Incontinência urinária em crianças

PorTeodoro Ernesto Figueroa, MD, Nemours/A.I. duPont Nemours Hospital for Children;
Keara N. DeCotiis, MD, Nemours/Alfred I. duPont Hospital for Children
Reviewed ByAlicia R. Pekarsky, MD, State University of New York Upstate Medical University, Upstate Golisano Children's Hospital
Revisado/Corrigido: modificado set. 2025
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Visão Educação para o paciente

Define-se incontinência urinária como a perda involuntária de urina 2 vezes/mês durante o dia ou a noite; a incontinência pode ser intermitente ou contínua. Incontinência contínua refere-se ao escape constante de urina durante o dia e à noite. Propôs-se uma revisão terminológica para o momento de ocorrência da incontinência intermitente (1, 2):

  • Para incontinência urinária durante o dia: incontinência diurna.

  • Para incontinência urinária durante a noite: enurese (ou incontinência noturna [somente durante o sono).

A incontinência diurna geralmente só é diagnosticada depois dos 5 ou 6 anos de idade. A enurese geralmente só é diagnosticada depois dos 7 anos e é mais comum entre meninas. Antes dessa idade, a enurese costuma ser chamada de micção noturna involuntária (3). Esses limites etários baseiam-se em crianças que estão se desenvolvendo normalmente e, portanto, podem não ser aplicáveis àquelas com atraso de desenvolvimento. Tanto a enurese como a incontinência diurna são sintomas e não diagnósticos; assim, exigem a investigação de uma causa subjacente.

Em geral, a idade em que se alcança a continência urinária varia, mas > 90% das crianças têm continência diurna aos 5 anos de idade (4, 5). A continência noturna demora mais tempo para ser alcançada. A enurese afeta aproximadamente 20% das crianças aos 5 anos e 10% aos 10 anos; há uma taxa de remissão espontânea de 14% ao ano (6). Cerca de 0,5 a 3% dos adultos continuam a ter episódios de enurese. A enurese é mais comum entre meninos e quando há história familiar de enurese (7).

Classifica-se a incontinência como:

  • Incontinência primária: crianças que nunca alcançaram a continência urinária por 6 meses.

  • Incontinência secundária: crianças que desenvolveram incontinência após um período de pelo menos 6 meses de controle urinário.

As causas orgânicas são mais prováveis na incontinência secundária. Mesmo quando não há causa orgânica, o tratamento apropriado e a educação dos pais são essenciais devido ao impacto físico e psicológico dos acidentes urinários (8).

(Ver também Incontinência urinária em adultos.)

Referências gerais

  1. 1. Hashim H, Blanker M, Drake M, et al. International Continence Society (ICS) report on the terminology for nocturia and nocturnal lower urinary tract function. Neurourol Urodyn. 2019, 38:499–508. doi:10.1002/nau.23917

  2. 2. Austin PF, Bauer SB, Bower W, et al. The standardization of terminology of lower urinary tract function in children and adolescents: Updated report from the standardization committee of the International Children's Continence Society. Neurourol Urodyn. 2016, 35(4):471–481. doi:10.1002/nau.22751

  3. 3. Wright, AJ: The epidemiology of childhood incontinence. In Pediatric Incontinence, Evaluation and Clinical Management, edited by Franco I, Austin P, Bauer S, von Gontard A, Homsy I. Chichester, John Wiley & Sons Ltd., 2015, pp. 37–60.

  4. 4. Nieuwhof-Leppink AJ, Schroeder RPJ, van de Putte EM, de Jong TPVM, Schappin R. Daytime urinary incontinence in children and adolescents. Lancet Child Adolesc Health. 2019;3(7):492-501. doi:10.1016/S2352-4642(19)30113-0

  5. 5. Nasir R, Schonwald A: Urinary function and enuresis. In Developmental and Behavioral Pediatrics, ed. 1, edited by Voight RG, Macias MM, Myers SM. American Academy of Pediatrics, 2010, pp. 602–609.

  6. 6. Caldwell PH, Edgar D, Hodson E, Craig JC. 4. Bedwetting and toileting problems in children. Med J Aust. 2005;182(4):190-195. doi:10.5694/j.1326-5377.2005.tb06653.x

  7. 7. Jacobs‐Perkins A: Enuresis. In Pediatric Clinical Advisor (Second Edition), edited by Garfunkel LC, Kaczorowski JM, Christy C. Philadelphia, Mosby, 2007, pp. 189–190.

  8. 8. Austin PF, Vricella GJ: Functional disorders of the lower urinary tract in children. In Campbell-Walsh Urology, ed. 11, edited by Wein A, Kavoussi L, Partin A, Peters C. Philadelphia, Elsevier, 2016, pp. 3297–3316.

Fisiopatologia da incontinência urinária em crianças

Fisiologicamente, a função da bexiga consiste em uma fase de armazenamento e uma fase de micção. Anormalidades em qualquer uma dessas fases pode causar incontinência primária ou secundária (1).

Durante a fase de armazenamento, a bexiga serve como um reservatório para a urina. A capacidade de armazenamento é afetada pelo volume da bexiga e pela mudança na pressão do detrusor (isto é, complacência vesical, que se refere à facilidade com que a bexiga se estica ao se encher). A capacidade de armazenamento tende a aumentar à medida que as crianças crescem. A complacência vesical pode diminuir devido a infecções repetidas ou obstrução da saída, resultando em hipertrofia do músculo vesical. A compressão externa da bexiga pelo colo e/ou reto (p. ex., em crianças com constipação) também pode diminuir a capacidade de armazenamento.

Durante a fase de esvaziamento, as contrações vesicais sincronizam com a abertura do colo vesical e do esfíncter urinário externo. A incontinência pode ocorrer se há disfunção na coordenação ou na sequência da micção. Há múltiplas razões para essa disfunção. Um exemplo é a irritação da bexiga, que provoca contrações irregulares e assincronia na sequência do esvaziamento, resultando em incontinência. A irritação da bexiga pode advir de uma infecção do trato urinário ou de algo que pressione a bexiga (p. ex., o reto distendido pela obstipação) (2).

A maturação do padrão miccional da infância à idade adulta envolve passar do padrão de micção reflexa do lactente (em que as contrações da bexiga ocorrem sem a oposição dada pelo aumento da resistência de saída) ao padrão adulto (em que as contrações da bexiga são suprimidas pelo centro de micção pontino). Durante a maturação, há uma fase de transição em que as contrações do detrusor são contrapostas pela contração do esfíncter externo (3). O esfíncter externo está sob controle muscular voluntário em pacientes neurotípicos. O desenvolvimento do controle voluntário do esfíncter ocorre durante o treinamento do vaso sanitário.

Referências sobre fisiopatologia

  1. 1. Wan J, Kraft K: Neurological control of storage and voiding. In The Kelalis-King-Belman Textbook of Clinical Pediatric Urology, ed. 6, edited by Docimo S, Canning D, Khoury A, Salle JLP. Boca Raton, CRC Press, 2019, pp. 803–819.

  2. 2. Bush N, Shah A, Pritzker J, et al: Constipation and lower urinary tract symptoms. In The Kelalis-King-Belman Textbook of Clinical Pediatric Urology, ed. 6, edited by Docimo S, Canning D, Khoury A, Salle JLP. Boca Raton, CRC Press, 2019, pp. 873–883.

  3. 3. Horowitz, M: Diurnal and nocturnal enuresis. In The Kelalis-King-Belman Textbook of Clinical Pediatric Urology, ed. 6, edited by Docimo S, Canning D, Khoury A, Salle JLP. Boca Raton, CRC Press, 2019, pp. 853–872.

Etiologia da incontinência urinária em crianças

A incontinência urinária da criança tem causas diferentes comparadas à incontinência urinária dos adultos.

Embora algumas anormalidades causem tanto incontinência noturna quanto diurna, a etiologia normalmente varia dependendo se a incontinência ocorre à noite ou durante o dia, assim como se é primária ou secundária. A maioria das incontinências urinárias primárias ocorre à noite (isto é, enurese), e não é secundária a distúrbios orgânicos.

A enurese pode ser dividida em monossintomática (ocorre apenas durante o sono) e complexa (outras anormalidades estão presentes, como incontinência urinária diurna e/ou sintomas urinários).

Enurese

Condições comórbidas (p. ex., infecção do trato urinário, obstipação, insuficiência renal aguda) podem contribuir para até 30% dos casos e são mais comuns em casos complexos, em comparação com a enurese monossintomática (1).

A maioria dos demais casos é de etiologia incerta (também chamada enurese noturna primária), mas acredita-se que sejam decorrentes de uma combinação de fatores, incluindo:

  • Retardo maturacional ou atraso do desenvolvimento

  • O treinamento esfincteriano que não foi concluído

  • Pequena capacidade funcional da bexiga (na verdade, a bexiga não é pequena, mas se contrai antes de estar totalmente cheia)

  • Volume urinário noturno aumentado

  • Dificuldade de despertar do sono

  • História familiar

Se um dos pais teve enurese, há 44% de chance de seus filhos apresentarem o mesmo quadro (2). A chance aumenta para 77% se ambos os pais tiveram.

Cerca de 14% ao ano se resolvem sem intervenção (3).

Os fatores que contribuem para as causas orgânicas da enurese (também chamada enurese noturna secundária) incluem:

Incontinência durante o dia

Causas orgânicas comuns da incontinência urinária diurna incluem:

  • Irritabilidade da bexiga

  • Fraqueza relativa do músculo detrusor (tornando-se difícil a inibição da incontinência)

  • Obstipação

  • Refluxo uretrovaginal: meninas que adotam posição inadequada para urinar (p. ex., com as pernas fechadas) ou apresentam dobras de pele redundantes podem ter refluxo de urina para a vagina, resultando em vazamento ao ficar em pé após a micção.

  • Anormalidades estruturais (p. ex., ureter ectópico)

  • Fraqueza anormal do esfíncter devido a bexiga neurogênica (p. ex., espinha bífida, medula ancorada)

Ver tabela Alguns fatores de risco e causas orgânicas de incontinência diurna e enurese em crianças.

Tabela
Tabela

Referências sobre etiologia

  1. 1. Franco I, von Gontard A, De Gennaro M; International Childrens's Continence Society. Evaluation and treatment of nonmonosymptomatic nocturnal enuresis: a standardization document from the International Children's Continence Society. J Pediatr Urol. 2013;9(2):234-243. doi:10.1016/j.jpurol.2012.10.026

  2. 2. Fritz G, Rockney R, Bernet W, et al. Practice parameter for the assessment and treatment of children and adolescents with enuresis. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry. 2004;43(12):1540-1550. doi:10.1097/01.chi.0000142196.41215.cc

  3. 3. Caldwell PH, Edgar D, Hodson E, Craig JC. 4. Bedwetting and toileting problems in children. Med J Aust. 2005;182(4):190-195. doi:10.5694/j.1326-5377.2005.tb06653.x

Avaliação da incontinência urinária em crianças

A avaliação deve incluir investigação sobre obstipação (que pode ser um fator contribuinte para incontinência noturna e diurna).

História

A anamnese é a ferramenta diagnóstica mais importante na avaliação de uma criança com incontinência urinária. Embora haja muitos avanços tecnológicos que podem apoiar a avaliação, uma avaliação clínica ainda é considerada a principal ferramenta diagnóstica (1).

A história da doença atual investiga o início dos sintomas (isto é, primários ou secundários), o momento de ocorrência dos sintomas (p. ex., à noite, durante o dia, apenas após a micção) e se os sintomas são contínuos (isto é, pequeno vazamento constante) ou intermitentes. É importante observar a idade em que foi iniciado o treinamento esfincteriano e se a ausência de escapes foi alcançada. A anotação esquemática da micção (diário miccional), incluindo ocasião, frequência e volume, pode ser útil. Sintomas associados importantes incluem polidipsia, disúria, urgência, frequência, gotejamento e esforço. A posição durante a micção e a força do jato de urina devem ser observadas. Para evitar perda de urina, crianças com incontinência urinária podem utilizar manobras de retenção, como cruzar as pernas ou ficar de cócoras (às vezes com a mão ou o calcanhar pressionado contra o períneo). Em algumas crianças, as manobras de contenção podem aumentar o risco de infecções do trato urinário. Semelhante ao diário miccional, um diário de evacuação pode ajudar a identificar obstipação.

A revisão dos sistemas deve observar sintomas sugestivos da causa, incluindo: frequência, tamanho e consistência das fezes (obstipação); febre, dor abdominal, disúria e hematúria (infecção do trato urinário); prurido perianal e vaginite (oxiuríase); poliúria e polidipsia (resistência à arginina vasopressina ou diabetes mellitus); e roncos ou pausas respiratórias durante o sono (apneia do sono). A possibilidade de abuso sexual deve ser considerada, pois, embora seja uma causa incomum, não deve ser negligenciada.

A história clínica anterior deve se concentrar na identificação de possíveis causas conhecidas, incluindo agravos perinatais ou defeitos congênitos (p. ex., espinha bífida), distúrbios neurológicos, distúrbios gastrointestinais, distúrbios renais e histórico de infecções do trato urinário. Qualquer tratamento atual ou prévio para incontinência e como foram realmente implementados deve ser registrado, assim como uma lista dos medicamentos atuais.

A história do desenvolvimento deve observar atraso maturacional ou do desenvolvimento e outros transtornos associados à disfunção miccional (p. ex., transtorno de déficit de atenção/hiperatividade, que pode aumentar a probabilidade de incontinência urinária).

Deve-se pesquisar a presença de incontinência nos antecedentes familiares e quaisquer distúrbios urológicos.

A história social deve observar fatores de estresse que ocorrem ao redor do início dos sintomas, incluindo dificuldades na escola, com amigos ou em casa; embora a incontinência urinária não seja um transtorno psicológico, pode ocorrer um período breve de episódios molhados durante o estresse.

O médico deve também perguntar sobre o impacto da incontinência sobre a criança, porque isso pode afetar as decisões de tratamento.

Exame físico

O exame se inicia com revisão dos sinais vitais para febre (infecção do trato urinário), sinais para perda ponderal (diabetes mellitus) e hipertensão (nefropatia). No exame da cabeça e do pescoço, deve-se observar aumento das tonsilas, respiração bucal ou insuficiência de crescimento (apneia obstrutiva do sono). No exame abdominal, deve-se observar a presença de massa consistente com fezes ou bexiga cheia.

Nas meninas, o exame genital deve observar qualquer eritema significativo, aderências labiais, cicatrizes ou achados sugestivos de abuso sexual (embora este último seja raro). O orifício da uretra ectópica é difícil de ver, mas deve ser pesquisado.

Nos meninos, o exame deve observar irritação do meato ou qualquer lesão da glande ou ao redor do ânus ou reto.

Em ambos os sexos, escoriações perianais podem sugerir oxiuríase.

Defeitos da linha média podem estar presentes no exame da espinha (p. ex., depressão sacral profunda, tufo de cabelos sacral). Uma avaliação neurológica básica direcionada à força, sensibilidade e reflexos sacrais das extremidades inferiores (p. ex., reflexo anal superficial) e, em meninos, ao reflexo cremastérico, deve ser realizada para identificar possível disrafismo espinhal. O exame do reto pode detectar obstipação ou diminuição do tônus retal.

Sinais de alerta

Achados de particular interesse são:

  • Sinais ou preocupações sobre abuso sexual

  • Muita sede, poliúria e perda ponderal

  • Incontinência urinária diurna primária prolongada (além dos 6 anos de idade)

  • Sinais neurológicos, especialmente nos membros inferiores

  • Sinais físicos de comprometimento neurológico

  • Incontinência de início recente depois de ausência de escapes por mais de 1 ano

Interpretação dos achados

Em geral, a incontinência urinária noturna primária ocorre em crianças com anamnese e exame físico sem alterações e provavelmente representa atraso na maturação. Uma pequena porcentagem das crianças tem uma doença médica tratável; às vezes, os achados podem sugerir possíveis causas (ver tabela Alguns fatores de risco e causas orgânicas de incontinência diurna e enurese em crianças).

Para crianças avaliadas por enurese, é importante que os clínicos determinem se sintomas diurnos de urgência, frequência, postura corporal ou manobras de contenção e incontinência estão presentes. Crianças com esses sintomas têm enurese complexa e o tratamento deve ser direcionado principalmente ao controle dos sintomas diurnos.

Na incontinência urinária diurna, sugere-se micção disfuncional por incontinência intermitente precedida por sensação de urgência, história de distração durante brincadeiras ou uma combinação. Incontinência após micção (por causa da falta de esvaziamento total da bexiga) também pode fazer parte da história.

Incontinência causada por uma ITU é provavelmente um episódio distinto em vez de crônico, problema intermitente e pode ser acompanhado por sintomas típicos (p. ex., urgência, frequência, dor durante a micção); mas outras causas da incontinência urinária podem levar à ITU secundária.

A obstipação deve ser considerada na ausência de outros achados em crianças com fezes duras ou incomumente grandes e dificuldade de eliminação (e, às vezes, fezes palpáveis ao exame).

Apneia do sono deve ser considerada com história de sonolência diurna excessiva e transtorno do sono; os pais podem fornecer história de ronco ou pausas respiratórias.

Prurido anal ou retal (especialmente à noite), vaginite, uretrite, combinados ou não, levantam a suspeita de oxiuríase.

Sede excessiva, incontinência diurna e enurese, e perda ponderal sugerem uma possível causa orgânica (p. ex., diabetes mellitus).

Embora seja difícil de diagnosticar, o estresse, incluindo abuso sexual, deve ser considerado. O abuso sexual é uma causa rara, mas é muito importante para ser negligenciado.

Exames

Determinação da etiologia da incontinência costuma ser aparente depois da história e exame físico.

A urinálise e cultura de urina são frequentemente feitas para ambos os sexos (ver Como cateterizar a bexiga em meninas e ver Como cateterizar a bexiga em meninos).

Exames adicionais são úteis principalmente quando história, exame físico ou ambos sugerem causa orgânica (ver tabela Alguns fatores de risco e causas orgânicas de incontinência diurna e enurese em crianças). Ultrassonografia dos rins e da bexiga é frequentemente feita para verificar se a anatomia dos tratos urinário e renal está normal (2). A ultrassonografia também pode ser utilizada para avaliar o diâmetro retal e, se houver suspeita de obstipação, pode-se realizar uma radiografia do abdome para confirmar se há uma grande quantidade de fezes. Urofluxometria pode mostrar um padrão de micção interrompido em pacientes com disfunções miccionais.

Referências sobre avaliação

  1. 1. Wintner A, Figueroa TE: History and physical examination of the child. In The Kelalis-King-Belman Textbook of Clinical Pediatric Urology, ed. 6, edited by Docimo S, Canning D, Khoury A, Salle JLP. Boca Raton, CRC Press, 2019, pp. 3–27.

  2. 2. Coplen DE: Radiologic assessment of bladder disorders. In The Kelalis-King-Belman Textbook of Clinical Pediatric Urology, ed. 6, edited by Docimo S, Canning D, Khoury A, Salle JLP. Boca Raton, CRC Press, 2019, pp. 780–787.

Tratamento da incontinência urinária em crianças

A parte mais importante do tratamento é orientar a família sobre a causa e a evolução clínica da incontinência (1). A educação adequada ajuda a reduzir o impacto psicológico negativo dos episódios de incontinência urinária, resultando em maior adesão ao tratamento

O sucesso do tratamento da incontinência urinária também depende da participação voluntária dos pais e da criança no plano de tratamento. Se a criança apresenta atraso do desenvolvimento em relação à idade, não se incomoda com a incontinência ou não deseja participar do plano terapêutico, o plano deve ser adiado até que ela esteja pronta para participar.

O tratamento da incontinência urinária deve ser direcionado para qualquer causa subjacente identificada, embora frequentemente nenhuma causa seja encontrada. A seguir, são especificados os tratamentos que podem ser úteis.

Abordagens punitivas devem ser evitadas porque prejudicam o tratamento e resultam apenas em baixa autoestima.

Enurese

Modificações comportamentais devem ser as principais recomendações para pacientes com enurese. As modificações incluem o seguinte:

  • Ingestão regular de líquidos durante o dia e minimização da ingestão de líquidos e sólidos (p. ex., jantar) 1 a 2 horas antes do sono (2)

  • Dupla micção (urinar duas vezes consecutivas) antes de dormir

  • Manejo adequado da obstipação

A estratégia mais eficaz a longo prazo, quando causas orgânicas não estão presentes, é um alarme de enurese. Evidências indicam que as crianças têm aproximadamente 7 vezes mais probabilidade de alcançar uma resposta completa (ou seja, 14 noites secas consecutivas) e 9 vezes mais de mantê-la a longo prazo quando utilizam um alarme de enurese, em comparação com um alarme de controle (isto é, um alarme comum) ou nenhum alarme (3). As crianças podem precisar utilizar um alarme para enurese todas as noites por até 4 meses antes que os sintomas se resolvam completamente.

O alarme dispara quando ocorre a enurese. Embora as crianças inicialmente continuem tendo episódios de enurese, ao longo do tempo, aprendem a associar a sensação de bexiga cheia ao alarme e então acordam para urinar antes de um evento enurético. Esses alarmes estão facilmente disponíveis sem prescrição médica.

O alarme para enurese não deve ser usado por crianças com enurese complexa ou com capacidade vesical reduzida (conforme evidenciado pelo diário miccional). Essas crianças devem ser tratadas da mesma maneira como as crianças com incontinência urinária diurna.

Medicamentos como desmopressina oral (DDAVP, arginina vasopressina) e imipramina (ver tabela Alguns medicamentos orais utilizados para incontinência urinária em crianças) podem diminuir episódios de enurese noturna. Mas os resultados não são sustentados na maioria dos pacientes quando o tratamento é interrompido; os pais e as crianças devem ser prevenidos disso para ajudar a limitar decepções. O DDAVP é preferível à imipramina devido à rara possibilidade de morte súbita com o uso da imipramina.

Incontinência durante o dia

É importante que os médicos tratem qualquer obstipação subjacente. Informações do diário miccional podem ajudar a identificar crianças com capacidade funcional vesical reduzida, aumento da frequência e urgência urinária e infrequência urinária, todas as quais podem apresentar incontinência urinária.

Medidas gerais podem incluir:

  • Exercícios para conter a urgência: as crianças devem ser orientadas para ir ao banheiro tão logo sintam a necessidade de urinar. Elas retêm a urina até onde puderem e, quando não conseguirem mais segurar a micção, iniciam a diurese e, a seguir, interrompem e recomeçam a micção. Este exercício fortalece o esfíncter e dá à criança a confiança de que podem alcançar o banheiro antes que o acidente ocorra.

  • Aumentar gradualmente o intervalo entre as micções (se houver suspeita de instabilidade do detrussor ou micção disfuncional)

  • Mudanças de comportamento (p. ex., micção atrasada) com reforço positivo e micção programada (momento de urinar): as crianças serão lembradas de que devem urinar por um relógio que vibra ou por sons de um alarme (melhor que os pais lembrando).

  • O uso de métodos miccionais corretos para desencorajar a retenção de urina na vagina: em meninas com acúmulo vaginal de urina, o tratamento é incentivar a posição sentada virada para trás no vaso sanitário ou sentada virada para frente com os joelhos afastados, o que expandirá o introito e permitirá o fluxo direto da urina para o vaso sanitário.

  • Biofeedback: essa terapia conservadora não cirúrgica é utilizada para tratar disfunção vesical, incontinência urinária, incontinência fecal, urgência e dor pélvica; para reeducar os músculos do assoalho pélvico; e para restaurar e manter a saúde. As crianças são orientadas a isolar e ativar corretamente músculos específicos do assoalho pélvico e da parede abdominal, minimizando o envolvimento dos músculos adjacentes, a fim de promover uma micção coordenada e sinérgica (4).

No caso de fusão labial, recomenda-se o uso de creme de estrogênios ou triancinolona conjugados a 0,5%.

Medicação (ver tabela Alguns medicamentos orais utilizados para incontinência urinária em crianças) não é normalmente uma terapia de primeira linha, mas às vezes é útil. Anticolinérgicos (oxibutinina e tolterodina) podem beneficiar pacientes com incontinência urinária diurna por causa de micção disfuncional. Em geral, esses medicamentos são prescritos quando a terapia comportamental ou a fisioterapia se mostram ineficazes Às vezes, medicamentos para incontinência diurna também podem ser úteis no tratamento da enurese.

Anticolinérgicos (especificamente, anticolinérgicos antimuscarínicos) que são prescritos para o tratamento da bexiga hiperativa em adultos (p. ex., solifenacina e darifenacina) demonstraram eficácia em crianças. De maneira similar, o mirabegrona, agonista do receptor beta-3, tem sido utilizado em crianças para tratar sintomas de incontinência urinária decorrente da hiperatividade do músculo detrusor refratária a anticolinérgicos (5).

Tabela
Tabela

Referências sobre o tratamento

  1. 1. Vande Walle J, Rittig S, Bauer S, et al. Practical consensus guidelines for the management of enuresis. Eur J Pediatr. 2012;171(6):971-983. doi:10.1007/s00431-012-1687-7

  2. 2. Maternik M, Krzeminska K, Zurowska A. The management of childhood urinary incontinence. Pediatr Nephrol. 2015;30(1):41-50. doi:10.1007/s00467-014-2791-x

  3. 3. Caldwell PH, Codarini M, Stewart F, Hahn D, Sureshkumar P. Alarm interventions for nocturnal enuresis in children. Cochrane Database Syst Rev. 2020;5(5):CD002911. Publicado em 2020 Mai 4. doi:10.1002/14651858.CD002911.pub3

  4. 4. Rae A, Renson, C: Biofeedback in the treatment of functional voiding disorders. In Pediatric Incontinence, Evaluation and Clinical Management, edited by Franco I, Austin P, Bauer S, von Gontard A, Homsy I. Chichester, John Wiley & Sons Ltd., 2015, pp. 145–152.

  5. 5. Johnson EK, Bauer SB: Neurogenic voiding dysfunction and functional voiding disorders: Evaluation and nonsurgical management. In The Kelalis-King-Belman Textbook of Clinical Pediatric Urology, ed. 6, edited by Docimo S, Canning D, Khoury A, Salle JLP. Boca Raton, CRC Press, 2019, pp. 820–852.

Pontos-chave

  • A incontinência urinária primária manifesta-se mais frequentemente como incontinência à noite (enurese).

  • A obstipação deve ser considerada como um fator contribuinte.

  • As causas orgânicas da incontinência (incontinência secundária) são infrequentes, mas devem ser consideradas.

  • A maioria dos casos de enurese regride com a maturação (14% ao ano), mas 0,5 a 3% dos adultos podem continuar a apresentar episódios de enurese noturna.

  • Um alarme de enurese é o tratamento mais eficaz para enurese relacionada ao atraso na maturação ou no desenvolvimento.

  • Outros tratamentos incluem intervenções comportamentais e ocasionalmente medicamentos.

  • A educação dos pais é essencial para resultados e bem-estar da criança.

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