Síncope

PorAndrea D. Thompson, MD, PhD, University of Michigan;
Michael J. Shea, MD, Michigan Medicine at the University of Michigan
Revisado/Corrigido: jul 2022
Visão Educação para o paciente

Síncope é a perda de consciência súbita e breve com perda do tônus postural seguida de restabelecimento espontâneo. O paciente fica imóvel e flácido e geralmente com membros frios, pulso fraco e respiração superficial. Às vezes ocorrem movimentos musculares abruptos involuntários breves, que lembram uma convulsão.

Quase síncope é o atordoamento e a sensação de desmaio iminente, sem perda da consciência. Geralmente é classificada e discutida com a síncope, pois as causas são as mesmas.

Convulsões podem causar perda de consciência súbita, porém não são consideradas síncopes. Entretanto, as convulsões podem ser consideradas em pacientes que apresentam síncope aparente, pois a história pode não ser clara ou estar indisponível, e algumas convulsões não são tônico-clônicas. Além disso, a convulsão breve (< 5 s) ocorre algumas vezes com a síncope verdadeira.

O diagnóstico depende de história cuidadosa, testemunho de terceiros ou exame fortuito durante o evento.

Fisiopatologia da síncope

A maioria das síncopes resulta de fluxo cerebral insuficiente. Alguns casos envolvem fluxo adequado, porém substratos cerebrais (oxigênio, glicose ou ambos) insuficientes.

Fluxo sanguíneo cerebral insuficiente

A maioria das deficiências do fluxo de sangue cerebral resulta de redução do débito cardíaco.

A diminuição do débito cardíaco pode ser causada por

  • Doenças cardíacas que obstruem o fluxo de saída

  • Doenças cardíacas com disfunção sistólica

  • Doenças cardíacas com disfunção diastólica

  • Arritmias (muito rápidas ou muito lentas)

  • Condições que diminuem o retorno venoso

A obstrução ao fluxo de saída pode ser exacerbada por exercício, vasodilatação e hipovolemia (particularmente na estenose aórtica e na cardiomiopatia hipertrófica), que podem precipitar a síncope.

Arritmias causam síncope quando a frequência cardíaca é rápida demais para permitir o enchimento ventricular adequado (p. ex., > 150 ou 180 bpm) ou muito lenta para propiciar débito adequado (p. ex., < 30 ou 35 bpm).

O retorno venoso pode ser reduzido por hemorragia, aumento de pressão intratorácica, de tônus vagal (que também pode diminuir a frequência cardíaca) e perda do tônus simpático (p. ex., por fármacos, pressão no seio carotídeo e disfunção autonômica). A síncope que envolve esses mecanismos (exceto por hemorragia), geralmente, é denominada vasovagal ou neurocardiogênica, sendo comum e benigna.

Hipotensão ortostática, uma causa benigna comum de síncope, resulta da falha de mecanismos normais (p. ex., taquicardia sinusal, vasoconstrição ou ambas) para compensação da diminuição temporária no retorno venoso que ocorre ao ficar em pé.

As doenças cerebrovasculares (p. ex., acidente vascular encefálico e episódios de isquemia transitória) raramente causam síncope, pois em sua maioria não envolvem estruturas centroencefálicas, que devem ser afetadas para causarem perda de consciência. Entretanto, a isquemia da artéria basilar, decorrente de episódio isquêmico transitório, acidente vascular encefálico ou enxaqueca, pode causar síncope. Raramente, pacientes com artrite cervical intensa ou espondilose desenvolvem insuficiência vertebrobasilar com síncope quando a cabeça é movimentada em certas posições.

Insuficiência de substrato cerebral

O sistema nervoso central necessita de oxigênio e glicose para funcionar. Mesmo com fluxo sanguíneo normal, o deficit significativo de qualquer um deles causará perda de consciência. Na prática, a hipoglicemia é primariamente a causa, pois a hipóxia raramente ocorre de forma a causar perda de consciência abrupta (exceto em acidentes de voo ou mergulho). Perda de consciência decorrente de hipoglicemia é, raramente, tão abrupta como na síncope ou nas convulsões pela ocorrência de sinais de alerta (exceto em pacientes que utilizam betabloqueadores); mas o início pode ser pouco evidente para o examinador, a menos que o evento tenha sido testemunhado.

Etiologia da síncope

As causas geralmente são classificadas de acordo com o mecanismo (ver tabela Algumas causas de síncope).

As causas mais comuns são

  • Vasovagal (neurocardiogênica)

  • Idiopática

Vários casos de síncope nunca têm um diagnóstico concreto, porém não levam à lesão aparente. Um número menor de casos tem causa grave geralmente cardíaca.

Tabela
Tabela

Avaliação da síncope

A avaliação deve ser realizada o mais cedo possível após o evento. Quanto mais remoto for o evento da síncope, mais difícil será o diagnóstico. A informação de testemunhas é bastante útil e obtida com mais precisão o mais cedo possível.

História

A história da doença atual deve verificar certos eventos que levam à síncope, incluindo atividades do paciente (p. ex., exercício, discussão, situação potencialmente emocionante), posição (p. ex., deitado ou em pé) e, se estiver em pé, por quanto tempo. Sintomas associados importantes imediatamente antes ou após o evento incluem se havia uma sensação de perda de consciência iminente, náuseas, sudorese, visão turva ou em túnel, formigamento dos lábios ou das pontas dos dedos, dor torácica ou palpitação. A duração do tempo de recuperação também deve ser verificada. As testemunhas, se houver, devem ser solicitadas a descrever o evento, particularmente a presença e duração de qualquer atividade convulsiva.

A revisão de sistemas deve averiguar quaisquer áreas de dor ou lesão, episódios de tontura ou quase síncope ao levantar e episódios de palpitação ou dor torácica aos esforços. Os pacientes devem ser questionados sobre os sintomas que sugiram possíveis causas, incluindo fezes com sangue ou melena, menstruações intensas (anemia); vômitos, diarreia ou excesso de diurese (desidratação e anormalidades de eletrólitos) e fatores de risco de embolia pulmonar (cirurgia ou imobilização recente, câncer estabelecido, coágulos prévios ou estados de hipercoagulabilidade).

A história clínica deve averiguar eventos prévios de síncopes e doenças cardiovasculares e convulsivas estabelecidas. Deve-se identificar os fármacos utilizados (particularmente anti-hipertensivos, diuréticos, vasodilatadores e antiarrítmicos ver tabela Algumas causas medicamentosas da síncope). A história familiar deve avaliar a presença de doenças cardíacas em jovens ou morte súbita de qualquer membro da família.

Exame físico

Os sinais vitais são essenciais. A frequência cardíaca e a pressão arterial são aferidas com o paciente em decúbito dorsal e 3 minutos após permanecer em pé. O pulso é palpado para verificar irregularidades.

O exame geral observa o estado mental do paciente, incluindo qualquer confusão ou hesitação, sugerindo um estado pós-ictal e quaisquer sinais de lesão (p. ex., contusão, edema, dor e mordida na língua).

Ausculta-se o coração para verificar a existência de sopros e, se existentes, observam-se quaisquer alterações no sopro durante a manobra de Valsalva, ficar em pé ou ao ficar de cócoras.

A avaliação cuidadosa das ondas venosas jugulares (ver figura Ondas venosas jugulares normais) enquanto se palpa a carótida ou ausculta o coração pode permitir o diagnóstico de arritmia, se o ECG não estiver disponível. Por exemplo, ondas “a” em canhão ocorrem quando a contração atrial acontece contra uma valva atrioventricular direita fechada e indicam dissociação atrial-ventricular.

Palpa-se o abdome para verificar a existência de aumento da sensibilidade e efetua-se o toque retal para checar a presença de sangue macroscópico ou oculto.

Realiza-se o exame neurológico para identificar qualquer anormalidade focal, que sugira uma causa do sistema nervoso central (p. ex., doença convulsiva).

Sinais de alerta

Certos achados sugerem uma etiologia mais grave:

  • Síncope aos esforços

  • Múltiplas recidivas em curto período de tempo

  • Sopro cardíaco ou outros achados que sugiram cardiopatia estrutural (p. ex., dor torácica)

  • Idade avançada

  • Lesão significativa durante a síncope

  • História familiar de morte súbita e inesperada, síncope por esforço, ou síncope recorrente inexplicada ou convulsões

Interpretação dos achados

Embora a causa, geralmente, seja benigna, é importante identificar uma causa ocasional que ofereça risco à vida (p. ex., taquiarritmia e bloqueio atrioventricular) pelo risco de morte súbita. Os achados clínicos (ver tabela Algumas causas da síncope) ajudam a sugerir a causa em 40 a 50% dos casos. Algumas generalizações são úteis.

As causas benignas geralmente levam à síncope.

  • A síncope precipitada por estímulo físico ou emocional desagradável (p. ex., dor e medo), ocorrendo, geralmente, na posição em pé é, geralmente, precedida de sintomas de alerta mediados pelo vago (p. ex., náuseas, fraqueza, bocejos, apreensão, visão turva e sudorese) sugere síncope vasovagal.

  • A síncope que ocorre, geralmente, ao se assumir a posição ortostática (particularmente em pacientes idosos após repouso prolongado no leito ou naqueles que utilizam fármacos de certas classes) sugere síncope ortostática.

  • A síncope que ocorre após se permanecer em pé por longos períodos sem se mover decorre do acúmulo de sangue venoso.

Causas perigosassão sugeridas pelos sinais de alerta.

  • A síncope por esforço sugere obstrução da via de saída do coração ou arritmia induzida por exercício. Esses pacientes algumas vezes desenvolvem dor torácica e/ou palpitação. Os achados cardíacos podem identificar a causa. Um sopro basal severo, de pico tardio irradiando para as artérias carótidas sugere estenose aórtica; um sopro sistólico que aumenta com a manobra de Valsalva e desaparece com agachamento sugere cardiomiopatia hipertrófica.

  • A síncope que inicia e termina súbita e espontaneamente é típica de causas cardíacas, com mais frequência arritmia.

  • Síncope, enquanto deitado, também sugere arritmia porque os mecanismos vasovagais e ortostáticos não causam síncope na posição de decúbito.

  • Síncope acompanhada de lesão durante o episódio aumenta a probabilidade de uma causa cardíaca ou convulsão e, portanto, o evento é mais preocupante. De certa forma, os sinais de aviso e a perda de consciência mais lenta que acompanham a síncope vasovagal benigna diminuem a probabilidade de lesão.

Perda de consciência durante uma convulsão ou confusão pós-ictal pode, às vezes, ser confundida com síncope, mas movimentos bruscos musculares ou convulsões que duram mais de alguns segundos, incontinência, sialorreia ou morder a língua, se presentes, geralmente apontam para uma convulsão.

Exames

Exames são tipicamente realizados.

  • ECG

  • Oximetria de pulso

  • Algumas vezes, ecocardiografia

  • Algumas vezes, teste de inclinação ortostática

  • Exames de sangue, apenas se clinicamente indicados

  • Raramente, indicam-se métodos de imagem do sistema nervoso central

Em geral, se a síncope resultar em lesão ou for recorrente (particularmente dentro de um breve período), recomenda-se avaliação mais intensa. Não se realizam exames de imagem cardíaco e cerebral, a menos que indicado por achados clínicos (suspeita de etiologia cardíaca ou deficits neurológicos).

Os pacientes com suspeita de arritmias, miocardites ou isquemia devem ser avaliados internados. Outros podem ser avaliados como pacientes ambulatoriais.

Realiza-se ECG em todos os pacientes. O ECG pode revelar arritmia, distúrbio de condução, sobrecarga ventricular, pré-excitação, QT longo, disfunção de marca-passo, isquemia do miocárdio ou infarto do miocárdio. Se o diagnóstico for questionável após essa avaliação básica, é prudente medir marcadores cardíacos e obter ECG seriados para descartar IM em pacientes idosos, além de monitoramento de ECG por pelo menos 24 horas. Qualquer arritmia detectada deve ser associada à alteração de consciência para ser implicada como causa, mas a maioria dos pacientes não apresenta síncope durante o monitoramento. Por outro lado, a presença de sintomas, na ausência de distúrbios de ritmo, ajuda a excluir causa cardíaca. Um gravador de eventos (que pode registrar o ritmo cardíaco por períodos mais longos) pode ser útil se os sintomas de alerta precedem a síncope. O ECGAR, eletrocardiograma promediado, pode identificar a predisposição a arritmias ventriculares em pacientes com cardiopatia isquêmica ou em pacientes após infarto do miocárdio. Se os episódios de síncope são pouco frequentes (p. ex., < 1/mês), um gravador de eventos implantável pode ser utilizado para gravação de mais longo prazo. Esse dispositivo registra continuamente o ritmo e pode ser acessado por equipamento externo, permitindo a impressão do ritmo cardíaco.

A oximetria de pulso deve ser realizada durante ou imediatamente após o episódio para identificar hipoxemia (que pode indicar embolia pulmonar). Se há hipoxemia, indica-se angiografia por TC para descartar embolia pulmonar.

Realizam-se exames laboratoriais com base na suspeita clínica; painéis de exames laboratoriais obtidos reflexivamente têm pouca utilidade. Entretanto, todas as mulheres em idade fértil devem realizar exame de gestação. Se houver suspeita de anemia, avalia-se o hematócrito. Avaliam-se os eletrólitos somente se houver a presunção clínica de anormalidade (p. ex., pelos sintomas ou uso de fármacos). Troponina sérica é medida se houver suspeita de infarto do miocárdio grave.

Indica-se ecocardiografia para pacientes com síncope clinicamente inexplicável, síncope induzida por esforço, sopros cardíacos ou suspeita de tumores intracardíacos (p. ex., pacientes com síncope posicional).

O teste de inclinação ortostática pode ser feito se a história e o exame físico indicarem síncope vasodepressora ou outra síncope induzida por reflexo. Também é utilizado para avaliar a síncope induzida por esforço, se a ecocardiografia ou o teste de esforço forem negativos.

Realiza-se teste de esforço (físico ou farmacológico) quando há suspeita de isquemia miocárdica intermitente. Em geral, é realizado para pacientes com sintomas induzidos por esforços. O teste de esforço é menos valioso, a menos que a atividade física precipite a síncope.

Considera-se o teste eletrofisiológico invasivo se os exames não invasivos não identificarem arritmia em pacientes com qualquer um dos seguintes:

  • Síncope recorrente inexplicada

  • Sinais de alarme inexplicados

  • Cardiomiopatia isquêmica, cardiomiopatia não isquêmica e doença congênita do adulto ou síncope inexplicada que não atende os critérios para o uso de um CDI para prevenção primária

Uma resposta negativa define um subgrupo de baixo risco com alta taxa de remissão da síncope. O uso de estudo eletrofisiológico é controverso em outros pacientes.

Recomenda-se o EEG quando houver suspeita de doença convulsiva.

TC e RM de crânio e encéfalo só são indicadas se os sinais e sintomas sugerirem doenças neurológicas focais.

Tratamento da síncope

Na síncope testemunhada, verificam-se os pulsos imediatamente. Se o paciente estiver sem pulso, inicia-se a RCP. Se houver pulsação, a bradicardia grave é tratada com atropina ou marca-passo externo transtorácico. É possível utilizar isoproterenol para manter a frequência cardíaca adequada, enquanto se instala marca-passo temporário.

Tratam-se as taquiarritmias; um choque sincronizado de corrente direta é mais rápido e mais seguro do que fármacos para pacientes instáveis. Trata-se o retorno venoso inadequado mantendo-se o paciente em decúbito dorsal, elevando as pernas e administrando soro fisiológico por via IV. O tamponamento é aliviado por pericardiocentese. Pneumotórax hipertensivo exige inserção de cânula pleural e drenagem. A anafilaxia é tratada com adrenalina parenteral.

O posicionamento do paciente na horizontal, com as pernas elevadas tipicamente encerra o episódio de síncope se as doenças potencialmente fatais forem excluídas. Se o paciente sentar-se muito rapidamente, a síncope pode recidivar; a colocação do paciente na posição sentada ou seu transporte na posição ereta pode prolongar a hipoperfusão cerebral e impedir a recuperação.

O tratamento específico depende da causa e de sua fisiopatologia. Dirigir e utilizar maquinários devem ser proibidos até que a causa seja determinada e tratada.

Fundamentos de geriatria: síncope

A causa mais comum da síncope em idosos é hipotensão postural decorrente de uma combinação de fatores. Os fatores incluem artérias rígidas não complacentes, redução do bombeamento musculoesquelético do retorno venoso por causa de inatividade física, e degeneração do nó sinoatrial e do sistema de condução devido à cardiopatia estrutural progressiva.

Em idosos, a síncope, geralmente, tem mais de uma causa. Por exemplo, a combinação do uso de vários fármacos para o coração e para a pressão arterial, com a permanência em pé em uma igreja quente, durante um culto longo ou emocionante, pode desencadear síncope, mesmo que nenhum fator isolado possa causar síncope.

Pontos-chave

  • A síncope resulta da disfunção global do sistema nervoso central, geralmente por fluxo sanguíneo cerebral insuficiente.

  • A maioria das síncopes resulta de causas benignas.

  • Algumas causas menos comuns envolvem arritmias cardíacas ou obstrução da via de saída do coração e são graves e potencialmente fatais.

  • A síncope vasovagal geralmente tem deflagrador aparente, sintomas alarmantes e alguns minutos ou mais de sintomas após a recuperação.

  • Síncope por arritmias cardíacas tipicamente ocorre de maneira abrupta e tem recuperação rápida.

  • Se a etiologia benigna não está clara, dirigir e utilizar máquinas devem ser proibidos até que a causa seja determinada e tratada — a próxima manifestação de uma causa cardíaca não reconhecida pode ser fatal.

  • O tratamento é direcionado à doença subjacente.

Informações adicionais

Primary Writing Committee, Sandhu RK, Raj SR, et al: Canadian Cardiovascular Society Clinical Practice Update on the Assessment and Management of Syncope. Can J Cardiol 36(8):1167–1177, 2020. doi: 10.1016/j.cjca.2019.12.023

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