Visão geral de incidentes com armas de destruição em massa

PorJames M. Madsen, MD, MPH, University of Florida
Revisado/Corrigido: jan 2023
Visão Educação para o paciente

Incidentes de destruição em massa (IDMs) são eventos nos quais um número suficientemente alto de vítimas sobrecarrega os recursos médicos disponíveis. Eles compreendem catástrofes naturais (p. ex., furacões) e vários tipos de eventos intencionais e não intencionais causados pelo homem, como acidentes com veículos de transporte, liberação de substâncias perigosas, explosões e tiroteios.

Armas de destruição em massa (ADMs) são aquelas que podem produzir incidentes de destruição em massa. Incluem uma variedade de

  • Produtos químicos

  • Toxinas

  • Agentes biológicos (infecciosos)

  • Fontes de radiação

  • Explosivos

Os tipos de armas algumas vezes são chamados de QBRNE (química, biológica, radiológica, nuclear ou explosiva) ou NBQ (nuclear, biológica ou química). Os efeitos dos agentes uma ADM podem ser locais (em ou próximo do local de exposição) ou sistêmicos (por causa da absorção e distribuição na circulação).

Armas químicas são às vezes chamadas de armas de destruição em massa (ADMs), mas esse termo é menos adequado porque implica destruição física significativa da infraestrutura, o que só ocorre com as ADMs explosivas. Além disso, embora “arma” signifique o uso intencional (p. ex., nações em guerra ou terroristas), a maioria das ADMs tem equivalentes não intencionais (p. ex., vazamento industrial ou durante o transporte de substância tóxica ou radioativa, epidemia de doença infecciosa ou explosão industrial) para que os princípios básicos e a resposta sejam os mesmos.

Exposição

Exposição é

  • Contato com uma superfície epitelial

Absorção significa

  • Penetração de uma barreira epitelial que resulta em contaminação interna

Para eventos envolvendo radiação, a exposição também significa a passagem da radiação eletromagnética pelo corpo (denominada irradiação), que pode ocorrer sem contato físico com a fonte de radiação (ver Exposição e contaminação radioativas). Para todos os tipos de ADMs, contaminação refere-se à substância presente na superfície epitelial (contaminação externa) ou em depósitos no corpo (contaminação interna). Contaminação interna mais comumente se refere apenas a partículas radioativas no corpo, em vez de outros agentes ADM.

Exposição a uma ADM pode ser facilmente perceptível, como ocorre numa explosão ou em algum vazamento ou derramamento visível, e pode até ser anunciada com antecedência por algum agressor. No entanto, a exposição a armas NBQ pode ser oculta, mesmo se a substância em questão dispersar-se como resultado de uma explosão. Como a maioria dos agentes NBQ não tem odor ou aparência prontamente identificáveis e como geralmente há um tempo apreciável entre a exposição e o surgimento de sinais ou sintomas, uma explosão só pode ser reconhecida como um evento de exposição NBQ algum tempo mais tarde. A exposição oculta pode ser particularmente difícil de identificar ou diferenciar de uma epidemia natural da doença. Uma exceção é exposição a altas doses de determinados produtos químicos (p. ex., cianetos e agentes neurotóxicos), que podem causar efeitos óbvios depois de apenas alguns segundos ou minutos, especialmente quando eles forem inalados.

Depois de disseminadas no ambiente, as ADMs podem existir como uma combinação de sólidos, líquidos, gases ou vapores (a forma gasosa de uma substância que é líquida à temperatura ambiente). Partículas de poeira fina ou pequenas gotas de líquidos pode ficar suspensas no ar como aerossóis (p. ex., gás, bruma, fumaça, ou vapores). O estado físico do agente determina a sua persistência no meio ambiente e as potenciais vias de exposição. Agentes persistentes, normalmente sólidos e líquidos de baixa volatilidade, permanecem no ambiente por mais de um dia em condições normais; alguns podem persistir por semanas. Agentes não persistentes, tipicamente gases e líquidos de alta volatilidade, dispersam-se em < 24 horas. Aerossóis particulados podem depositar-se no solo em questão de minutos a dias, dependendo do tamanho das partículas e das condições meteorológicas, mas, então ainda podem atuar como contaminantes de superfície.

Além da dose e substância, a via de exposição é um fator importante nas manifestações clínicas de um evento produzido por ADM. Gases, vapores e partículas podem ser inalados. Sólidos e líquidos podem contaminar a pele, a partir da qual podem ser absorvidos ou transferidos para a boca e ingeridos. Objetos contaminados (p. ex., detritos de uma explosão) podem penetrar na pele e, portanto, introduzir agentes NBQ por via parenteral. Assepsia geralmente refere-se à assepsia externa, à remoção de produtos químicos, toxinas ou agentes infecciosos da superfície epitelial. A remoção de substâncias radioativas do corpo é denominada assepsia interna.

Abordagem inicial a incidentes em massa com vítimas

A abordagem para um incidente com uma arma de destruição em massa (ADM) é

  • Prontidão

  • Reconhecimento

  • Avaliação primária e triagem

  • Avaliação secundária

  • Tratamento

Essas etapas frequentemente se sobrepõem. Reconhecimento, avaliação e tratamento podem acontecer simultaneamente, dependendo da natureza, número e gravidade dos acidentes.

Prontidão

Prevenção, que tipicamente é feita por civis em vez de por instituições de saúde, elimina a necessidade de atendimento médico. Mas se a prevenção falhar, as estratégias de prontidão são cruciais.

Hospitais e serviços pré-hospitalares devem ter um plano contra desastres, além de suprimentos e equipamentos adequados para responder a um incidente com ADM. Atividades de preparação para desastres tipicamente incluem análise da vulnerabilidade de risco e protocolos para ativar e mobilizar novas equipes para os locais e as funções especificadas, bem como de alocar recursos (p. ex., leitos, salas de operação, sangue). Suprimentos e equipamentos normalmente compreendem as áreas específicas para a assepsia com drenagem contida, revestimentos de pavimentos e equipamentos de proteção para minimizar a propagação da contaminação, e estoques de antídotos ou sistemas formais para obtê-los de outras fontes. Os planos tipicamente incluem exigência de treinamentos formais periódicos, que embora sejam apenas uma aproximação distante de um incidente de destruição em massa real, ajudam a equipe a conhecer o processo, incluindo a localização dos procedimentos por escrito, dos suprimentos e dos equipamentos (particularmente os de descontaminação).

Reconhecimento

O reconhecimento de incidentes de destruição em massa por explosivos, armas de fogo e acidentes de transporte, é simples. Entretanto, reconhecer eventos incidente de destruição em massa ocultos exige um alto grau de suspeita clínica por parte dos socorristas e dos médicos. Profissionais de saúde devem primeiro reconhecer que um evento ou grupo de doenças pode representar a utilização de alguma arma de destruição em massa. A seguir, devem determinar o tipo de ADM e a classe do agente.

O reconhecimento de um incidente com ADM pode vir através dos serviços de inteligência ou do anúncio pelos autores, indícios ambientais (p. ex., animais mortos ou morrendo, odores estranhos) ou monitores ambientais (químico, biológico ou de radiação), que podem não estar disponíveis em todos os hospitais. O único indício pode ser observar que um grande número de pessoas apresentam sintomas incomuns. Entretanto, os relatos iniciais da identidade do agente ou agentes utilizados em um incidente com ADM costumam ser incompletos ou conter erros, e ter alto índice de suspeita clínica é inestimável.

À medida que avaliam-se as vítimas, os sinais e sintomas característicos podem ser reconhecidos. Existem toxíndromes (complexo de sinais e sintomas típicos da exposição a uma classe de agentes) para várias classes de agentes químicos e toxinas [ver tabela Síndromes tóxicas comuns]; estas toxíndromes são cruciais para o reconhecimento clínico. Essencialmente, a análise laboratorial das amostras clínicas e ambientais pode ser necessária. Mas o diagnóstico e tratamento iniciais podem precisar ser feitos sem confirmação laboratorial, especialmente para os agentes químicos com curtos períodos de latência.

Avaliação primária e triagem

A avaliação primária e a triagem das vítimas de IDM diferem da avaliação e triagem do trauma normal (ver tabela Classificação de triagem). O grande número de vítimas em um IDM exige que o contato e a tomada de decisão iniciais sejam breves, particularmente quando os acidentes ocorrerem com agentes com períodos de latência curta. A triagem pode ser particularmente difícil porque muitos pacientes atingidos por ADMs não têm lesões visíveis e porque muitas pessoas em ou próximas de um IDM que não foram expostas ao agente podem ter reações de estresse (p. ex., hiperventilação, tremores, náuseas e/ou fraqueza) que mimetizam os efeitos das ADM. Em alguns casos, até 80% dos pacientes que chegaram aos hospitais tinham somente reação de estresse. Pode ser difícil diferenciar os efeitos puramente psicológicos dos efeitos tóxicos, infecciosos ou radiológicos. Um bom primeiro passo é separar os pacientes que conseguem andar daqueles que não conseguem; essa diferenciação identificará os mais gravemente afetados. Entretanto, é necessária a retriagem frequente dos pacientes ambulatoriais para detectar aqueles que começam a se deteriorar após um período de latência.

Tabela

Dicas e conselhos

  • Novas triagens frequentes de pacientes ambulatoriais após um incidente com vítimas em massa são necessárias para detectar aqueles que começam a se deteriorar após um período de latência.

A zona quente é a área imediatamente adjacente à liberação da ADM. O risco de contaminação dos profissionais de saúde é maior na zona quente e normalmente apenas o pessoal de resposta de emergência com equipamentos de proteção individual adequados têm permissão para entrar nessa área. Esses equipamentos tipicamente contém mecanismos de proteção toxicológica (MPT) nível A, que oferecem encapsulamento completo com aparelho de respiração autossuficiente.

A zona morna (corredor de assepsia) margeia a zona quente. Assepsia abrangente de corpo inteiro (assepsia completa) deve ocorrer nessa zona. A equipe médica pode precisar usar equipamento de proteção durante a avaliação primária, a triagem e o tratamento inicial das vítimas, especialmente em caso de pacientes expostos a produtos químicos. Esses equipamentos são tipicamente material MPT nível B, que incluem os respiradores com filtro de ar.

A zona fria (zona limpa) abrange os serviços de emergência hospitalar. Como a assepsia supostamente já ocorreu na zona quente, a segurança da equipe médica da zona fria normalmente deve ser feita com as precauções universais. No entanto, os hospitais ainda precisam ter capacidade de assepsia porque muitos pacientes que não passaram pela triagem e assepsia local (isto é, saíram da cena por conta própria e por meios próprios) podem chegar. A entrada inadvertida de pacientes contaminados em um serviço de emergência hospitalar altera a classificação para zona morna ou mesmo quente.

Avaliação secundária

Como inicialmente há poucas informações acerca do IDM, a avaliação inicial do agente envolvido pode estar equivocada ou incompleta. Assim, é essencial reavaliar sistematicamente cada paciente e a situação geral usando um método rápido e reprodutível. Esse método deve usar uma progressão lógica que aborda cada um dos 3 componentes — agente, ambiente e hospedeiro (paciente) — da tríade epidemiológica e que considera (ou reconsidera)

  • Agente (s) possível (eis)

  • Estado (s) do agente (s) no ambiente

  • Transição do agente para o paciente (vias de penetração ou vias de exposição e absorção)

  • Efeitos clínicos do agente, incluindo se os efeitos forem locais (ou próximos do local de penetração), sistêmicos (por distribuição hematológica) ou ambos

  • Evolução temporal (duração da exposição, tempo de exposição, período de latência, tendência atual dos sintomas e prognóstico)

  • Diagnóstico diferencial e exposições ou doenças concomitantes

  • Possíveis interações entre as exposições ou as doenças concomitantes

Um acrônimo útil (em inglês) para facilitar a avaliação secundária rápida é ASBESTOS (ver tabela ASBESTOS*: avaliação secundária de destruição em massa decorrentes de armas químicas ou radiológicas). (1).

Tabela

Referência geral

  1. 1. Madsen JM: Toxins as weapons of mass destruction. A comparison and contrast with biological-warfare and chemical-warfare agents. Clin Lab Med 21(3):593-605, 2001.

Tratamento de lesões por armas de destruição em massa

O objetivo do tratamento inicial das vítimas por armas de destruição em massa é

  • Proteger os profissionais de saúde

  • Interromper a exposição ao agente (remover o paciente da área contaminada, eliminar a contaminação do paciente)

  • Estabilizar clinicamente os pacientes

Um mnemônico útil é ABCDDs: Airway (via respiratória), Breathing (respiração), Circulation (circulação), Immediate Decontamination (assepsia imediata) e Drugs (fármacos). Entretanto, essas etapas são aplicadas quase simultaneamente quanto possível, em vez de seguir uma ordem rigorosa. Por exemplo, o broncoespasmo em pacientes expostos a agentes neurotóxicos pode ser tão grave que os pacientes não podem ser ventilados (B) até a administração da atropina (D), e os fármacos podem ser ineficazes enquanto os agentes químicos permanecerem em contato com o paciente. À medida que estes passos forem tomados, a equipe de resposta às emergências NBQ, especialmente no caso de acidente químico, deve ter cuidado e se proteger contra a exposição (do ambiente e diretamente das vítimas) antes de prestar socorro.

Vias respiratórias, respiração e circulaçãosão abordadas de maneira padrão, como discutido em Reanimação cardiopulmonar (RCP) em adultos. Esses passos são tipicamente adotados inicialmente, seja a causa trauma físico ou por NBQ. Uma exceção é a de certos pacientes com exposição a substâncias químicas (p. ex., agentes neurotóxicos) para os quais a assepsia imediata e a administração de antídotos podem salvar vidas (e prevenir o aparecimento ou permitir o tratamento eficaz de problemas nas vias respiratórias ou respiratórios). A estabilização clínica dos ABCs algumas vezes precisa ser feita na zona quente.

A prioridade da assepsia varia de acordo com o tipo de ADM e do quadro clínico do paciente. Os pacientes expostos a agentes biológicos ou radiológicos em aerossol (ver Contaminação e exposição à radiação: descontaminação externa) normalmente têm contaminação cutânea e/ou das roupas. Como a maioria desses agentes não penetra rapidamente na pele íntegra, despir e banhar normalmente bastam para descontaminar; essa assepsia não deve ser postergada, mas não é tão urgente como quando certos agentes químicos estão envolvidos. Como certos agentes químicos (p. ex., gás mostarda, agentes neurotóxicos líquidos) começam a penetrar na pele pelo contato e também podem começar a lesar o tecido imediatamente, os pacientes expostos a esses agentes precisam de assepsia imediata para interromper a absorção contínua e evitar a propagação da contaminação para outras partes do paciente e para a equipe médica e os locais de atendimento. A assepsia imediata é mais eficaz com um produto tópico comercial especialmente formulado para a assepsia cutânea (Reactive Skin Decontamination Lotion, ou RSDL®), que inativa os agentes neurotóxicos e gás mostarda sobre a pele (não deve ser usado nos olhos ou em feridas). Mas água e sabão também são eficazes. A água por si só é menos eficaz para as substâncias químicas oleosas, mas ainda assim deve ser utilizada quando não houver sabão disponível. Uma solução de hipoclorito de sódio a 0,5% (preparada pela diluição de água sanitária doméstica normal a 5% em água, numa proporção de 1:9, respectivamente) também é eficaz, mas não deverá ser usada nos olhos ou em feridas. Em uma emergência, qualquer adsorvente disponível (p. ex., toalhas de papel, tecido, solo rico em argila, pão) pode ser aplicado à área afetada, esfregado por até 2 minutos e então removido por lavagem abundante. Deve-se inspecionar as feridas e remover todos os detritos; as feridas devem então ser lavadas com água ou soro fisiológico.

Os fármacos para a estabilização inicial devem ser administrados quando necessário como para qualquer paciente instável. A maioria dos tratamentos medicamentosos definitivo para vítimas de ADM pode esperar até que internação hospitalar. As exceções são o tratamento do choque e dos efeitos agudos dos agentes químicos como cianetos e agentes neurotóxicos. Antídotos apropriados para esses agentes devem estar disponíveis para administração imediata no atendimento pré-hospitalar.

As opiniões expressas neste artigo são as do autor e não refletem a política oficial do Departamento das Forças Armadas, Departamento de Defesa ou o Governo dos Estados Unidos.

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