Tabagismo e outros usos do tabaco

PorJudith J. Prochaska, PhD, MPH, Stanford Prevention Research Center, Stanford University
Revisado/Corrigido: nov 2023
Visão Educação para o paciente

O uso do tabaco é um problema importante de saúde individual e pública. A dependência se desenvolve rapidamente. As principais consequências são morte prematura e morbidade causada por doença cardiovascular, pulmonar e muitos outros tipos de câncer e DPOC (doença pulmonar obstrutiva crônica). Todos os tabagistas devem ser aconselhados a parar de utilizar tabaco e receber assistência e/ou encaminhamentos para aumentar seu sucesso em se tornar livres da substância.

O tabaco é usado por causa dos efeitos da nicotina. A nicotina é altamente viciante quando absorvida pelo pulmão. Os produtos da combustão do tabaco contêm outras substâncias que podem causar morbidade e mortalidade significativas.

O tabaco pode ser fumado em cigarros, charutos ou cachimbo, incluindo cachimbo de água (narguilé). Os produtos de tabaco oral incluem aqueles que servem para mascar e deixar na boca. Os produtos de nicotina para vaping (p. ex., cigarros eletrônicos) são populares, especialmente entre adolescentes, em razão do seu alto teor de nicotina, disponibilidade de sabores sem gosto de tabaco e designs discretos.

Os produtos comercializados como sachês orais de nicotina sem tabaco são a novidade mais recente nesse mercado dos Estados Unidos. Esses produtos também estão disponíveis em sabores sem gosto de tabaco e tem um design discreto. Utilizam concentrações de nicotina superiores às dos chicletes e pastilhas de nicotina aprovados pela U.S. Federal Drug Administration (FDA).

Com a diversificação do mercado de produtos de tabaco, o uso de produtos duplos ou múltiplos de tabaco tornou-se mais comum. O consumo de cigarros, que é a forma mais prejudicial de tabagismo, continua sendo a forma predominante de uso de tabaco em adultos; os cigarros eletrônicos são a forma mais comum de tabagismo entre adolescentes.

Todos os produtos do tabaco contêm carcinogêneos e outras toxinas; produtos de tabaco sem fumaça não são alternativas seguras ao tabagismo.

(Ver também Drogas ilícitas e intoxicantes: vaping.)

Epidemiologia do uso de tabaco

A prevalência do uso de tabaco nos Estados Unidos diminuiu nos últimos 50 anos, mas devido ao crescimento populacional, o número de fumantes permaneceu relativamente estável em torno de quase 35 milhões (1).

Cigarros

A porcentagem de indivíduos nos Estados Unidos que fumam cigarros está diminuindo desde 1964, quando o Surgeon General divulgou pela primeira vez a ligação entre tabagismo e problemas de saúde. Contudo, 11,5% dos adultos (28,3 milhões) nos Estados Unidos ainda fumam (1).

Fumar é mais prevalente entre estes grupos:

  • Homens

  • Adultos jovens

  • Pessoas que se identificam como lésbicas, gays, bissexuais ou transexuais

  • Pessoas com deficiência

  • Pessoas com escolaridade abaixo do ensino médio

  • Pessoas que vivem abaixo da linha da pobreza

  • Pessoas com transtornos psiquiátricos (inclusive dependência química)

  • Índios norte-americanos e nativos do Alasca

O tabagismo é menos comum entre os hispânicos e ainda menos comum entre as mulheres americanas de origem asiática.

Quase todas as pessoas que fumam começam antes dos 18 anos, fazendo com que o tabagismo seja um distúrbio hebiátrico e/ou pediátrico (2). Todos os dias, aproximadamente 2.300 jovens com menos de 18 anos fumam o primeiro cigarro e quase 200 jovens começam a fumar diariamente. Os principais fatores de risco de início do tabagismo na infância são o tabagismo de familiares e colegas, bem como exposição à publicidade e ao marketing do tabaco na mídia impressa, on-line e nos pontos de venda em lojas, além das cenas de tabagismo nos filmes e videogames.

Outros produtos de tabaco e nicotina

Fumar charutos e cachimbos é menos comum nos Estados Unidos. Em 2021, cerca de 8,6 milhões de pessoas com 18 anos ou mais (3,5%) fumavam charutos e 2,3 milhões (0,9%) fumavam cachimbo ou narguilé (1). Esses percentuais mantiveram-se relativamente estáveis nos últimos 15 anos. Os prejuízos à saúde decorrentes de fumar cachimbo e charuto são doença cardiovascular; DPOC, câncer de cavidade oral, pulmão, laringe, esôfago, colo e pâncreas; doença periodontal e perda dos dentes.

Cigarros eletrônicos ou vape são dispositivos com uma bateria e um cartucho contendo um pulverizador que aquece uma solução de propilenoglicol, glicerol e geralmente, mas nem sempre, nicotina. Os cigarros eletrônicos imitam a ação mão-boca do cigarro comum. Muitos cigarros eletrônicos entregam altos níveis de nicotina profundamente nos pulmões, o que aumenta o risco de dependência. No caso dos cigarros eletrônicos, há menos sinais que indicam a quantidade consumida, como acontece ao se contar as bitucas de cigarro. Muitos aparelhos de cigarro eletrônico fornecem de 5.000 a 6.000 tragadas, o que equivale a 500 a 600 cigarros ou 25 a 30 maços de cigarro.

Embora não haja combustão ao utilizar cigarros eletrônicos, o aerossol emitido pelo dispositivo é mais do que vapor d'água. Além de frequentemente conter nicotina, o aerossol do cigarro eletrônico tem partículas ultrafinas, que podem ser inaladas e chegar ao pulmão; aromatizantes como diacetil, um produto químico ligado a doença pulmonar grave; compostos orgânicos voláteis; substâncias químicas que causam câncer; e metais pesados (p. ex., níquel, estanho e chumbo), embora todos em níveis mais baixos do que na fumaça do cigarro convencional. Embora os efeitos tardios da inalação do aerossol do cigarro eletrônico não sejam claramente conhecidos, é razoável supor que sejam menos nocivos do que os conhecidos efeitos adversos da fumaça por combustão dos cigarros convencionais. Para as pessoas que utilizam cigarros eletrônicos e continuam a fumar, prática comum dos usuários duplos, os benefícios para a saúde do uso de cigarros eletrônicos não estão comprovados.

Os efeitos do uso materno de cigarro eletrônico sobre o desenvolvimento fetal são desconhecidos, bem como os efeitos a longo prazo do uso de cigarros eletrônicos no desenvolvimento do encéfalo em adolescentes. Entreos jovens, o uso de cigarro eletrônico excede o uso de tabaco combustível (2). Os riscos tardios dos cigarros eletrônicos, fenômeno relativamente recente, são desconhecidos. (Ver também informações sobre cigarros eletrônicos na The National Academies of Sciences, Engineering, and Medicine [Health and Medicine Division]: Public health consequences of e-cigarettes.)

Lesão pulmonar associada ao uso de produtos para vaping e cigarros eletrônicos (EVALI, na sigla em inglês) é um termo utilizado pelo Centers for Disease Control and Prevention (CDC) para descrever um surto ocorrido em vários estados de doença pulmonar grave, identificado pela primeira vez em agosto de 2019 e associado ao uso de cigarros eletrônicos e produtos para vaping. As manifestações clínicas constituem um diagnóstico de exclusão que inclui sintomas respiratórios (p. ex., tosse, dor torácica, falta de ar), sintomas gastrointestinais (p. ex., dor abdominal, náuseas, vômitos, diarreia), sintomas constitucionais inespecíficos (p. ex., febre, calafrios, perda ponderal), redução da oxigenação sanguínea, contagem elevada de leucócitos e lesões semelhantes àquelas causadas por exposições a vapores químicos tóxicos, gases tóxicos e agentes tóxicos. De acordo com o CDC, até fevereiro de 2020, houve mais de 2.800 hospitalizações e 68 mortes em todo o país devido a EVALI. As diretrizes do CDC apontam predominantemente para a vaping de tetraidrocanabinol (THC) líquido como a causa e, em particular, o THC líquido diluído com acetato de vitamina E. O CDC parou de monitorar a incidência do EVALI em fevereiro de 2020 por causa do declínio nos casos e nas mortes, bem como na identificação de acetato de vitamina E, que é o agente mais reconhecido associado ao EVALI (3). O CDC incentiva os médicos a continuar notificando possíveis casos de EVALI ao departamento de saúde local ou estadual para investigação adicional. Se há suspeita de EVALI, o médico deve obter uma anamnese detalhada das substâncias utilizadas, fontes dos produtos, duração e frequência de uso, dispositivos utilizados e como esses dispositivos foram utilizados.

O tabaco que não produz fumaça (tabaco de mascar e rapé) é utilizado por aproximadamente 2,1% das pessoas ≥ 18 anos de idade (1) e aproximadamente 1,6% dos estudantes do ensino médio (2). A toxicidade do tabaco sem fumaça varia de acordo com a marca. Seus prejuízos são doença cardiovascular, doença oral (p. ex., câncer, retração gengival, gengivite, periodontite e suas consequências) e teratogenicidade.

A exposição oral inadvertida ao tabaco é incomum, mas pode causar toxicidade grave. Crianças pequenas ocasionalmente ingerem cigarros de maços abertos, pontas de cigarro de cinzeiros, líquido de cigarros eletrônicos ou chiclete de nicotina. Em 2022, 6.745 casos de exposição potencialmente tóxica a cigarros eletrônicos e produtos líquidos de nicotina foram notificados ao American Association of Poison Control Centers (AAPCC) (ver AAPCC: E-cigarettes and Nicotine).

A exposição cutânea ao tabaco pode ser tóxica. Aqueles que colhem e processam tabaco e manuseiam o tabaco verde sem proteção (especialmente quando úmido) podem absorver a nicotina pela pele e apresentar sintomas de intoxicação por nicotina, síndrome denominada de doença do tabaco verde.

A exposição passiva à fumaça do cigarro (tabagismo indireto) ocorre quando as pessoas inalam a fumaça de um cigarro aceso ou a fumaça exalada por uma pessoa fumando perto. A quantidade inalada (e, portanto, seus efeitos) variam de acordo com a proximidade e a duração da exposição, bem como o ambiente (p. ex., espaço fechado) e a ventilação. O CDC estima que mais de 41.000 mortes a cada ano são decorrentes do tabagismo passivo (4). (Ver também CDC: Secondhand Smoke.)

Referências sobre epidemiologia

  1. 1. Cornelius ME, Loretan CG, Jamal A, et al: Tobacco Product Use Among Adults - United States, 2021. MMWR Morb Mortal Wkly Rep 72(18):475-483, 2023. Published 2023 May 5. doi:10.15585/mmwr.mm7218a1

  2. 2. Park-Lee E, Ren C, Cooper M, et al: Tobacco Product Use Among Middle and High School Students - United States, 2022. MMWR Morb Mortal Wkly Rep 71(45):1429-1435, 2022. Publicado em 11 de novembro de 2022. doi:10.15585/mmwr.mm7145a1

  3. 3. Rebuli ME, Rose JJ, Noël A, et al: The E-cigarette or Vaping Product Use-Associated Lung Injury Epidemic: Pathogenesis, Management, and Future Directions: An Official American Thoracic Society Workshop Report. Ann Am Thorac Soc 20(1):1-17, 2023. doi:10.1513/AnnalsATS.202209-796ST

  4. 4. Homa DM, Neff LJ, King BA, et al: Vital signs: disparities in nonsmokers' exposure to secondhand smoke--United States, 1999-2012. MMWR Morb Mortal Wkly Rep 64(4):103-108, 2015

Fisiopatologia do tabagismo

Nicotina é um fármaco altamente viciante encontrada no tabaco, sendo um dos principais componentes da fumaça do cigarro. A compulsão por cigarro pode começar depois de dias da primeira utilização. A nicotina estimula os receptores colinérgicos de nicotina no cérebro, liberando dopamina e outros neurotransmissores, o que ativa o sistema de recompensa do cérebro durante atividades prazerosas, de forma semelhante à da maioria das outras drogas viciantes. Dopamina, glutamato e ácido gama-aminobutírico (GABA) são mediadores importantes de dependência à nicotina.

Há dependência psicológica quando as pessoas fumam para alterar o seu humor ou evitar sintomas de abstinência; esta pode ocorrer 2 semanas depois do início do tabagismo e em até aproximadamente 25% dos adolescentes que experimentam o cigarro. A dependência física (isto é, ou seja, a ocorrência de sintomas de abstinência com a cessação) também ocorre em 2 semanas. As pessoas fumam para suprir a dependência de nicotina, mas simultaneamente inalam centenas de carcinógenos, gases nocivos e aditivos químicos, que fazem parte da fumaça do cigarro. Esses componentes tóxicos, mais que a nicotina, são responsáveis pelos múltiplos malefícios causados pelo tabagismo à saúde. Os subprodutos do alcatrão na fumaça do tabaco induzem o metabolismo enzimático hepático (principalmente a CYP2A6), levando ao aumento da depuração metabólica de certos medicamentos.

Efeitos crônicos do tabagismo

Fumar prejudica praticamente todos os órgãos do corpo. O tabagismo é a principal causa de mortalidade prevenível nos Estados Unidos e em todo o mundo. Nos Estados Unidos, o tabagismo é responsável por aproximadamente 500.000 mortes a cada ano. As pessoas que fumam têm maior probabilidade de morrer prematuramente de uma doença causada diretamente pelo tabagismo, perdendo em média até 10 anos de vida. (Ver também Health Consequences of Smoking, Surgeon General fact sheet.)

Os principais efeitos crônicos são o aumento da probabilidade de:

As doenças coronarianas são uma das principais causas de mortes relacionadas com o tabaco. O risco de infarto do miocárdio duplica se a pessoa fumar 1 maço por dia e o risco de mortalidade cardiovascular aumenta > 50% em um período de 35 anos. Os mecanismos englobam lesão endotelial celular, aumentos transitórios da pressão arterial e da frequência cardíaca, indução a um estado pró-trombótico e efeitos adversos nos lipídios séricos. O tabagismo causa aproximadamente 32% das mortes por doença coronariana (1).

O câncer de pulmão é outra importante fonte de mortes relacionadas com o tabaco. O tabagismo é a causa mais comum de câncer de pulmão na Europa e na América do Norte, e é responsável por mais de 87% das mortes por câncer de pulmão (1). O tecido pulmonar é diretamente exposto aos carcinógenos inalados.

A DPOC também é responsável por uma parcela significativa das mortes relacionadas ao tabaco. O tabaco é responsável por 79% de todos os casos de DPOC (1). O tabagismo prejudica os mecanismos de defesa local das vias respiratórias e, particularmente nas pessoas geneticamente susceptíveis, tende a acelerar o declínio da função pulmonar. A tosse e a dispneia aos esforços são comuns.

As doenças graves menos comuns, porém graves, relacionadas com o tabagismo são degeneração macular relacionada com a idade, doenças vasculares não cardíacas (p. ex., acidente vascular encefálico e aneurisma da aorta), outros tipos de câncer (p. ex., vesical, colo do útero, colorretal, esofágico, renal, laríngeo, hepático, orofaríngeo, pancreático, de estômago, de garganta e leucemia mieloide aguda), diabetes mellitus, pneumonia, artrite reumatoide e tuberculose.

Além disso, o tabagismo é fator de risco de outras doenças que acarretam morbidade e incapacitação significativas, como uma infecção das vias respiratórias superiores de repetição, asma, catarata, infertilidade, disfunção erétil, menopausa precoce, úlcera péptica, osteoporose, fraturas de quadril e periodontite.

Fumo passivo

O fumo passivo é a fumaça do tabaco exalada por uma pessoa que fuma ou produzida por uma guimba de cigarro acesa. O fumo passivo relaciona-se com as mesmas neoplasias, doenças respiratórias e cardiovasculares que ameaçam as pessoas que fumam. O risco da doença está relacionado com a exposição. Por exemplo, entre cônjuges, o risco médio é aproximadamente 20% maior para o câncer de pulmão e em aproximadamente 20 a 30% maior para a doença coronariana. (Ver também CDC: Secondhand Smoke.)

As crianças expostas à fumaça de cigarro perdem mais dias de aulas em razão de doenças do que as não expostas. Estima-se que o tratamento de doenças relacionadas com o fumo para crianças custa 4,6 bilhões de dólares/ano (2).

No total, estima-se que o fumo passivo causa 41.000 mortes a cada ano nos Estados Unidos (entre 2% e 3% de todas as mortes), com uma estimativa de perda de custos de produtividade decorrente de mortes prematuras pela exposição ao fumo passivo da ordem de 5,6 bilhões de dólares por ano (em 2006) (1). Esses achados fizeram com que estados e cidades nos Estados Unidos proibissem o fumo em locais de trabalho, em um esforço de proteger os trabalhadores e outros dos riscos substanciais do fumo passivo. Em 2000, nenhum estado norte-americano ou o Distrito de Colúmbia tinha em vigor alguma lei abrangente contra fumar livremente em ambientes fechados. Esse número aumentou para 26 em 2010, e mais um estado foi acrescentado em 2015. Atualmente, 28 estados norte-americanos, Washington DC, Porto Rico e as Ilhas Virgens Americanas têm leis abrangentes sobre o consumo de tabaco ao ar livre que abrangem locais de trabalho, restaurantes e bares. Em alguns estados sem leis estaduais antifumo abrangentes, avanços substanciais foram feitos progressos notáveis no nível local com a adoção de leis antitabagismo amplas. Contudo, 7 estados sem leis abrangentes contra o fumo em todo o estado (Flórida, New Hampshire, Carolina do Norte, Oklahoma, Pensilvânia, Tennessee e Virgínia) têm estatutos de preempção que proíbem a adoção de leis locais antitabagismo. (Ver também American Lung Association: Smokefree Air Laws)

Fumar durante a gestação aumenta o risco de aborto espontâneo, gestação ectópica, parto prematuro e defeitos congênitos. Recém-nascidos de mães que fumam tendem a ter baixo peso ao nascer e têm maior risco de

Efeitos indiretos do tabagismo

Os efeitos indiretos do tabagismo podem ser graves.

Incêndios relacionados com o tabagismo ocorrem em aproximadamente 7.800 edifícios residenciais nos Estados Unidos a cada ano, de acordo com a Federal Emergency Management Agency (FEMA). Os incêndios causam aproximadamente 275 mortes, 750 feridos e 361 milhões de dólares em perdas patrimoniais todos os anos. (Ver FEMA: Residential Building Smoking Fire Trends [2012-2021].) Esses incêndios são a principal causa de morte resultante de incêndios não intencionais nos Estados Unidos.

As interações medicamentosas com o tabagismo são comuns. Os efeitos são em grande parte decorrentes da indução de enzimas metabólicas hepáticas pelos subprodutos do alcatrão contido no tabaco. A nicotina não induz de forma semelhante as enzimas metabólicas e, portanto, os efeitos da interação medicamentosa não ocorrem na terapia de reposição de nicotina ou com os cigarros eletrônicos. Os níveis e, algumas vezes, os efeitos clínicos dos medicamentos e substâncias a seguir são diminuídos pelo tabagismo crônico, principalmente pela indução das enzimas CYP2A6:

  • Antiarrítmicos (alguns): flecainida, lidocaína e mexiletina

  • Antidepressivos (alguns): clomipramina, fluvoxamina, imipramina e trazodona

  • Antipsicóticos (alguns: clorpromazina, clozapina, flufenazina, haloperidol, olanzapina, tiotixeno)

  • Cafeína

  • Estrogênios (orais)

  • Insulina (absorção tardia causada por vasoconstrição na pele)

  • Pentazocina

  • Teofilina

Duas exceções são as benzodiazepinas, para as quais os efeitos da sedação são menores, provavelmente por causa dos efeitos estimulantes da nicotina, e os betabloqueadores, com diminuição da pressão arterial e do controle da frequência cardíaca, possivelmente causados pela ativação simpática mediada pela nicotina.

Referências sobre fisiopatologia

  1. 1. National Center for Chronic Disease Prevention and Health Promotion (US) Office on Smoking and Health. The Health Consequences of Smoking—50 Years of Progress: A Report of the Surgeon General. Atlanta (GA): Centers for Disease Control and Prevention (US); 2014.

  2. 2. Yao T, Sung HY, Wang Y, Lightwood J, Max W: Healthcare costs attributable to secondhand smoke exposure at home for U.S. adults. Prev Med 108:41-46, 2018. doi:10.1016/j.ypmed.2017.12.028

Sinais e sintomas do uso de tabaco

Efeitos agudos

A nicotina aumenta discretamente a frequência cardíaca, a pressão arterial e a frequência respiratória. Pessoas que fumam podem sentir aumento de energia e excitação, aumento da capacidade de concentração, diminuição da tensão e ansiedade, e uma sensação de prazer e recompensa. Náuseas são comuns na primeira exposição de alguém à nicotina. A nicotina diminui o apetite e pode ser um substituto comportamental da alimentação. Os efeitos da nicotina são transitórios, dada sua meia-vida curta. Se não for administrada repetidamente, o indivíduo experimenta os efeitos da abstinência de nicotina, que inclui letargia, dificuldade de concentração, inquietação, ansiedade, tensão, humor deprimido, irritabilidade e fome.

Com o tabaco convencional, a tolerância aos exercícios tende a diminuir por causa da irritação do trato respiratório. O baixo grau de toxicidade do monóxido de carbono também pode limitar a tolerância aos exercícios, mas isso provavelmente é ocorre apenas entre os atletas de elite.

Intoxicação ou overdose

Em geral, a intoxicação aguda por nicotina ocorre por exposição oral (p. ex., crianças que ingerem cigarro ou chiclete de nicotina ou líquido de cigarro eletrônico) ou exposição cutânea (p. ex., manipulação de produtos de tabaco cru) em vez do próprio ato de fumar.

A intoxicação leve por nicotina, como é comum na doença do tabaco verde e nas pequenas ingestões pelas crianças (p. ex., < 1 cigarro ou 3 guimbas), tipicamente se manifesta como náuseas, vômitos, cefaleia e fraqueza. Os sintomas desaparecem espontaneamente, geralmente 1 a 2 horas depois da ingestão, se a intoxicação for leve; entretanto, os sintomas podem persistir por 24 horas se a intoxicação for grave.

A intoxicação por nicotina grave provoca toxíndrome colinérgica com náuseas, vômitos, sialorreia, lacrimejamento, diarreia, poliúria, miofasciculações e fraqueza muscular. Os pacientes costumam apresentar dor abdominal em cólica e, se a intoxicação for muito grave, arritmia, hipotensão, convulsões e coma. A dose fatal de nicotina é de aproximadamente 60 mg em adultos não fumantes, 120 mg em adultos que fumam e apenas 10 mg em crianças pequenas. Cada cigarro contém aproximadamente 8 mg de nicotina (somente cerca de 1 mg é absorvido ao fumar). Entretanto, geralmente é difícil determinar a quantidade ingerida pelas crianças pela história porque raramente a ingestão é observada; qualquer ingestão deve ser considerada potencialmente perigosa.

Efeitos crônicos

Os resultados decorrentes do próprio tabagismo são manchas amarelas nos dentes e nos dedos e em comparação a controles pareados por idade, o peso é discretamente mais baixo (diferença ≤ 5 kg), a pele é mais seca e mais enrugada e o cabelo é mais fino.

Outros sintomas são os mesmos das doenças pulmonar e cardiovascular relacionadas com o tabagismo. Tosse crônica e dispneia a esforços são comuns. As deficiências circulatórias e respiratórias diminuem a tolerância aos exercícios, muitas vezes resultando em um estilo de vida mais sedentário e, portanto, à redução adicional da tolerância aos exercícios.

Abstinência

A cessação do tabagismo muitas vezes provoca sintomas intensos de abstinência da nicotina, principalmente desejo de fumar, mas também outros sintomas (p. ex., ansiedade, dificuldade de concentração, perturbação do sono, depressão) e ganho de peso futuro.

Diagnóstico do uso de tabaco

  • Indagação direta

A toxicidade aguda nem sempre é aparente na história. Talvez as crianças não tenham sido observadas ingerindo tabaco, goma de nicotina ou líquidos de cigarros eletrônicos, e os pacientes com a doença do tabaco verde talvez não pensem em mencionar que manuseiam tabaco. Assim, deve-se indagar às crianças e aos trabalhadores agrícolas apresentando sintomas típicos, especialmente manifestações colinérgicas, a possibilidade de exposição ao tabaco. Não é necessário fazer exames complementares.

Mais de 70% das pessoas que fumam procuram um centro de atendimento primário anualmente, mas apenas uma minoria sai tendo recebido orientação e medicações para auxiliar a cessação do tabagismo. Para maximizar a identificação do tabagismo e, portanto, o benefício da cessação para a saúde pública, deve-se perguntar a todos os pacientes sobre o uso de tabaco durante as consultas médicas independentemente dos sintomas de apresentação, sobretudo durante as consultas para os sintomas possivelmente relacionados com o tabagismo (p. ex., sintomas circulatórios ou respiratórios). Além disso, a avaliação da quantidade utilizada pelos pacientes (o número de cigarros fumados por dia) e depois de quantos minutos eles fumam ao acordar (30 minutos é sinal de problemas de vício) podem ajudar a indicar a gravidade da dependência do tabaco e do vício em nicotina e ajudar a orientar a escolha e a dose dos medicamentos para a cessação.

Tratamento de tabagismo

Deve-se lavar a pele exposta à nicotina. Do contrário, o tratamento para a intoxicação aguda por nicotina é de suporte. Não se recomenda esvaziamento gástrico. Nos pacientes com sintomas leves ou vômitos, não se deve administrar carvão vegetal; alguns médicos recomendariam carvão vegetal para os pacientes com sintomas graves ou que ingeriram grandes quantidades e não vomitaram. Pode ser necessário proteger as vias respiratórias e prover suporte ventilatório para os pacientes obnubilados, os pacientes com hipersecreção respiratória ou com fraqueza da musculatura respiratória. Para convulsões, utilizam-se benzodiazepinas. O choque é tratado com hidratação venosa e, se a reposição volêmica for ineficaz, com aminas vasopressoras. O uso da atropina pode ser considerada para os pacientes com hipersecreção respiratória ou bradicardia; caso contrário, o uso de anticolinérgicos não é recomendado.

Todas as pessoas que fumam devem ser orientadas a parar de fumar pelo seu médico. A assistência neste processo engloba a orientação sobre a cessação do tabagismo e, geralmente, tratamento farmacológico (ver tabela Medicamentos e produtos de reposição de nicotina para cessação do tabagismo). Recomendações dadas pela linha direta para parar de fumar (1-800-QUIT-NOW), sites web (p. ex., Smokefree.gov) e outros recursos podem ajudar. Deve-se aconselhar as gestantes tabagistas a parar de fumar e ajudá-las recomendando o tratamento intensivo de cessação do tabagismo. Mas a 2021 US Preventive Services Task Force concluiu que as evidências não eram suficientes para avaliar os benefícios e os danos do tratamento farmacológico para a cessação do tabagismo em gestantes (ver Tobacco Smoking Cessation in Adults, Including Pregnant Women: Behavioral and Pharmacotherapy Interventions).

Prevenção do tabagismo

É importante prevenir o tabagismo entre os jovens porque 90% dos adultos que fumam começam antes dos 18 anos e bem poucos adultos começam a fumar ou utilizar produtos de tabaco sem fumaça após os 26 anos de idade (1). Estima-se que hoje 5,6 milhões dos jovens < 18 anos nos Estados Unidos morrerão prematuramente por causa de doença relacionada ao tabaco; pode-se evitar essas mortes por meio de medidas de saúde pública e ações regulatórias (1). Por exemplo, restringir representações de tabagismo em filmes e jogos de vídeo, fazer cumprir a idade mínima federal de 21 anos para venda de produtos de tabaco, proibir sabores mentolados e saborizados em todas as formas de tabaco, aumentar o preço dos cigarros e restringir descontos da indústria do tabaco no ponto de venda são intervenções importantes para prevenir o tabagismo entre os jovens.

A National Academies of Sciences concluiu que há evidências substanciais de que o uso de cigarros eletrônicos aumenta o risco do consumo de cigarros convencionais entre jovens e adultos jovens (2). Ainda não se sabe se isso se traduz no uso prolongado dos cigarros convencionais.

Referências sobre prevenção

  1. 1. National Center for Chronic Disease Prevention and Health Promotion (US) Office on Smoking and Health. The Health Consequences of Smoking—50 Years of Progress: A Report of the Surgeon General. Atlanta (GA): Centers for Disease Control and Prevention (US); 2014.

  2. 2. National Academies of Sciences, Engineering, and Medicine; Health and Medicine Division; Board on Population Health and Public Health Practice; Eaton DL, Kwan LY, Stratton K, et al: Public Health Consequences of E-Cigarettes. Washington (DC): National Academies Press (US); January 23, 2018.

Pontos-chave

  • O tabagismo é a principal causa de mortalidade prevenível nos Estados Unidos.

  • A maioria dos adultos que fumam começa antes dos 18 anos de idade.

  • O desejo de fumar começa em dias depois do primeiro cigarro e persiste muito tempo depois de parar de fumar.

  • Cigarros criam e sustentam a dependência por meio do rápido fornecimento de nicotina para o cérebro.

  • Além da nicotina, a fumaça do cigarro contém substâncias carcinógenas, gases nocivos ou aditivos químicos, que são responsáveis pelos efeitos adversos para a saúde que os cigarros causam.

  • Os efeitos nocivos do tabagismo compreendem maior risco de doenças debilitantes e fatais (p. ex., câncer de pulmão, doença pulmonar obstrutiva crônica e doença coronariana), incêndios residenciais e florestais e interações medicamentosas.

  • A nicotina age de maneira aguda como um estimulante leve nas doses habituais, mas pode causar síndromes tóxicas colinérgicas graves com grandes doses (geralmente decorrente da ingestão oral ou exposição cutânea direta).

  • Perguntar a todos os pacientes sobre tabagismo, independentemente dos sintomas de apresentação; orientar todas as pessoas que fumam a parar; oferecer assistência para apoiar a cessação; e organizar o acompanhamento para evitar recidivas.

Informações adicionais

Os recursos em inglês a seguir podem ser úteis. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo destes recursos.

  1. Centers for Disease Control and Prevention — Youth Tobacco Prevention: fatos informativos, infográficos e outros recursos para professores, conselheiros, pais e outros envolvidos em práticas anti-tabagismo, instruções para jovens

  2. Smokefree.gov: recurso do National Cancer Institute (NCI) para ajudar a reduzir as taxas de tabagismo nos Estados Unidos, particularmente entre certas populações, fornecendo informações sobre cessação do tabagismo, um plano personalizado para parar de fumar e suporte baseado na literatura científica

  3. The National Academies of Sciences, Engineering, and Medicine: Health and Medicine Division: Public health consequences of e-cigarettes: A 2018 review of the evidence of the health effects related to the use of electronic nicotine delivery systems

  4. World Health Organization: WHO launches Quit Tobacco App: informações sobre o aplicativo "Quit Tobacco" da OMS, que tem como alvo todas as formas de tabaco, ajuda os usuários a identificar os gatilhos, definir seus alvos, controlar a fissura e manter o foco a fim de parar de fumar

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