(Ver também Visão geral das infecções bacterianas da pele.)
Etiologia
Há três subtipos de infecção necrosante de partes moles (INTM):
INTM tipo I, costuma acometer o tronco e o períneo, resulta de infecção polimicrobiana geralmente por estreptococos do grupo A (p. ex., Streptococcus pyogenes) ou uma mistura de bactérias aaeróbias e anaeróbias (p. ex., Bacteroides spp.). Esses organismos caracteristicamente invadem o tecido celular subcutâneo a partir de uma úlcera contígua, infecção ou após trauma. Os estreptococos podem surgir de uma área remota de infecção por via hematogênica. O acometimento perineal (também denominado gangrena de Fournier), em geral, é uma complicação de cirurgia recente, abscessos perirretais, infecção de glândulas periuretrais ou infecção retroperitoneal resultante de vísceras abdominais perfuradas. Pacientes diabéticos são particularmente propensos à INTM tipo I. Infecções do tipo I geralmente produzem gás nas de partes moles tornando sua manifestação semelhante à da gangrena gasosa (mionecrose clostridiana), que é uma infecção monomicrobiana (1).
A causa mais comum de INTM tipo II é o estreptococos beta-hemolítico do grupo A; o Staphylococcus aureus é o secundo patógeno mais comum. Os pacientes tendem a ser mais jovens com história de poucos problemas de saúde, mas podem ter história de uso de drogas IV, traumas ou cirurgias recentes. A infecção tem o potencial de rápida disseminação local e complicações sistêmicas, como choque tóxico.
A INTM tipo III geralmente está associada a lesões aquáticas sofridas em áreas costeiras mais quentes. Vibrio vulnificus é o patógeno usual. Infecções do tipo III compartilham similaridades clínicas com infecções do tipo II e podem se espalhar rapidamente.
Referência sobre etiologia
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1. Stevens DL, Bryant AE: Necrotizing soft-tissue infections. N Engl J Med 377(23):2253–2265, 2017. doi: 10.1056/NEJMra1600673.
Fisiopatologia
A infecção necrosante de partes moles causa isquemia tecidual por oclusão disseminada de pequenos vasos sanguíneos subcutâneos. Essa oclusão resulta em infarto e necrose cutânea, o que facilita o crescimento de anaeróbios (p. ex., Bacteroides), promovendo ao mesmo tempo o metabolismo anaeróbico por um organismo facultativo (p. ex., Escherichia coli), resultando em gangrena. O metabolismo anaeróbico produz hidrogênio e nitrogênio, gases relativamente insolúveis que podem se acumular no tecido celular subcutâneo.
Sinais e sintomas
O principal sintoma da infecção necrosante de partes moles é dor de forte intensidade. Em pacientes com sensibilidade normal, dor desproporcional aos achados clínicos pode ser um indício precoce. Entretanto, em áreas denervadas por neuropatia periférica, a dor pode ser mínima ou ausente. O tecido afetado é eritematoso, quente e edemaciado, descorando-se rapidamente. Bolhas, crepitação (resultante de gás no tecido mole) e gangrena podem se desenvolver. Os tecidos subcutâneos necrosam (incluindo a fáscia adjacente), com disseminação para o tecido adjacente. Os músculos não são afetados no início. Os pacientes estão agudamente enfermos, com febre alta, taquicardia, alteração do estado mental, variando desde confusão até embotamento, e hipotensão. Se houver bacteremia ou sepse há necessidade de agressivo suporte hemodinâmico. Síndrome de choque tóxico estreptocócico pode se desenvolver.
Diagnóstico
Prognóstico
Tratamento
O tratamento da infecção necrosante precoce de partes moles é principalmente cirúrgico, e não deve ser postergado por exames diagnósticos.
Antibióticos IV são adjuvantes, geralmente com 2 ou mais medicamentos; um esquema empírico aguardando os resultados da coloração de Gram e cultura é com penicilina G 4 milhões de unidades a cada 4 horas junto com clindamicina 600 a 900 mg a cada 8 horas, ou ceftriaxona 2 g a cada 12 horas. A evidência de bolhas, equimoses, flutuação, crepitação e disseminação sistêmica de infecção requer a imediata exploração cirúrgica e debridamento. A incisão inicial deve se estender até que um dedo ou instrumento separe a pele do tecido subcutâneo a partir da fáscia profunda. O erro mais comum é a intervenção cirúrgica insuficiente; cirurgias repetidas a cada 1 ou 2 dias, com mais incisões e debridamento, se necessário, devem ser realizadas de forma rotineira.
A amputação de uma extremidade pode ser necessária.
Antes e após as cirurgias, a administração de líquidos IV é necessária. Revisar e ajustar a escolha dos antibióticos pelo Gram e pela cultura dos tecidos obtidos durante a cirurgia. Terapia adjuvante com oxigênio hiperbárico pode ser benéfica; todavia, evidências de sua eficácia não são conclusivas. Imunoglobulina IV foi sugerida para a síndrome do choque tóxico estreptocócico com INTM.
Pontos-chave
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A infecção necrosante de partes moles (INPM) pode evoluir de uma úlcera ou infecção contígua, disseminação hematogênica ou após trauma.
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Considerar a INTM em pacientes com achados característicos ou dor desproporcional aos achados clínicos, particularmente em pacientes com diabetes ou outros fatores de risco.
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Encaminhar para tratamento cirúrgico durante a administração de líquidos IV e antibioticoterapia, sem perder tempo com testes.