Fibrose hepática

PorTae Hoon Lee, MD, Icahn School of Medicine at Mount Sinai
Revisado/Corrigido: jan 2022
Visão Educação para o paciente

Fibrose hepática é uma cicatrização exuberante em que excesso de tecido conjuntivo acumula-se no fígado. A matriz extracelular pode estar com produção excessiva, ou degradação deficiente, ou ambos. O gatilho é a lesão crônica, especialmente se esta tiver componente inflamatório. A fibrose não causa qualquer sintoma, mas pode provocar hipertensão portal (a cicatrização altera o fluxo sanguíneo próximo do fígado) ou cirrose (a cicatrização resulta na alteração da arquitetura normal do fígado e disfunção hepática). O diagnóstico baseia-se na biópsia hepática. O tratamento envolve a correção da causa de base, sempre que possível.

Na fibrose hepática, existe excessivo acúmulo de tecido conjuntivo no fígado; este tecido representa a cicatrização em resposta à lesão celular hepática crônica e repetida. Comumente, a fibrose progride, altera a arquitetura hepática e, por fim, a função hepática, na tentativa de regeneração dos hepatócitos e de reparo ao dano tecidual. Quando essa alteração é difusa, a cirrose é diagnosticada.

Etiologia da fibrose hepática

Vários tipos de lesão hepática podem causar fibrose (ver tabela Distúrbios e fármacos que podem causar fibrose hepática). A lesão hepática aguda autolimitada (p. ex., hepatite viral aguda A), mesmo quando fulminante, não necessariamente distorce o andaime arquitetural e por isso não causa fibrose avançada, a despeito da perda de hepatócitos. Em fases iniciais, a fibrose hepática pode regredir se a causa for reversível (p. ex., nos casos de eliminação viral). Depois de meses a anos de lesão crônica ou recorrente, a fibrose torna-se permanente. O desenvolvimento da fibrose é mais acelerado quando há mecanismos de obstrução biliar.

Tabela

Fisiopatologia da fibrose hepática

A fibrose inicia-se pela ativação de células estelares perivasculares (células de Ito, armazenadoras de gordura). Essas e outras células vizinhas proliferam-se, tornando-se células contráteis, denominadas miofibroblastos. Essas células aumentam a produção da matriz extracelular anormal (que consiste em colágeno, outras glicoproteínas e glicanos) e de proteínas da matriz celular. Células de Kupffer (macrófagos residentes), hepatócitos lesionados, plaquetas e agregados leucocitários. Como resultado, liberam espécies reativas de oxigênio e mediadores inflamatórios (p. ex., fator de crescimento derivado das plaquetas, fatores transformadores de crescimento e fator de crescimento de tecido conjuntivo). Assim, a ativação de células estelares resulta na matriz extracelular anormal, tanto em quantidade quanto na composição.

Os miofibroblastos, estimulados pela endotelina 1, contribuem para o aumento da resistência da veia porta e aumentam a densidade da matriz anormal. Tratos fibrosos aglomeram-se nos ramos aferentes portais venosos e nas veias hepáticas aferentes, gerando um bypass pelos hepatócitos e limitando o aporte hepatocitário de sangue. Dessa forma, a fibrose contribui para haver isquemia hepatocitária (causando disfunção hepatocelular) e hipertensão portal. A extensão da isquemia e da hipertensão portal determina quanto o fígado será afetado. Por exemplo, a fibrose hepática congênita afeta os ramos portais, poupando o parênquima. O resultado é hipertensão portal sem disfunção hepatocelular.

Sinais e sintomas da fibrose hepática

A fibrose hepática não causa sintomas. Os sintomas podem resultar de doença que causa fibrose ou, depois que a fibrose progride para cirrose, de complicações da hipertensão portal. Esses sintomas são icterícia, sangramento varicoso, ascite e encefalopatia portossistêmica. Cirrose pode resultar em insuficiência hepática e insuficiência hepática potencialmente fatal.

Diagnóstico da fibrose hepática

  • Avaliação clínica

  • Às vezes, exames sanguíneos e/ou exames de imagem não invasivos

  • Algumas vezes, biópsia hepática

Suspeita-se de fibrose hepática se os pacientes têm doença hepática crônica conhecida (p. ex., hepatite viral crônica C [HCV] e hepatite B crônica [HBV], doença hepática alcoólica) ou se os resultados dos testes hepáticos são anormais; nesses casos, os testes são feitos para verificar fibrose e, se a fibrose está presente, para determinar sua gravidade (estágio). Conhecer o estágio da fibrose pode orientar as decisões médicas. Por exemplo, triagem para carcinoma hepatocelular e para varizes gastroesofágicas é indicada se a cirrose está confirmada, mas geralmente não é indicada para fibrose leve ou moderada. A avaliação do grau de fibrose hepática ajuda a prever o prognóstico dos pacientes com hepatite viral crônica. No entanto, desde a ampla disponibilidade dos antivirais de ação direta, saber o grau de fibrose tornou-se muito menos importante para decidir quando iniciar a terapia antiviral.

Os testes utilizados para estadiar a fibrose incluem exames de imagem convencionais, exames de sangue, biópsia hepática e exames de imagem não invasivos mais recentes que avaliam a rigidez do fígado.

Exames de imagem convencionais: os exames de imagem convencionais incluem ultrassonografia, TC e RM. Esses testes podem detectar evidências de cirrose e hipertensão portal, como nodularidade na superficie hepática, esplenomegalia e varizes. No entanto, não são sensíveis para a fibrose moderada ou mesmo avançada e podem falhar em detectar algumas causas de cirrose se esplenomegalia e varizes estão ausentes. Embora a fibrose possa aparecer como ecogenicidade alterada na ultrassonografia ou heterogeneidade do sinal no TC, esses resultados são inespecíficos e podem indicar somente gordura do parênquima hepático.

Avaliação por imagem não invasiva da fibrose: tecnologias acústicas mais recentes podem aumentar a precisão da ultrassonografia e RM para detectar fibrose ou cirrose precoce; elas incluem

Para esses testes, as vibrações acústicas são aplicadas ao abdome com uma sonda. A rapidez com que essas vibrações são transmitidas ao longo do tecido hepático indica a rigidez (isto é, fibrose) do fígado. Entretanto, algumas outras condições além da fibrose também aumentam a rigidez hepática, incluindo hepatite ativa grave, aumento da pressão cardíaca direita e estado pós-prandial. Além disso, essas técnicas não foram adequadamente validadas na gestação, na resposta virológica sustentada após tratamento para o HCV e em doenças hepáticas raras. Portanto, normalmente não se recomenda o uso dessas técnicas em pacientes com uma dessas doenças.

A biópsia hepática continua sendo o padrão ouro para o diagnóstico e estadiamento da fibrose hepática e para o diagnóstico da doença hepática subjacente que causa fibrose. No entanto, a biópsia hepática é invasiva, o que resulta em um risco de 10 a 20% de complicações menores (p. ex., dor pós-procedimento) e risco de 0,5 a 1% de complicações graves (p. ex., sangramento significativo). Além disso, a biópsia hepática é limitada pelo erro de amostragem e concordância imperfeita entre observadores na interpretação dos resultados histológicos. Assim, a biópsia hepática nem sempre pode ser feita. Em geral, biópsia hepática não é feita apenas para o estadiamento da fibrose hepática, a menos que exames não invasivos não ajudem a estabelecer o diagnóstico (p. ex., porque diferentes exames não invasivos produzem resultados discordantes) ou para ensaios clínicos.

O sistema de estadiamento do metavir avalia as alterações inflamatórias (atividade histológica) e o nível de fibrose como a seguir (1):

Atividade histológica

  • A0 = nenhuma atividade

  • A1 = atividade leve

  • A2 = atividade moderada

  • A3 = atividade grave

Fibrose

  • F0 = sem fibrose

  • F1 = fibrose portal sem septos

  • F2 = fibrose portal com septos raros

  • F3 = múltiplos septos sem cirrose

  • F4 = cirrose

Exames de sangue estão incluídos em modelos clínicos [p. ex., índice APRI, escore BARD, escore FIB-4, classificação de fibrose por doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA), que combinam testes comumente disponíveis (AST, ALT, contagem de plaquetas, albumina, RNI) com dados demográficos e informações clínicas [p. ex., idade, índice de massa corporal (IMC), diabetes/glicemia em jejum prejudicada]. Alguns painéis comercialmente disponíveis [p. ex., FibroTest (conhecido como Fibrosure nos Estados Unidos), Hepascore, European Liver Fibrosis Panel (ELF)] combinam marcadores indiretos (p. ex., bilirrubina sérica) e marcadores diretos da função hepática. Marcadores diretos são substâncias envolvidas na patogênese da deposição de matriz extracelular ou citocinas que induzem a deposição de matriz extracelular. Esses painéis são mais bem utilizados para distinguir entre dois níveis de fibrose: ausente a mínimo versus moderado a grave; eles não diferenciam com precisão os graus de fibrose moderada a grave. Portanto, se houver suspeita de fibrose, uma abordagem é começar com um desses painéis e então fazer as novas avaliações por testes de imagem não invasivos da fibrose, reservando a biópsia hepática como um último recurso.

Referência sobre diagnóstico

  1. 1. Bedossa P, Poynard T: An algorithm for the grading of activity in chronic hepatitis C. The METAVIR Cooperative Study Group. Hepatology 24(2):289-293, 1996. doi: 10.1002/hep.510240201

Tratamento da fibrose hepática

  • Tratamento da causa

Uma vez que a fibrose é um sinal de agressão hepática, o tratamento geralmenteconcentra-se na causa (removendo a base da lesão hepática). Esse tratamento pode incluir antivirais para eliminar o vírus da hepatite B ou o vírus da hepatite C na hepatite viral crônica, abstinência alcoólica na doença hepática alcoólica, perda ponderal em pacientes com esteatoepatite não alcoólica (ENA), remoção de metais pesados, como ferro na hemocromatose ou cobre na doença de Wilson e descompressão das vias biliares na obstrução biliar. Esses tratamentos podem evitar a progressão da fibrose e, em alguns pacientes, também inverter algumas das alterações fibróticas.

O tratamento visando a regressão da fibrose geralmente é muito tóxico para uso a longo período (p. ex., corticoides, penicilamina) ou não tem eficácia comprovada (p. ex., colchicina, silimarina do cardo mariano). Outros tratamentos antifibróticos estão em estudo, especialmente para ENA (p. ex., glitazona, vitamina E, agonista do GLP-1, agonista do PPAR, agonista do FXR, inibidor da caspase, inibidores de SK1). O café foi associado a um menor risco de cirrose em metanálises, mas são necessários estudos adicionais.

Pontos-chave

  • Lesão hepática aguda autolimitada (p. ex., devido à hepatite A viral aguda), mesmo quando fulminante, tende a não causar fibrose.

  • As causas mais comuns da fibrose hepática são as hepatites B e C, esteatoepatite não alcoólica e abuso de álcool.

  • A fibrose só causa sintomas se progredir para cirrose.

  • A biópsia hepática, embora imperfeita, é o exame diagnóstico padrão-ouro, porém cada vez mais tem sido suplantada por alternativas não invasivas.

  • Testes não invasivos, como elastografia transitória e elastografia por ressonância magnética, estão se tornando cada vez mais importantes.

  • Tratar a causa da fibrose.

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