Marburg e Ebola são filovírus que causam hemorragia, falência de múltiplos órgãos e altas taxas de mortalidade. O diagnóstico é realizado por ensaio imunoenzimático, PCR (polymerase chain reaction), ou microscopia eletrônica. O tratamento é de suporte. Isolamento rigoroso e medidas de quarentena são necessários para controlar epidemias.
Os vírus de Marburg e Ebola são filoviruses filamentosos distintos entre si, mas que causam doenças clinicamente semelhantes caracterizadas por febres hemorrágicas e extravasamento capilar. A infecção pelo vírus Ebola é um pouco mais virulenta do que a infecção pelo vírus Marburg.
Vírus Ebola isolados foram diferenciados em 5 espécies:
Vírus Ebola do Zaire
Vírus Ebola do Sudão
Vírus Ebola da floresta Tai [anteriormente, vírus Ebola da Costa do Marfim (a floresta Tai situa-se na Costa do Marfim])
Vírus Ebola Bundibugio
Vírus Ebola de Reston (que está presente na Ásia, mas não causa doenças em seres humanos)
A maioria das epidemias das infecções por vírus de Marburg e Ebola se originou na África Subsaariana Central e Ocidental. Epidemias eram raras e esporádicas; elas foram parcialmente contidas porque ocorreram em áreas isoladas. Quando ocorre a disseminação para outras áreas, geralmente resulta de viajantes da África.
Em dezembro de 2013, uma grande epidemia do vírus Ebola Zaire começou na Guiné rural (África Ocidental), então se espalhou para áreas urbanas densamente povoadas na Guiné e para a vizinha Libéria e Serra Leoa. Infectou milhares de pessoas e tem uma taxa de letalidade de aproximadamente 59%. Viajantes infectados disseminaram o vírus Ebola para a Nigeria, Europa e América do Norte. Casos do Ebola continuaram a ocorrer nos primeiros meses de 2016; Serra Leoa foi por fim declarada livre do Ebola em março de 2016, Guiné em maio de 2016 e a Libéria em junho de 2016.
Vários surtos adicionais de Ebola ocorreram na República Democrática do Congo (RDC) entre 2017 e 2022 (1, 2, 3, 4, 5). Duas vacinas contra o Ebola Zaire foram desenvolvidas em 2020 (6) e ajudaram a controlar os surtos.
Em setembro de 2022, Uganda relatou um caso de doença por Ebola causada pelo Ebolavírus do Sudão, o primeiro de uma década; o surto resultou em uma mortalidade de 50% entre 142 casos e foi declarado terminado em janeiro de 2023 (7).
Em fevereiro de 2025, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA emitiram um alerta da Rede de Alerta de Saúde sobre um surto confirmado de Ebola em Uganda causado pelo vírus Sudão (8).
Transmissão dos vírus Marburg e Ebola
A maioria dos casos envolve exposição a primatas não humanos na África subsaariana. O vetor e o reservatório não foram definitivamente identificados, embora o vírus Marburg tenha sido identificado em morcegos e casos tenham ocorrido em pessoas expostas a morcegos (p. ex., em minas ou cavernas). Epidemias do vírus Ebola foram associadas ao consumo de carne de animais selvagens nas áreas afetadas (carne de caça) ou sopa feita com morcegos. Infecções pelos vírus Ebola e Marburg também ocorreram depois da manipulação de tecidos de animais infectados.
Filovírus são altamente contagiosos. A transmissão entre pessoas ocorre por meio do contato da pele e mucosa com fluídos corpóreos (saliva, sangue, vômito, urina, fezes, suor, leite materno, sêmen) de uma pessoa sintomática infectada ou raramente de um primata não humano. Os seres humanos só são infectantes depois que desenvolvem os sintomas. Os sinais e sintomas persistem em pacientes sobreviventes durante o período de tempo que demora para desenvolver uma resposta imunológica eficaz. Tipicamente, os pacientes sobreviventes eliminam o vírus completamente e não mais transmitem o vírus; mas o vírus Ebola pode persistir em certos locais privilegiados em termos imunitários (olho, cérebro, testículos). O vírus pode voltar a aparecer a partir desses locais e causar sequelas tardias ou recorrência, e suspeita-se da transmissão sexual entre os sobreviventes e indivíduos suscetíveis.
A transmissão do vírus Marburg por sêmen infectado foi comprovada até 7 semanas após a recuperação clínica (9). O material genético do vírus Ebola persistiu por um ano ou mais no sêmen de 63% dos homens que se recuperaram do Ebola. Entretanto, os testes PCR não podem determinar se o vírus Ebola presente está vivo e pode disseminar a doença. Contudo, um homem transmitiu o vírus para sua parceira > 500 dias depois de apresentar os sintomas iniciais da infecção, indicando que pode haver persistência e transmissão do vírus infeccioso. É possível que o Ebola seja transmitido por contato sexual ou outro tipo de contato com o sêmen (10).
Suspeita-se de transmissão por aerossol em alguns casos; entretanto, se ocorrer, provavelmente é rara.
Durante uma epidemia a transmissão é principalmente interpessoal, resultante do contato próximo com sangue, secreções, outros líquidos fisiológicos ou órgãos das pessoas infectadas. Cerimonias fúnebres em que o corpo é lavado e os enlutados têm contato físico com o falecido desempenharam um papel importante na transmissão da infecção.
Referências gerais
1. Centers for Disease Control and Prevention: Ebola: 2017 Democratic Republic of the Congo, Bas Uélé District. 2017.
2. World Health Organization (WHO): New Ebola outbreak declared in Democratic Republic of the Congo, May 2018.
3. World Health Organization: Ebola virus disease – Democratic Republic of the Congo, December 2021
4. World Health Organization: Ebola outbreak 2022 - Équateur Province, DRC
5. World Health Organization: Ebola Virus Disease –Democratic Republic of the Congo, September 2022
6. Centers for Disease Control and Prevention: Ebola: 2020 Democratic Republic of the Congo, Equateur Province.
7. Centers for Disease Control and Prevention: Health Advisory Ebola Outbreak
8. World Health Organization: Ebola disease caused by Sudan ebolavirus – Uganda
9. World Health Organization: Fact Sheet: Marburg virus disease. February 15, 2018.
10. Bausch DG, Crozier I: The Liberia Men's Health Screening Program for Ebola virus: Win-win-win for survivor, scientist, and public health. Lancet Glob Health 4 (10):e672–673, 2016. doi: 10.1016/S2214-109X(16)30207-8
Sinais e sintomas de infecções pelo vírus de Marburg e pelo vírus Ebola
Os sintomas da infecção pelos vírus de Marburg e Ebola são muito semelhantes.
Após um período de incubação de 2 a 21 dias, ocorrem febre, mialgia e cefaleia, frequentemente com dor abdominal, náuseas e sintomas respiratórios superiores (tosse, dor torácica, faringite). Fotofobia, congestão conjuntival, icterícia e linfadenopatia também ocorrem. Vômitos e diarreia pode se manifestar rapidamente. Delirium, estupor e coma podem ocorrer, indicando envolvimento do sistema nervoso central.
Sintomas hemorrágicos começam nos primeiros dias e incluem petéquias, equimoses e franca sangramento ao redor de locais de punção e nas mucosas. Um exantema maculopapular, principalmente no tronco, começa por volta do 5º dia.
Pode haver hipovolemia grave resultante de:
Perda extensa de líquidos por causa de diarreia e vômitos
Extravasamento capilar, resultando em hipoalbuminemia e perda de líquido do espaço intravascular
Perda de eletrólitos pode causar hiponatremia, hipopotassemia e hipocalcemia graves. Isso pode levar a arritmias cardíacas.
Durante a segunda semana de sintomas, pode haver defervescência com início da recuperação, ou evoluir para falência de múltiplos órgãos, levando ao óbito. A recuperação é prolongada e pode ser complicada por hepatite recorrente, mielite transversa e orquite. A taxa de letalidade varia de 25 a 90% dos casos.
Sobreviventes da infecção pelo vírus Ebola podem ter comprometimentos na cognição, visão e mobilidade devido à dor articular (1). Catarata grave pode ocorrer em crianças, e uveíte tem sido descrita em adultos.
O vírus Ebola pode persistir no sistema nervoso central e causar remissão.
Referência sobre sinais e sintomas
1. Jagadesh S, Sevalie S, Fatoma R, et al: Disability among Ebola survivors and their close contacts in Sierra Leone: A retrospective case-controlled cohort study. Clin Infect Dis 66 (1):131–133, 2018. doi: 10.1093/cid/cix705
Diagnóstico das infecções por vírus de Marburg e Ebola
Avaliação e teste de acordo com as diretrizes dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças
Imunoensaio enzimático (ELISA) e transcriptase reversa RT-PCR (polymerase chain reaction)
Suspeita-se de infecção por vírus de Marburg ou por Ebola em pacientes com tendência a sangramento, febre e outros sintomas consistentes com infecção precoce por filovírus e que viajaram para áreas endêmicas. O CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças) publicou um algoritmo e diretrizes para avaliar os viajantes que retornam de regiões endêmicas (1). Uma abordagem semelhante pode ser utilizada se houver suspeita do vírus Marburg (2).
Quando há suspeita, os testes incluem hemograma completo, exames bioquímicos de sangue de rotina, testes de função hepática, testes de coagulação e urinálise. Os testes diagnósticos incluem ELISA e RT-PCR. O padrão-ouro é a detecção de características virais feita em microscopia eletrônica, executada em tecido infectado (especialmente o fígado) ou no sangue.
Os casos devem ser discutidos com as autoridades de saúde pública, que podem ajudar em todas as etapas do tratamento, incluindo:
Decidir se o diagnóstico deve ser confirmado
Organizar o transporte das amostras para testes
O tratamento, incluindo o transporte para os centros selecionados e, quando indicado, uso de novas terapias
Monitorar contatos
Referências sobre diagnóstico
1. Centers for Disease Control and Prevention: Viral Hemorrhagic Fevers (VHFs): Guide for Clinicians Evaluating an Ill Person for VHF or Other High-Consequence Disease. May 13, 2024. Accessed June 18, 2025.
2. Centers for Disease Control and Prevention: Viral Hemorrhagic Fevers: Ebola: Clinical Guidance for Ebola Disease. January 30, 2025. Accessed July 7, 2025.
Tratamento das infecções por vírus de Marburg e Ebola
Cuidados de suporte
Terapia antiviral
O tratamento é de suporte e inclui:
Manutenção do volume sanguíneo e equilíbrio de eletrólitos
Substituição dos fatores de coagulação depletados
Minimização dos procedimentos invasivos
Tratamento dos sintomas, incluindo o uso de analgésicos
Dois tratamentos com anticorpos monoclonais, REGN-EB3 e mAb114, estão disponíveis para tratar a infecção pelo vírus Ebola do Zaire (1). REGN-EB3 é uma combinação de 3 anticorpos monoclonais (atoltivimabe/maftivimabe/odesivimabe), e mAb114 é um anticorpo monoclonal único (ansuvimabe). Ambos os tratamentos foram comprovadamente eficazes durante o surto de Ebola de 2018 a 2020 na RDC, com taxas de cura de cerca de 90% em pacientes com baixas cargas virais (o que sugere que o tratamento foi iniciado nos primeiros dias após a infecção). A taxa de mortalidade em pacientes não tratados e não vacinados é superior a 70%.
Tratamentos experimentais para infecção pelo vírus de Marburg, incluindo antivirais (favipiravir, remdesivir), IgG policlonal e anticorpos monoclonais, estão em investigação clínica, mas não há tratamento definitivo disponível (2).
Referências sobre tratamento
1. Tshiani Mbaya O, Mukumbayi P, Mulangu S. Review: Insights on Current FDA-Approved Monoclonal Antibodies Against Ebola Virus Infection. Front Immunol 12:721328, 2021. doi:10.3389/fimmu.2021.721328
2. Kortepeter MG, Dierberg K, Shenoy ES, Cieslak TJ; Medical Countermeasures Working Group of the National Ebola Training and Education Center's (NETEC) Special Pathogens Research Network (SPRN) Marburg virus disease: A summary for clinicians. Int J Infect Dis 99:233-242, 2020. doi:10.1016/j.ijid.2020.07.042
Prevenção das infecções por vírus de Marburg e Ebola
Duas vacinas contra Ebola, estão disponíveis: rVSV-ZEBOV e um esquema de duas doses com Ad26.ZEBOV e MVA-BN-Filo (1). O rVSV-ZEBOV, utilizado no final do surto de Ebola de 2016 na África Ocidental e no surto de 2018 na RDC, é utilizado para a prevenção da doença causada pelo vírus Ebola do Zaire em pessoas com 18 anos ou mais. Uma segunda vacina, administrada em 2 doses (uma de Ad26.ZEBOV e outra de MVA-BN-Filo), pode ser utilizada para a prevenção da doença causada pelo vírus Ebola (espécie Zaire ebolavírus) em indivíduos com 1 ano de idade ou mais. As vacinas contra o Ebola do Zaire não fornecem proteção cruzada contra a doença do vírus Ebola do Sudão. Três vacinas candidatas foram recomendadas para teste durante o surto de ebolavírus Sudão em Uganda, mas o surto terminou antes que os ensaios clínicos da vacina pudessem ser realizados.
Para evitar a propagação, todos os casos suspeitos, incluindo cadáveres, requerem isolamento rigoroso e manuseio especial. Os pacientes sintomáticos com possível infecção pelos vírus Ebola ou Marburg devem ser isolados em unidades com isolamento. Unidades de terapia intensiva (UTIs) padrão em hospitais públicos não são adequadas. Unidades de isolamento especiais oferecem controle total do destino das secreções fisiológicas e produtos respiratórios.
Membros da equipe em contato com os pacientes devem estar completamente protegidos com roupas que contêm contenção interna dos gases respiratórios. Funcionários treinados devem estar disponíveis para ajudar aqueles em contato com os pacientes a remover suas roupas de proteção. Protocolos para colocação e remoção de máscaras, óculos ou protetores faciais, jaleco e luvas devem ser seguidos (2).
Esterilização total de equipamentos, fechamento de hospitais e educação da comunidade diminuem a duração de epidemias.
Como os vírus Marburg e Ebola podem persistir no sêmen e serem transmitidos por via sexual, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que os pacientes infectados e seus parceiros sexuais se abstenham de todos os tipos de sexo ou usem preservativos de forma correta e sistemática até que ocorra um dos seguintes (3, 4, 5):
2 exames para o vírus sejam negativos
Se o exame não estiver disponível, ≥ 12 meses após o início dos sintomas
Referências sobre prevenção
1. Tomori O, Kolawole MO. Ebola virus disease: current vaccine solutions. Curr Opin Immunol 71:27-33, 2021. doi:10.1016/j.coi.2021.03.008
2. Centers for Disease Control and Prevention: Viral Hemorrhagic Fevers (VHFs): Guidance for Personal Protective Equipment (PPE). May 2, 2024. Accessed June 18, 2025.
3. World Health Organization: Interim infection prevention and control guidance for care of patients with suspected or confirmed filovirus haemorrhagic fever in health-care settings, with focus on Ebola. 2014. Accessed June 18, 2025.
4. World Health Organization: Marburg Virus Disease. January 20, 2025. Accessed June 18, 2025.
5. World Health Organization: Interim advice on the sexual transmission of the Ebola virus disease. January 21, 2016; Accessed June 18, 2025.
Pontos-chave
Os vírus Ebola e Marburg, embora distintos, causam febres hemorrágicas semelhantes; os surtos são perpetuados principalmente pela transmissão interpessoal por meio do contato com fluidos corporais infectados, órgãos de pessoas infectadas ou cadáveres.
Suspeitar de infecção pelos vírus de Marburg ou Ebola em pacientes com tendência a sangramento, febre e outros sintomas compatíveis, e que viajaram para áreas endêmicas.
Isolar os pacientes com possível infecção em isolamento e utilizar procedimentos rigorosos para proteger os profissionais que cuidam desses pacientes.
Duas vacinas contra o vírus Ebola do Zaire estão em uso rotineiro na RDC. Três vacinas candidatas foram desenvolvidas para o Ebolavírus do Sudão.
Planejar o diagnóstico, tratamento e prevenção da transmissão com as autoridades de saúde pública.
