Ua veíte é inflamação do trato uveal (ver figura Secção transversa do olho). A uveíte é classificada anatomicamente como
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Uveíte anterior: localizada primariamente no segmento anterior do olho, irite (inflamação isolada na câmara anterior) e iridociclite (inflamação na câmara anterior e no corpo vítreo anterior)
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Uveíte intermediária: localizada na cavidade vítrea e/ou região da pars plana
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Uveíte posterior: qualquer forma de retinite, coroidite ou inflamação do disco óptico
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Panuveíte: inflamação comprometendo as estruturas anteriores, intermediárias e posteriores
A uveíte também é classificada de acordo com o início (súbito ou insidioso), a duração (limitada ou persistente) e a evolução (aguda, recorrente ou crônica) (1).
Seção transversal do olho
Referência geral
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1. Jabs DA, Nussenblatt RB, Rosenbaum JT, et al: Standardization of uveitis nomenclature for reporting clinical data. Results of the First International Workshop. Am J Ophthalmol 140(3):509-16, 2005.
Etiologia
Causas da uveíte anterior incluem
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Idiopática ou pós-cirúrgica (a causa mais comum)
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Trauma
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Infecção pelo vírus do herpes [vírus Herpes simplex (HSV), vírus Varicela-zoster (VZV) e citomegalovirus (CMV)]
As causas de uveíte intermediária são
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Idiopática (mais comum)
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Tuberculose (TB)
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Doença de Lyme (em regiões endêmicas)
As causas da uveíte posterior (retinite) são
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Idiopática (mais comum)
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CMV em hospedeiro imunocomprometido
As causas da panuveíte são
Raramente, fármacos sistêmicos causam uveíte (normalmente anterior). Exemplos são sulfonamidas, bifosfonados (inibidores da reabsorção óssea), rifabutina, cidofovir e os inibidores do ponto de verificação (check-point) como o nivolumabe e o ipilimumabe.
Sinais e sintomas
Os sinais e sintomas das uveítes geralmente são sutis e variam consideravelmente, dependendo do local acometido e da gravidade da inflamação.
A uveíte anterior tende a ser a mais sintomática (especialmente quando aguda), geralmente se manifesta com
Uveíte anterior crônica pode ter sintomas menos exuberantes e apresentar irritação ou diminuição da visão.
Os sinais de uveíte anterior incluem hiperemia da conjuntiva adjacente à córnea. Resultados de lâmpada de fenda incluem precipitados endoteliais (aglomerados de leucócitos na superfície da córnea interna), células e flare (turvação) na câmara anterior (humor aquoso) e sinéquias posteriores. Com uveíte anterior grave, os leucócitos podem formar uma camada na câmara anterior (hipópio).
Uveíte intermediária é tipicamente indolor e se manifesta com
Os sinais primários são células no humor vítreo. Agregados e condensações de células inflamatórias ocorrem com frequência, parecendo “bolas de neve”. Pode haver diminuição da acuidade visual por causa de moscas volantes e edema cistoide da mácula, resultantes do extravasamento de líquido dos vasos sanguíneos na mácula. Células vítreas confluentes e condensadas e “bolas de neve” na região da pars plana (próximo da junção entre a íris e a esclera) podem produzir a aparência clássica de “banco de neve”, que pode estar associada à neovascularização da retina periférica.
Uveíte posterior pode se apresentar com os mais diversos sintomas; porém, os mais relatados são moscas volantes e diminuição da acuidade visual, assim como em uveíte intermediária. Sinais incluem
Panuveíte pode produzir qualquer um dos sinais e sintomas descritos anteriormente ou mesmo todos eles.
Complicações
Complicações graves da uveíte incluem perda profunda e irreversível da visão, especialmente quando a uveíte não é reconhecida, é inadequadamente tratada, ou ambos.
As complicações mais frequentes incluem
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Catarata (secundária ao processo da doença e/ou ao tratamento com corticoides)
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Glaucoma (secundário ao processo da doença e/ou ao tratamento com corticoides)
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Neovascularização da retina, nervo óptico ou íris
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Edema macular cístico (a causa mais comum de visão diminuída em pacientes com uveíte)
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Hipotonia (pressão intraocular muito baixa para sustentar a saúde do olho)
Diagnóstico
Deve-se suspeitar de uveíte em qualquer paciente que tenha dor ocular, vermelhidão, fotofobia, moscas volantes ou diminuição da visão. Pacientes com uveíte anterior unilateral têm dor ocular no olho comprometido quando a luz é direcionada ao olho não comprometido (fotofobia verdadeira), o que é incomum em conjuntivite.
Diagnóstico de uveíte anterior é feito pelo reconhecimento de células e flare na câmara anterior. Células e flare são vistas com uma lâmpada de fenda e são mais evidentes quando se utiliza uma luz brilhante estreita intensamente focada na câmara anterior, em um ambiente escuro. Achados de uveíte intermediária e posterior são mais facilmente observados após a dilatação da pupila. Oftalmoscopia indireta (normalmente feita por um oftalmologista) é mais sensível do que a oftalmoscopia direta. (Nota: se uma uveíte é suspeitada, os pacientes devem ser encaminhados imediatamente para avaliação oftalmológica completa.)
Muitas condições que causam inflamação intraocular podem imitar uveíte e devem ser consideradas nas definições clínicas apropriadas. Essas doenças são, mais comumente, conjuntivite grave (p. ex., ceratoconjuntivite epidêmica), ceratite grave (p. ex., ceratoconjuntivite herpética, ceratite ulcerativa periférica) e esclerite grave.
O glaucoma agudo de ângulo fechado pode causar hiperemia e dor intensa semelhante à da uveíte, razão pela qual é importante verificar a pressão intraocular em todas as consultas. A uveíte está frequentemente (mas nem sempre) associada à baixa pressão intraocular, enquanto a pressão é tipicamente alta no glaucoma agudo de ângulo fechado. A uveíte também pode ser diferenciada do glaucoma de ângulo fechado pela ausência de opacidade córnea e de aprofundamento da câmara anterior.
Outros mascaramentos são alguns tipos de câncer intraocular nos muito jovens (tipicamente retinoblastoma e leucemia) e nos idosos (linfoma intraocular). Menos comumente, a retinose pigmentar pode se manifestar com inflamação leve, que pode ser confundida com uveíte.
Tratamento
O tratamento da inflamação ativa geralmente envolve corticoides administrados topicamente (p. ex., 1 gota de acetato de prednisolona a 1% a cada 1 h enquanto acordado) ou com injeção peri ou intraocular juntamente com um fármaco cicloplégico-midriático (p. ex., gotas de homatropina a 2 ou 5% [se disponível] ou gotas de ciclopentolato a 0,5 ou 1,0%, sendo qualquer um dos dois fármacos administrados bid a qid dependendo da gravidade). Antimicrobianos são usados para tratar a uveíte infecciosa. Casos particularmente graves ou crônicos podem exigir corticoides sistêmicos (p. ex., prednisona 1 mg/kg por via oral uma vez/dia), imunossupressores sistêmicos não esteroidais (p. ex., metotrexato 15 a 25 mg por via oral uma vez por semana ou adalimumabe 40 mg em semanas alternadas), fototerapia a laser, crioterapia transescleral da periferia da retina ou remoção cirúrgica do vítreo (vitrectomia) (1).
Referência sobre o tratamento
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1. Jaffe GJ, Dick AD, Brézin AP, et al: Adalimumab in patients with active noninfectious uveitis. N Engl J Med 8; 375(10):932-43, 2016. doi: 10.1056/NEJMoa1509852.
Pontos-chave
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A inflamação do trato uveal (uveíte) pode afetar o segmento anterior (incluindo a íris), trato uveal intermediário (incluindo o vítreo), ou úvea posterior (incluindo a coroide, retina e nervo óptico).
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A maioria dos casos é idiopática, mas causas conhecidas incluem infecções, trauma e doenças autoimunes.
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Os achados na uveíte anterior aguda são dor ocular, fotofobia, hiperemia em torno da córnea (eritema ciliar) e, pelo exame com lâmpada de fenda, células e brilho reflexo.
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A uveíte anterior crônica pode ter sintomas menos exuberantes e apresentar irritação ocular ou diminuição da visão.
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Uveítes intermediária e posterior tende a causar menos dor e olho vermelho, porém, mais moscas volantes e diminuição da visão.
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O diagnóstico é confirmado por exame de lâmpada de fenda e oftalmoscopia (muitas vezes indireta) a após a dilatação pupilar.
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O tratamento deve ser feito pelo oftalmologista geralmente por meio de corticosteroide tópico e um colírio cicloplégico-midriático.