Anafilaxia

PorJames Fernandez, MD, PhD, Cleveland Clinic Lerner College of Medicine at Case Western Reserve University
Revisado/Corrigido: out 2022
Visão Educação para o paciente

Anafilaxia é uma reação alérgica aguda potencialmente fatal mediada por IgE que ocorre em pessoas previamente sensibilizadas quando são expostas novamente ao antígeno sensibilizador. Os sintomas podem incluir estridor, dispneia, sibilos e hipotensão. O diagnóstico é clínico. O tratamento é com adrenalina. Broncoespasmo e edema das vias respiratórias superiores podem exigir beta-agonistas inaláveis ou injetáveis e, às vezes, entubação endotraqueal. Hipotensão persistente exige líquidos IV e, às vezes, vasopressores.

(Ver também Visão geral dos distúrbios alérgicos e atópicos.)

É difícil determinar a prevalência da anafilaxia, mas um estudo utilizando 2 pesquisas públicas realizadas nos Estados Unidos sugeriu que a prevalência é de cerca de 1,6% da população adulta em geral. A anafilaxia fatal é muito menos comum; ocorre em < 1 por milhão de habitantes (1).

Referência geral

  1. 1. Ma L, Danoff TM, Borish L: Case fatality and population mortality associated with anaphylaxis in the United States. J Allergy Clin Immunol 133 (4):1075–1083, 2014. doi: 10.1016/j.jaci.2013.10.029

Etiologia da anafilaxia

A anafilaxia normalmente é desencadeada por

  • Fármacos (p. ex., antibióticos beta-lactâmicos, insulina, estreptoquinase, extratos alergênicos)

  • Alimentos (p. ex., oleaginosas, ovos, frutos do mar)

  • Proteínas (p. ex., antitoxina para tétano, transfusões de sangue)

  • Venenos de animais

  • Látex

Alérgenos do amendoim e látex podem ser transportados pelo ar. Ocasionalmente, exercício ou exposição ao frio podem provocar ou contribuir para uma reação anafilática.

História de atopia não aumenta o risco de anafilaxia, mas aumenta o risco de morte quando a anafilaxia ocorre.

Fisiopatologia da anafilaxia

A interação do antígeno com IgE nos basófilos e mastócitos desencadeia a liberação de histamina, leucotrienos e outros mediadores que causam contração difusa do músculo liso (p. ex., resultando em broncoconstrição, vômitos ou diarreia) e vasodilatação com extravasamento de plasma (p. ex., resultando em urticária ou angioedema).

Reaçõs anafilactoides

As reações anafilactoides são clinicamente indiferenciáveis da anafilaxia, mas não contêm IgE e não exigem sensibilização prévia. Elas ocorrem via estimulação direta dos mastócitos ou via complexos imunes que ativam o complemento.

Os gatilhos mais comuns das reações anafiláticas são

  • Meios de contraste radiopacos iodados

  • Ácido acetilsalicílico e outros anti-inflamatórios não esteroides (AINEs)

  • Opioides

  • Anticorpos monoclonais

  • Exercício

Sinais e sintomas da anafilaxia

Os sintomas de anafilaxia normalmente começam em 15 minutos depois da exposição e envolvem a pele, vias respiratórias superiores ou inferiores, sistema cardiovascular e/ou trato gastrintestinal. Uma ou mais áreas podem ser afetadas, e os sintomas não necessariamente progridem de leves (p. ex., urticária) para graves (p. ex., obstrução das vias respiratórias, choque refratário), embora cada paciente costume manifestar a mesma reação na exposição subsequente.

Os sintomas variam de leves a graves e incluem rubor, prurido, urticária, espirros, rinorreia, náuseas, cólicas abdominais, diarreia, uma sensação de asfixia ou dispneia, palpitação e tonturas.

Os sinais de anafilaxia incluem hipotensão, taquicardia, urticária, angioedema, sibilos, estridor, cianose e síncope. Pode haver choque em minutos, e os pacientes podem ter convulsões, tornar-se não responsivos e morrer. Colapso cardiovascular pode ocorrer sem sintomas respiratórios ou outros sintomas.

Reações de fase tardia podem ocorrer 4 a 8 horas após a exposição ou mais tarde. Os sinais e sintomas geralmente são menos graves do que foram inicialmente e podem limitar-se à urticária; entretanto, podem ser mais graves ou fatais. Portanto, deve-se observar os pacientes com reação anafilática em uma unidade de pronto-atendimento por várias horas após a reação inicial.

Diagnóstico da anafilaxia

  • Avaliação clínica

  • Às vezes, a medição dos níveis urinários de triptase

O diagnóstico da anafilaxia é clínico. Deve-se suspeitar de anafilaxia se qualquer um dos seguintes ocorrer subitamente sem explicação:

  • Choque

  • Sintomas respiratórios (p. ex., dispneia, estridor, sibilos)

  • Duas ou mais outras manifestações de uma possível anafilaxia (p. ex., angioedema, rinorreia, sintomas gastrintestinais)

O risco de progressão rápida para choque não deixa tempo para testes, embora casos leves e duvidosos possam ser confirmados medindo os níveis séricos de triptase (preferencialmente 2 horas após a reação). Durante a anafilaxia, esses níveis são elevados, e medi-los pode ajudar a confirmar o diagnóstico se este não estiver claro ou se os sintomas recorrerem (p. ex., após tratamento com fármacos IV).

A causa geralmente é facilmente reconhecida com base na história. Se profissionais de saúde têm sintomas anafiláticos não explicáveis, alergia ao látex deve ser considerada.

Dicas e conselhos

  • Considerar alergia ao látex em profissionais de saúde com sintomas anafiláticos não explicáveis.

Tratamento da anafilaxia

  • Adrenalina administrada imediatamente

  • Às vezes, entubação

  • Líquidos IV e, às vezes, vasopressores para hipotensão persistente

  • Anti-histamínicos

  • Beta-agonistas inalados para broncoespasmo

Tratam-se as reações anafilactoides de forma semelhante às reações anafiláticas.

Adrenalina

A adrenalina é a base do tratamento para a anafilaxia; ela pode ajudar a aliviar todos os sinais e sintomas e deve ser administrada imediatamente.

[A adrenalina pode ser administrada por via subcutânea ou IM [a dose habitual é de 0,3 a 0,5 mL de solução a 1:1.000 (0,1%) em adultos ou 0,01 mL/kg em crianças, repetida a cada 5 a 15 minutos]. A absorção máxima ocorre quando o fármaco é administrado por via intramuscular na face anterolateral (do centro para fora) da coxa.

O tratamento da parada cardíaca é de acordo com os protocolos padrão. Pacientes com hipotensão ou obstrução grave das vias respiratórias podem receber adrenalina IV ou intraóssea (IO). Prefere-se o gotejamento contínuo usando uma bomba de infusão, mas se o atraso para preparar o gotejamento e a bomba for inaceitável, pode-se administrar a adrenalina em uma dose IV lenta única, em bolus de 0,05 a 0,1 mg [0,5 a 1 mL de uma solução a 0,1 mg/mL (1:10.000) durante 1 a 2 minutos]. No caso do gotejamento contínuo, mistura-se 1 mg de adrenalina em 250 mL de solução salina a 5% ou solução salina a 0,9% para uma concentração de 4 mcg/mL; inicia-se a 0,1 mcg/kg/minuto e titula-se 0,05 mcg/kg/min a cada 2 a 3 minutos, como necessário, dependendo da pressão arterial, frequência cardíaca e oxigenação. Se não for possível estimar precisamente o peso do paciente, a dose inicial recomendada para adultos é de 1 a 2 mcg/minuto, aumentada em 2 a 4 mcg/min a cada 2 a 3 minutos. Se um bolus inicial for desejável, mas o acesso IV tardar, pode-se também administrar 0,2 a 0,25 mg de adrenalina por meio do tubo endotraqueal (2 a 2,5 mL de uma solução de 0,1 mg/mL diluída em 5 a 10 mL de água ou solução salina estéril); alternativamente, pode-se administrar uma segunda dose IM de adrenalina.

Glucagon 1 a 5 mg IV durante 5 minutos (20 a 30 mcg/kg em crianças), seguido de infusão de 5 a 15 mcg/minuto, foi recomendado para pacientes tomando betabloqueadores orais, que atenuam o efeito da adrenalina. Contudo, algumas evidências sugerem que os pacientes em uso de betabloqueadores não são menos responsivos à adrenalina (1, 2. 3). A administração rápida de glucagon pode causar vômitos.

Outros tratamentos

Pacientes com estridor e sibilos que não respondem à adrenalina devem receber oxigênio e ser entubados. Recomenda-se a entubação precoce porque a espera de uma resposta à adrenalina pode permitir que o edema das vias respiratórias superiores progrida o suficiente para impedir a entubação endotraqueal e exigir uma cricotireotomia.

Hipotensão muitas vezes desaparece depois que é administrada adrenalina. Hipotensão persistente geralmente pode ser tratada com 1 a 2 L (20 a 40 mL/kg em crianças) de líquidos IV isotônicos (p. ex., soro fisiológico a 0,9%). Hipotensão refratária a líquidos e adrenalina IV pode exigir vasopressores (p. ex., dopamina, 5 mcg/kg/minuto).

Anti-histamínicos—tanto bloqueadores dos receptores H1 (p. ex., difenidramina, 50 a 100 mg por via intravenosa) como bloqueadores de H2 (p. ex., cimetidina, 300 mg, IV) —devem ser administrados a cada 6 horas até os sintomas desaparecerem.

Beta-agonistas inaláveis são úteis para o manejo do broncoespasmo que persiste após o tratamento com adrenalina; albuterol, 5 a 10 mg, por nebulização contínua pode ser administrado.

Corticoides não têm eficácia comprovada, mas podem ajudar a prevenir uma reação de fase tardia; metilprednisolona, 125 mg IV é inicialmente adequada.

Referências sobre o tratamento

  1. 1. White JL, Greger KC, Lee S, et al: Patients taking β-Blockers do not require increased doses of epinephrine for anaphylaxis. J Allergy Clin Immunol Pract 6 (5):1553–1558.e1, 2018. doi: 10.1016/j.jaip.2017.12.020

  2. 2. Sturm GJ, Herzog SA, Aberer W, et al: β-blockers and ACE inhibitors are not a risk factor for severe systemic sting reactions and adverse events during venom immunotherapy. Allergy 76 (7):2166–2176, 2021. doi: 10.1111/all.14785

  3. 3. Tejedor-Alonso MA, Farias-Aquino E, Elia Pérez-Fernández E, et al: Relationship between anaphylaxis and use of beta-blockers and angiotensin-converting enzyme inhibitors: A systematic review and meta-analysis of observational studies. J Allergy Clin Immunol Pract 7 (3):879–897.e5, 2019. doi: 10.1016/j.jaip.2018.10.042

Prevenção da anafilaxia

A prevenção primária da anafilaxia é evitar os gatilhos conhecidos. Utiliza-se dessensibilização para gatilhos alergênicos que não podem ser evitados com segurança (p. ex., picadas de insetos).

Não se deve reexpor os pacientes com reações anafiláticas a um agente de contraste radiopaco anteriores. Quando a exposição é absolutamente necessária, os pacientes recebem 3 doses de prednisona, 50 mg por via oral a cada 6 horas, começando 18 horas antes do procedimento, e 50 mg de difenidramina, por via oral, 1 hora antes do procedimento; mas há poucas evidências apoiando a eficácia dessa abordagem.

Pacientes com reação anafilática a picadas de insetos, alimentos ou outras substâncias conhecidas devem usar um bracelete de alerta e levar consigo uma seringa autoinjetável pré-preenchida com adrenalina (contendo 0,3 mg para adultos e 0,15 mg para crianças) e anti-histamínicos orais para autotratamento imediato após a exposição. Se ocorrer reação grave, deve-se aconselhar os pacientes a usar esses tratamentos o mais rápido possível e então encaminhá-los a um pronto-socorro. Lá, eles podem ser monitorados atentamente e o tratamento pode ser repetido ou ajustado conforme necessário.

Pontos-chave

  • Os gatilhos comuns da anafilaxia incluem fármacos (p. ex., antibióticos beta-lactâmicos, extratos alergênicos), alimentos (p. ex., oleaginosas, frutos do mar), proteínas (p. ex., antitoxina do tétano, transfusões de sangue), venenos de animais e látex.

  • As reações não mediadas pela IgE que têm manifestações do tipo anafilática (reações anafilactoides) podem ser causadas por corante iodado radiopaco, ácido acetilsalicílico, outros AINEs, opioides, anticorpos monoclonais e exercícios físicos.

  • Considerar a anafilaxia caso o paciente apresente hipotensão inexplicável, sintomas respiratórios, ou ≥ 2 manifestações anafiláticas (p. ex., angioedema, rinorreia, sintomas gastrintestinal).

  • Administrar adrenalina imediatamente, porque os sintomas anafiláticos podem progredir rapidamente para oclusão das vias respiratórias ou choque; a adrenalina pode ajudar a aliviar os sintomas.

  • Instruir os pacientes a sempre usar uma pulseira de alerta e transportar uma seringa de epinefrina pré-cheia e auto-injetável para autotratamento imediato após a exposição.

Informações adicionais

O recurso em inglês a seguir pode ser útil. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo deste recurso.

  1. Anaphylaxis—a 2020 practice parameter update, systematic review, and grading of recommendations, assessment, development and evaluation (GRADE) analysis. Esse artigo discute a epidemiologia, fatores de risco, a patogênese, o diagnóstico e o tratamento da anafilaxia. Avalia os benefícios e danos relativos dos suplementos de glicocorticoides e/ou pré-medicação com anti-histamínicos para prevenir a anafilaxia e as evidências desses tratamentos. O artigo também fornece recomendações sobre o tratamento.

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