(Ver também Visão geral das infecções bacterianas da pele Visão geral das infecções bacterianas da pele Infecções bacterianas da pele podem ser classificadas como infecções cutâneas e de tecidos moles (ICTM) e infecções bacterianas agudas da pele e estruturas cutâneas (IBAPEC). ICTM incluem Carbúnculos... leia mais .)
Etiologia da infecção necrosante de tecidos moles
Há dois subtipos de infecção necrosante de partes moles (INTM):
Tipo I
Tipo II
INTM tipo I, costuma acometer o tronco e o períneo, resulta de infecção polimicrobiana geralmente por estreptococos do grupo A (p. ex., Streptococcus pyogenes) ou uma mistura de bactérias aaeróbias e anaeróbias (p. ex., Bacteroides spp.). Esses organismos caracteristicamente invadem o tecido celular subcutâneo a partir de uma úlcera contígua, infecção ou após trauma. Os estreptococos podem surgir de uma área remota de infecção por via hematogênica. O acometimento perineal (também denominado gangrena de Fournier), geralmente, é uma complicação de cirurgia recente, abscessos perirretais, infecção de glândulas periuretrais ou infecção retroperitoneal resultante de vísceras abdominais perfuradas. Pacientes diabéticos são particularmente propensos à INTM tipo I. Infecções do tipo I geralmente produzem gás nas de partes moles tornando sua manifestação semelhante à da gangrena gasosa (mionecrose clostridiana Infecções de tecido mole por clostrídio Infecções clostridianas do tecido mole incluem celulite, miosite e mionecrose. Estas normalmente ocorrem após trauma. Os sintomas podem incluir edema, dor, gases com crepitação, exsudatos com... leia mais ), que é uma infecção monomicrobiana (1 Referência sobre etiologia Infecção necrosante de tecidos moles é tipicamente causada por uma composição de organismos anaeróbios e aeróbios que provocam necrose do tecido subcutâneo, que geralmente inclui a fáscia. Essa... leia mais ).
O INTM tipo II é monomicrobiano e é mais comumente causado por estreptococos beta-hemolítico do grupo A; o Staphylococcus aureus é o secundo patógeno mais comum. Os pacientes tendem a ser mais jovens, com história de poucos problemas de saúde, mas podem ter história de uso de drogas ilícitas IV, traumas ou cirurgias recentes. A infecção tem o potencial de rápida disseminação local e complicações sistêmicas como choque tóxico. Um subgrupo de INTM tipo II geralmente ocorre com lesões aquáticas sustentadas em áreas costeiras mais quentes. Vibrio vulnificus é o patógeno usual.
Mionecrose por clostrídio Infecções de tecido mole por clostrídio Infecções clostridianas do tecido mole incluem celulite, miosite e mionecrose. Estas normalmente ocorrem após trauma. Os sintomas podem incluir edema, dor, gases com crepitação, exsudatos com... leia mais (gangrena gasosa) pode se desenvolver espontaneamente ou após lesão profunda e traumática. Similar ao INTM tipo I, o gás geralmente se desenvolve no tecido; entretanto, como na INTM tipo II, a mionecrose por clostrídios é tipicamente uma infecção monomicrobiana.
Referência sobre etiologia
1. Stevens DL, Bryant AE: Necrotizing soft-tissue infections. N Engl J Med 377(23):2253–2265, 2017. doi: 10.1056/NEJMra1600673
Fisiopatologia da infecção necrosante de tecidos moles
A infecção necrosante de partes moles causa isquemia tecidual por oclusão disseminada de pequenos vasos sanguíneos subcutâneos. Essa oclusão resulta em infarto e necrose cutânea, o que facilita o crescimento de anaeróbios (p. ex., Bacteroides), promovendo ao mesmo tempo o metabolismo anaeróbico por um organismo facultativo (p. ex., Escherichia coli), resultando em gangrena. O metabolismo anaeróbico produz hidrogênio e nitrogênio, gases relativamente insolúveis que podem se acumular no tecido celular subcutâneo.
Sinais e sintomas da infecção necrosante em tecidos moles
O principal sintoma da INTM é dor intensa. Em pacientes com sensibilidade normal, dor desproporcional aos achados clínicos pode ser um indício precoce. Entretanto, em áreas denervadas por neuropatia periférica, a dor pode ser mínima ou ausente.
O tecido afetado é quente, eritematoso e edemaciado, descorando-se rapidamente. Bolhas, crepitação (resultante de gás no tecido mole) e gangrena podem se desenvolver. Os tecidos subcutâneos necrosam (incluindo a fáscia adjacente), com disseminação para o tecido adjacente. Os músculos podem ser inicialmente poupados, mas podem ser envolvidos à medida que a doença progride.
Os pacientes estão agudamente enfermos, com febre alta, taquicardia, alteração do estado mental, variando desde confusão até embotamento, e hipotensão. Se houver bacteremia ou sepse há necessidade de agressivo suporte hemodinâmico.
Diagnóstico da infecção necrosante de tecidos moles
Exame clínico
Hemocultura e cultura de feridas
O diagnóstico da INTM, feito por anamnese e exame clínico, é confirmado por leucocitose, proteína C reativa elevada, gás nas partes moles na radiografia, hemocultura positiva e deterioração do estado metabólico e hemodinâmico.
Pode-se utilizar TC e RM para delinear a doença, mas não se deve adiar o tratamento enquanto se aguarda os resultados dos exames de imagem.
Durante a exploração cirúrgica, há exsudato cinza, fáscia superficial friável e ausência de pus.
A diferenciação da mionecrose por clostrídios é feita por meio de testes microbiológicos, mas como o tratamento deve ocorrer imediatamente, ele visa tanto a INTM como a mionecrose por clostrídios.
Tratamento da infecção necrosante de tecidos moles
Desbridamento cirúrgico
Antibióticos
Amputação, se necessária
O tratamento da INTM precoce e da mionecrose por clostrídios é principalmente cirúrgico, o que não deve ser adiado por estudos diagnósticos.
A evidência de bolhas, equimoses, flutuação, crepitação e disseminação sistêmica de infecção requer a imediata exploração cirúrgica e debridamento. A incisão inicial deve se estender até que um dedo ou instrumento separe a pele do tecido subcutâneo a partir da fáscia profunda. O erro mais comum é a intervenção cirúrgica insuficiente; cirurgias repetidas a cada 1 ou 2 dias, com mais incisões e debridamento, se necessário, devem ser realizadas de forma rotineira. A terapia por pressão negativa para feridas (NPWT, também chamada fechamento a vácuo, ou VAC), que aplica sucção à ferida, tem sido utilizada como adjuvante ao tratamento entre os debridamentos.
A amputação de uma extremidade pode ser necessária.
Antibióticos IV são adjuvantes, geralmente incluindo 2 ou mais fármacos. Um esquema empírico deve incluir antibióticos eficazes contra organismos anaeróbios e aeróbios. As recomendações atuais da Infectious Diseases Society of America (IDSA) sugerem o uso de vancomicina, linezolida ou daptomicina combinada com piperacilina/tazobactam, um carbapenem, ceftriaxona mais metronidazol ou fluoroquinolona mais metronidazol. Deve-se reduzir a cobertura antibiótica de acordo com os resultados da hemocultura e da cultura de tecidos, assim que estes resultados estiverem disponíveis. (Ver the IDSA's 2014 practice guidelines for the diagnosis and management of skin and soft-tissue infections.)
Antes e após as cirurgias, a administração de líquidos IV é necessária.
Imunoglobulina IV foi sugerida como terapia adjuvante para a síndrome do choque tóxico estreptocócico Choque tóxico estreptocócico A síndrome do choque tóxico (toxic shock syndrome) é causada por exotoxinas estafilocócicas ou estreptocócicas. As manifestações incluem febre alta, hipotensão, exantema eritematoso difuso e... leia mais com INTM.
Prognóstico para infecção necrosante de tecidos moles
A taxa de mortalidade por todas as causas em pacientes tratados é cerca de 20 a 30% (1 Referência sobre prognóstico Infecção necrosante de tecidos moles é tipicamente causada por uma composição de organismos anaeróbios e aeróbios que provocam necrose do tecido subcutâneo, que geralmente inclui a fáscia. Essa... leia mais ).
O prognóstico é agravado por doenças antigas, demora em realizar o diagnóstico, tratamento e debridamento cirúrgico insuficiente.
Referência sobre prognóstico
1. Hua C, Urbina T, Bosc R, et al: Necrotising soft-tissue infections. Lancet Infect Dis 23(3):e81–e94, 2023. doi: 10.1016/S1473-3099(22)00583-7
Pontos-chave
A infecção necrosante de partes moles (INPM) pode evoluir de uma úlcera ou infecção contígua, disseminação hematogênica ou após trauma.
Considerar a INTM em pacientes com achados característicos ou dor desproporcional aos achados clínicos, particularmente em pacientes com diabetes ou outros fatores de risco.
Encaminhar para tratamento cirúrgico durante a administração de líquidos IV e antibioticoterapia, sem perder tempo com testes.