Espasmos infantis são convulsões caracterizadas por flexão súbita dos braços, flexão anterior do tronco, extensão das pernas e, mais frequentemente, exibição de hipsarritmia (padrões de ondas desorganizados) no eletroencefalograma. O tratamento consiste em hormônio adrenocorticotrófico, corticoides orais ou vigabratina.
Os espasmos infantis duram poucos segundos e podem repetir-se várias vezes ao dia. Em geral, manifestam-se em crianças com < 1 ano de idade e têm pico entre 4 e 6 meses de idade (1). As convulsões podem resolver-se espontaneamente até os 5 anos de idade, mas geralmente podem ser substituídas por outros tipos de convulsões; em particular, espasmos infantis podem progredir para outras formas de epilepsia, como síndrome de Lennox-Gastaut (2).
Os espasmos infantis são raros e ocorrem em aproximadamente 1,5/100.000 crianças por ano em todo o mundo (3).
A síndrome de West é um tipo de espasmo infantil e um subconjunto de um grupo mais amplo de espasmos epilépticos chamado síndrome de espasmos epilépticos infantis. É utilizada para descrever crianças com espasmos infantis que exibem hipsarritmia na eletroencefalografia (4). Algumas crianças que têm espasmos infantis, mas que não preenchem todos os critérios para a síndrome de West, ainda podem ser diagnosticadas com a síndrome dos espasmos epilépticos infantis. Se as manifestações clínicas de espasmos infantis se desenvolverem ou continuarem a se manifestar fora da infância, elas são denominadas espasmos epilépticos.
Referências gerais
1. Cowan LD, Hudson LS. The epidemiology and natural history of infantile spasms. J Child Neurol. 1991;6(4):355-364. doi:10.1177/088307389100600412
2. Riikonen R. Infantile Spasms: Outcome in Clinical Studies. Pediatr Neurol. 2020;108:54-64. doi:10.1016/j.pediatrneurol.2020.01.015
3. Jia JL, Chen S, Sivarajah V, Stephens D, Cortez MA. Latitudinal differences on the global epidemiology of infantile spasms: systematic review and meta-analysis. Orphanet J Rare Dis. 2018;13(1):216. Publicado em 2018 Nov 29. doi:10.1186/s13023-018-0952-x
4. Pavone P, Polizzi A, Marino SD, et al. West syndrome: a comprehensive review. Neurol Sci. 2020;41(12):3547-3562. doi:10.1007/s10072-020-04600-5
Etiologia dos espasmos infantis
Normalmente, os espasmos infantis ocorrem em crianças com doenças cerebrais graves e anomalias de desenvolvimento, que muitas vezes já foram reconhecidas. Essas doenças podem incluir o seguinte:
Complexo de esclerose tuberosa é uma causa comum de espasmos infantis que pode levar à epilepsia resistente a medicamentos. Síndrome de Sturge-Weber e neurofibromatose são outras causas neurocutâneas.
Raramente, anormalidades cromossômicas (p. ex., síndrome de Down), malformações estruturais do sistema nervoso central (p. ex., síndrome de Aicardi) e infecções neurotrópicas congênitas (p. ex., sífilis, infecção por vírus Zika, infecção por citomegalovírus) podem levar a espasmos infantis.
Algumas vezes a causa dos espasmos infantis não pode ser identificada.
Fisiopatologia dos espasmos infantis
Acredita-se que a fisiopatologia da lesão neurológica que leva a espasmos infantis seja influenciada por vários fatores. Erros inatos do metabolismo e predisposições genéticas podem levar a danos neurológicos semelhantes aos efeitos de defeitos estruturais (patologias orgânicas). Além disso, fatores adquiridos como hipóxia-isquemia e infecções também podem causar lesão neurológica após o nascimento. Consequentemente, interações anormais entre o córtex e o tronco encefálico podem se manifestar como espasmos infantis.
Sinais e sintomas dos espasmos infantis
Os espasmos começam com contrações súbitas, rápidas e tônicas do tronco e dos membros, às vezes por vários segundos. Os espasmos variam de acenos sutis de cabeça até contrações do corpo todo.
Há 3 tipos de espasmos: flexor, extensor ou, mais frequentemente, ambos (misto). Os espasmos flexores causam flexão súbita do pescoço, tronco, braços e pernas. Os espasmos extensores geralmente causam espasmos centrais (pescoço e tronco). Os espasmos mistos geralmente causam flexão da parte superior do corpo com extensão das pernas. Nos três tipos, os espasmos geralmente ocorrem em grupos, muitas vezes em várias dezenas de episódios sucessivos, e costumam ocorrer após a criança acordar, podendo também ocorrer ao adormecer. Às vezes, inicialmente eles são confundidos com o reflexo de sobressalto. O estado pós-ictal pode ser caracterizado por falta de resposta motora.
Atrasos no desenvolvimento (ver Desenvolvimento infantil) pode estar presente antes do início do espasmo infantil. Em lactentes com desenvolvimento normal, a regressão do desenvolvimento (p. ex., as crianças podem parar de sorrir ou perder a capacidade de sentar ou rolar) pode ocorrer após o início dos espasmos infantis.
Diagnóstico dos espasmos infantis
Eletroencefalografia (EEG) com estágios de vigília e sono
Neuroimagem, de preferência RM
Avaliação da etiologia subjacente, se ainda não diagnosticada
História prévia (p. ex., encefalopatia hipóxico-isquêmica neonatal) e/ou sinais e sintomas que sugerem o diagnóstico dos espasmos infantis em algumas crianças. Exames físicos e neurológicos devem ser realizados, mas, geralmente, não são identificados achados patognomônicos, exceto em crianças com complexo da esclerose tuberosa ou outras síndromes neurocutâneas.
Realiza-se EEG para confirmar o diagnóstico e verificar anormalidades específicas. O padrão interictal típico é de hipsarritmia (ondas caóticas, de alta voltagem, delta e teta polimórficas, com descargas agudas multifocais). Podem ocorrer múltiplas variações (p. ex., hipsarritmia focal ou assimétrica). O padrão ictal costuma ser uma atenuação súbita, acentuada e difusa da atividade elétrica.
Neuroimagem, de preferência RM, é feita se não tiver sido realizada recentemente.
Exames para determinar a causa
Se não ficar claro a partir da neuroimagem ou história anterior, testes para determinar a causa podem incluir
Testes laboratoriais (p. ex., hemograma completo com diferencial, níveis séricos de glicose, eletrólitos, ureia, creatinina, sódio, cálcio, magnésio, fósforo, aminoácidos e ácidos orgânicos na urina; testes hepáticos) se houver suspeita de uma doença metabólica, mas não diagnosticada na triagem neonatal.
Testes genético (painéis genéticos para epilepsia estão disponíveis)
Análise do líquido cefalorraquidiano (LCR) para verificar distúrbios metabólicos
(Ver também Abordagem ao paciente com distúrbio metabólico hereditário suspeito.)
Tratamento dos espasmos infantis
Hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) intramuscular
Corticoides orais
Vigabatrina (especialmente para o complexo da esclerose tuberosa)
Os espasmos infantis não respondem aos anticonvulsivantes típicos.
As terapias padrão para espasmos infantis geralmente são ACTH e corticoides e, em alguns casos, vigabatrina (1).
A ACTH pode ser administrada por via IM diariamente em injeções de alta ou baixa dose. O Pediatric Epilepsy Research Consortium (PERC) recomenda a dose mais alta, administrada por 2 semanas e então diminuída a cada 3 dias até que 29 dias de tratamento sejam completados. Se tratamento com dose baixa foi tentado e não interrompeu os espasmos em 2 semanas, usa-se a dose mais alta (2).
Corticoides (p. ex., prednisona) são administrados por 4 a 7 semanas.
A vigabatrina é o fármaco de escolha quando os espasmos são causados por complexo da esclerose tuberosa. Também é frequentemente utilizado em crianças com lesão ou malformação cerebral grave preexistente e naquelas que não toleram ou não respondem à terapia com ACTH. A dosagem de vigabatrina por via oral é aumentada gradualmente por cerca de uma semana, se necessário. Não há evidências suficientes de que quaisquer outros anticonvulsivantes ou a dieta cetogênica seja eficaz.
Em alguns pacientes com espasmos resistentes ou com malformação cortical focal, a cirurgia para epilepsia pode eliminar as convulsões.
Há evidências de que quanto mais rapidamente a terapia eficaz é iniciada, melhor o desfecho do desenvolvimento neurológico, em particular quando nenhuma causa é identificada.
Referências sobre tratamento
1. Go CY, Mackay MT, Weiss SK, et al. Evidence-based guideline update: medical treatment of infantile spasms. Report of the Guideline Development Subcommittee of the American Academy of Neurology and the Practice Committee of the Child Neurology Society. Neurology. 2012;78(24):1974-1980. doi:10.1212/WNL.0b013e318259e2cf
2. Knupp KG, Coryell J, Nickels KC, et al. Response to treatment in a prospective national infantile spasms cohort. Ann Neurol. 2016;79(3):475–484. doi:10.1002/ana.24594
Prognóstico para paralisia cerebral
A frequência de mortes prematuras varia de 5 a 31% (1) e está relacionada à etiologia dos espasmos infantis.
Em um estudo longitudinal finlandês com 214 crianças com espasmos infantis e uma taxa de acompanhamento de 100%, os resultados comuns a longo prazo relatados foram autismo e comportamento hipercinético, e uma proporção significativa tinha deficiência intelectual. Cerca de um terço continuou a ter crises epilépticas. Após o período completo de acompanhamento de 35 anos, cerca de um terço havia morrido (2). Mais estudos longitudinais em outras populações são necessários para generalização.
Referências sobre prognóstico
1. Riikonen R. Long-term outcome of West syndrome: A study of adults with a history of infantile spasms. Epilepsia. 1996;37(4):367–372. doi:10.1111/j.1528-1157.1996.tb00573.x
2. Riikonen R. Infantile Spasms: Outcome in Clinical Studies. Pediatr Neurol. 2020;108:54-64. doi:10.1016/j.pediatrneurol.2020.01.015
Pontos-chave
Os espasmos infantis duram alguns segundos e podem recorrer muitas vezes ao dia; eles podem desaparecer espontaneamente por volta dos 5 anos de idade, mas frequentemente são substituídos por outros tipos de convulsões.
Normalmente, os espasmos infantis ocorrem em lactentes com distúrbios cerebrais subjacentes e alterações de desenvolvimento que muitas vezes já foram reconhecidos; o complexo da esclerose tuberosa é uma causa comum.
Fazer eletroencefalografia para confirmar o diagnóstico e outros exames (p. ex., RM cerebral e testes genéticos e metabólicos) para avaliar a causa do espasmo infantil.
Os espasmos infantis podem ser tratados com hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), corticoides orais ou vigabatrina (o fármaco de escolha para espasmos causados pelo complexo da esclerose tuberosa).
