O câncer de endométrio geralmente é um adenocarcinoma endometrioide. Tipicamente, manifesta-se como sangramento uterino pós-menopausa. O diagnóstico é por biópsia. O estadiamento é cirúrgico. O tratamento requer histerectomia, salpingo-ooforectomia bilateral e, para histologia de alto risco, geralmente linfadenectomia pélvica e para-aórtica. Para câncer avançado, geralmente indica-se radioterapia, terapia endócrina ou quimioterapia.
O câncer de endométrio é mais comum em países de alta renda em que as taxas de obesidade são altas. Nos Estados Unidos, esse tipo de câncer é o 4º mais comum em mulheres. A American Cancer Society estima que em 2023, aproximadamente 66.200 novos casos de câncer endometrial serão diagnosticados e que aproximadamente 13.030 mulheres morrerão por causa desse tipo de câncer (1). Aproximadamente 80% desses novos casos estarão em estádio inicial com prognóstico favorável, e os 20% restantes terão doença de alto grau ou em estádio avançado (2).
Nos Estados Unidos, a incidência de câncer de endométrio é mais alta do que a média em mulheres negras, indígenas norte-americanas e nativas do Alasca (hispânicas 26,1/100.000; indígenas norte-americanas não hispânicas ou nativas do Alasca 28,8; asiáticas não hispânicas ou das ilhas do Pacífico 22,7; negras não hispânicas 29,4; brancas não hispânicas 27,6) (3). A mortalidade é mais alta em mulheres negras (hispânicas 4,3/100.000; indígenas norte-americanas não hispânicas ou nativas do Alasca 4,5; asiáticas não hispânicas ou das ilhas do Pacífico 3,5; negras não hispânicas 9,1; brancas não hispânicas 4,6) (3).
O câncer de endométrio afeta principalmente as mulheres na pós-menopausa. A mediana da idade das pacientes no momento do diagnóstico é 63 anos (3). A maioria dos casos é diagnosticada em mulheres com 55 a 64 anos.
Referências gerais
1. American Cancer Society: Key Statistics for Endometrial Cancer. Acessado em 14 de julho de 2023.
2. American Cancer Society: Cancer Facts & Figures 2023.Atlanta: American Cancer Society; 2023. Acessado em 14 de julho de 2023.
3. National Cancer Institute's Surveillance, Epidemiology, and End Results (SEER) Program: Cancer Stat Facts: Uterine Cancer. Acessado em 14 de julho de 2023
Etiologia do câncer de endométrio
Os fatores de risco para câncer endometrial são
Estrogênio sem oposição (níveis séricos elevados de estrogênio e nenhuma ou baixa progesterona)
Idade > 45 anos
Obesidade
Uso de tamoxifeno > 2 anos
Síndrome de Lynch
História pessoal de radioterapia pélvica
A exposição aumentada ao estrogênio extrínseco ou intrínseco pode estar associada com
Obesidade
Síndrome do ovário policístico ou outra disfunção ovulatória
terapia de reposição de estrogênios sem progesterona
Nuliparidade
Menarca precoce
Menopausa tardia
Tumores produtores de estrogênio
A maioria dos cânceres de endométrio é causada por mutações esporádicas. Mas em aproximadamente 5% das pacientes, mutações hereditárias causam câncer endometrial; o câncer de endométrio decorrente de mutações hereditárias tende a ocorrer em idade mais jovem e é frequentemente diagnosticado 10 a 20 anos antes do câncer esporádico. Cerca da metade dos casos que envolve hereditariedade ocorre em famílias com a síndrome de Lynch (câncer colorretal hereditário sem polipose [CCRHSP]). Pacientes com a síndrome de Lynch têm alto risco de desenvolver outros tipos de câncer (p. ex., câncer colorretal, câncer de ovário).
Patologia do câncer endometrial
O câncer de endométrio geralmente é precedido de hiperplasia endometrial. Classifica-se comumente carcinoma endometrial em 2 tipos.
Os tumores do tipo I (não agressivos) são mais comuns, costumam ser responsivos ao estrogênio e são geralmente diagnosticados em mulheres com obesidade e em idades mais jovens (perimenopausa ou no início da menopausa). São precedidos por hiperplasia endometrial. Esses tumores geralmente são de baixo grau; o prognóstico é bom. Adenocarcinoma endometrioide (graus 1 e 2) é a histologia mais comum. Esses tumores podem mostrar instabilidade microssatélite e têm mutações no PTEN, PIK3CA, KRAS e CTNNB1.
Em geral, tumores tipo II são de alto grau e incluem carcinomas endometrioides de grau 3 e tumores com histologia não endometrioide (p. ex., seroso, de células claras, de células mistas, indiferenciado, misto, tipo mesonéfrico, tipo mucinoso gastrointestinal, e carcinossarcoma). Eles tendem a ocorrer em mulheres mais velhas. Aproximadamente 10 a 30% têm mutações p53 (1). Até 10% dos carcinomas do endométrio são do tipo II (2). O prognóstico é muito reservado.
Adenocarcinomas endometrioides é responsável por aproximadamente 75 a 80% dos cânceres de endométrio (3).
Há 4 subtipos moleculares distintos de carcinoma endometrial endometrioide (4):
POLE ultramutado (POLEmut): caracterizado por mutações patogênicas no domínio exonuclease da DNA polimerase-ε, resultando em uma carga mutacional tumoral ultra-alta e um prognóstico favorável
Deficiência de proteínas de reparo do DNA (mismatch repair-deficient, MMRd): perda de proteínas de reparo de incompatibilidade, levando à instabilidade de microssatélites e um prognóstico intermediário
Sem perfil molecular específico (NSMP): não tem características moleculares identificadoras e desfechos dependentes do estádio e do grau do tumor e um prognóstico intermediário
p53-mutante: tem baixa carga mutacional no tumor e alterações somáticas no número de cópias, resultando em um prognóstico desfavorável
A determinação do subtipo molecular, se viável, acrescenta informações valiosas aos fatores de risco clínico-patológicos padrão para classificar os pacientes com câncer de endométrio em grupos de risco, predizer o prognóstico e orientar as recomendações de tratamento.
Carcinomas serosos papilares uterinos (10%), carcinomas de células claras (< 5%), e carcinossarcomas (< 5%) são considerados histologias mais agressivas, de alto risco e, portanto, estão associadas a maior incidência de doença extrauterina na apresentação. Carcinossarcomas costumavam ser categorizados como sarcomas, mas agora são considerados e tratados como tumores epiteliais de alto grau (carcinomas).
Carcinomas mucinosos costumam ser de baixo grau; o prognóstico é bom. Mutações KRAS são comuns nesses tumores.
Outros tipos histopatológicos do carcinoma de endométrio incluem os carcinomas neuroendócrino, indiferenciado e misto (composto por mais de um tipo, com pelo menos 10% de cada componente).
Câncer endometrial pode se disseminar como a seguir:
Da superfície da cavidade uterina ao canal cervical
Do miométrio à serosa e à cavidade peritoneal
Do lúmen das tubas uterinas ao ovário, ligamento largo e superfícies peritoneais
Pela corrente sanguínea, levando a metástases à distância
Por via linfática
Quanto maior (mais indiferenciado) o grau do tumor, maior a probabilidade de invasão miometrial profunda, de metástases para os linfonodos pélvicos ou para-aórticos, ou de que o câncer se espalhe na região extrauterina.
Referências sobre patologia
1. Cancer Genome Atlas Research Network, Kandoth C, Schultz N, et al: Integrated genomic characterization of endometrial carcinoma [published correction appears in Nature 2013 Aug 8;500(7461):242]. Nature 497(7447):67-73, 2013. doi:10.1038/nature12113
2. Faber MT, Frederiksen K, Jensen A, et al: Time trends in the incidence of hysterectomy-corrected overall, type 1 and type 2 endometrial cancer in Denmark 1978-2014. Gynecol Oncol 146(2):359-367, 2017. doi:10.1016/j.ygyno.2017.05.015
3. Lu KH, Broaddus RR: Endometrial cancer. N Engl J Med 383(21):2053-2064, 2020. doi:10.1056/NEJMra1514010
4. WHO Classification of Tumours Editorial Board: 2020 WHO Classification of Tumours, 5th Edition, Volume 4: Female Genital Tumors.
Sinais e sintomas do câncer endometrial
A maioria (> 90%) das mulheres com câncer endometrial se apresentam com sangramento uterino anormal (p. ex., sangramento pós-menopausa, sangramento intermenstrual pré-menopausa, disfunção ovulatória). Dependendo da idade e dos fatores de risco, 1 a 19% das mulheres com sangramento pós-menopausa têm câncer de endométrio (1).
Referência sobre sinais e sintomas
1. Clarke MA, Long BJ, Del Mar Morillo A, et al: Association of endometrial cancer risk with postmenopausal bleeding in women: a systematic review and meta-analysis. JAMA Intern Med 178(9):1210-1222, 2018. doi:10.1001/jamainternmed.2018.2820
Diagnóstico do câncer endometrial
Biópsia endometrial
Os seguintes itens sugerem câncer de endométrio:
Sangramento pós-menopausa
Sangramento anormal em mulheres na pré-menopausa (sangramento intermenstrual, disfunção ovulatória), especialmente em mulheres > 45 anos
Um teste de Papanicolau rotineiro, mostrando células endometriais na pós-menopausa
Um teste de Papanicolau rotineiro mostrando células endometriais atípicas em qualquer mulher
Se houver suspeita de câncer endometrial, realiza-se biópsia endometrial ambulatorial; a sensibilidade é > 90%. Uma alternativa para mulheres na pós-menopausa de risco médio é a ultrassonografia transvaginal; é necessária biópsia se a espessura do revestimento endometrial for > 4 mm e os resultados forem inconclusivos (1).
Se os resultados da biópsia são inconclusivos ou sugerem pré-câncer (p. ex., hiperplasia complexa com atipia) ou câncer, realiza-se dilatação e curetagem (DC), muitas vezes com histeroscopia.
Depois que o câncer endometrial é diagnosticado, a avaliação pré-tratamento consiste em hemograma completo e outros exames de sangue (eletrólitos séricos, renais e hepáticos). Realiza-se radiografia de tórax. Se uma anormalidade é visualizada na radiografia de tórax, deve-se fazer TC. Deve-se ainda considerar:
RM da pelve para determinar a origem do tumor (colo do útero ou útero) e extensão local
Para carcinomas de alto grau, TC de tórax, abdome e pelve
Se houver suspeita de doença metastática com base em exame físico ou exames de sangue, tomografia por emissão positiva (PET)-CT
Como o câncer endometrial às vezes resulta de uma mutação hereditária, deve-se considerar aconselhamento e/ou teste genético se as pacientes têm < 50 anos ou história familiar significativa de câncer endometrial, câncer de ovário ou câncer colorretal ou síndrome de Lynch conhecida (CCHSP).
Estadiamento
O estadiamento do câncer de endométrio é baseado em histologia não agressiva versus agressiva; extensão da disseminação, incluindo profundidade da invasão, extensão para as estruturas circundantes e metástases extrauterinas ou linfonodais; invasão do espaço linfovascular; e classificação molecular (ver tabela Estadiamento FIGO do carcinoma e carcinossarcoma do corpo do útero).
O estadiamento é cirúrgico e sendo feito pela exploração do abdome e da pelve, biópsia ou excisão das lesões extrauterinas suspeitas, histerectomia abdominal total e, nas pacientes com características de alto risco (câncer grau 1 ou 2 com invasão profunda do miométrio, câncer grau 3, todos os tipos de câncer com histologia de alto risco), linfadenectomia pélvica e para-aórtica. Pode-se fazer o estadiamento por laparotomia, laparoscopia ou cirurgia assistida por robô. Se o câncer parece estar confinado ao útero, uma alternativa à linfadenectomia pélvica e para-aórtica é o mapeamento de linfonodos sentinela.
Quando a classificação molecular é conhecida:
Os estádios I e II da FIGO baseiam-se em achados cirúrgicos/anatômicos e histológicos. No caso de POLEmut ou p53abn, o estádio da FIGO é modificado no estádio inicial da doença. Isso é representado no estádio FIGO pela adição de “m” para classificação molecular, e adiciona-se um índice de modo a denotar um status POLEmut ou p53abn. O status MMRd ou NSMP não modifica os estádios iniciais da FIGO; entretanto, essas classificações moleculares devem ser registradas para fins de coleta de dados. Quando a classificação molecular revela MMRd ou NSMP, deve ser registrada como Estádio Im ou Estádio Im e Estádio IIm ou Estádio IIm.
Os estádios III e IV da FIGO são baseados em achados cirúrgicos/anatômicos. A categoria do estádio não é modificada pela classificação molecular; entretanto, para fins de coleta de dados, a classificação molecular, se conhecida, deve ser registrada com o índice apropriado, como Estádio IIIm ou Estádio IVm. Por exemplo, quando a classificação molecular é p53abn, ela deve ser registrada como Estádio IIIm ou Estádio IVm.
Mapeamento do linfonodo sentinela no câncer endometrial
Pode-se considerar o mapeamento de linfonodo sentinela (LNS) para o estadiamento cirúrgico do câncer que parece confinado ao útero (estágio I) (2). Em muitos centros, o mapeamento do LNS é atualmente o padrão para cânceres com histologia de alto risco (isto é, carcinoma seroso papilar, carcinoma de células claras e carcinossarcomas) (3).
O papel do mapeamento LNS no câncer endometrial está sendo avaliado em vários estudos. O estudo FIRES mostrou que, em pacientes com câncer endometrial em estádio clínico I, o mapeamento de LNS com indocianina verde (ICG) é altamente preciso para o diagnóstico de metástases de câncer endometrial; foi recomendado como substituto à linfadenectomia completa (4). O mapeamento do LNS é feito como para câncer do colo do útero utilizando os mesmos marcadores (corante azul, tecnécio-99 [99Tc] ICG). Pode-se realizar o mapeamento de linfonodos sentinela por meio de cirurgia aberta ou minimamente invasiva, como cirurgia assistida por robô ou laparoscopia (5).
É controverso o local onde injetar o marcador em pacientes com carcinoma endometrial. Evidências sugerem que no câncer endometrial, a injeção de ICG no colo do útero resulta em uma taxa de detecção mais alta do que a injeção histeroscópica e em uma distribuição anatômica semelhante nos linfonodos (6). Em geral, injeta-se o corante na colo do útero de modo superficial (1 a 3 mm) e profundo (1 a 2 cm) às 3 e 9 horas. Com essa técnica, o corante penetra nos troncos linfáticos uterinos (que se interseccionam nos paramétrios) e aparece no ligamento largo que leva aos LNSs pélvicos e, ocasionalmente, para-aórticos.
Se forem identificados linfonodos sentinela bilateralmente, não é indicada linfadenectomia, independentemente das características do tumor. Se um lado (ou ambos) não tem linfonodos sentinela identificados, é necessária linfadenectomia completa nesse lado. Cabe ao cirurgião decidir se a dissecção dos linfonodos para-aórticos é necessária.
As causas mais comuns da localização dos LNSs são
Medial aos vasos sanguíneos ilíacos externos
Ventral aos vasos sanguíneos ilíacos internos
Na parte superior da região do obturador
Locais menos comuns são as regiões ilíaca e/ou pré-sacral.
Deve-se fazer linfadenectomia pélvica completa quando qualquer um dos seguintes ocorre:
O mapeamento não detecta nenhum LNS em pacientes com tumores de alto risco.
Uma hemipélvis não pode ser mapeada.
Existem nódulos suspeitos ou grosseiramente ampliados, independentemente do mapeamento.
Um ensaio clínico randomizado em fase III e em andamento (ENDO-3) está avaliando a biópsia de LNS sem dissecção de linfonodo retroperitoneal em comparação com nenhuma dissecção nodal no carcinoma endometrioide, carcinoma de células claras, carcinoma seroso ou carcinossarcoma, em estádio clínico 1 da FIGO grau 1 a 3 (7).
Referências sobre diagnóstico
1. ACOG (American College of Obstetricians and Gynecologists) Committee Opinion No. 734: The role of transvaginal ultrasonography in evaluating the endometrium of women with postmenopausal bleeding. Obstet Gynecol 131 (5):e124-e129, 2018. doi: 10.1097/AOG.0000000000002631
2. Cusimano MC, Vicus D, Pulman K, et al: Assessment of sentinel lymph node Biopsy vs lymphadenectomy for intermediate- and high-grade endometrial cancer staging. JAMA Surg 156 (2):157–164, 2021. doi: 10.1001/jamasurg.2020.5060
3. Schlappe BA, Weaver AL, McGree ME, et al: Multicenter study comparing oncologic outcomes after lymph node assessment via a sentinel lymph node algorithm versus comprehensive pelvic and paraaortic lymphadenectomy in patients with serous and clear cell endometrial carcinoma. Gynecol Oncol 156 (1):62–69, 2020. doi: 10.1016/j.ygyno.2019.11.002
4. Rossi EC, Kowalski LD, Scalici J, et al: A comparison of sentinel lymph node biopsy to lymphadenectomy for endometrial cancer staging (FIRES trial): A multicentre, prospective, cohort study. Lancet Oncol 18 (3):384–392, 2017. doi: 10.1016/S1470-2045(17)30068-2
5. Segarra-Vidal B, Dinoi G, Zorrilla-Vaca A, et al: Minimally invasive compared with open hysterectomy in high-risk endometrial cancer. Obstet Gynecol 138 (6):828–837, 2021. doi: 10.1097/AOG.0000000000004606
6. Rossi EC, Jackson A, Ivanova A, Boggess JF: Detection of sentinel nodes for endometrial cancer with robotic assisted fluorescence imaging: cervical versus hysteroscopic injection. Int J Gynecol Cancer 23 (9):1704–1711, 2013. doi: 10.1097/IGC.0b013e3182a616f6
7. Obermair A, Nicklin J, Gebski V, et al: A phase III randomized clinical trial comparing sentinel node biopsy with no retroperitoneal node dissection in apparent early-stage endometrial cancer - ENDO-3: ANZGOG trial 1911/2020. Int J Gynecol Cancer 31(12):1595-1601, 2021. doi:10.1136/ijgc-2021-003029
Tratamento do câncer endometrial
Histerectomia total e salpingo-ooforectomia bilateral
Linfadenectomia pélvica e para-aórtica para grau 1 ou 2 com invasão miometrial profunda (> 50%), qualquer grau 3, e para todos os cânceres com histologia de alto risco
Radioterapia pélvica com ou sem quimioterapia para o estádio II ou III
Em geral, recomenda-se terapia multimodal para o estágio IV
(Ver também National Comprehensive Cancer Network (NCCN): NCCN Clinical Practice Guidelines in Oncology: Uterine Neoplasms.)
Deve-se remover o câncer endometrial em bloco, geralmente realizando uma histerectomia total e salpingo-ooforectomia bilateral. Deve-se evitar a fragmentação ou morcelação intraperitoneal do tumor.
Pode-se realizar a cirurgia por qualquer via (vaginal, aberta, robótica, laparoscópica). Para pacientes com tumores restritos ao útero, a cirurgia minimamente invasiva é a abordagem preferível porque sua taxa de complicações peri e pós-operatórias é menor, as internações são mais curtas (1), o custo é menor e os desfechos oncológicos são comparáveis (2).
Evidências geralmente corroboram os desfechos oncológicos comparáveis da cirurgia laparoscópica e da laparotomia. No estudo LAP2 do Gynecologic Oncology Group, mulheres com câncer uterino em estádio clínico I a IIA foram aleatoriamente selecionadas para cirurgia laparoscópica ou laparotomia na proporção de 2 para 1. O estudo não demonstrou inferioridade estatística da abordagem laparoscópica. Contudo, depois de um tempo médio de seguimento de 59 meses, as taxas de sobrevida das duas abordagens foram semelhantes; a taxa de sobrevida geral em 5 anos foi de 90% em ambos os grupos. As taxas de recorrência estimadas em 5 anos também foram semelhantes [14% versus 12% (3)]. O estudo Laparoscopic Approach to Cancer of the Endometrium (LACE) foi um estudo prospectivo, randomizado e internacional que incluiu 760 pacientes com câncer endometrioide uterino em estádio I. Foram aleatoriamente atribuídas para receber histerectomia laparoscópica ou histerectomia aberta. A sobrevida livre da doença em 4,5 anos (82% versus 81%) e a sobrevida geral (mortalidade: 7,4% versus 6,8%) foram semelhantes (4).
Em pacientes com câncer endometrial grau 1 ou 2 e < 50% de invasão, a probabilidade de metástase linfática é < 2% (5). Nessas pacientes, o tratamento é geralmente histerectomia total e salpingo-ooforectomia bilateral por laparotomia, laparoscopia ou cirurgia assistida por robô. Entretanto, para mulheres jovens com adenocarcinoma endometrioide estágio IA ou IB, a preservação dos ovários geralmente é segura e recomendada para preservar a função ovariana.
Se a paciente tem algum dos seguintes, realiza-se também uma linfadenectomia pélvica e para- aórtica (a menos que o mapeamento de LNS tenha identificado LNSs bilaterais):
Câncer grau 1 ou 2 com invasão miometrial profunda (> 50%)
Qualquer tipo de câncer grau 3
Todos os cânceres com histologia de alto risco (carcinoma papiloso seroso, carcinoma de células claras, carcinossarcoma)
Quaisquer nódulos suspeitos ou grosseiramente ampliados, independentemente do mapeamento
Se forem identificados linfonodos sentinela bilateralmente, não é indicada linfadenectomia, independentemente das características do tumor. Se um linfonodo sentinela não é identificado em um dos lados, é necessária linfadenectomia completa nesse lado.
O estágio II ou III do câncer endometrial requer radioterapia pélvica com ou sem quimioterapia. O tratamento para o estádio III do câncer precisa ser individualizado, mas a cirurgia é uma opção; de maneira geral, as pacientes que se submetem à cirurgia e à radioterapia combinadas apresentam melhores prognósticos. Exceto em pacientes com doença parametrial extensa, histerectomia total e salpingo-ooforectomia bilateral devem ser efetuadas.
O tratamento do câncer endometrial em estágio IV varia e depende da paciente, mas, geralmente, envolve a combinação de cirurgia, radioterapia e quimioterapia. Ocasionalmente, também se pode considerar a terapia endócrina.
O tratamento do câncer endometrial em estágio IV varia e depende da paciente, mas, geralmente, envolve a combinação de cirurgia, radioterapia e quimioterapia. Ocasionalmente, também se pode considerar a terapia endócrina (6).
Muitos fármacos citotóxicos (particularmente carboplatina mais paclitaxel) são eficazes. São ministradas para mulheres com câncer metastático ou recorrente. Outra opção é doxorrubicina.
Para o câncer avançado, quimioterapia com carboplatina e paclitaxel tem sido o padrão. No entanto, dados recentes corroboram o uso do lenvatinibe, um inibidor multialvo da tirosina quinase dos receptores do VEGF (fator de crescimento endotelial vascular) e pembrolizumabe, um anticorpo monoclonal que inibe a atividade da proteína da morte celular programada 1 (PD-1). Um estudo recente de fase II mostrou uma taxa de resposta objetiva de 39,6% em pacientes que tomam essa combinação (7).
Câncer avançado ou recorrente
Diversos estudos mostraram um benefício para a terapia mais direcionada para o câncer recorrente como uma alternativa à quimioterapia padrão (geralmente carboplatina e paclitaxel). Em um ensaio clínico de fase II de pacientes com câncer endometrial recorrente, a combinação de everolimo (um inibidor de mTOR) e letrozol (um inibidor de aromatase) mostrou uma taxa de benefício clínico de 40% e uma taxa de resposta objetiva de 32% (8).
Nos pacientes com carcinoma seroso papilar uterino recorrente, a quimioterapia padrão com carboplatina e paclitaxel tem sido a recomendação de rotina. No entanto, dados recentes de um estudo prospectivo de fase II sugerem que a adição de trastuzumabe fornece benefícios adicionais. Nesse ensaio clínico, os pacientes que tiveram carcinoma seroso uterino e que tiveram teste positivo para receptor do fator de crescimento epidérmico humano 2 (HER2)/neu foram randomizados para receber carboplatina mais paclitaxel (braço controle) por 6 ciclos ou carboplatina mais paclitaxel mais trastuzumabe IV (braço experimental). A adição de trastuzumabe aumentou a sobrevida livre de progressão de 8 meses para 12,6 meses (9).
A combinação de quimioterapia e imunoterapia mostrou efeitos sinérgicos no tratamento do câncer de endométrio. Em um ensaio clínico randomizado global, duplo-cego e controlado por placebo em fase III, o dosarlimabe mais carboplatina-paclitaxel em comparação com placebo mais carboplatina-paclitaxel aumentou significativamente a sobrevida livre de progressão (SLP) entre os pacientes com câncer de endométrio avançado (estádio III ou IV) ou recorrente (a SLP aos 24 meses foi de 36,1% no grupo dostarlimabe versus 18,1% no grupo placebo; razão de risco, 0,64) (10). A sobrevida geral aos 24 meses foi de 71,3% com o dostarlimabe e 56,0% com o placebo (razão de risco de mortalidade de 0,64). A análise do subgrupo mostrou um benefício substancial em pacientes com tumores com alta instabilidade de microssatélites/deficientes em proteína de reparo do DNA (a SLP em 24 meses foi de 61,4% no grupo dostarlimabe versus 15,7% no grupo placebo; razão de risco de progressão ou morte, 0,28).
A adição de pembrolizumabe à quimioterapia parece fornecer um benefício adicional à SLP para pacientes com câncer de endométrio avançado ou recorrente. Um ensaio clínico randomizado, duplo-cego, controlado por placebo em fase III em pacientes com câncer de endométrio deficiente em proteínas de reparo do D NA em estádio III-IVB tratado com quimioterapia (paclitaxel mais carboplatina) mais pembrolizumabe em comparação com quimioterapia mais placebo encontrou um aumento na SLP no grupo pembrolizumabe (SLP 74% versus 38%; 13,1 versus 8,7 meses; taxa de risco 0,54) (11).
Prevenção da fertilidade na hiperplasia endometrial e câncer de endométrio precoce
Pacientes com hiperplasia endometrial complexa e atipia têm até 50% de risco de desenvolver câncer endometrial concomitante. O tratamento da hiperplasia endometrial consiste em progestágeno ou cirurgia definitiva, dependendo da complexidade da lesão e do desejo da paciente de preservar a fertilidade.
Se jovens pacientes com tumores de grau 1 e sem invasão miometrial (documentada por RM) desejarem preservar a fertilidade, progesterona, somente, é uma opção. Aproximadamente 46 a 80% das pacientes apresentam resposta completa dentro de 3 meses depois do início da terapia. Depois de 3 meses, as pacientes devem ser avaliadas via D e C (dilation & curettage) para biópsia endometrial.
Alternativamente, o uso de um dispositivo intrauterino (DIU) de liberação de levonorgestrel é cada vez mais utilizado para tratar pacientes com hiperplasia atípica complexa ou câncer endometrial grau 1. Em um estudo prospectivo de grupo único, a taxa de resposta patológica em 12 meses foi de 90,6% no caso de hiperplasia atípica complexa e de 66,7% no caso de câncer endometrial endometrioide de grau 1. Os eventos adversos foram leves; o tratamento não teve efeitos negativos sobre a qualidade de vida (12).
Recomenda-se cirurgia se o tratamento conservador não for eficaz (o câncer endometrial continua presente após 6 a 9 meses do tratamento) ou se as pacientes não mais querem ter filhos. Contraindica-se o tratamento que preserva a fertilidade em pacientes com adenocarcinomas endometrioides de alto grau, carcinoma papiloso seroso uterino, carcinoma de células claras ou carcinossarcoma.
Em mulheres jovens com adenocarcinoma endometrioide estágio IA ou IB, a preservação ovariana é segura e recomendada.
Histologias de alto risco
Carcinoma seroso papilar uterino, carcinomas de células claras e carcinossarcomas são considerados cânceres de alto risco histologicamente agressivos e, portanto, têm maior probabilidade de se disseminarem para fora do útero na apresentação.
Tipicamente, recomenda-se a terapia multimodal para esses tumores endometriais histologicamente agressivos. O tratamento primário é a histerectomia abdominal, a salpingo-ooforectomia bilateral com linfadenectomia pélvica e para-aórtica com biópsia do omento e do peritônio.
Em pacientes com doença extra-uterina aparente, deve-se fazer citorredução para reduzir a maior parte do tumor para não haver doença residual aparente.
A terapia adjuvante para carcinomas papilares serosos e de células claras depende do estágio:
Estádio IA sem invasão miometrial e sem doença residual na amostra da histerectomia: observação e acompanhamento rigorosos (uma abordagem aceitável)
Outros cânceres em estágio IA e IB ou estágio II: geralmente, braquiterapia vaginal seguida de quimioterapia sistêmica com carboplatina e paclitaxel
Doença mais avançada: quimioterapia padrão com carboplatina e paclitaxel
A terapia adjuvante para carcinossarcoma também depende do estágio:
Estádio IA sem invasão miometrial e sem doença residual na amostra da histerectomia: observação e acompanhamento rigorosos (uma abordagem aceitável)
Todos os outros estágios: geralmente quimioterapia sistêmica com ifosfamida e paclitaxel
Referências sobre o tratamento
1. Walker JL, Piedmonte MR, Spirtos NM, et al: Laparoscopy compared with laparotomy for comprehensive surgical staging of uterine cancer: Gynecologic Oncology Group Study LAP2. Clin Oncol 27 (32):5331-5336, 2009. doi: 10.1200/JCO.2009.22.3248
2. Galaal K, Donkers H, Bryant A, Lopes AD: Laparoscopy versus laparotomy for the management of early stage endometrial cancer. Cochrane Database Syst Rev 10 (10):CD006655, 2018. doi: 10.1002/14651858.CD006655.pub3
3. Walker JL, Piedmonte MR, Spirtos NM, et al: Recurrence and survival after random assignment to laparoscopy versus laparotomy for comprehensive surgical staging of uterine cancer: Gynecologic Oncology Group LAP2 Study. J Clin Oncol 30 (7):695–700, 2012. doi: 10.1200/JCO.2011.38.8645
4. Janda M, Gebski V, Davies LC, et al: Effect of total laparoscopic hysterectomy vs total abdominal hysterectomy on disease-free survival among women with stage I endometrial cancer: A randomized clinical trial. JAMA 317 (12):1224-1233, 2017. doi: 10.1001/jama.2017.2068
5. Kumar S, Podratz KC, Bakkum-Gamez JN, et al: Prospective assessment of the prevalence of pelvic, paraaortic and high paraaortic lymph node metastasis in endometrial cancer. Gynecol Oncol 132(1):38-43, 2014. doi:10.1016/j.ygyno.2013.10.002
6. Decruze SB, Green JA: Hormone therapy in advanced and recurrent endometrial cancer: a systematic review. Int J Gynecol Cancer 17(5):964-978, 2007. doi:10.1111/j.1525-1438.2007.00897.x
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Prognóstico para câncer endometrial
O prognóstico é pior para tumores de alto grau, disseminação mais extensa e para pacientes idosas.
As taxas médias de sobrevida em 5 anos para pacientes com câncer endometrial são (1)
Estádio I ou II: 70 a 95%
Estágio III ou IV: 10 a 60%
Em geral, 63% das pacientes ficam livres da doença em 5 anos ≥ após o tratamento.
Referência sobre prognóstico
1. National Cancer Institute's Surveillance, Epidemiology, and End Results (SEER) Program: Cancer Stat Facts: Uterine Cancer. Acessado em 31 de agosto de 2023
Pontos-chave
Câncer de endométrio é um dos cânceres mais comuns em mulheres.
O prognóstico é melhor para os tumores de tipo I, que são adenocarcinomas endometrioides grau 1 ou 2; tendem a ser responsivos ao estrogênio e diagnosticados em uma idade mais jovem.
Recomendar amostragem do endométrio para mulheres com sangramento uterino anormal, particularmente aquelas > 45 anos; a avaliação ultrassonográfica da espessura endometrial é uma alternativa para mulheres na pós-menopausa de risco médio.
Estadiar câncer endometrial cirurgicamente por laparotomia, laparoscopia ou cirurgia assistida por robô.
O tratamento é geralmente histerectomia total, salpingo-ooforectomia bilateral e linfadenectomia e às vezes com radioterapia e/ou quimioterapia.
Considerar o mapeamento do linfonodo sentinela para cânceres que parecem estar confinados ao útero.
Considerar o tratamento com preservação da fertilidade para pacientes com adenocarcinoma endometrioide grau 1 ou hiperplasia atípica complexa endometrial.
Considerar aconselhamento e exame genéticos para pacientes < 50 anos e aquelas com história familiar significativa de câncer endometrial, ovariano e/ou colorretal (síndrome de Lynch [câncer colorretal hereditário sem polipose]).
Informações adicionais
O recurso em inglês a seguir pode ser útil. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo deste recurso.
National Cancer Institute: Endometrial Cancer Treatment: esse site web fornece informações sobre câncer endometrial, sua classificação, estadiamento e tratamento por estádio.