Pneumonite por hipersensibilidade

(Alveolite alérgica extrínseca)

PorJoyce Lee, MD, MAS, University of Colorado School of Medicine
Revisado/Corrigido: jul 2023
Visão Educação para o paciente

A pneumonite por hipersensibilidade é uma síndrome que inclui tosse, dispneia e fadiga causadas pela sensibilização e subsequente hipersensibilidade a antígenos ambientais (em geral, ocupacionais ou domésticos). Existem as formas aguda, subaguda e crônica, caracterizadas por inflamação intersticial e desenvolvimento de granulomas e fibrose, com a exposição a longo prazo. O diagnóstico baseia-se na combinação de história, exame físico, métodos de imagem, lavado broncoalveolar e biópsia. O tratamento em curto prazo é com corticoides; o tratamento em longo é evitar os antígenos e, em caso de fibrose, costuma ser a supressão imunitária.

(Ver também Visão geral da doença pulmonar intersticial.)

Etiologia da pneumonite por hipersensibilidade

Mais de 300 antígenos foram identificados como gatilhos de pneumonite por hipersensibilidade. Os antígenos encontrados na agricultura, nas aves e na contaminação da água respondam por cerca de 75% dos casos.

Os antígenos costumam ser classificados por tipo e ocupação (ver tabela Exemplos de pneumonites por hipersensibilidade); o pulmão do agricultor, causado pela inalação de pó de feno contendo actinomicetos termofílicos, é o protótipo. Existe sobreposição substancial entre pneumonite por hipersensibilidade e bronquite crônica nos fazendeiros, nos quais a bronquite crônica é muito mais comum, ocorre independentemente da condição de tabagista, está relacionada com a exposição ao actinomiceto termofílico e desencadeia achados semelhantes àqueles da pneumonite por hipersensibilidade nos exames diagnósticos.

Tabela

Fisiopatologia da pneumonite por hipersensibilidade

A doença parece representar reação de hipersensibilidade do tipo IV, em que a exposição repetida ao antígeno em indivíduos geneticamente suscetíveis causa alveolite neutrofílica e mononuclear, seguida de infiltração linfocítica intersticial e reação granulomatosa. Com a exposição contínua, ocorre fibrose e obliteração bronquiolar.

Precipitinas circulantes (anticorpos sensíveis ao antígeno) parecem não ter papel etiológico primário e a história clínica de alergia (como asma e alergias sazonais) não constitui fator predisponente. O tabagismo parece retardar ou prevenir o desenvolvimento, talvez pela atenuação da resposta imunitária do pulmão a antígenos inalados. No entanto, o tabagismo pode exacerbar a doença quando esta estiver estabelecida.

A pneumonite por hipersensibilidade pode ser diferenciada de outras doenças clinicamente semelhantes, mas as fisiopatologias são diferentes.

  • A síndrome da poeira tóxica orgânica (micotoxicose pulmonar, febre de grãos), por exemplo, é uma síndrome constituída por febre, calafrios, mialgias e dispneia, que não requer sensibilização anterior e que se admite ser provocada pela inalação de toxinas produzidas por fungos ou outros contaminantes da poeira orgânica.

  • A doença do carregador de silo pode causar insuficiência respiratória, síndrome do desconforto respiratório agudo e bronquiolite obliterante ou bronquite, mas é desencadeada pela inalação de óxidos de nitrogênio tóxicos, produzidos pela silagem de alfafa ou milho recentemente fermentado.

  • A asma ocupacional causa dispneia em indivíduos sensibilizados a antígeno inalado, mas características como obstrução de vias respiratórias, eosinofilia de vias respiratórias e diferenças nos antígenos deflagradores a distinguem da pneumonite por hipersensibilidade.

Sinais e sintomas da pneumonite por hipersensibilidade

Sinais e sintomas tendem a depender do modo de início

  • Aguda

  • Crônica

  • Subaguda

Apenas uma pequena proporção de indivíduos expostos desenvolve sintomas e, na maioria dos casos, somente depois de semanas a meses de exposição e sensibilização.

Pneumonite aguda por hipersensibilidade

A doença aguda ocorre em indivíduos anteriormente sensibilizados, com exposição aguda e de alto nível ao antígeno, manifestando-se por febre, calafrios, tosse, aperto no tórax bilateralmente (como pode ocorrer na asma) e dispneia 4 a 8 horas depois da exposição. Também pode haver anorexia, náuseas e vômito. O exame físico revela taquipneia, estertores inspiratórios difusos de finos a médios e, em quase todos os casos, ausência de sibilos.

Pneumonite crônica por hipersensibilidade

A doença crônica ocorre em indivíduos com exposição crônica em longo prazo e de baixo nível ao antígeno (como nos criadores de pássaros), manifestando-se pelo desenvolvimento de dispneia de esforço ao longo de meses a anos, tosse produtiva, fadiga e perda ponderal. Há poucos achados físicos; não é comum ocorrer baqueteamento digital e não há febre. Nos casos avançados, a fibrose pulmonar provoca sinais e sintomas de insuficiência cardíaca direita e/ou respiratória.

Pneumonite subaguda por hipersensibilidade

A doença subaguda situa-se entre as formas aguda e crônica e manifesta-se por qualquer um dos sintomas, como tosse, dispneia, fadiga e anorexia, os quais se desenvolvem no decorrer de dias a semanas, ou por sintomas agudos sobrepostos aos crônicos.

Diagnóstico da pneumonite por hipersensibilidade

  • TC de alta resolução (TCAR)

  • Testes de função pulmonar

  • Lavado broncoalveolar

  • Exame histológico e testes sorológicos

O diagnóstico da pneumonite por hipersensibilidade exige alto índice de suspeita em pacientes com sintomas compatíveis e história de exposição ocupacional, vocacional ou doméstica. Deve-se considerar pneumonia por hipersensibilidade em pacientes com doença pulmonar intersticial recém-identificada (1). TCAR e testes de função pulmonar são realizados rotineiramente. O lavado broncoalveolar e a biópsia pulmonar podem ser necessárias se os resultados forem inconclusivos. O diagnóstico diferencial é amplo e envolve doenças pulmonares ambientais, sarcoidose, bronquiolite obliterante, doença pulmonar associada a doença reumática sistêmica e outras doenças pulmonares intersticiais.

As pistas na história incluem

  • Pneumonias atípicas recorrentes

  • Início dos sintomas depois de mudar para um novo emprego ou casa

  • Utilização domiciliar de banheira de hidromassagem, sauna, piscina ou outras fontes de água parada ou poluída ou outra exposição regular a elas em outros locais

  • Ter aves como animais de estimação

  • Exacerbação e alívio dos sintomas em ambientes específicos e longe deles

Frequentemente, o exame não é útil para a realização do diagnóstico, embora possam existir sons respiratórios anormais e baqueteamento digital.

Exames de imagem

Classicamente, utilizam-se métodos de imagem nos pacientes com história, sinais e sintomas compatíveis.

A radiografia de tórax não é sensível e nem específica para a detecção da doença e é, com frequência, normal em pacientes com as formas aguda e subaguda. Pode revelar opacidades reticulares e nodulares, habitualmente quando existem sintomas. As radiografias de tórax de pacientes com doença crônica têm maior probabilidade de revelar opacidades reticulares ou nodulares nos lobos superiores, com redução dos volumes pulmonares e aspecto em “favo de mel”, de modo semelhante à fibrose pulmonar idiopática.

É muito mais provável que a TC de alta resolução revele as alterações, sendo considerada o padrão para a avaliação das alterações parenquimatosas na pneumonite por hipersensibilidade. O achado mais típico da CTAR na doença aguda e subaguda é a presença de uma profusão de micronódulos centrolobulares pouco definidos. Ocasionalmente, a atenuação em vidro fosco é o único achado ou o predominante. É habitualmente difuso, mas, às vezes, poupa a periferia do lóbulo secundário. Áreas focais de hiperlucência, semelhantes àquelas observadas na bronquiolite obliterante, podem ser uma característica proeminente em alguns pacientes (p. ex., atenuação em mosaico com aprisionamento de ar na TCAR expiratória).

Na pneumonite crônica por hipersensibilidade, existem sinais de fibrose pulmonar (p. ex., perda de volume lobar, opacidades reticulares/lineares e aspecto em “favo de mel”); nódulos centrolobulares podem estar ausentes. Alguns pacientes com pneumonia por hipersensibilidade crônica e que não fumam revelam sinais de enfisema do lobo superior. A linfadenopatia mediastinal é incomum, distinguindo, desta forma, pneumonite por hipersensibilidade de sarcoidose.

Testes de função pulmonar

Deve-se realizar testes de função pulmonar como parte da avaliação padrão dos casos suspeitos de pneumonite por hipersensibilidade. A doença pode provocar padrão obstrutivo, restritivo, ou misto das alterações das vias respiratórias. Com maior frequência, a doença avançada acarreta defeito restritivo (diminuição dos volumes pulmonares), diminuição da DLCO e hipoxemia. A obstrução das vias respiratórias é incomum na doença aguda, mas pode se desenvolver na doença crônica.

Lavado broncoalveolar

Os resultados do lavado broncoalveolar raramente são específicos para a pneumonite por hipersensibilidade, mas com frequência são um componente da avaliação diagnóstica para sintomas respiratórios crônicos e alterações da função pulmonar. A linfocitose no líquido do lavado (> 40%), com razão CD4+/CD8+ < 1,0 (razão normal ± erro padrão da média = 2,3 ± 0,2), é característica da doença; em comparação, a linfocitose com predominância de CD4+ (razão > 1,0) é mais característica de sarcoidose. Outros achados podem envolver mastocitose > 1% (depois de exposição aguda), neutrofilia e eosinofilia.

O teste de transformação de linfócitos é um ensaio in vitro de sensibilização e é particularmente útil na detecção de sensibilização a metais. O teste pode ser feito no sangue periférico, mas é mais realizado no líquido de lavagem brônquica. Nesse teste, os linfócitos do paciente são expostos a potenciais antígenos. Se os linfócitos transformarem-se em blastos e proliferarem, eles (e, portanto, o paciente) foram previamente sensibilizados para esse antígeno.

Biópsia pulmonar

Pode-se indicar biópsia pulmonar transbrônquica ou cirúrgica quando os testes não invasivos são inconclusivos. Os achados variam, mas tipicamente incluem metaplasia peribronquiolar, granulomas não necrosantes mal formados e pneumonia organizada. A fibrose intersticial pode estar presente nos casos crônicos.

Outros testes

Indicam-se exames adicionais quando houver a necessidade de fundamentar ainda mais o diagnóstico ou para a detecção de outras causas de doença pulmonar intersticial. Precipitinas circulantes (anticorpos precipitantes específicos para o antígeno pressuposto) são sugestivas de uma exposição que pode ser a causa da doença. No entanto, a existência de precipitinas circulantes não é sensível nem específica. A identificação de um antígeno precipitante específico pode exigir que especialistas em higiene industrial façam uma avaliação aerobiológica e/ou microbiológica detalhada do local de trabalho, mas geralmente eles são orientados por fontes estabelecidas de antígenos instigantes (p. ex., Bacillus subtilis nas fábricas de detergentes).

Os testes dérmicos não são úteis e não há eosinofilia.

Os testes úteis na detecção de outras doenças envolvem sorologias e culturas (para psitacose e outras pneumonias) e autoanticorpos (para doença reumática sistêmica). A elevação dos níveis de eosinófilos pode sugerir pneumonias eosinofílicas crônicas. O aumento dos linfonodos hilares e paratraqueais é mais característico de sarcoidose.

Referência sobre diagnóstico

  1. 1. Raghu G, Remy-Jardin M, Ryerson CJ, et al: Diagnosis of hypersensitivity pneumonitis in adults. An Official ATS/JRS/ALAT Clinical Practice Guideline. Am J Respir Crit Care Med 202(3):e36–e69, 2020. doi: 10.1164/rccm.202005-2032ST

Tratamento da pneumonite por hipersensibilidade

  • Corticoides

O tratamento da pneumonite por hipersensibilidade aguda ou subaguda se faz com corticoides, geralmente prednisona, 60 mg por via oral uma vez ao dia, durante 1 a 2 semanas, com redução progressiva no decorrer de 2 a 4 semanas para 20 mg, uma vez ao dia, seguida de reduções semanais de 2,5 mg até a interrupção do fármaco. Esse esquema alivia os sintomas iniciais, mas não parece alterar a evolução a longo prazo.

O tratamento da pneumonite por hipersensibilidade crônica geralmente é com cursos prolongados de prednisona, 30 a 40 mg por via oral uma vez ao dia, com redução gradual dependente da resposta clínica. Alguns pacientes precisam de agentes poupadores de corticoides (como o micofenolato e a azatioprina) para o tratamento de longo prazo.

Prognóstico para pneumonite por hipersensibilidade

As alterações patológicas da pneumonite por hipersensibilidade aguda são completamente reversíveis se detectadas de modo precoce e se a exposição ao antígeno for eliminada. A doença aguda é autolimitada com a interrupção da exposição ao antígeno; os sintomas geralmente diminuem em horas. A doença crônica tem um prognóstico mais complicado: normalmente a fibrose é irreversível, mas não progride se os pacientes não mais forem expostos ao antígeno.

Prevenção da pneumonite por hipersensibilidade

O aspecto mais importante do tratamento de longo prazo da bronquiolite por hipersensibilidade é evitar a exposição a antígenos. A modificação completa do ambiente raramente é factível, em especial para lavradores e outros trabalhadores, para os quais podem ser efetivas as medidas de controle de poeira (como a umidificação do adubo antes da utilização), ou o emprego de filtros de ar ou de máscaras protetoras. É possível utilizar fungicidas para prevenir o crescimento de microrganismos antigênicos (p. ex., no feno ou na cana de açúcar), mas não está estabelecida a segurança desta abordagem a longo prazo. A limpeza extensa dos sistemas de ventilação umidificada, a remoção de carpetes úmidos e a manutenção de baixa umidade também são efetivas em alguns ambientes. Os pacientes devem ser informados, contudo, de que essas medidas podem ser inadequadas se a exposição continuar.

Pontos-chave

  • A pneumonite por hipersensibilidade é uma reação de hipersensibilidade tipo IV que pode ser desencadeada por uma ampla variedade de alérgenos.

  • Nos pacientes com risco e que têm sintomas compatíveis, obter história detalhada da exposição ocupacional, não vocacional e doméstica.

  • Fazer TC de alta resolução, provas de função pulmonar e, se o diagnóstico não for claro, possivelmente lavado broncoalveolar com biópsia.

  • Tratar a maioria dos pacientes com prednisona oral.

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