O duodeno pode ser obstruído por estenose, atresia e por pressão provocada por massa extrínseca. Atresia duodenal e outras causas de obstrução duodenal são frequentemente associadas à síndrome de Down. O diagnóstico é feito com exames de imagem. O tratamento é correção cirúrgica.
(Ver também Visão geral das anomalias gastrointestinais congênitas.)
Atresia duodenal
A atresia duodenal é a 2ª atresia mais comum do trato gastrointestinal (GI). A incidência é estimada em 1 para 10.000 nascidos vivos (1). É decorrente da falta de canalização do duodeno embrionário. Essa falha pode estar relacionada a um evento isquêmico ou a fatores genéticos.
A atresia duodenal, ao contrário de outras atresias intestinais, é comumente associada a outras anomalias congênitas; aproximadamente 25 a 40% dos lactentes com atresia duodenal têm síndrome de Down (1). Outras anomalias associadas incluem anomalias vertebrais, atresia anal, malformações cardíacas, fístula traqueoesofágica, atresia esofágica, anomalias renais e aplasia radial, e anomalias dos membros (acrônimo VACTERL, em inglês), bem como má rotação, pâncreas anular, anomalias das vias biliares e anomalias mandibulofaciais.
Suspeita-se de diagnóstico de atresia duodenal no pré-natal se houver polidrâmnio e/ou estômago dilatado. A ultrassonografia pré-natal pode detectar um duplo sinal de bolha (bolha gástrica grande e bolha duodenal proximal menor) em até 80% dos casos (2).
Essa radiografia mostra o típico efeito de bolha dupla observado na obstrução total do duodeno. A bolha menor representa a parte proximal do duodeno dilatada (seta aberta); a bolha maior representa o estômago (seta fechada). Esse efeito pode ser visto na atresia de duodeno, na membrana duodenal, no pâncreas anular e veia porta pré-duodenal. Raramente, também pode ser visto na obstrução duodenal total resultante de bandas de Ladd em um paciente mal rodado.
No pós-natal, lactentes com atresia duodenal apresentam, dificuldades alimentares e vômito bilioso. Suspeita-se do diagnóstico com base nos sintomas e nos achados radiográficos clássicos de dupla bolha, que mostram uma bolha no estômago e outra no duodeno proximal, além de pouco ou nenhum ar no intestino distal. Embora uma série contratada gastrointestinal superior forneça o diagnóstico definitivo, ela deve ser realizada com cuidado em crianças por um radiologista experiente nesse procedimento para evitar a aspiração, e não costuma ser necessária se a cirurgia for feita imediatamente. Se a cirurgia for adiada (p. ex., devido a outros problemas médicos, como síndrome do desconforto respiratório ou a necessidade de estabilizar o recém-nascido), um enema de contraste deve ser realizado para confirmar que o sinal de dupla bolha não é devido à má rotação.
Uma vez feita a suspeita diagnóstica, o lactente não deve receber nada por boca, e a sonda nasogástrica deve ser colocada para diminuir a compressão sobre o estômago.
A cirurgia é a terapia definitiva.
Estenose duodenal
Ocorre menos comumente do que a atresia duodenal, mas apresenta aspecto semelhante e requer cirurgia. É também frequentemente associada à síndrome de Down.
Cisto do colédoco
Um cisto do colédoco pode obstruir o duodeno por pressão extrínseca. A incidência varia de aproximadamente 1 em 100.000 pessoas nos Estados Unidos e Europa a 1 em 13.000 no Japão (3). Mais da metade dos casos notificados ocorre no Japão. Existem algumas evidências de que a incidência dos cistos de colédoco está aumentando (4).
Lactentes com cisto do colédoco apresentam, classicamente, a tríade clássica de dor abdominal (dado muito difícil de ser considerado no neonato), massa no hipocôndrio direito e icterícia. Se o cisto for grande, ele também pode apresentar-se com graus variados de obstrução duodenal. Neonatos podem manifestar colestase. Em alguns lactentes, pancreatite é um achado associado.
Seu diagnóstico é feito, com mais frequência, pela ultrassonografia. Pode-se definir esses cistos ainda mais utilizando colangiopancreatografia por ressonância magnética, colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) ou ultrassonografia endoscópica.
O tratamento de cistos do colédoco é cirúrgico e requer excisão completa do cisto por causa do alto risco (7 a 30%) de desenvolver neoplasia nos remanescentes císticos (5, 6). O procedimento cirúrgico mais comumente utilizado é hepatojejunostomia em Y de Roux. Esse procedimento costuma ser feito por via laparoscópica. Alguns estudos recentes observaram que o desfecho pode ser melhorado com cirurgia assistida por robô. O risco de câncer é reduzido, mas não eliminado com ressecção completa (7).
Pâncreas anular
Pâncreas anular é uma anomalia congênita rara (5 a 15/100.000 nascidos vivos) (8) e é frequentemente associado à síndrome de Down. Nessa anomalia, o tecido pancreático circunda a segunda porção do duodeno, causando obstrução duodenal.
Cerca de dois terços das pessoas afetadas permanecem assintomáticas. Entre aqueles que desenvolvem sintomas, a maioria se manifesta no período neonatal, mas a apresentação clínica pode ser retardada até a idade adulta. Lactentes apresentam problemas alimentares e êmese que pode ser biliosa.
O diagnóstico do pâncreas anular pode ser sugerido por radiografia do abdome mostrando o mesmo sinal de bolha dupla visto na atresia duodenal. O diagnóstico também pode ser feito por uma série gastrointestinal superior e, de modo mais definitivo, por TC ou colangiopancreatografia por ressonância magnética. A colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) pode ser feito em crianças maiores.
O tratamento é derivação cirúrgica do pâncreas anular com duodenoduodenostomia, duodenojejunostomia ou gastrojejunostomia. Deve-se evitar a ressecção do pâncreas por causa das potenciais complicações da pancreatite e do desenvolvimento de fístula pancreática.
Má rotação
Obstrução duodenal causada por má rotação é rara, ocorrendo em uma pequena parcela de lactentes com má rotação "sintomática" (1/2500 a 6000) (9).
Referências
1. Bethell GS, Long AM, Knight M, Hall NJ; BAPS-CASS. Congenital duodenal obstruction in the UK: a population-based study. Arch Dis Child Fetal Neonatal Ed. 2020;105(2):178-183. doi:10.1136/archdischild-2019-317085
2. Engwall-Gill AJ, Zhou AL, Penikis AB, et al. Prenatal sonography in suspected proximal gastrointestinal obstructions: Diagnostic accuracy and neonatal outcomes. J Pediatr Surg. 2023;58(6):1090-1094. doi: 10.1016/j.jpedsurg.2023.02.029
3. Soares KC, Kim Y, Spolverato G, et al. Presentation and clinical outcomes of choledochal cysts in children and adults: a multi-institutional analysis. JAMA Surg. 2015;150(6):577-584. doi:10.1001/jamasurg.2015.0226
4. Ohashi T, Wakai T, Kubota M, et al. Risk of subsequent biliary malignancy in patients undergoing cyst excision for congenital choledochal cysts. J Gastroenterol Hepatol. 2013;28(2):243-247. doi:10.1111/j.1440-1746.2012.07260.x
5. Søreide K, Søreide JA. Bile duct cyst as precursor to biliary tract cancer. Ann Surg Oncol. 2007;14(3):1200-1211. doi:10.1245/s10434-006-9294-3
6. Frenette C, Mendiratta-Lala M, Salgia R, Wong RJ, Sauer BG, Pillai A. ACG Clinical Guideline: Focal Liver Lesions. Am J Gastroenterol. 2024;119(7):1235-1271. doi:10.14309/ajg.0000000000002857
7. Bloomfield GC, Nigam A, Calvo IG, et al. Characteristics and malignancy rates of adult patients diagnosed with choledochal cyst in the West: a systematic review. J Gastrointest Surg. 2024;28(1):77-87. doi:10.1016/j.gassur.2023.11.007
8. Alkhayyat M, Bachour S, Abou Saleh M, et al. The epidemiology of annular pancreas in the United States: a population-based study. J Clin Gastroenterol. 2022;56(2):186-191. doi:10.1097/MCG.0000000000001531
9. Salehi Karlslätt K, Husberg B, Ullberg U, Nordenskjöld A, Wester T. Intestinal Malrotation in Children: Clinical Presentation and Outcomes. Eur J Pediatr Surg. 2024;34(3):228-235. doi:10.1055/s-0043-1764239
