Condução do trabalho de parto normal

PorRaul Artal-Mittelmark, MD, Saint Louis University School of Medicine
Revisado/Corrigido: mai 2021
Visão Educação para o paciente

O trabalho de parto consiste em uma série de contrações rítmicas, involuntárias ou clinicamente induzidas do útero que resultam em apagamento (afinamento e encurtamento) e dilatação do colo do útero. A Organização Mundial da Saúde (OMS) define parto normal como:

  • O nascimento tem um início espontâneo e é de baixo risco no começo do trabalho de parto e permanece assim durante todo o trabalho de parto e o parto.

  • O lactente nasce espontaneamente na posição cefálica entre 37 e 42 semanas da gestação.

  • Após o nascimento, mãe e lactente estão em boas condições (1).

Não se sabe o que causa o estímulo para o trabalho de parto, mas a manipulação digital ou o alargamento manual do colo durante o exame acentuam a contratilidade uterina, muito provavelmente pela estimulação da liberação de ocitocina pela glândula hipófise posterior.

O trabalho de parto normal geralmente começa dentro de 2 semanas (antes ou depois) da data prevista para o parto. Na primeira gestação, o trabalho de parto leva em média 12 a 18 horas; partos subsequentes são geralmente mais breves, em média de 6 a 8 horas.

O tratamento das complicações durante o trabalho parto requerem medidas adicionais (p. ex., indução do parto, fórceps ou extrator a vácuo, cesariana).

(Ver também Anormalidades e complicações do trabalho de parto e do parto.)

Referência geral

  1. 1. Technical Working Group, World Health Organization: Care in normal birth: A practical guide. Birth Issues in Perinatal Care 24(2):121–123, 2008. doi: 10.1111/j.1523-536X.1997.00121.pp.x

Início do trabalho de parto

A ruptura das membranas corioamnióticas ou a saída do tampão mucoso indicam o início do trabalho de parto.

A perda do tampão mucoso (pequena quantidade de sangue com muco que sai do colo) pode preceder o início do trabalho de parto em até 72 horas. O tampão pode ser diferenciado do sangramento vaginal anormal do 3º trimestre, pois há menos sangue, tipicamente misturado com muco e a dor, devido ao descolamento prematuro da placenta (abruptio placentae), não está presente. Na maioria das gestantes, realizou-se ultrassonografia de rotina prévia e descartou-se placenta prévia. Porém, deve-se assumir a presença de placenta prévia se a ultrassonografia não tiver excluído as chances e o sangramento tenha ocorrido. Nesses casos, contraindica-se o exame vaginal digital e realiza-se ultrassonografia assim que possível para determinar a localização da placenta e descartar descolamento prematuro da placenta.

O trabalho de parto começa com contrações uterinas irregulares de intensidade variável; essas contrações parecem amolecer (amadurecer) o colo, que começa a se apagar e dilatar. À medida que o parto se desenvolve, aumentam a duração, intensidade e frequência das contrações.

Estágios do trabalho de parto

São 3 as fases do parto.

A 1ª fase — do início do trabalho de parto até a dilatação total do colo (cerca de 10 cm) — compreende 2 períodos, latente e ativo.

Durante a fase latente, as contrações irregulares tornam-se progressivamente coordenadas, o desconforto é mínimo e o colo se apaga e dilata até 4 cm. O período latente é variável, sendo difícil precisar o tempo de duração, variando, em média, 8 horas em nulíparas e 5 horas em multíparas; a duração é considerada anormal se for > 20 horas em nulíparas e > 12 horas em multíparas.

Durante a fase ativa, o colo se torna plenamente dilatado e a apresentação fetal insinua-se na pelve média. Em média, a fase ativa dura de 5 a 7 horas em nulíparas e de 2 a 4 horas em multíparas. Tradicionalmente, deve-e esperar que a colo do útero dilate-se 1,2 cm/hora em nulíparas e 1,5 cm/hora em multíparas. Entretanto, dados recentes sugerem que a progressão mais lenta da dilatação cervical de 4 a 6 cm pode ser normal (1). O exame pélvico é feito a cada 2 a 3 horas a fim de se avaliar o progresso do trabalho de parto. A falta de progresso da dilatação e a descida da apresentação podem indicar distocia (desproporção cefalopélvica).

Permanecer em pé e deambular encurta o primeiro estágio do trabalho de parto em > 1 hora e reduz a taxa de parto cesárea (1).

Se as membranas não se romperem de modo espontâneo, alguns médicos utilizam rotineiramente amniotomia (ruptura artificial das membranas) durante a fase ativa. Como resultado, o trabalho de parto pode evoluir mais rápido e o líquido amniótico meconial pode ser detectado precocemente. Nesse período, a amniotomia pode ser necessária para monitorar o feto e confirmar o seu bem-estar. Deve-se evitar amniotomia em mulheres com HIV ou hepatites B ou C, para que o feto não seja exposto a tais organismos.

Durante a 1ª fase do trabalho de parto, deve-se verificar a frequência cardíaca materna e a pressão arterial e frequência cardíaca fetais continuamente por monitoramento eletrônico ou por ausculta intermitente, geralmente com um dispositivo de ultrassom portátil com Doppler (ver monitoramento fetal). As mulheres podem começar a sentir necessidade de fazer força para baixo, enquanto a insinuação fetal descende na pelve. Entretanto, devem ser desencorajadas a fazer força até que o colo esteja dilatado por completo para que não esgarcem o colo ou desperdicem energia.

A 2ª fase vai da dilatação total do colo até o desprendimento do feto. Dura até 2 horas em nulíparas (em média 50 minutos) e 1 hora em multíparas (em média 20 minutos). Esse processo pode durar outra hora ou mais se for conduzido com o uso de analgesia (epidural) ou sedação intensa com opioide. Para o parto espontâneo, a mulher deve suplementar as contrações uterinas por meio da força de expulsão. Na 2ª fase, as mulheres devem ser examinadas constantemente e os batimentos cardíacos fetais devem ser checados de modo contínuo ou após cada contração. As contrações uterinas podem ser monitoradas pela palpação ou eletronicamente.

Durante o 2º estágio do trabalho de parto, a massagem do períneo com lubrificantes e compressas quentes podem amolecer e distender o períneo, reduzindo assim a taxa de lesões perineais de 3º e 4º graus (2). Essas técnicas são amplamente utilizadas por parteiras e outros profissionais. Deve-se tomar precauções para reduzir o risco de infecção durante a massagem do períneo.

Durante o 2º estágio (em comparação com o 1º estágio), a posição da mãe não afeta a duração ou o modo do parto, nem o desfecho materno ou neonatal nos partos sem anestesia peridural (3). Além disso, a técnica de empurrar (espontânea versus direcionada e tardia versus imediata) não afeta o modo do parto nem o desfecho materno ou neonatal. O uso de anestesia peridural atrasa a expulsão e pode prolongar o 2º estágio em uma hora (4).

A 3ª fase do parto começa após a retirada do lactente e termina com a retirada da placenta. Essa fase geralmente dura apenas poucos minutos, mas pode durar até 30 minutos.

Referências aos estágios do trabalho de parto

  1. 1. Lawrence A, Lewis L, Hofmeyr GJ, Styles C: Maternal positions and mobility during first stage labour. Cochrane Database Syst Rev (8):CD003934, 2013. doi: 10.1002/14651858.CD003934.pub3

  2. 2. Aasheim V, et al: Perineal techniques during the second stage of labour for reducing perineal trauma. Cochrane Database Syst Rev 6:CD006672, 2017. doi: 10.1002/14651858.CD006672.pub3

  3. 3. Gupta JK, Sood A, Hofmeyr GJ, et al: Position in the second stage of labour for women without epidural anaesthesia. Cochrane Database Syst Rev 5:CD002006, 2017. doi: 10.1002/14651858.CD002006.pub4

  4. 4. Lemos A, Amorim MM, Dornelas de Andrade A, et al: Pushing/bearing down methods for the second stage of labour. Cochrane Database Syst Rev. 3:CD009124, 2017. doi: 10.1002/14651858.CD009124.pub3

Ruptura das membranas

Ocasionalmente, as membranas (amniótica e saco coriônico) se rompem antes do trabalho de parto começar e o líquido amniótico escoa pelo colo e pela vagina. A ruptura das membranas em qualquer fase antes do início do trabalho de parto é chamada ruptura prematura das membranas (RPM). Algumas mulheres com RPMO sentem uma grande quantidade de líquido saindo subitamente pela vagina, seguida da saída contínua de líquido.

A confirmação adicional não será necessária se, durante o exame, for visualizada a saída de líquido pelo colo. A confirmação nos casos difíceis necessita de alguns testes. Por exemplo, o pH do líquido vaginal deve ser testado com papel de nitrazina, que se torna azul-escuro em pH > 6,5 (pH do líquido amniótico: 7,0 a 7,6); resultados falso-positivos podem ocorrer se o líquido vaginal contiver sangue ou sêmen ou houver algum quadro infeccioso. Podem-se obter amostras de secreções do fórnice vaginal posterior e do colo, colocadas na lâmina, fixadas e visualizadas microscopicamente para ferning. O teste de ferning (cristalização do cloreto de sódio no líquido na forma de folha de coqueiro no líquido amniótico) confirma a ruptura das membranas.

Se o quadro ainda não estiver confirmado, a ultrassonografia demonstrando oligoâmnio (deficiência de líquido amniótico) fornece mais evidências sugestivas de ruptura de membranas. Raramente é necessária a amniocentese com instilação de corante para confirmar a ruptura; o corante detectado na vagina ou no tampão confirma a ruptura.

Quando uma mulher apresentar ruptura de membranas, deve procurar um médico imediatamente. Cerca de 80 a 90% das mulheres com RPM a termo (≥ 37 semanas) e cerca de 50% das mulheres com RPM pré-termo (< 37 semanas) entram em trabalho de parto espontaneamente em 24 horas; > 90% das mulheres com RPM entram em trabalho de parto em 2 semanas. Quanto mais precoce for a ruptura das membranas, antes de 37 semanas, maior será o tempo decorrido entre a ruptura e o início do trabalho de parto. Se houver ruptura de membranas em gestante de termo e, em várias horas não se iniciar o trabalho de parto, este deve ser induzido com o intuito de diminuir os riscos de infecção materna ou fetal.

Opções de nascimento

A maioria das mulheres prefere o parto hospitalar e a maioria dos médicos o recomenda em razão das complicações maternas ou fetais inesperadas que podem ocorrer durante o parto ou no pós-parto, mesmo em mulheres sem fatores de risco. Cerca de 30% dos partos hospitalares envolvem complicações obstétricas (p. ex., lacerações, hemorragia pós-parto). Outras complicações incluem descolamento de placenta anormal (separação prematura), padrão cardíaco fetal não tranquilizador, distocias de ombro, necessidade de cesariana de emergência, anormalidades e depressão neonatais.

Todavia, muitas mulheres desejam um ambiente mais caseiro para o parto; em resposta, muitos hospitais fornecem instalações para um parto com poucas formalidades e regulamentações rígidas, mas com equipamentos de emergência e equipe habilitada. As maternidades podem ser independentes ou localizadas nos hospitais; os cuidados em ambos os locais são semelhantes ou idênticos. Alguns hospitais certificam parteiras para o cuidado de gestantes de baixo risco. As parteiras trabalham com o médico, que está continuamente disponível para consultas e partos operatórios (p. ex., por fórceps, extração a vácuo ou cesariana). Todas as opções de nascimento devem ser discutidas.

Para muitas mulheres, a presença do parceiro ou outros acompanhantes durante o trabalho de parto é útil e deve ser incentivada. Apoio moral, incentivos e expressões de afeto diminuem a ansiedade e fazem o processo do trabalho de parto menos assustador e desagradável. Cursos sobre o nascimento e o parto podem preparar a família para enfrentar um trabalho de parto e parto normal ou complicado. Partilhar o estresse do parto, sons e sinais de seus próprios filhos tende a criar fortes laços entre a família e o lactente.

A família deve estar bem informada sobre quaisquer complicações.

Admissão

Tipicamente, as gestantes são aconselhadas a ir para o hospital se acharem que suas membranas se romperam ou estiverem sentindo contrações com duração de, pelo menos, 30 s e que ocorram de modo regular com intervalos de 6 minutos ou menos. Na primeira hora após a chegada ao hospital, se uma mulher está em trabalho de parto geralmente pode ser determinada com base nos seguintes:

  • Ocorrência de contrações uterinas dolorosas regulares e sustentadas

  • Início do trabalho de parto

  • Ruptura da membrana

  • Apagamento cervical completo

Se esses critérios não forem encontrados, o falso trabalho de parto pode ser temporariamente diagnosticado e a gestante deve ser observada por algum tempo e, se o trabalho de parto não se iniciar em poucas horas, é enviada de volta para casa.

Quando a gestante é admitida, anotam-se sua pressão arterial, frequências cardíaca e respiratória, temperatura e peso, e observa-se a presença ou ausência de edemas. Coleta-se uma amostra de urina para análise de proteínas e glicose, e se obtém sangue para hemograma, tipagem sanguínea e triagem de anticorpos. Se não foram realizados exames laboratoriais de rotina durante as consultas pré-natais, deve-se fazê-los; esses exames incluem rastreamento à procura de HIV, hepatite B, sífilis e infecção estreptocócica do grupo B.

Realiza-se o exame físico. Durante o exame do abdome, o médico estima o tamanho, a posição e a apresentação do feto, utilizando as manobras de Leopold (ver figura Manobra de Leopold). Observam-se a presença e a frequência dos batimentos cardíacos fetais. Estimativas preliminares de intensidade, frequência e duração das contrações também são obtidas.

Um dispositivo mnemônico útil para avaliação é o 3 Ps:

  • Poderes (força, frequência e duração das contrações)

  • Passagem (medições pélvicas)

  • Passageiro (p. ex., tamanho fetal, posição, padrão da frequência cardíaca)

Manobra de Leopold

(A) O fundo uterino é palpado para determinar que é ocupado pela parte fetal. (B) Cada lado do abdome materno é palpado para determinar que lado corresponde à coluna fetal e quais as extremidades. (C) A área acima da sínfise púbica é palpada para localizar a parte em apresentação e assim determinar quanto o feto desceu e se está encaixado. (D) Uma mão aplica pressão sobre o fundo, enquanto o dedo indicador e o polegar da outra mão palpam a parte em apresentação para confirmar a apresentação e o encaixe.

Se o trabalho de parto estiver ativo e a gestação estiver a termo, uma enfermeira obstetriz ou um médico realiza toque vaginal com os 2 dedos da mão (utilizando luva) para avaliar a progressão do trabalho de parto. Se houver sangramento (em particular, se intenso), adia-se o exame até que a localização da placenta se confirme por ultrassonografia. Se o sangramento resultar de placenta prévia, o exame vaginal pode desencadear hemorragia grave.

Se o trabalho de parto não estiver ativo, mas as membranas estiverem rotas, procede-se a um exame especular inicialmente para documentar a dilatação e o apagamento cervical e estimar a posição (local da parte apresentada); entretanto, adia-se o exame digital até que ocorra a fase ativa do trabalho de parto ou problemas (p. ex., queda da frequência cardíaca fetal). Se as membranas estiverem rotas, deve-se observar a presença de mecônio fetal (o qual produz uma coloração marrom-esverdeada), pois pode ser um sinal de estresse fetal. Se o trabalho de parto for pré-termo (< 37 semanas) ou não tiver se iniciado, deve-se realizar apenas um exame especular estéril e obter uma cultura para gonococos, clamídia e estreptococos do grupo B.

Obtém-se dilatação cervical em centímetros, como o diâmetro de um círculo; com 10 cm é considerada completa.

O apagamento é estimado em porcentagens, de zero a 100%. Como o apagamento envolve o encurtamento e afinamento do colo, ele pode ser registrado em centímetros utilizando-se como guia a média normal e não apagada do comprimento cervical de 3,5 a 4,0 cm.

O plano de descida é expresso em centímetros acima ou abaixo das espinhas isquiáticas. O nível da espinha isquiática corresponde ao plano 0; os níveis acima (+) e os abaixo () da espinha isquiática são medidos em cm. A situação fetal, a posição e a apresentação são anotadas.

  • Posição descreve a relação do eixo axial do feto com aquele da mãe (longitudinal, oblíquo, transverso).

  • Posição descreve a relação da parte fetal apresentada com a pelve materna (p. ex., OEA — para cefálico, SDP — para pélvico).

  • Apresentação descreve a parte do feto na abertura cervical (p. ex., pelve, vértice, ombros).

Preparação para o parto

As mulheres são admitidas no pré-parto para observação frequente até o parto. Se o trabalho de parto estiver na fase ativa, a mulher deve receber pouca ou nenhuma ingestão por via oral, em razão da possibilidade de vômitos e aspiração durante o parto, ou em casos de parto de emergência, com anestesia, se necessário.

Depilar ou aparar a vulva e pelos pubianos não é indicado e isso aumenta o risco de infecções de feridas.

Pode-se iniciar a infusão de Ringer lactato com catéter em acesso venoso na mão ou no antebraço. Durante o trabalho de parto normal de 6 a 10 horas, a gestante deve receber 500 a 1.000 mL dessa solução. A infusão previne desidratação durante o trabalho de parto e, em consequência, a hemoconcentração, além de manter adequado o volume sanguíneo. O catéter possibilita a infusão imediata de fármacos ou sangue, caso necessário. Os líquidos também são valiosos, se for utilizada anestesia epidural ou espinal. Se o parto com instrumentos ou cesárea parece improvável, as mulheres podem beber líquidos claros.

Analgesia

Os analgésicos podem ser utilizados durante o trabalho de parto, mas deve-se administrar somente a menor quantidade requerida para o conforto materno, porque os analgésicos atravessam a placenta, podendo causar depressão respiratória neonatal. Pode ocorrer toxicidade neonatal, pois, antes da secção do cordão umbilical, o neonato, cujos processos de metabolização e excreção são imaturos, livra-se do fármaco recebido de maneira lenta, por meio de metabolização hepática ou excreção urinária. As orientações sobre o nascimento e o parto reduzem a ansiedade.

Os médicos oferecem cada vez mais a injeção epidural (provendo a anestesia local) como primeira escolha para a analgesia do parto. Tipicamente, o anestésico local (p. ex., ropivacaína a 0,2%, bupivacaína a 0,125%) é continuamente infundido, com frequência com um opioide (p. ex., fentanila, sufentanila) no espaço epidural lombar. Inicialmente, dá-se a anestesia com cautela para evitar a diminuição da consciência da pressão que ajuda a estimular o empurrão e também para evitar o bloqueio motor. Deve-se tranquilizar as mulheres de que a analgesia epidural não aumenta o risco de cesariana (1).

Se a injeção epidural for contraindicada ou for preferível a administração IV, é comum utilizar fentanil (100 mcg) ou sulfato de morfina (até 10 mg) IV a cada 60 a 90 minutos. Ambos os opioides promovem boa analgesia com baixas doses. Se há toxicidade neonatal, fornece-se suporte à respiração e pode-se administrar naloxona 0,01 mg/kg por IM, IV, subcutânea ou endotraqueal ao recém-nascido como um antagonista específico. A naloxona pode ser repetida dentro de 1 a 2 minutos com base na resposta do neonato. Os médicos devem checar o neonato 1 a 2 horas após a dose inicial de naloxona, pois os efeitos da dose inicial se atenuam.

Se fentanil ou morfina fornecem analgesia insuficiente, deve-se utilizar uma dose adicional de opioide ou outro método analgésico em vez dos chamados fármacos sinérgicos (p. ex., prometazina), que não têm nenhum antídoto. (Esses fármacos, na realidade, são aditivas e não sinérgicas.) Os fármacos sinérgicos ainda são algumas vezes utilizadas, pois diminuem as náuseas causadas pelos opioides; devem-se administrar doses pequenas.

Referências à analgesia

  1. 1. Practice Guidelines for Obstetric Anesthesia: An Updated Report by the American Society of Anesthesiologists Task Force on Obstetric Anesthesia and the Society for Obstetric Anesthesia and Perinatology*. Anesthesiology 124:270–300, 2016. doi: 10.1097/ALN.0000000000000935

Monitoramento fetal

O bem-estar fetal deve ser monitorado durante o trabalho de parto. Os principais parâmetros basais são frequência cardíaca fetal e sua variabilidade, em particular como eles mudam em resposta a contrações uterinas e movimento fetal. Como a interpretação da frequência cardíaca fetal pode ser subjetiva, certos parâmetros foram definidos (ver tabela Definições do monitoramento fetal).

Tabela

Vários padrões são reconhecidos; eles são classificados em 3 camadas [(categorias 1)], que geralmente se correlacionam com o estado ácido-base do feto:

  • Categoria I: normal

  • Categoria II: indeterminado

  • Categoria III: anormal

Um padrão normal prediz fortemente o estado fetal de ácido-base normal no período de observação. Esse padrão tem todas as características a seguir:

  • Frequência cardíaca 110 a 160 bpm na linha de base

  • Variabilidade da frequência cardíaca moderada (de 6 a 25 batidas) na linha de base e com movimento ou contrações

  • Nenhuma desaceleração tardia ou variável durante as contrações

Desacelerações precoces e acelerações apropriadas para a idade podem estar presentes ou ausentes em um padrão normal.

Um padrão indeterminado é qualquer padrão não claramente classificado como normal ou anormal. Muitos padrões são qualificados como indeterminados. Se o feto é acidótico não pode ser determinado a partir do padrão. Padrões indeterminados exigem monitoramento fetal atento de tal modo que qualquer deterioração possa ser reconhecida o mais rápido possível.

Um padrão anormal geralmente indica acidose metabólica fetal no momento da observação. Esse padrão é caracterizado por um dos seguintes:

  • Variabilidade da frequência cardíaca basal ausente mais desacelerações tardias recorrentes

  • Variabilidade da frequência cardíaca basal ausente mais desacelerações variáveis recorrentes

  • Variabilidade da frequência cardíaca basal ausente mais bradicardia (frequência cardíaca < 110 batimentos/minuto sem variabilidade ou < 100 batimentos/minuto)

  • Padrão sinusoidal (variabilidade fixa de cerca de 5 a 40 batidas/minuto em aproximadamente 3 a 5 ciclos/minuto, semelhante a uma onda sinusoidal)

Padrões anormais exigem ações imediatas para corrigi-los (p. ex., oxigênio suplementar, reposicionamento, tratamento de hipotensão arterial materna, interrupção da oxitocina) ou preparação para um parto acelerado.

Padrões refletem o estado fetal em um determinado ponto no tempo; padrões podem e mudam.

O monitoramento pode ser manual e intermitente, utilizando-se um fetoscópio para auscultar a frequência cardíaca fetal. Entretanto, nos Estados Unidos, o monitoramento eletrônico (externo ou interno) tem se tornado o padrão nos cuidados a gestantes de alto risco e muitas clínicas o utilizam para todas as gestantes. O valor do uso rotineiro do monitoramento eletrônico em partos de baixo risco é muitas vezes debatido. Mas foi demonstrado que o monitoramento eletrônico fetal reduza a taxa de mortalidade geral em grandes ensaios clínicos e mostrou aumentar as taxas de cesariana, provavelmente porque muitas anormalidades aparentes são falso- positivas. Assim, a taxa de partos cesárea é mais alta nas mulheres monitoradas eletronicamente do que nas mulheres monitoradas por ausculta.

A oximetria do pulso fetal é estudada como uma forma de confirmar anormalidades ou resultados equívocos do monitoramento eletrônico; o estado de oxigenação fetal pode ajudar a determinar se a cesariana é necessária.

Análise do segmento ST e da onda T fetal no trabalho de parto (STAN) pode ser utilizada para verificar no ECG fetal elevação ou depressãodo segmento ST; qualquer um dos resultado presumivelmente indica hipoxemia fetal e tem alta sensibilidade e especificidade para acidose fetal. Para STAN, um eletrodo deve ser anexado ao couro cabeludo fetal; então alterações na onda T e no segmento ST do ECG fetal são automaticamente identificadas e analisadas.

Se a ausculta manual da frequência cardíaca for utilizada, deve ser efetuada durante todo o trabalho de parto, de acordo com diretrizes específicas, sendo necessária uma enfermeira para cada paciente.

  • Para gestantes de baixo risco, em trabalho de parto normal, a frequência cardíaca fetal deve ser checada depois de cada contração ou a cada 30 minutos durante a 1ª fase do parto e a cada 15 minutos durante a 2ª fase.

  • Para gestantes de alto risco, deve-se checar a frequência cardíaca fetal a cada 15 minutos na 1ª fase e a cada 3 a 5 minutos na 2ª fase.

Recomenda-se ouvir por pelo menos 1 a 2 minutos, com início no pico da contração uterina a fim de checar desacelarações tardias. A ausculta periódica tem taxas menores de falso-positivos para anormalidades e incidência de intervenções que o monitoramento eletrônico contínuo e promove maior contato pessoal com a mulher durante o trabalho de parto. Entretanto, seguir o padrão das diretrizes para ausculta é geralmente difícil e pode não ser custo-efetivo. Além disso, a menos que efetuada cuidadosamente, a ausculta pode não detectar anormalidades.

O monitoramento eletrônico da frequência cardíaca fetal pode ser

  • Externo: os dispositivos são colocados no abdome materno para registrar os sons dos batimentos cardíacos fetais e as contrações uterinas.

  • Interno: as membranas amnióticas devem estar rompidas. Então, inserem-se sensores através da colo do útero; fixa-se um eletrodo no couro cabeludo para monitorar os batimentos cardíacos e coloca-se um catéter na cavidade uterina para aferir a pressão intrauterina.

Em geral, o monitoramento externo ou a interno é similarmente confiável. Dispositivos externos são utilizados para mulheres em trabalho de parto normal; métodos internos são utilizados quando os métodos externos não tiverem dado informações suficientes sobre o bem-estar fetal ou sobre a intensidade das contrações uterinas (p. ex., se um dispostivo externo não estiver funcionando corretamente).

A cardiotocografia registra a frequência cardíaca fetal e as contrações uterinas utilizando monitores eletrônicos externos e correlaciona a FC com os movimentos fetais (relatados pela mãe); é chamado de não estresse porque nenhum estressor é aplicado ao feto durante o teste, embora sons (p. ex., campainha, estimulador acústico) possam ser utilizados para despertar o feto. Espera-se que a frequência cardíaca aumente quando o feto se move e em outros intervalos. Cardiotocografia é normalmente feita por 20 minutos (ocasionalmente por 40 minutos). Os resultados são considerados reativos (tranquilizadores) se houver 2 acelerações de 15 bpm ao longo de 20 minutos. A ausência de acelerações é considerada não reativo (preocupante). A presença de desacelerações tardias sugere hipoxemia, potencial de acidose fetal e necessidade de intervenção.

Em geral, realiza-se perfil biofísico após cardiotocografia preocupante. Um perfil biofísico adiciona avaliação ultrassonográfica do volume do líquido amniótico e, às vezes, avaliação do movimento, tônus, respiração e frequência cardíaca fetais, à cardiotocografia. Cardiotocografia e perfil biofísico são utilizados com frequência para monitorar as complicações das gestações de alto risco (p. ex., complicações por diabetes ou hipertensão materna, ou por natimortos anteriores, ou restrição de crescimento fetal em uma gestação anterior).

Teste de estresse de contração (teste de desafio com ocitocina) agora é raramente realizado. Nesse teste, monitoram-se os movimentos fetais e a frequência cardíaca (em geral, externamente) durante as contrações induzidas por ocitocina. Quando realizado, o teste de estresse de contração deve ser feito em um hospital.

Se um problema é detectado durante o trabalho de parto (p. ex., desacelerações da frequência cardíaca fetal, falta de variabilidade normal da frequência cardíaca), a gestante deve receber oxigênio por máscara facial ou rápida infusão IV de líquidos, ou ser posicionada lateralmente. Se o padrão cardíaco fetal não melhorar por um período razoável e o parto não for iminente, é necessária a cesariana de urgência.

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