(Ver também Visão geral das lesões durante mergulho Visão geral de lesões durante mergulho Mais de 1.000 lesões relacionadas com mergulho ocorrem anualmente nos Estados Unidos; > 10% são fatais. Lesões similares podem ocorrer em trabalhadores em túneis e cápsulas de mergulho (estruturas... leia mais .)
A lei de Henry afirma que a quantidade de gás dissolvido em um líquido é diretamente proporcional à pressão parcial do gás em equilíbrio com líquido. Assim, a quantidade de gases inertes (p. ex., nitrogênio ou hélio) dissolvidos no sangue e tecidos aumenta em uma pressão mais alta.
Durante a subida, quando a pressão circundante diminui, pode haver a formação de bolhas (principalmente de nitrogênio). As bolhas de gás liberadas podem aumentar em qualquer tecido e causar sintomas locais, ou podem percorrer a via sanguínea e alcançar órgãos distantes (embolismo gasoso arterial Embolia gasosa arterial Embolismo gasoso arterial é um evento potencialmente catastrófico, o qual ocorre quando bolhas de gás entram ou se formam nos vasos arteriais e ocluem o fluxo sanguíneo, causando isquemia do... leia mais ). Bolhas causam estes sintomas ao
Bloquear vasos sanguíneos
Romper ou comprimir tecidos
Indução de lesão endotelial e extravasamento de plasma
Ativação de cascatas da coagulação e inflamatórias
Como o nitrogênio se dissolve rapidamente na gordura, os tecidos com alto teor de lipídios (p. ex., no sistema nervoso central) são particularmente suscetíveis.
Fatores de risco da doença da descompressão
A doença da descompressão ocorre em cerca de 2 a 4/10.000 mergulhadores recreacionais. A incidência é maior entre mergulhadores profissionais expostos a águas mais profundas e tempos de mergulho mais longos. Os fatores de risco incluem:
Mergulhos de baixa temperatura
Desidratação
Exercício após mergulho
Fadiga
Voar depois de mergulhar
Obesidade
Idade avançada
Mergulhos prolongados ou profundos
Subidas rápidas
Derivação cardíaca da direita para a esquerda
Como o excesso de nitrogênio permanece dissolvido nos tecidos do corpo durante pelo menos 12 horas depois de cada mergulho, mergulhos repetidos depois de 1 dia têm maior probabilidade de causar doença da descompressão. A doença da descompressão também pode se desenvolver se a pressão diminuir abaixo da pressão atmosférica (p. ex., por exposição à altitude).
Classificação da doença da descompressão
A doença da descompressão é classificada como:
Tipo I: envolve articulações, pele e sistema linfático; é mais leve e costuma não ser fatal
Tipo II: inclui envolvimento neurológico ou cardiorrespiratório, que é grave, às vezes fatal, e afeta vários sistemas de órgãos
Embora a medula espinal seja especialmente vulnerável, outras áreas vulneráveis incluem cérebro, sistema respiratório (p. ex., embolismo pulmonar) e sistema circulatório (p. ex., insuficiência cardíaca, choque cardiogênico).
O termo the bends refere-se à articulação local ou à dor muscular em razão da doença da descompressão, porém é utilizado com frequência como sinônimo para qualquer componente de distúrbio.
O termo doença descompressiva refere-se à doença da descompressão ou embolia gasosa arterial.
Referências gerais
Vann RD, Butler FK, Mitchell SJ, et al: Decompression illness. Lancet 377(9760):153-164, 2011. doi: 10.1016/S0140-6736(10)61085-9
Mitchell SJ, Bennett MH, Moon RE: Decompression sickness and arterial gas embolism. N Engl J Med 386(13):1254-1264, 2022. doi: 10.1056/NEJMra2116554
Sinais e sintomas da doença da descompressão
Sintomas graves podem se manifestar dentro de minutos na superfície; porém, na maioria dos pacientes, os sintomas começam gradualmente, às vezes com pródromo de mal-estar, fadiga, anorexia e cefaleia. Os sintomas ocorrem dentro de 1 hora em superfície em 50% dos pacientes, e em torno de 6 horas em 90%. Raramente, os sintomas podem se manifestar de 24 a 48 horas após a chegada à superfície, especialmente após exposição a altitude depois do mergulho (como viagem aérea).
A doença da descompressão tipo I costuma causar dor que piora progressivamente nas articulações (mais comumente, cotovelos e ombros) e ocasionalmente músculos; em geral, a dor não se intensifica durante o movimento e é descrita como “profunda” e “incômoda”. Outras manifestações clínicas incluem linfedema, manchas na pele, prurido e exantema.
A doença da descompressão tipo II consiste em sintomas neurológicos e, às vezes, respiratórios. Se manifesta com paresia típica, falta de sensibilidade, formigamento, dificuldade urinária e perda dos controles intestinal e renal. Cefaleia e fadiga podem se apresentar, mas não são específicas. Tontura, tinidos e perda de audição podem ocorrer caso a orelha interna seja afetada. Sintomas graves incluem convulsões, fala distorcida, perda da visão, confusão e coma. Pode ocorrer morte.
Asfixia (doença da descompressão respiratória) é rara, porém é uma manifestação grave; os sintomas incluem falta de ar, dor torácica e tosse, resultantes de edema pulmonar. A embolização massiva de bolhas da árvore vascular pulmonar pode resultar em colapso circulatório rápido e morte.
Osteonecrose disbárica é uma manifestação tardia da doença da descompressão e costuma ocorrer sem nenhum sintoma prévio. Consiste em forma insidiosa de osteonecrose Osteonecrose (ON) A osteonecrose é um infarto ósseo focal que pode tanto ser causado por fatores etiológicos específicos como ser idiopático. Pode causar dor, limitação do movimento, colapso articular e osteoartrite... leia mais causada por exposições repetidas prolongadas ou próximas de pressões aumentadas (normalmente, em pessoas trabalhando em ar comprimido e em mergulhos profissionais profundos, mais que em mergulho esportivo). A deterioração das superfícies articulares do ombro e do quadril podem causar dor crônica e incapacidade decorrente de osteoartrite secundária.
A imobilização decorrente da doença da descompressão pode levar a complicações como trombose venosa profunda Trombose venosa profunda A trombose venosa profunda é a coagulação do sangue em uma veia profunda de um membro (em geral de panturrilha, coxa) ou pelve. A TVP aguda é a causa principal de embolia pulmonar. Decorre de... leia mais e embolia pulmonar Embolia pulmonar (EP) A Embolia pulmonar (EP) é a oclusão de artérias pulmonares por trombos que se originam de outro local, classicamente de veias de grosso calibre ou da pelve. Os fatores de risco de embolia pulmonar... leia mais .
Diagnóstico da doença da descompressão
Avaliação clínica
O diagnóstico é clínico. TC e ressonância nuclear magnética (RM) podem ser úteis para excluir outros distúrbios que causam sintomas similares (p. ex., hérnia do disco invertebral, derrame isquêmico, hemorragia do sistema nervoso central). Embora esses estudos às vezes mostrem anormalidades encefálicas ou medulares decorrentes da doença da descompressão, sua sensibilidade para essa doença é baixa e o tratamento geralmente deve ser iniciado com base na suspeita clínica.
A embolia gasosa arterial Embolia gasosa arterial Embolismo gasoso arterial é um evento potencialmente catastrófico, o qual ocorre quando bolhas de gás entram ou se formam nos vasos arteriais e ocluem o fluxo sanguíneo, causando isquemia do... leia mais pode causar manifestações similares (para comparação das características, tabela ). Contudo, o tratamento imediato para ambos é semelhante.
Para osteonecrose disbárica, radiografia óssea pode mostrar degeneração articular, a qual não pode ser distinguida daquela causada por outras doenças articulares; a RM é normalmente diagnóstica.
Tratamento da doença da descompressão
Oxigênio a 100%
Terapia de recompressão
Fluidoterapia para manter o volume intravascular
A maioria dos pacientes se recupera completamente.
Inicialmente, o alto fluxo de oxigênio a 100% aumenta a eliminação de nitrogênio pela ampliação do gradiente de pressão do nitrogênio entre os pulmões e a circulação, acelerando assim a reabsorção das bolhas embólicas contendo nitrogênio.
Para restaurar o volume intravascular perdido, indica-se reposição de líquidos por via oral (com água comum) para pacientes alertas com manifestações leves. Indicam-se líquidos IV isotônicos sem glicose para pessoas com manifestações graves.
Indica-se terapia de descompressão Terapia de recompressão A terapia de recompressão é a administração de oxigênio a 100% por até várias horas em uma câmara selada pressurizada a pelo menos 1,9 (geralmente 1,9 a 3,0) atmosferas, gradualmente reduzida... leia mais para todos os pacientes, exceto talvez aqueles cujos sintomas limitam-se a prurido, manchas na pele e fadiga, que podem ser tratados apenas com oxigênio; deve-se observar os pacientes quanto a deteriorações (1 Referências sobre o tratamento A doença da descompressão ocorre quando rápida redução da pressão (p. ex., durante a subida de um mergulho, saída de uma cápsula ou câmara hiperbárica ou subida para altitude) causa gás previamente... leia mais ). Transportam-se os pacientes com sintomas mais graves para uma instituição de descompressão apropriada. Como o tempo de tratamento e a gravidade da lesão são importantes determinantes do resultado, o transporte não deve ser retardado para desempenho de procedimentos não essenciais.
Se a evacuação de ar for requerida, é preferível um avião com capacidade de pressão interna de 1 atm. Em aeronaves não pressurizadas, deve-se manter uma baixa altitude [< 609 m (< 2.000 pés)] e administrar oxigênio continuamente. Companhias aéreas comerciais normalmente têm pressão de cabine equivalente a 2.438 m (8.000 pés) em atitude normal de cruzeiro, o que pode exacerbar os sintomas. Voar em avião comercial logo após mergulho pode precipitar os sintomas. Em pacientes com doença descompressiva, deve-se equilibrar o risco da exposição à altitude com o risco de deterioração se não evacuado para tratamento definitivo.
Quando os sintomas são leves (p. ex., exame neurológico normal e estável por 24 horas), é improvável que a recompressão ou evacuação tardia por aeronave comercial piorem o desfecho de longo prazo.
Como a doença da descompressão ou embolia gasosa arterial pode ser complicada pela trombose venosa profunda Trombose venosa profunda A trombose venosa profunda é a coagulação do sangue em uma veia profunda de um membro (em geral de panturrilha, coxa) ou pelve. A TVP aguda é a causa principal de embolia pulmonar. Decorre de... leia mais e tromboembolia pulmonar Embolia pulmonar (EP) A Embolia pulmonar (EP) é a oclusão de artérias pulmonares por trombos que se originam de outro local, classicamente de veias de grosso calibre ou da pelve. Os fatores de risco de embolia pulmonar... leia mais , deve-se considerar a realização periódica de uma ultrassonografia das veias da perna.
Referências sobre o tratamento
1. Moon RE, Mitchell S: Hyperbaric treatment for decompression sickness: Current recommendations. Undersea Hyperb Med, 46(5):685-693, 2019. PMID: 31683368.
2. Mitchell SJ, Bennett MH, Moon RE: Decompression sickness and arterial gas embolism. N Engl J Med 386(13):1254-1264, 2022. doi: 10.1056/NEJMra2116554
Prevenção da doença da descompressão
Normalmente, a formação significante de bolhas pode ser evitada por limitação da profundidade e duração dos mergulhos em amplitude que não necessita de descompressão durante a subida (chamadas de sem limites) ou por subida com paradas de descompressão, como especificado em diretrizes publicadas (p. ex., a tabela de descompressão no capítulo Diagnosis and Treatment of Decompression Sickness and Arterial Gas Embolism do U.S. Navy Diving Manual). Muitos mergulhadores utilizam um computador portátil de mergulho que traça continuamente a profundidade e o tempo de profundidade e calcula o tempo da descompressão.
Também, muitos mergulhadores fazem uma parada de segurança por alguns minutos a cerca de 4,6 m (15 pés) abaixo da superfície. Contudo, os casos podem ocorrer após mergulhos feitos sem respeitar as paradas estabelecidas, e a incidência da doença da descompressão não diminuiu apesar do uso disseminado de computadores de mergulho (embora possam ocorrer menos casos graves).
Mergulhos com < 24 horas de intervalo (mergulhos repetitivos) e mergulhos realizados em altitude requerem técnicas especiais para determinar os procedimentos de descompressão apropriados.
Pontos-chave
Os sintomas da doença da descompressão ocorrem dentro de 1 hora em superfície em 50% dos pacientes afetados, e em até 6 horas em 90%.
Se há suspeita da doença, iniciar alto fluxo de oxigênio a 100% e providenciar o transporte mais rápido possível para uma câmara de recompressão, utilizando transporte terrestre ou aéreo com capacidade de 1 atmosfera de pressão interna.
Orientar os mergulhadores a seguir as recomendações estabelecidas (p. ex., profundidade e duração de mergulho, uso de paradas de descompressão durante a subida) que diminuem o risco de doença da descompressão.
Informações adicionais
Os recursos em inglês a seguir podem ser úteis. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo desses recursos.
Divers Alert Network: 24-hour emergency hotline, 919-684-9111
Duke Dive Medicine: Physician-to-physician consultation, 919-684-8111
Undersea and Hyperbaric Medical Society: informações científicas e médicas sobre a medicina submarina e hiperbárica por meio de seu periódico bimestral revisado por pares, Undersea and Hyperbaric Medicine, e outros recursos
U.S. Navy Diving Manual: guia de referência detalhado publicado pela marinha dos Estados Unidos destacando o treinamento de mergulhadores e operações de mergulho