A intoxicação por peixe e mariscos envolve uma das várias toxinas que podem causar manifestações gastrointestinais, neurológicas ou mediadas por histamina.
(Ver também Princípios gerais da intoxicação.)
Intoxicação por peixe ciguatera.
A intoxicação por ciguatera é responsável por 20% de todas as doenças de origem alimentar associadas a peixes (aproximadamente 16.000 casos anualmente nos Estados Unidos com 300 hospitalizações) e pode resultar da ingestão de qualquer uma das > 400 espécies de peixes dos recifes tropicais da Flórida, das Antilhas ou do Pacífico, onde um dinoflagelado produz uma toxina que se acumula na carne dos peixes (1). Peixes velhos e grandes (p. ex., garoupa, vermelho, peixe-rei várias espécies de peixe nos Estados Unidos]) contêm maior quantidade de toxinas. Nenhum processo conhecido, incluindo o cozimento, é protetor, e o sabor não é afetado. A intoxicação pode ocorrer após ingestão de peixe fresco ou congelado. Nenhum produto comercial está disponível para detectar ciguatoxina em peixes.
A transmissão perinatal pode ocorrer e a ciguatoxina é secretada no leite materno. Gestantes e lactantes devem evitar consumir o peixe suspeito.
Os sintomas podem se iniciar de 2 a 8 horas após a ingestão. Cólicas abdominais, náuseas, vômitos e diarreia duram de 6 a 17 horas; depois, pode haver prurido, parestesia, cefaleia, mialgia, sensação reversa de frio e calor e dor facial. Meses após, pode ocorrer debilidade por fenômenos sensoriais não usuais e nervosismo (2). O diagnóstico é clínico.
Como tratamento, sugere-se manitol IV mas não tem sido evidenciado nítido benefício (3, 4). Gabapentina, amitriptilina, nifedipina e pregabalina têm sido utilizadas para tratar os sintomas neurológicos de longo prazo com graus variados de sucesso (5, 6, 7, 8).
Intoxicação por peixe escombroide
A intoxicação por escombroide é causada pelos altos níveis de histamina no corpo do peixe devido à decomposição bacteriana após sua captura. Espécies comumente afetadas são:
Atum
Cavalinha
Bonito
Peixe-serra
Dourado-do-mar
O gosto do peixe pode ser amargo ou picante. Rubor facial e, possivelmente, náuseas, vômitos, dor epigástrica e urticária são observados alguns minutos após a ingestão e involuem em 24 horas. Os sintomas são frequentemente confundidos com alergia a alimentos. Diferentemente das outras intoxicações por peixe, nestes casos ela pode ser prevenida pela conservação adequada do peixe após sua captura (9). A intoxicação por histamina também foi relatada após o consumo de queijo suíço devido à contaminação bacteriana do leite cru antes do processamento (10).
O diagnóstico é clínico. Se for possível testar o peixe restante, níveis de histamina superiores a 100 mg/100 g confirmam o diagnóstico.
O tratamento é feito com bloqueadores H1 e bloqueadores H2. Sintomas graves (edema das vias respiratórias, broncoespasmo ou choque distributivo) podem requerer tratamento para anafilaxia com adrenalina e vasopressores.
Intoxicação por tetrodotoxina
A intoxicação por tetrodotoxina é mais comumente decorrente de ingestão de peixes que inflam, como baiacu (fugu), uma iguaria japonesa, mas > 100 espécies de água doce e salgada contêm tetrodotoxina (11). Os sintomas iniciais incluem parestesia na face e nos membros, seguida de aumento de salivação, náuseas, vômitos, diarreia e dor abdominal. Também pode ocorrer paralisia respiratória potencialmente fatal. O tratamento é sintomático com atenção à assistência ventilatória até que a toxina seja metabolizada, o que pode levar dias. Relatos de caso sugerem que anticolinesterases como edrofônio ou neostigmina podem ajudar a reverter alguns dos efeitos neurológicos paralíticos, mas os dados são inconclusivos (12).
A toxina não pode ser destruída por lavagem, cozimento ou congelamento.
Intoxicação por mariscos
Intoxicação paralítica por moluscos de concha ocorre de junho a outubro, especialmente no dorso do Pacífico e Nova Inglaterra, quando mexilhões, ostras, vieiras e conchas estão contaminados pelos dinoflagelados venenosos responsáveis pela maré vermelha. Este dinoflagelado produz a neurotoxina saxitoxina, que é resistente ao cozimento, congelamento ou marinada. Frutos do mar contaminados podem apresentar aparência, odor e sabor normais. Parestesia perioral ocorre de 5 a 30 minutos após a ingestão. Depois, observam-se náuseas, vômitos e cólicas abdominais seguidos por fraqueza muscular. O tratamento é de suporte. A paralisia respiratória não tratada pode ser fatal; em sobreviventes, a recuperação geralmente é completa (13).
Referências
1. Glaziou P, Legrand AM. The epidemiology of ciguatera fish poisoning. Toxicon. 1994;32(8):863-873. doi:10.1016/0041-0101(94)90365-4
2. Pearn J. Neurology of ciguatera. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2001;70(1):4-8. doi:10.1136/jnnp.70.1.4
3. Friedman MA, Fleming LE, Fernandez M, et al. Ciguatera fish poisoning: treatment, prevention and management. Mar Drugs. 2008;6(3):456-479. doi:10.3390/md20080022
4. Mullins ME, Hoffman RS. Is mannitol the treatment of choice for patients with ciguatera fish poisoning? Clin Toxicol (Phila). 2017;55(9):947-955. doi:10.1080/15563650.2017.1327664
5. Perez CM, Vasquez PA, Perret CF. Treatment of ciguatera poisoning with gabapentin. N Engl J Med. 2001;344(9):692-693. doi:10.1056/NEJM200103013440919
6. Davis RT, Villar LA. Symptomatic improvement with amitriptyline in ciguatera fish poisoning. N Engl J Med. 1986;315(1):65.
7. Calvert GM, Hryhorczuk DO, Leikin JB. Treatment of ciguatera fish poisoning with amitriptyline and nifedipine. J Toxicol Clin Toxicol. 1987;25(5):423-428. doi:10.3109/15563658708992645
8. Brett J, Murnion B. Pregabalin to treat ciguatera fish poisoning. Clin Toxicol (Phila). 2015;53(6):588. doi:10.3109/15563650.2015.1052499
9. Hungerford JM. Scombroid poisoning: a review. Toxicon. 2010;56(2):231-243. doi:10.1016/j.toxicon.2010.02.006
10. Taylor SL, Stratton JE, Nordlee JA. Histamine poisoning (scombroid fish poisoning): an allergy-like intoxication. J Toxicol Clin Toxicol. 1989;27(4-5):225-240. doi:10.3109/15563658908994420
11. Bane V, Lehane M, Dikshit M, et al. Tetrodotoxin: chemistry, toxicity, source, distribution and detection. Toxins (Basel). 2014;6(2):693-755. Publicado em 2014 Fev 21. doi:10.3390/toxins6020693
12. Liu SH, Tseng CY, Lin CC. Is neostigmine effective in severe pufferfish-associated tetrodotoxin poisoning?. Clin Toxicol (Phila). 2015;53(1):13-21. doi:10.3109/15563650.2014.980581
13. Etheridge SM. Paralytic shellfish poisoning: seafood safety and human health perspectives. Toxicon. 2010;56(2):108-122. doi:10.1016/j.toxicon.2009.12.013
