Doença de Hirschsprung

(Megacolo congênito)

PorJaime Belkind-Gerson, MD, MSc, University of Colorado
Reviewed ByAlicia R. Pekarsky, MD, State University of New York Upstate Medical University, Upstate Golisano Children's Hospital
Revisado/Corrigido: modificado ago. 2025
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Visão Educação para o paciente

A doença de Hirschsprung é uma anomalia congênita que consiste na aganglionose colônica (e, portanto, na falta da inervação) do intestino grosso, geralmente limitada ao colo, resultando em obstrução funcional parcial ou total. Os sintomas são de obstipação e distensão. O diagnóstico pode ser sugerido pela avaliação com enema baritado; o diagnóstico definitivo requer biópsia retal (biópsia por sucção ou biópsia cirúrgica). Manometria anal pode ajudar a avaliar e revelar falta de relaxamento do músculo esfíncter interno do ânus após distensão por balão retal. O tratamento é cirúrgico.

(Ver também Visão geral das anomalias gastrointestinais congênitas.)

A doença de Hirschsprung, às vezes abreviada como HSCR, é causada pela ausência congênita do plexo autônomo de Meissner e Auerbach (aganglionose) na parede intestinal. Acredita-se que a etiologia da aganglionose seja a falha da migração dos neuroblastos a partir da crista neural.

A incidência estimada da doença de Hirschsprung é 1 em 5.000 nascidos vivos (1, 2).

Com frequência, a doença limita-se ao segmento distal do colo (75% dos casos), mas pode envolver todo o colo (3-10% dos casos) e mesmo os intestinos delgado e grosso; a área denervada sempre é contígua (3). Os homens são os mais afetados (proporção homem:mulher 4:1), exceto quando o colo inteiro está envolvido, quando então não há diferença entre os sexos.

Referências gerais

  1. 1. Mueller JL, Goldstein AM. The science of Hirschsprung disease: What we know and where we are headed. Semin Pediatr Surg. 2022;31(2):151157. doi:10.1016/j.sempedsurg.2022.151157

  2. 2. Montalva L, Cheng LS, Kapur R, et al. Hirschsprung disease. Nat Rev Dis Primers. 2023;9(1):54. Publicado em 2023 Out 12. doi:10.1038/s41572-023-00465-y

  3. 3. Urla C, Lieber J, Obermayr F, et al. Surgical treatment of children with total colonic aganglionosis: functional and metabolic long-term outcome. BMC Surg. 2018;18(1):58. Publicado em 2018 Ago 15. doi:10.1186/s12893-018-0383-6

Patogênese da doença de Hirschsprung

Há um componente genético significativo e complexo na doença de Hirschsprung e > 40 genes diferentes estão associados à patogênese (1). Em 20% dos casos, acredita-se que a doença seja causada por uma mutação genética única, enquanto no restante dos casos, pensa-se que múltiplas mutações genéticas sejam a causa. Em 12% dos casos, a doença de Hirschsprung está associada a uma anormalidade cromossômica como síndrome de Down.

Cerca de 20 a 30% dos pacientes com doença de Hirschsprung têm outras anomalias congênitas. Por exemplo, cerca de 20% dos pacientes com síndrome de hipoventilação central congênita também apresentam doença de Hirschsprung; a combinação é chamada síndrome de Haddad. Outras doenças associadas à doença de Hirschsprung incluem a síndrome de Waardenburg, síndrome de Bardet-Biedl, síndrome de Goldberg-Shprintzen e hipoplasia cartilaginosa e pilosa.

A probabilidade de recorrência da doença entre familiares aumenta conforme a extensão do intestino envolvido — de 4% no geral até 50% nos casos em que a doença envolve todo o cólon.

Dicas e conselhos

  • Cerca de 20 a 30% dos pacientes com doença de Hirschsprung têm outras anomalias congênitas.

O peristaltismo no segmento envolvido está ausente ou anormal, resultando em espasmo contínuo da musculatura lisa e obstrução parcial ou completa com acúmulo do conteúdo intestinal e dilatação do intestino proximal que é inervado normalmente. “Lesões intercaladas” quase nunca ocorrem.

Referência sobre patogênese

  1. 1. Montalva L, Cheng LS, Kapur R, et al. Hirschsprung disease. Nat Rev Dis Primers. 2023;9(1):54. Publicado em 2023 Out 12. doi:10.1038/s41572-023-00465-y

Sinais e sintomas da doença de Hirschsprung

A manifestação ocorre mais comumente no início da vida, mas alguns pacientes só a manifestam na infância ou mesmo na idade adulta.

Normalmente, quase todos os neonatos passam mecônio nas primeiras 24 horas de vida. A maioria dos neonatos com doença de Hirschsprung não consegue eliminar mecônio nas primeiras 48 horas de vida (1). O lactente manifesta obstipação, distensão abdominal e, por fim, vômitos como nas outras formas de obstrução intestinal distal. Às vezes, lactentes com aganglionose segmentar ultracurta apresentam apenas obstipação intermitente leve, muitas vezes com surtos de diarreia leve, o que faz retardar o diagnóstico.

Lactentes também podem ter insuficiência de crescimento. Menos comumente, os lactentes podem apresentar enterocolite associada à doença de Hirschsprung.

Em lactentes mais velhos e crianças maiores, os sinais e sintomas podem incluir anorexia, obstipação, dificuldade de ganhar peso, ausência do reflexo de evacuação e, ao exame, um reto vazio com fezes palpáveis na parte alta do colo e uma passagem repentina de fezes estimulada pelo toque do examinador (sinal da explosão).

Referência sobre sinais e sintomas

  1. 1. Bradnock TJ, Knight M, Kenny S, Nair M, Walker GM; British Association of Paediatric Surgeons Congenital Anomalies Surveillance System. Hirschsprung's disease in the UK and Ireland: incidence and anomalies. Arch Dis Child. 2017;102(8):722-727. doi:10.1136/archdischild-2016-311872

Diagnóstico da doença de Hirschsprung

  • Enema baritado

  • Aspiração retal ou biópsia cirúrgica

  • Manometria retal

Deve-se fazer o diagnóstico da doença de Hirschsprung o mais rápido possível. Quanto mais tempo a doença permanecer não tratada, maior a probabilidade de desenvolver enterocolite associada à doença de Hirschsprung, uma complicação que pode ser fulminante e fatal. A maioria dos pacientes pode ser diagnosticada no início da infância.

A abordagem inicial é normalmente feita com o enema baritado e/ou biópsia retal por sucção. (NOTA: Não se deve fazer enema baritado em pacientes com suspeita de enterocolite associada à doença de Hirschsprung por causa do risco de perfuração.) O enema baritado pode mostrar o diâmetro de transição entre o colo dilatado, normalmente inervado proximal ao segmento distal estreitado com inervação ausente. O enema baritado deve ser feito sem preparo prévio, o qual pode dilatar o segmento anormal e descomprimir o colo proximal, o que não permite fazer um diagnóstico correto. Como dados característicos podem estar ausentes no período neonatal, a radiografia pode ser feita 24 horas após a evacuação; se revelar colo ainda cheio de bário, o diagnóstico de doença de Hirschsprung torna-se provável.

A biópsia retal pode demonstrar a ausência de células ganglionares. A coloração para a acetilcolinesterase pode ajudar a realçar os troncos nervosos dilatados; a coloração com calretina pode ser feita para detectar a ausência de inervação da mucosa (1).

Alguns centros também podem fazer manometria retal, que normalmente revela a falta de relaxamento do esfíncter anal interno após a insuflação do balão no reto, que é característica da inervação anormal.

O diagnóstico definitivo requer biópsia cirúrgica ou por sucção do reto e, em seguida, biópsias cirúrgicas para mapear a extensão da doença e, assim, planejar o tratamento cirúrgico.

Teste genético não é rotineiro, mas pode ser feito se a avaliação mostrar manifestações de uma síndrome genética ou nos casos de aganglionose colônica total.

Doença de Hirschsprung
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Esse enema baritado mostra aganglionose até a flexura esplênica. O intestino aganglionar é estreito e espástico (à direita), ao passo que o intestino proximal normalmente inervados (topo) é dilatado e preenchido com material fecal.

By permission of the publisher. From Wald A: Gastroenterology and Hepatology: Colon, Rectum, and Anus. Editado por M Feldman (editor da série) and CR Boland. Philadelphia, Current Medicine, 1996.

Dicas e conselhos

  • O enema baritado para a doença de Hirschsprung deve ser realizado, se possível, em um cólon despreparado (sem enemas anteriores ou outra descompressão retal), mas apenas se não houver suspeita de enterocolite associada à doença de Hirschsprung.

Referência sobre diagnóstico

  1. 1. Claxton HL, Lounis SA, Stanton M, Hall NJ, Aldeiri B. The Diagnostic Value of Immunohistochemistry Markers in Hirschsprung Disease; A Systematic Review and Meta-analysis. J Pediatr Surg. 2025;60(2):162010. doi:10.1016/j.jpedsurg.2024.162010

Tratamento da doença de Hirschsprung

  • Correção cirúrgica

O tratamento da doença de Hirschsprung é a correção cirúrgica aproximando o intestino normalmente inervado ao ânus com a preservação dos esfíncteres anais. No neonato com doença de segmento longo, isso geralmente requer um procedimento em 2 etapas, começando com uma colostomia proximal ao segmento aganglionar para descomprimir o cólon (1). Em seguida, esperou-se até que o neonato crescesse antes do 2º estágio do procedimento, em que toda a porção aganglionar do colo foi ressecada e foi realizado um procedimento de abaixamento (pull-through). No neonato com doença de segmento curto, um procedimento em 1 estágio é realizado no diagnóstico ou após um atraso de 1 a 3 meses. Resultados com o uso da laparoscopia são semelhantes aos da cirurgia a céu aberto, com período de hospitalização menor, realimentação mais cedo e menos dor.

Após a reparação definitiva, o prognóstico é bom, embora algumas crianças tenham dismotilidade crônica com obstipação e/ou problemas obstrutivos.

Treatment reference

  1. 1. Montalva L, Cheng LS, Kapur R, et al. Hirschsprung disease. Nat Rev Dis Primers. 2023;9(1):54. Publicado em 2023 Out 12. doi:10.1038/s41572-023-00465-y

Pontos-chave

  • Desnervação congênita afeta o colo distal e menos frequentemente as regiões maiores do colo e, às vezes, até mesmo o intestino delgado.

  • Lactentes normalmente apresentam achados de obstrução intestinal distal, como obstipação, distensão abdominal e vômitos.

  • Achados do enema baritado (feito sem preparação prévia) e manometria retal são altamente sugestivos; o diagnóstico é confirmado por biópsia retal.

  • O segmento afetado é removido cirurgicamente, e o segmento normal é tracionado até o ânus.

Enterocolite associada à doença de Hirschsprung (megacólon tóxico)

Enterocolite associada à doença de Hirschsprung é uma complicação da doença de Hirschsprung com risco de morte, provocada por aumento exagerado do colo, seguido, muitas vezes, de sepse e choque.

A etiologia da enterocolite associada à doença de Hirschsprung (HAEC) parece relacionar-se à dilatação proximal acentuada secundária à obstrução, com adelgaçamento da parede do cólon, supercrescimento bacteriano e translocação bacteriana. Sepse ou choque podem se desenvolver (mais frequentemente quando todo o cólon é afetado pela doença de Hirschsprung), e a morte pode ocorrer rapidamente; entretanto, com o tratamento, a mortalidade é rara (1–3). Até 20% dos lactentes nascidos a termo com doença de Hirschsprung podem desenvolver HAEC; portanto, é fundamental o monitoramento rigoroso desses lactentes.

A enterocolite associada à doença de Hirschsprung ocorre mais comumente nos primeiros meses de vida, antes da correção cirúrgica, mas também pode ocorrer no primeiro ano após a cirurgia. Lactentes com síndrome de Down têm maior risco de desenvolver essa complicação no pós-operatório. Lactentes apresentam febre (neonatos com instabilidade térmica), distensão abdominal, diarreia (que pode ser sanguinolenta ou explosiva) e, subsequentemente, obstipação.

Não se deve fazer enema baritado em pacientes com suspeita de enterocolite associada à doença de Hirschsprung por causa do risco de perfuração.

O tratamento inicial da enterocolite associada à doença de Hirschsprung é de suporte com repouso intestinal, reanimação com líquidos, descompressão com sondas nasogástrica e retal e antibióticos de amplo espectro para incluir cobertura anaeróbica (p. ex., metronidazol com ampicilina e gentamicina, aztreonam ou piperacilina/tazobactam) (4). Alguns especialistas defendem a irrigação retal em lactentes que não estão em condição crítica para limpar o cólon, mas o procedimento deve ser realizado com cuidado para não aumentar a pressão colônica e causar perfuração.

A cirurgia é o tratamento definitivo para lactentes que ainda não passaram por reparo cirúrgico, bem como para aqueles com perfuração ou necrose intestinal. Para lactentes que podem ser estabilizados, pode-se realizar o tratamento cirúrgico definitivo em vez da abordagem padrão prévia utilizando uma ileostomia ou colostomia de desvio. Deve-se realizar a abordagem padrão prévia em lactentes com doença grave.

Referências

  1. 1. Pruitt LCC, Skarda DE, Rollins MD, Bucher BT. Hirschsprung-associated enterocolitis in children treated at US children's hospitals. J Pediatr Surg. 2020;55(3):535-540. doi:10.1016/j.jpedsurg.2019.10.060

  2. 2. Chantakhow S, Tepmalai K, Singhavejsakul J, Tantraworasin A, Khorana J. Prognostic factors of postoperative Hirschsprung-associated enterocolitis: a cohort study. Pediatr Surg Int. 2023;39(1):77. Publicado em 2023 Jan 9. doi:10.1007/s00383-023-05364-7

  3. 3. Montalva L, Cheng LS, Kapur R, et al. Hirschsprung disease. Nat Rev Dis Primers. 2023;9(1):54. Publicado em 2023 Out 12. doi:10.1038/s41572-023-00465-y

  4. 4. Gosain A, Frykman PK, Cowles RA, et al. Guidelines for the diagnosis and management of Hirschsprung-associated enterocolitis. Pediatr Surg Int. 2017;33(5):517-521. doi:10.1007/s00383-017-4065-8

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