Ascaríase é a infecção pelo nematoide (verme) Ascaris lumbricoides ou ocasionalmente pelo nematoide Ascaris suum (parasita intimamente relacionado, típico de suínos). Os sintomas iniciais são pulmonares (tosse, sibilos); mais tarde, ocorrem sintomas gastrointestinais, com cólicas ou dor abdominal decorrentes da obstrução do lúmen gastrointestinal (intestinos ou ductos biliares ou pancreático) por vermes adultos. Infecções leves podem ser assintomáticas. Crianças infectadas cronicamente podem desenvolver desnutrição. O diagnóstico é feito pela identificação de ovos ou vermes adultos nas fezes, vermes adultos que migram do nariz, da boca ou do reto, ou raramente larvas no escarro durante a fase de migração pulmonar. O tratamento é feito com albendazol, mebendazol ou ivermectina (ou pamoato de pirantel em gestantes).
A ascaríase é a infecção intestinal mais comum por helmintos (parasitas) em todo o mundo, mas a maioria das infecções ocorre em áreas tropicais e subtropicais com saneamento limitado e altas taxas de contaminação fecal do solo, água e alimentos.
A prevalência global é estimada em 819 milhões (1). A prevalência é maior em crianças em idade escolar (2). Nos Estados Unidos, a maioria dos casos ocorre em refugiados, imigrantes ou viajantes para regiões tropicais endêmicas.
A infecção contribui para a desnutrição. As mortes são principalmente decorrentes da obstrução do intestino ou do trato biliar em crianças.
A transmissão de humano para humano é fecal-oral pela ingestão de material fecal contendo ovos férteis de Ascaris lumbricoides em alimentos ou água contaminados ou através do contato com as mãos que tocaram sujeira contaminada ou outros materiais.
A infecção humana também pode ser causada pela ingestão dos ovos fertilizados de Ascaris suum (um parasita intimamente relacionado ao dos porcos) nas fezes de porcos. Os ovos são ingeridos ao manusear porcos infectados ou ao consumir frutas ou vegetais contaminados crus ou mal cozidos.
(Ver também Abordagem às infecções parasitárias.)
Referências gerais
1. Magalhães L, Nogueira DS, Gazzinelli-Guimarães PH, et al. Immunological underpinnings of Ascaris infection, reinfection and co-infection and their associated co-morbidities. Parasitology. Publicado online 12 de abril de 2021. doi:10.1017/S0031182021000627
2. Silver ZA, Kaliappan SP, Samuel P, et al. Geographical distribution of soil transmitted helminths and the effects of community type in South Asia and South East Asia - A systematic review. PLoS Negl Trop Dis. 2018;12(1):e0006153. Publicado em 2018 Jan 18. doi:10.1371/journal.pntd.0006153
Fisiopatologia da ascaríase
Ovos de A. lumbricoides ingeridos eclodem no duodeno e as larvas resultantes penetram na parede do intestino delgado, migrando pela circulação portal através do fígado para o coração e para os pulmões. As larvas se fixam nos vasos capilares alveolares, penetram nas paredes alveolares e ascendem à árvore brônquica para a orofaringe. São ingeridos e voltam ao intestino delgado, no qual se desenvolvem até vermes adultos, se acasalando e liberando ovos nas fezes.
As fêmeas adultas variam de 20 a 35 centímetros, e os machos adultos variam de 15 a 30 centímetros de comprimento. O ciclo de vida é completado em aproximadamente 2 a 3 meses; vermes adultos vivem 1 a 2 anos.
Image from the Centers for Disease Control and Prevention, Global Health, Division of Parasitic Diseases and Malaria.
Uma massa emaranhada de vermes na infecção grave pode produzir obstrução de intestino, em particular em crianças. Vermes adultos individuais com migração aberrante ocasionalmente obstruem os ductos biliares ou pancreáticos, provocando colecistite ou pancreatite; colangite, abscesso no fígado e peritonite são menos comuns.
A febre causada por outras doenças ou certos fármacos (p. ex., albendazol, mebendazol, tetracloretileno) pode desencadear a migração anômala dos vermes adultos.
Sinais e sintomas da ascaríase
Larvas de Ascaris que migram para os pulmões podem causar tosse, sibilos e, ocasionalmente, hemoptise ou outros sintomas respiratórios nas pessoas sem exposição prévia ao Ascaris. Após uma exposição inicial, pessoas em áreas endêmicas desenvolvem imunidade mediada por células T auxiliares tipo 2 (Th2), associada à diminuição da carga de vermes e sintomas (1).
Vermes adultos em pequeno número geralmente não produzem sintomas gastrointestinais, embora a passagem de um verme adulto pela boca ou pelo reto possa levar um paciente assintomático a procurar um serviço de saúde. Obstrução intestinal ou biliar causa cólicas abdominais, náuseas e vômitos. Icterícia é incomum.
Até mesmo infecções moderadas podem conduzir à desnutrição em crianças. A fisiopatologia não é conhecida e pode incluir competição por nutrientes, prejuízo de absorção e redução de apetite.
Referência sobre sinais e sintomas
1. McSharry C, Xia Y, Holland CV, Kennedy MW. Natural immunity to Ascaris lumbricoides associated with immunoglobulin E antibody to ABA-1 allergen and inflammation indicators in children. Infect Immun. 1999;67(2):484-489. doi:10.1128/IAI.67.2.484-489.1999
Diagnóstico da ascaríase
Exame microscópico das fezes
Identificação dos vermes adultos nas fezes ou que surgem do nariz, boca ou reto
O diagnóstico da ascaríase é feito pela detecção microscópica dos ovos nas fezes ou pela visualização direta dos vermes adultos nas fezes ou emergindo do nariz, boca ou reto. Ocasionalmente, larvas podem ser encontradas no escarro durante a fase pulmonar. Os vermes adultos podem ser vistos em exames radiográficos do trato gastrointestinal.
A eosinofilia pode ser intensa quando as larvas migram para os pulmões, mas geralmente cede quando os vermes adultos se fixam no intestino. Radiografia de tórax durante a fase pulmonar pode mostrar infiltrados que, na presença de eosinofilia, leva ao diagnóstico da síndrome de Löffler.
Tratamento da ascaríase
Albendazol, mebendazol ou ivermectina
Para gestantes, pamoato de pirantel
Deve-se tratar todas as infecções intestinais por Ascaris.
O pamoato de pirantel também é eficaz e é o tratamento recomendado em gestantes. Benzimidazóis são potencialmente teratogênicos e, se seu uso for considerado em gestantes, o risco do tratamento deve ser equilibrado com o risco de doença não tratada (1).
Antes do tratamento com ivermectina, deve-se avaliar nos pacientes coinfecção por Loa loa se eles moraram em áreas da África Central onde Loa loa é endêmico porque a ivermectina pode causar reações graves em pacientes com loíase e níveis altos de microfilárias.
Dados recentes sugerem que a nitazoxanida também é eficaz para infecções leves por Ascaris, mas menos eficaz para infeções intensas. Piperazina, que era utilizada em larga escala, foi substituída por alternativas menos tóxicas.
Pode-se tratar de maneira eficaz as complicações obstrutivas com terapia anti-helmíntica ou pode ser necessária extração cirúrgica ou endoscópica dos vermes adultos.
Para infecções pulmonares, o tratamento é sintomático; inclui broncodilatadores e corticoides. Em geral, utilizam-se fármacos anti-helmínticos.
Referência sobre tratamento
1. Keiser J, Utzinger J. Efficacy of current drugs against soil-transmitted helminth infections: systematic review and meta-analysis. JAMA. 2008;299(16):1937-1948. doi:10.1001/jama.299.16.1937
Prevenção da ascaríase
A prevenção da ascaríase requer condições sanitárias adequadas.
As estratégias de prevenção incluem
Lavar bem as mãos com água e sabão antes de manusear alimentos, após possível contato com fezes ou sujeira contaminada e após manusear porcos
Lavar, descascar e/ou cozinhar todos os vegetais e frutas crus antes de ingeri-los
Evitar o consumo de legumes crus ou não lavados em áreas onde fezes de porcos ou humanas são utilizadas como fertilizante
Não defecar ao ar livre, exceto em latrinas com descarte apropriado de esgoto
Pontos-chave
A ascaríase é a infecção intestinal por helminto mais prevalecente no mundo.
Os ovos eclodem no intestino delgado, e as larvas migram primeiro para os pulmões e depois retornam ao intestino delgado, onde amadurecem.
Larvas nos pulmões podem causar tosse e sibilos; massas de vermes adultos podem obstruir o intestino e vermes adultos únicos podem migrar e obstruir os dutos biliares ou pancreáticos.
Diagnosticar por exame microscópico das fezes; ocasionalmente, vermes adultos são vistos migrando do nariz, boca ou reto.
Tratar com albendazol, mebendazol ou ivermectina, ou pamoato de pirantel em gestantes; as obstruções podem exigir extração cirúrgica ou endoscópica dos vermes.
