Categorias de fármacos de risco em idosos

PorJ. Mark Ruscin, PharmD, FCCP, BCPS, Southern Illinois University Edwardsville School of Pharmacy;
Sunny A. Linnebur, PharmD, BCPS, BCGP, Skaggs School of Pharmacy and Pharmaceutical Sciences, University of Colorado
Revisado/Corrigido: jul 2021
Visão Educação para o paciente

    Algumas categorias de fármacos (p. ex., analgésicos, anticoagulantes, anti-hipertensivos, fármacos antiparkinsonianos, diuréticos, hipoglicemiantes e psicoativos) impõem risco especial aos idosos. Alguns fármacos, embora razoáveis para uso em adultos jovens, têm tantos riscos que devem ser considerados inadequados aos idosos. Os critérios de Beers da American Geriatric Society® são mais comumente usados para identificar esses fármacos inadequados (ver tabela Fármacos potencialmente inapropriados em idosos) (1). Os critérios de Beers classificam ainda mais fármacos potencialmente inapropriados em 3 grupos:

    • Potencialmente inapropriado para todos os idosos: se possível, deve ser evitado

    • Potencialmente inapropriados por causa de interações fármaco-doença e fármaco-síndrome: devem ser evitados em idosos com certas doenças ou síndromes

    • Para ser usados com cautela: o benefício pode compensar o risco em alguns pacientes

    Tabela
    Tabela

    Analgésicos

    Os AINEs são usados por mais de 30% das pessoas com idade de 65 a 89 anos, e metade de todas as prescrições de AINEs são para pessoas com > 60 anos. Vários AINEs estão disponíveis sem prescrição.

    O idoso pode estar propenso aos efeitos adversos desses fármacos, os quais podem ser mais graves em virtude de:

    • AINEs são altamente lipossolúveis e, como o tecido adiposo aumenta com a idade, a distribuição desses fármacos é mais extensa.

    • Frequentemente, a proteína plasmática está diminuída, resultando em níveis mais elevados de fármaco não ligado e exacerbação dos efeitos farmacológicos para fármacos altamente ligados a proteínas.

    • A função renal é reduzida em muitos idosos, resultando em diminuição da depuração renal e aumento dos níveis do fármaco.

    Os graves efeitos adversos incluem úlcera péptica e sangramento gastrintestinal superior; o risco é maior quando o AINE é iniciado e quando a dose é aumentada. O risco de hemorragia gastrintestinal aumenta quando AINEs são administrados com corticoides, varfarina, anticoagulantes orais diretos, ácido acetilsalicílico ou outros fármacos antiplaquetários (p. ex., clopidogrel). AINEs podem aumentar o risco de eventos cardiovasculares e causar retenção de líquidos e, às vezes, nefropatia.

    AINEs também podem aumentar a pressão arterial; este efeito pode ser desconhecido e provocar a intensificação do tratamento anti-hipertensivo (prescrição em cascata). Assim, os médicos devem se lembrar desse efeito quando a pressão arterial aumentar em pacientes idosos e interpelar sobre o uso de AINEs, particularmente os fármacos de venda livre.

    Os inibidores seletivos de COX-2 (ciclo-oxigenase-2) causam menos irritação gastrintestinal e inibição das plaquetas que os AINEs. Contudo, coxibes ainda acarretam risco de sangramento gastrintestinal, principalmente nos pacientes que usam varfarina ou ácido acetilsalicílico (mesmo em dose baixa) e naqueles que tiveram eventos gastrointestinais. A classe dos coxibes parece aumentar o risco de eventos cardiovasculares, mas o risco pode variar de acordo com o fármaco; eles devem ser usados cuidadosamente. O coxibes têm efeito renal comparável ao de outros AINEs.

    As alternativas de menor risco (p. ex., paracetamol, diclofenaco em gel tópico) devem ser usadas quando possível. Se os AINEs forem prescritos para o idoso, uma dose eficaz mais baixa deve ser usada, e a necessidade de uso contínuo deve ser frequentemente revisada. Se AINEs são usados a longo prazo, deve-se monitorar atentamente os níveis séricos de creatinina e a pressão arterial, sobretudo em pacientes com outros fatores de risco (p. ex., insuficiência cardíaca, insuficiência renal, cirrose com ascite, depleção de volume, uso de diuréticos) e deve-se considerar o uso concomitante de um fármaco gastroprotetor (p. ex., inibidor da bomba de prótons ou misoprostol).

    Anticoagulantes

    A idade pode aumentar a sensibilidade ao efeito anticoagulante da varfarina. Cuidado com a dosagem e o monitoramento de rotina podem evitar o aumento de risco de sangramento em pacientes idosos em uso de varfarina. Também é importante o monitoramento constante quando uma nova medicação for acrescentada ou a anterior for interrompida por serem comuns as interações medicamentosas com a varfarina; programas computadorizados de interação medicamentosa devem ser consultados, se o paciente estiver em uso de vários fármacos. Também deve-se monitorar nos pacientes interações da varfarina com alimentos, álcool, fármacos de venda livre e suplementos. Os anticoagulantes mais recentes (dabigatrana, rivaroxabana, apixabana, edoxaban) podem ser mais fáceis de dosar e têm menos interações medicamentosas e interações alimentos-fármacos do que a varfarina. Em comparação com a varfarina, os anticoagulantes mais recentes são tão ou mais eficazes em reduzir o risco de acidente vascular encefálico e hemorragia intracraniana em paciente com fibrilação atrial, mas ainda aumentam o risco de sangramento em idosos, particularmente naqueles com função renal prejudicada.

    Antidepressivos 

    Os antidepressivos tricíclicos são efetivos, mas raramente devem ser usados no idoso. Os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs) e os inibidores da recaptação mistos, como inibidores da recaptação de serotonina e noradrenalina (IRSNs), são tão eficazes quanto os antidepressivos tricíclicos (ATCs) e causam menos toxicidade; contudo, há algumas preocupações em relação a alguns desses fármacos (abaixo). Além disso, todos os ISRS, IRSNs e ATCs podem aumentar o risco de quedas e hiponatremia em idosos.

    • Paroxetina: esse fármaco é mais sedativo que os outros ISRS, tem efeitos anticolinérgicos, e como alguns outros ISRS, podem inibir a atividade da enzima hepática citocromo P-450 2D6, possivelmente prejudicando o metabolismo de vários fármacos, incluindo tamoxifeno, alguns antipsicóticos, antiarrítmicos e antidepressivos tricíclicos.

    • Citalopram e escitalopram: deve-se limitar as doses em idosos a no máximo 20 mg/dia e 10 mg/dia, respectivamente, porque o prolongamento do QT é uma preocupação.

    • Venlafaxina e duloxetina: esses fármacos podem aumentar a pressão arterial.

    • Mirtazapina: esse fármaco pode ser sedativo e pode estimular o ganho de peso/apetite.

    • Sertralina: esse fármaco apresenta o maior risco de diarreia.

    Anti-hiperglicêmicos

    As doses de anti-hiperglicêmicos devem ser cuidadosamente ajustadas em indivíduos com diabetes mellitus. O risco de hipoglicemia decorrente de sulfonilureia pode aumentar com a idade. Como descrito na tabela Fármacos potencialmente inapropriados para idosos, não se recomenda a clorpropamida para pacientes idosos em razão do maior risco de hipoglicemia e hiponatremia decorrentes da síndrome de secreção hormonal inadequada de antidiuréticos (SIADH). O risco de hipoglicemia também é maior com a gliburida e a glimepirida do que com outros anti-hiperglicêmicos orais porque a depuração renal é diminuída em idosos.

    A metilformina, uma biguanida excretada pelo rim, aumenta a sensibilidade do tecido periférico à insulina e pode ser eficaz somente quando administrada isoladamente ou com sulfonilureias. O risco de acidose láctica é raro, mas tem sérias complicações, aumentando conforme o grau de insuficiência renal e no paciente idoso. Insuficiência cardíaca congestiva sintomática é uma contraindicação.

    Inibidores do cotransportador de sódio-glicose-2 (SGLT2) (canagliflozina, dapagliflozina e empagliflozina) podem aumentar o risco de infecções do trato urinário, infecções fúngicas e hipovolemia com hipotensão ortostática; devem ser evitados em pacientes com insuficiência renal.

    Anti-hipertensivos

    Em muitos pacientes idosos, uma dose inicial menor de anti-hipertensivo pode ser necessária para diminuir o risco de efeitos adversos; no entanto, para muitos idosos com hipertensão, para atingir a pressão arterial-alvo são necessárias doses-padrão e terapia multimedicamentosa. O tratamento inicial da hipertensão em idosos geralmente envolve um diurético do tipo tiazídico, inibidor da ECA, bloqueador do receptor da angiotensina II ou bloqueador de canais de Ca di-hidropiridínico, dependendo das comorbidades. Deve-se reservar betabloqueadores para aqueles com doença cardíaca ou para controle da frequência da fibrilação atrial. Nifedipino de ação rápida pode aumentar o risco de mortalidade e não deve ser usado. A pressão arterial em posições sentada e em pé pode ser monitorada, principalmente quando muitos antidepressivos são usados, para verificar se há hipotensão ortostática, que pode aumentar o risco de queda e fraturas. O monitoramento ambulatorial ou domiciliar da pressão arterial também pode ser mais preciso em idosos do que a medida da pressão arterial em clínicas porque muitos idosos têm síndrome do jaleco branco (aumento da pressão arterial enquanto no consultório médico) ou hipertensão mascarada (diminuição da pressão arterial enquanto no consultório médico). Os médicos devem contrabalancear os objetivos relacionados com alcançar uma PA alvo com o risco de efeitos adversos em idosos (como induzir à hipotensão ortostática ou aumentar o risco de quedas).

    Fármacos antiparkinsonianos

    A depuração de levodopa é reduzido em idosos, que são mais suscetíveis aos efeitos adversos dos fármacos, sobretudo, hipotensão ortostática e confusão. Portanto, os pacientes idosos devem começar com dosagem inicial baixa de levodopa e monitorar cuidadosamente os efeitos adversos. Os pacientes que ficam confusos quando utilizam a levodopa podem também não tolerar os agonistas da dopamina (p. ex., pramipexol, ropinirol). Como idosos com sintomas parkinsonianos também podem ter sintomas cognitivos concomitantes, deve-se evitar os fármacos com efeitos anticolinérgicos (p. ex., difenidramina, triexifenidil).

    Antipsicóticos

    Os antipsicóticos devem ser usados apenas para psicoses. Em pacientes agitados não psicóticos, os antipsicóticos controlam os sintomas apenas marginalmente melhor do que o placebo, podendo exercer efeitos adversos graves. Em pessoas com demência, estudos mostraram que antipsicóticos aumentam a mortalidade e o risco de acidente vascular encefálico, levando a FDA (U.S. Food and Drug Administration) a emitir um alerta de tarja negra sobre sua utilização nesses pacientes. Em geral, problemas de comportamento relacionados à demência (p. ex., vagar, gritar, não ser cooperativo) não respondem aos antipsicóticos. Antipsicóticos não devem ser usados apenas porque um determinado problema de comportamento (p. ex., gritar, repetir frases) é irritante para outras pessoas que não o paciente.

    Quando um antipsicótico é usado, a dose inicial deve ser cerca de um quarto daquela administrada em adultos e gradualmente aumentada, com monitoramento frequente quanto à resposta e efeitos adversos. Depois que o paciente responde, a dose deve ser reduzida, se possível, para a menor dose eficaz. O fármaco tem de ser interrompido se for ineficaz. Os dados de estudos clínicos relacionados a dosagem, eficácia e segurança desses fármacos em i idosos são limitados.

    Antipsicóticos podem diminuir a paranoia, mas podem piorar a confusão mental (ver também Antipsicóticos: antipsicóticos convencionais). Os idosos, principalmente do sexo feminino, estão em risco elevado de discinesia tardia, que geralmente é irreversível. A sedação, hipotensão ortostática, efeitos anticolinérgicos e acatisia (inquietação motora subjetiva) podem ocorrer em cerca de 20% dos pacientes idosos que usam antipsicótico, e o parkinsonismo induzido pelo fármaco pode persistir por até 6 a 9 meses após a interrupção da medicação.

    A disfunção extrapiramidal pode se desenvolver até mesmo quando são usados antipsicóticos de 2ª geração (p. ex., olanzapina, quetiapina, risperidona), sobretudo, em elevadas doses. Os riscos e benefícios do uso dos antipsicóticos deve ser discutido com o paciente ou com o cuidador responsável. Deve-se considerar antipsicóticos para problemas comportamentais somente quando as opções não farmacológicas tenham falhado e os comportamentos do paciente são uma ameaça para si mesmo ou para outros.

    Ansiolíticos e hipnóticos

    As causas tratáveis da insônia devem ser procuradas e conduzidas antes de se usar um hipnótico. As medidas não farmacológicas, como a terapia cognitivo-comportamental, e a higiene do sono (p. ex., evitar cafeína, bebidas cafeinadas, limitar a sesta, modificar o horário de sono) devem ser inicialmente testadas. Se forem ineficazes, os hipnóticos não benzodiazepinas (p. ex., zolpidem, eszopiclona, zapelona) são opções para uso em curto prazo. Esses fármacos se ligam principalmente ao subtipo do receptor benzodiazepina e causam menos perturbações do sono do que os diazepínicos. Têm início de ação mais rápido, menos efeitos rebote, menos efeitos no dia seguinte e menor potencial de dependência, mas indicam-se doses mais baixas para idosos. Hipnóticos não benzodiazepinas e benzodiazepinas de ação rápida, média e prolongada estão associados a maior risco de comprometimento cognitivo, delirium, quedas, fraturas e acidentes automobilísticos em idosos e devem ser evitados no tratamento da insônia. Benzodiazepinas podem ser apropriados para o tratamento de ansiedade ou crises de pânico em idosos.

    A duração da terapia ansiolítica e hipnótica deve ser limitada, se possível, em virtude do potencial desenvolvimento de tolerância e dependência; a retirada pode repercutir em ansiedade ou insônia.

    Os anti-histamínicos (p. ex., difenidramina, hidroxizina) não são recomendados como ansiolíticos ou hipnóticos por terem efeitos anticolinérgicos, e a tolerância aos efeitos sedativos se desenvolve rapidamente.

    A buspirona, um agonista parcial de serotonina, pode ser eficaz para transtornos gerais de ansiedade; o paciente idoso tolera bem doses de até 30 mg/dia. O início lento da ação ansiolítica (até 2 a 3 semanas) pode ser uma desvantagem em casos urgentes.

    Digoxina

    A digoxina é um glicosídio cardíaco usado para aumentar a contratilidade do miocárdio e no tratamento das arritmias supraventriculares. No entanto, deve ser usada com cautela em idosos. Em homens com insuficiência cardíaca e FEVE 45%, níveis séricos de digoxina > 0,8 ng/mL (1,0 nmol/L) estão associados a maior taxa de mortalidade. Os efeitos adversos estão tipicamente relacionados ao estreito índice terapêutico. Um estudo verificou que a digoxina foi benéfica em mulheres quando os níveis séricos eram de 0,5 a 0,9 ng/mL (0,6 a 1,2 nmol/L), mas possivelmente prejudicial com níveis 1,2 ng/mL (1,5 nmol/L). Numerosos fatores aumentam a probabilidade de toxicidade por digoxina em idosos. A insuficiência renal, desidratação temporária e o uso de AINE (comum em indivíduos idosos) podem diminuir a depuração renal da digoxina. Além disso, a depuração de digoxina diminui em média 50% nos pacientes idosos com níveis séricos normais de creatinina. Além disso, o volume de distribuição da digoxina pode ser reduzido caso exista diminuição da massa magra (evento comum associado à idade). Portanto, as doses iniciais devem ser baixas (0,125 mg/dia) e ajustadas de acordo com a resposta aos níveis séricos de digoxina (variação normal de 0,8 a 2,0 mg/mL [1,0 a 2,6 nmol/L]). No entanto, os níveis séricos de digoxina nem sempre se correlacionam com a probabilidade de toxicidade. Além disso, os critérios da American Geriatric Society Beers® sugerem evitar doses> 0,125 mg/dia (1) e evitar digoxina para o tratamento de primeira linha da insuficiência cardíaca e fibrilação atrial.

    Diuréticos

    Pequenas doses de diuréticos tiazídicos (p. ex., hidroclorotiazida ou clortalidona, 12,5 a 25 mg) podem efetivamente controlar a hipertensão em muitos pacientes idosos e acarretar menos risco de hipopotassemia e hiperglicemia que outros diuréticos. Assim, os suplementos de potássio podem ser necessários menos frequentemente.

    Em idosos, deve-se usar com cautela os diuréticos poupadores de potássio; deve-se monitorar atentamente os níveis séricos de potássio, sobretudo quando esses diuréticos são administrados com inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA) ou bloqueadores dos receptores da angiotensina II, ou quando o paciente apresenta comprometimento da função renal.

    Referência

    1. 1. The American Geriatrics Society 2019 Beers Criteria Update Expert Panel: American Geriatrics Society updated Beers Criteria® for potentially inappropriate medication use in older adults. J Am Geriatr Soc 67(4):674-694, 2019. doi:10.1111/jgs.15767

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