Doença de Kawasaki

(Doença de Kawasaki)

PorJay Mehta, MD, Perelman School of Medicine at The University of Pennsylvania
Reviewed ByAlicia R. Pekarsky, MD, State University of New York Upstate Medical University, Upstate Golisano Children's Hospital
Revisado/Corrigido: fev. 2025 | modificado jun. 2025
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Visão Educação para o paciente

A doença de Kawasaki é uma vasculite que, às vezes, envolve as artérias coronárias e tende a ocorrer em lactentes e crianças de 1 a 5 anos. Caracteriza-se por febre prolongada, exantema, conjuntivite, inflamação das mucosas e linfadenopatia. Podem se desenvolver aneurismas e rupturas da artéria coronária ou infarto do miocárdio decorrente de trombose. O diagnóstico é feito por critérios clínicos; uma vez que a doença é suspeitada, realiza-se ecocardiograma. O tratamento é feito com ácido acetilsalicílico e globulina imunitária IV. A ocorrência de trombose coronária requer fibrinólise ou intervenções percutâneas.

A doença de Kawasaki é uma vasculite de artérias de tamanho médio, principalmente de artérias coronárias, das quais 25% estão envolvidas em pacientes não tratados (1).

A doença de Kawasaki é uma das causas principais de cardiopatia adquirida na criança. As manifestações cardíacas precoces incluem miocardite aguda com insuficiência cardíaca, arritmias, endocardite e pericardite. Pode ocorrer formação subsequente de aneurismas das artérias coronárias. Aneurismas gigantes da artéria coronária (diâmetro interno > 8 mm na ecocardiografia), embora raros, têm maior risco de causar tamponamento cardíaco, trombose ou infarto.

Tecidos extravasculares também podem sofrer processo inflamatório, como vias respiratórias superiores, pâncreas, trato biliar, rins, mucosas e linfonodos.

Referência geral

  1. 1. McCrindle BW, Rowley AH, Newburger JW, et al. Diagnosis, Treatment, and Long-Term Management of Kawasaki Disease: A Scientific Statement for Health Professionals From the American Heart Association [correção publicada em Circulation. 2019 Jul 30;140(5):e181-e184. doi: 10.1161/CIR.0000000000000703]. Circulation. 2017;135(17):e927-e999. doi:10.1161/CIR.0000000000000484

Etiologia da doença de Kawasaki

A etiologia da doença de Kawasaki é desconhecida, mas a epidemiologia e as manifestações clínicas sugerem infecção ou, mais provavelmente, resposta imune anormal a uma infecção em crianças geneticamente predispostas.

Embora as crianças descendentes de japoneses tenham uma alta incidência, a doença de Kawasaki ocorre no mundo todo. Nos Estados Unidos, registram-se 4000-5500 casos/ano (1). A proporção homem:mulher é de cerca de 1,5:1. Oitenta por cento dos pacientes têm < 5 anos de idade (pico, 6 a 24 meses). São raros os casos entre adolescentes, adultos e < 4 meses de idade.

Os casos ocorrem o ano todo, mas são mais frequentes na primavera ou inverno. Grupos com DK têm sido relatados em comunidades, sem evidências claras de uma disseminação de pessoa para pessoa. Cerca de 2% dos pacientes apresentam recorrências, geralmente meses a anos mais tarde. Não há prevenção conhecida.

Referência sobre etiologia

  1. 1. Committee on Infectious Diseases, American Academy of Pediatrics, Kimberlin DW, Banerjee R, Barnett ED, Lynfield R, Sawyer MH: Red Book: 2024–2027 Report of the Committee on Infectious Diseases, ed. 33, 2024. doi:10.1542/9781610027359-TAB

Sinais e sintomas da doença de Kawasaki

A doença tende a avançar em 3 fases: aguda, subaguda e convalescente.

A fase aguda começa com febre que perdura por pelo menos 5 dias, geralmente ≥ 38,0° C e não cessa. A febre está associada com irritabilidade, letargia ocasional ou dor abdominal com cólicas intermitentes. Normalmente em um ou dois dias do início da febre, congestão conjuntival bulbar bilateral aparece sem exsudado.

Em 5 dias, aparece um exantema polimorfo, macular eritematoso, principalmente ao longo do tronco, muitas vezes com acentuação na região perineal. O exantema pode ser eritema urticariforme, morbiliforme, multiforme ou escarlatiniforme. É acompanhado de congestão da faringe; lábios avermelhados, fissurados e secos; e língua vermelha com aspecto de morango.

Durante a primeira semana, pode ocorrer palidez da porção proximal das unhas de dígitos e pododáctilos (leuconiquia parcial). Eritema ou pigmentação vermelho-púrpura e edema variável das palmas das mãos e plantas dos pés geralmente aparecem aproximadamente entre o 3º e o 5º dia. Embora o edema possa ser leve, ele muitas é vezes sensível, duro e não depressível. A fase aguda termina com a resolução da febre.

A fase subaguda vai do final da febre até aproximadamente o dia 25. Descamação periungueal, palmar, plantar e perineal começa por volta do 10º dia. A camada superficial da pele, às vezes, se solta em grandes cilindros, revelando pele nova normal. Artrite, artralgia e trombocitose podem estar presentes. Artrite ou artralgias (majoritariamente envolvendo grandes articulações) ocorrem em cerca de 33% dos pacientes.

As manifestações cardíacas geralmente acontecem na fase subaguda da síndrome, cerca de 1 a 4 semanas após o início, assim que a exantema, a febre e outros sintomas clínicos agudos precoces começam a desaparecer. No entanto, manifestações cardíacas podem ser observadas durante a fase aguda.

Linfadenopatia cervical sensível não supurativa ( 1 nódulo 1,5 cm de diâmetro) está presente durante todo o curso em cerca de 50% dos pacientes. A doença pode durar de 2 a 12 semanas, ou mais. Podem ocorrer casos incompletos ou atípicos, especialmente em crianças menores que têm maior risco de desenvolver doença coronariana. Esses achados se manifestam em cerca de 90% dos pacientes.

Outros achados menos específicos indicam envolvimento multissistêmico.

Outras manifestações clínicas são uretrite, meningite asséptica, hepatite, otite, vômitos, diarreia, hidropisia da vesícula biliar, sintomas da via respiratória superior e uveíte anterior.

A fase convalescente começa quando os sinais clínicos desaparecem e continua por cerca de 6 a 8 semanas após o início da fase aguda.

Diagnóstico da doença de Kawasaki

  • Critérios clínicos (febre 5 dias e achados característicos no exame físico)

  • ECG seriada e ecocardiograma

  • Testes para descartar outras doenças: hemograma, velocidade de hemossedimentação, proteína C-reativa, albumina, enzimas hepáticas, culturas da garganta e do sangue, urinálise, radiografia de tórax

O diagnóstico da doença de Kawasaki é por critérios clínicos (ver tabela Critérios para o diagnóstico da doença de Kawasaki) (1).

Sintomas similares podem resultar de escarlatina, síndromes esfoliativas estafilocócicas, sarampo, reações a fármacos e artrite idiopática juvenil sistêmica. Mimetizações menos comuns são leptospirose e febre maculosa das Montanhas Rochosas.

Uma síndrome inflamatória pós-infecciosa chamada síndrome inflamatória multissistêmica em crianças (SIM-C) foi observada como uma complicação rara da infecção por SARS-CoV-2. Os sintomas da MIS-C são semelhantes àqueles da doença de Kawasaki. As similidaridades são choque, exantema eritematoso, conjuntivite, envolvimento de mucosas, linfadenopatia e alterações cardíacas. Entretanto, crianças com MIS-C tendem a apresentar mais sintomas gastrointestinais (diarreia e vômitos) e neurológicos (cefaleia) do que crianças com doença de Kawasaki. Além disso, crianças com doença de Kawasaki tendem a ter conjuntivite que poupa a área límbica do olho e são mais jovens (geralmente tem menos de 5 anos de idade) (2, 3).

Tabela

Algumas crianças febris, especialmente aquelas com menos de 1 ano de idade, que têm menos de 4 dos 5 critérios diagnósticos, ainda assim desenvolvem complicações vasculíticas, incluindo aneurismas das artérias coronárias. Considera-se que essas crianças têm doença de Kawasaki atípica (ou incompleta). Deve-se considerar doença de Kawasaki atípica, e deve-se iniciar os testes se a criança teve ≥ 5 dias de febre ≥ 38,0° C mais ≥ 2 dos 5 critérios para doença de Kawasaki.

Testes laboratoriais não são diagnósticos, mas podem ser feitos para excluir outras doenças. Os pacientes são submetidos a hemograma completo, velocidade de hemossedimentação (VHS), hemocultura e cultura de material da orofaringe.

A leucocitose, frequentemente com aumento acentuado das células imaturas, é comumente aguda. Outros achados hematológicos são anemia normocítica leve, trombocitose [ 450.000/mcL (≥ 450.000 × 109/L)] na segunda ou terceira semana da doença e elevação na velocidade de hemossedimentação ou na proteína C-reativa. Anticorpos antinucleares, fator reumatoide e culturas são geralmente negativos.

Outras anormalidades, dependendo dos sistemas de órgãos envolvidos, incluem piúria estéril, aumento dos níveis das enzimas hepáticas, albumina sérica reduzida, proteinúria e pleocitose do líquido cefalorraquidiano.

A consulta ao cardiologista pediatra é importante. No momento do diagnóstico, fazem-se ECG e ecocardiografia. Como as anormalidades podem tornar-se evidentes apenas tardiamente, os exames devem ser repetidos posteriormente em 2 ou 3 semanas, 6 a 8 semanas e até 6 a 12 meses após início da doença. O ECG pode revelar arritmias, diminuição de voltagem ou hipertrofia ventricular esquerda. O ecocardiograma pode mostrar aneurismas das artérias coronárias, regurgitação valvular, pericardite ou miocardite. A arteriografia coronariana é ocasionalmente útil em pacientes com aneurismas e testes anormais de esforço.

Referências sobre diagnóstico

  1. 1. McCrindle BW, Rowley AH, Newburger JW, et al. Diagnosis, Treatment, and Long-Term Management of Kawasaki Disease: A Scientific Statement for Health Professionals From the American Heart Association [correção publicada em Circulation. 2019 Jul 30;140(5):e181-e184. doi: 10.1161/CIR.0000000000000703]. Circulation. 2017;135(17):e927-e999. doi:10.1161/CIR.0000000000000484

  2. 2. Burney JA, Roberts SC, DeHaan LL, et al. Epidemiological and clinical features of Kawasaki disease during the COVID-19 pandemic in the United States. JAMA Netw Open. 2022;5(6):e2217436. doi:10.1001/jamanetworkopen.2022.17436

  3. 3. Darby JB, Jackson JM. Kawasaki disease and multisystem inflammatory syndrome in children: An overview and comparison. Am Fam Physician. 2021;104(3):244-252.

Tratamento da doença de Kawasaki

  • Imunoglobulina IV (IGIV)

  • Ácido acetilsalicílico em altas doses

  • Seguimento cardiológico frequente

As crianças devem ser cuidadosamente tratadas por especialistas pediatras cardiologistas, infectologistas e/ou reumatologistas pediatras.

Como as crianças com doença de Kawasaki atípica têm alto risco de aneurisma coronário, não se deve adiar o tratamento. Deve-se começar o tratamento o mais rápido possível, idealmente nos primeiros 10 dias da doença, com uma combinação de imunoglobulina IV (dose única de 2 g/kg administrada durante 10 a 12 horas) e ácido acetilsalicílico oral em altas doses (1, 2). A eficiência do tratamento IGIV/ácido acetilsalicílico, quando iniciado > 10 dias do início da doença, é desconhecida, mas, mesmo assim, deve ser considerada. Pacientes com disfunção cardíaca podem precisar de um esquema alternativo (seja uma taxa de infusão mais lenta ou uma dose administrada em 2 dias) de IVIG devido ao grande volume associado à infusão.

Reduz-se a dose de ácido acetilsalicílico após a criança permanecer afebril por 4 a 5 dias; alguns profissionais preferem manter o ácido acetilsalicílico em altas doses até o 14º dia da doença. O metabolismo do ácido acetilsalicílico é errático durante a fase aguda da doença de Kawasaki, o que explica parcialmente as altas doses necessárias. Alguns especialistas monitoram os níveis séricos do ácido acetilsalicílico durante a terapia com altas doses, especialmente se mantida por 14 dias e/ou a febre persiste apesar do tratamento com IGIV.

A maioria dos pacientes apresenta uma resposta rápida nas primeiras 24 horas do tratamento. Uma pequena fração continua enferma com febre por vários dias e requer doses repetidas de IGIV, corticoides, infliximabe ou uma combinação. Deve-se conduzir o tratamento da doença refratária com informações de um cardiologista e um reumatologista.

Após a melhora dos sintomas da criança por 4 a 5 dias, mantém-se o ácido acetilsalicílico em baixa dose durante pelo menos 8 semanas do início da doença, até que os exames ecocardiográficos sejam repetidos. Se não houver aneurismas das artérias coronárias e ausência de sinais inflamatórios (demonstrado por normalização da VHS e plaquetas), o uso do ácido acetilsalicílico pode ser interrompido. Devido a sua ação antitrombótica, o ácido acetilsalicílico é mantido indefinidamente para aquelas crianças que apresentarem anormalidades das artérias coronárias. Crianças com aneurismas gigantes das coronárias podem necessitar tratamento anticoagulante adicional (p. ex., varfarina, antiplaquetários).

Prevenção de complicações do tratamento

Crianças que recebem IGIV podem ter uma taxa de resposta mais baixa a vacinas de vírus vivos. Portanto, geralmente deve-se adiar a vacina sarampo-caxumba-rubéola para 11 meses após a administração da IGIV e a vacina de varicela por 11 meses. Se o risco de exposição ao sarampo for alto, a vacina deve ser aplicada, porém a revacinação (ou teste sorológico) deve ser feita 11 meses depois.

Há um pequeno risco de síndrome de Reye em crianças que recebem tratamento de longo prazo com ácido acetilsalicílico durante surtos de influenza ou varicela; portanto, a vacinação anual contra influenza é especialmente importante para crianças com 6 meses de idade que recebem tratamento prolongado com ácido acetilsalicílico, e a vacina contra varicela deve ser administrada a crianças que estejam na idade apropriada ou que precisem completar a série. Posteriormente, pais de crianças tratadas com ácido acetilsalicílico devem ser instruídos para entrar em contato, imediatamente, com o médico da criança se ela for exposta ou desenvolver sintomas da gripe ou varicela. A interrupção temporária do ácido acetilsalicílico deve ser considerada (com substituição por dipiridamol para crianças com aneurismas documentados).

Referências sobre tratamento

  1. 1. McCrindle BW, Rowley AH, Newburger JW, et al. Diagnosis, Treatment, and Long-Term Management of Kawasaki Disease: A Scientific Statement for Health Professionals From the American Heart Association [correção publicada em Circulation. 2019 Jul 30;140(5):e181-e184. doi: 10.1161/CIR.0000000000000703]. Circulation. 2017;135(17):e927-e999. doi:10.1161/CIR.0000000000000484

  2. 2. Gorelik M, Chung SA, Ardalan K, et al. 2021 American College of Rheumatology/Vasculitis Foundation Guideline for the Management of Kawasaki Disease. Arthritis Rheumatol. 2022;74(4):586-596. doi:10.1002/art.42041

Prognóstico para doença de Kawasaki

Com terapia adequada, a taxa de mortalidade nos Estados Unidos é aproximadamente 0,17% (1). Febre de longa duração aumenta o risco cardíaco.

Mortes são resultados mais comuns como resultado de complicações cardíacas e podem ser súbitas e imprevisíveis: A terapia eficaz reduz os sintomas agudos e, mais importante, diminui a incidência de aneurismas das artérias coronárias de 20% para < 5%.

Na ausência de doença coronariana, o prognóstico para a recuperação completa é excelente. Cerca de dois terços dos aneurismas coronarianos regridem em 1 ano; mas não se sabe se a estenose coronariana residual permanece. Aneurismas coronarianos gigantes são menos propensos a regredir e exigem acompanhamento e tratamento mais intensivos.

Referência sobre prognóstico

  1. 1. Chang RK. Hospitalizations for Kawasaki disease among children in the United States, 1988-1997. Pediatrics. 2002;109(6):e87. doi:10.1542/peds.109.6.e87

Pontos-chave

  • A doença de Kawasaki é uma vasculite sistêmica infantil de etiologia desconhecida; é a principal causa de cardiopatia adquirida em crianças.

  • As complicações mais graves envolvem o coração e incluem miocardite aguda com insuficiência cardíaca, arritmias e aneurismas coronários.

  • As crianças têm febre, exantema (que mais tarde descama-se), inflamação oral e conjuntival e linfadenopatia; podem ocorrer casos atípicos com menos desses critérios clássicos.

  • O diagnóstico é feito por critérios clínicos (febre 38,0° C por pelo menos 5 dias e achados característicos no exame físico); crianças que atendem aos critérios devem realizar ECG e ecocardiografia seriados e consultar um especialista.

  • O uso precoce de alta dose de ácido acetilsalicílico e imunoglobulina IV alivia os sintomas e ajuda a prevenir complicações cardíacas.

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