superior.

Diagnóstico da colestase neonatal

  • Bilirrubina total e direta

  • Testes hepáticos

  • Testes de causas metabólicas, infecções e genéticas

  • Ultrassom do fígado

  • Mapeamento hepatobiliar

  • Ocasionalmente biópsia hepática, colangiografia operatória

Qualquer lactente que apresente icterícia após 2 semanas de idade (ou após 3 semanas se estiver em aleitamento materno, desde que o exame físico, a urina e a cor das fezes sejam normais) deve ser avaliado para colestase, incluindo dosagem de bilirrubina total e direta (1). Alguns especialistas defendem que os lactentes com icterícia recebendo aleitamento materno só precisam ser avaliados depois de 3 semanas de idade. A abordagem inicial deve ser direcionada para o diagnóstico das doenças tratáveis (p. ex., atresia biliar extra-hepática, na qual a intervenção cirúrgica precoce melhora o resultado a curto prazo).

A colestase é identificada pela elevação da bilirrubina total e direta. Os exames necessários para avaliar melhor a função hepática são a dosagem sérica de albumina, frações da bilirrubina, enzimas hepáticas, tempo de protrombina/tempo de tromboplastina parcial (TP/TTP) e amônia (ver Testes para colestase).

Depois de confirmar a colestase, é preciso determinar sua etiologia (ver tabela Avaliação diagnóstica para colestase neonatal) e evidências de má absorção (p. ex., baixos níveis das vitaminas lipossolúveis A, D, E, e K ou TP prolongado, sugerindo baixo nível de vitamina K).

Tabela
Tabela

Ultrassonografia abdominal é muitas vezes o primeiro exame; é não invasiva e pode avaliar o tamanho do fígado e certas anomalias da vesícula biliar e do duto biliar comum. Entretanto, não é específica.

Mapeamento hepatobiliar utilizando ácido hidroxi iminodiacético (varredura HIDA; também chamada de colecintilografia ou cintilografia hepatobiliar) também deve ser realizado; excreção do contraste no intestino afasta atresia biliar, mas ausência de excreção pode ocorrer com atresia biliar, hepatite neonatal grave e outras causas da colestase. Lactentes com colestase frequentemente recebem fenobarbital durante 5 dias antes de uma varredura HIDA em uma tentativa de aumentar a excreção. Em alguns centros pediátricos terciários, a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) pode ser realizada para investigar a anatomia do sistema ductal biliar.

Quando não foi feito nenhum diagnóstico, a biópsia hepática é geralmente realizada precocemente, às vezes com colangiografia cirúrgica. Pacientes com atresia biliar apresentam tipicamente alargamento portal, proliferação dos ductos biliares e aumento da fibrose. A hepatite neonatal é caracterizada por desarranjo lobular com células gigantes multinucleadas. A doença hepática aloimune é caracterizada por altos depósitos de ferro no fígado.

Referência sobre diagnóstico

  1. 1. Fawaz R, Baumann U, Ekong U, et al. Guideline for the Evaluation of Cholestatic Jaundice in Infants: Joint Recommendations of the North American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition and the European Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2017;64(1):154-168. doi:10.1097/MPG.0000000000001334

Tratamento da colestase neonatal

  • Da causa específica

  • Suplementos de vitaminas A, D, E e K

  • Triglicerídios de cadeia média

  • Às vezes, ácido ursodesoxicólico

  • No caso de suspeita de atresia biliar, exploração cirúrgica e, às vezes, portoenterostomia (procedimento de Kasai)

O tratamento específico é direcionado para a causa. Se não houver terapia específica, o tratamento será de suporte e consistirá, principalmente, em terapia nutricional, incluindo suplementos de vitaminas A, D, E e K (1).

Para os lactentes cuja alimentação é baseada em leite artificial, a fórmula utilizada deve conter alto teor de triglicerídios de cadeia média, porque a absorção é melhor quando há deficiência de sais biliares. A administração de calorias deve ser adequada, e os lactentes podem necessitar de calorias em valores > 130 calorias/kg/dia. Nos lactentes com algum fluxo biliar, o ácido ursodesoxicólico, administrado uma ou duas vezes ao dia, pode aliviar o prurido, melhorar o fluxo da bile e potencialmente atenuar a doença hepática.

Lactentes com suspeita de atresia biliar necessitam de exploração cirúrgica com colangiografia intraoperatória (2). Se a atresia biliar for confirmada, deverá ser realizada portoenterostomia (técnica de Kasai). O ideal é que tal procedimento seja realizado no primeiro mês de vida. Após esse período, o prognóstico piora significativamente. No pós-operatório, muitos pacientes passam a exibir problemas crônicos importantes, incluindo colestase persistente, colangite ascendente recorrente e insuficiência de crescimento. Antibióticos profiláticos (p. ex., sulfametoxazol/trimetoprima) costumam ser prescritos por um ano do pós-operatório como uma tentativa de prevenir a colangite ascendente. Mesmo com o tratamento ideal, muitos pacientes desenvolvem cirrose e acabam necessitando de transplante de fígado.

A colestase causada pela nutrição parenteral desaparece se a nutrição parenteral for interrompida ou, às vezes, se uma emulsão lipídica de nova geração for substituída por uma mais antiga antes de o lactente desenvolver doença hepática grave.

Como a doença hepática aloimune gestacional não tem nenhum marcador ou teste definitivo, o tratamento com imunoglobulina IV (IGIV) ou exsanguineotransfusão precisa ser considerado precocemente para reverter a lesão hepática contínua se nenhum diagnóstico definitivo tiver sido feito (3).

Referências sobre tratamento

  1. 1. Mouzaki M, Bronsky J, Gupte G, et al. Nutrition Support of Children With Chronic Liver Diseases: A Joint Position Paper of the North American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition and the European Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2019;69(4):498-511. doi:10.1097/MPG.0000000000002443

  2. 2. Tam PKH, Wells RG, Tang CSM, et al. Biliary atresia. Nat Rev Dis Primers. 2024;10(1):47. Publicado em 2024 Jul 11. doi:10.1038/s41572-024-00533-x

  3. 3. Fischer HS, Staufner C, Sallmon H, et al. Early exchange transfusion to treat neonates with gestational alloimmune liver disease: An 11-year cohort study. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2020;70(4):444–449. doi:10.1097/MPG.0000000000002593

Prognóstico para colestase neonatal

O prognóstico da colestase devida a disfunções específicas é variável (p. ex., doença metabólica), desde um curso completamente benigno até doença progressiva resultando em cirrose.

A atresia biliar é progressiva e, se não tratada, resulta em cirrose com hipertensão portal por vários meses, insuficiência hepática e morte até o 1º ano de vida.

A síndrome da hepatite neonatal idiopática geralmente apresenta evolução lenta, porém pode evoluir para insuficiência hepática e morte.

A doença hepática aloimune gestacional tem prognóstico desfavorável sem intervenção precoce.

Pontos-chave

  • Existem inúmeras causas herdadas e adquiridas da colestase neonatal, que resultam em falha da excreção de bilirrubina e, portanto, excesso de bilirrubina conjugada.

  • A colestase neonatal normalmente é observada nas primeiras 2 semanas de vida; os lactentes têm icterícia e muitas vezes colúria, acolia fecal e hepatomegalia.

  • Começar com provas de função hepática, ultrassonografia e exames de imagem da árvore hepatobiliar e testar as causas específicas, que às vezes indicam a biópsia hepática.

  • Tratar a causa específica e administrar tratamento de suporte, incluindo suplementação de vitaminas lipossolúveis e, para lactentes alimentados com fórmula, uma fórmula que seja rica em triglicerídeos de cadeia média e contenha calorias suficientes.

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