Leptospirose

PorLarry M. Bush, MD, FACP, Charles E. Schmidt College of Medicine, Florida Atlantic University;
Maria T. Vazquez-Pertejo, MD, FACP, Wellington Regional Medical Center
Revisado/Corrigido: nov 2022
Visão Educação para o paciente

Leptospirose é uma infecção causada por um dos diversos sorotipos patogênicos da spirochete Leptospira. Os sintomas são bifásicos. Nas duas fases ocorrem episódios febris agudos; a segunda fase às vezes inclui comprometimento hepático, pulmonar, renal e meníngeo. O diagnóstico é por cultura e sorologia. O tratamento é com antibióticos como doxiciclina ou penicilina.

A família das espiroquetas distingue-se pela forma helicoidal das bactérias. As espiroquetas patogênicas são Treponema, Leptospira e Borrelia. Tanto Treponema como Leptospira são muito finas para serem visualizadas usando microscopia de campo claro, mas são claramente vistas usando microscopia de campo escuro ou de fase. Borrelia são mais espessas e também podem ser coradas e visualizadas usando microscopia de campo claro.

Leptospirose, uma zoonose que ocorre em muitos animais domésticos e selvagens, pode provocar doença inaparente ou grave, até mesmo doença fatal em seres humanos. Infecções humanas são raras nos Estados Unidos.

Leptospira sobrevivem na natureza pela infecção renal crônica dos animais portadores — comumente ratos, cães, gado, cavalos, ovelhas, cabras e porcos. Esses animais eliminam leptospiras na urina durante anos. Cães, gado, porcos, camundongos e ratos são outras prováveis fontes comuns da infecção humana.

Infecções humanas são adquiridas por meio do contato direto com urina ou tecidos infectados, ou indiretamente por contato com água ou solo contaminado. Pele lesionada e mucosas expostas (conjuntiva, nasal, oral) são as portas de entrada habituais. A inalação por aerossol de núcleos de gotículas é um modo de entrada menos comum. A leptospirose pode ser uma doença ocupacional (p. ex., trabalhadores de fazenda ou de limpeza de esgoto e de matadouro), mas nos Estados Unidos, a maioria dos pacientes é exposta acidentalmente durante atividades recreativas (p. ex., nadando em água doce contaminada). Relataram-se surtos fora dos Estados Unidos após chuvas fortes ou inundações de água doce. Leptospira pode sobreviver por várias semanas a meses em fontes de água doce (p. ex., lagos, reservatórios). Contudo, podem sobreviver por apenas algumas horas em água salgada.

Casos de leptospirose nos Estados Unidos devem ser notificados ao Centers for Disease Control and Prevention (CDC). No Brasil, os casos devem ser notificados ao Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Os 100 a 200 casos anuais reportados nos Estados Unidos (a incidência mais alta está em Porto Rico, seguida do Havaí) ocorrem principalmente no final do verão e início do outono. Como faltam características clínicas distintas, provavelmente muitos casos não são diagnosticados ou notificados.

Sinais e sintomas da leptospirose

O período de incubação varia de 2 a 20 dias (normalmente, 7 a 13 dias).

A leptospirose é caracteristicamente bifásica, embora alguns pacientes apresentem apenas uma doença monofásica fulminante.

A fase septicêmica começa abruptamente, com cefaleia, mialgia intensa, calafrios, febre, tosse, faringite, dor no peito e, em alguns pacientes, hemoptise. Sufusão conjuntival normalmente aparece no 3º ou 4º dia. Esplenomegalia e hepatomegalia não são comuns. Essa fase dura 4 a 9 dias, com calafrios e febre recorrentes que muitas vezes aumenta para > 39° C. A defervescência ocorre a seguir.

A 2ª fase, ou imunitária, ocorre entre o 6º e o 12º dia da doença, correlacionando-se com o aparecimento de anticorpos no soro. A febre e os sintomas iniciais reaparecem e meningite pode se desenvolver. Iridociclite, neurite óptica e neuropatia periférica ocorrem raramente. O envolvimento dos pulmões pode ser grave, com hemorragia pulmonar. Essa fase normalmente dura de 4 a 30 dias.

Se adquirida durante gestação, a leptospirose pode provocar aborto, até mesmo durante o período de convalescença.

A síndrome de Weil (leptospirose ictérica) é uma forma grave, com icterícia causada por hemólise intravascular e, geralmente, azotemia, anemia, diminuição de consciência e febre contínua. O início é semelhante para as formas menos graves. Porém, manifestações hemorrágicas, que incluem epistaxes, petéquias, púrpura e equimoses decorrentes de dano capilar, aparecem e raramente progridem para hemorragia subaracnoide, adrenal, ou gastrintestinal. Trombocitopenia pode ocorrer. Sinais de disfunção hepatocelular e renal aparecem do 3º ao 6º dia. Anormalidades renais incluem proteinúria, piúria, hematúria e azotemia. O dano hepático é mínimo e a cura é completa.

A mortalidade é nula em pacientes anictéricos. Na icterícia, a taxa de casos fatais é de 5 a 10% (até 40% nos casos graves); é mais alta em pacientes > 60 anos.

Diagnóstico da leptospirose

  • Hemoculturas

  • Exames sorológicos

  • Às vezes, reação em cadeia da polimerase (PCR)

Sintomas semelhantes podem resultar de meningoencefalites virais, febre hemorrágica com síndrome renal decorrente do hantavírus, outras infecções por espiroquetas, gripe e hepatite. A história de doença bifásica pode ajudar a diferenciar a doença.

Deve-se considerar a leptospirose em qualquer paciente com febre de origem indeterminada se pode ter sido exposto a leptospiras (p. ex., inundação de água doce).

Para pacientes com suspeita de leptospirose, devem ser realizadas culturas no sangue, dosagens de anticorpos na fase aguda e convalescente (3 a 4 semanas), hemograma completo, exames bioquímicos no soro e testes de função hepática.

Punção lombar é obrigatória quando são encontrados sinais de irritação meníngea; a contagem de células no líquido cefalorraquidiano permanece entre 10 e 1.000 células/microL (0,01-1 × 109/L) e normalmente < 500 células/microL (< 0,5 × 109/L), com predomínio de mononucleares. A glicose no líquido cefalorraquidiano é normal; a proteína é < 100 mg/dL (1 g/L).

Em geral, a contagem de leucócitos é normal ou ligeiramente elevada no sangue periférico, mas pode alcançar 50.000/microL (50 × 109/L) em pacientes gravemente enfermos com icterícia. A presença de > 70% de neutrófilos ajuda a diferenciar leptospirose de doenças virais. A bilirrubina sérica tem elevação desproporcional com elevações de aminotransferases. Em pacientes ictéricos, normalmente os níveis de bilirrubina estão < 20 mg/dL (< 342 micromole/L), mas podem alcançar 40 mg/dL (684 micromole/L) em uma infecção grave.

Confirma-se a leptospirose ao se isolar leptospiras de espécimes clínicos ou quando são vistas em secreções ou tecidos. É provável que as culturas do sangue e líquido cefalorraquidiano sejam positivas durante a 1ª semana da doença, quando leptospiras podem estar presentes e antes que os títulos de anticorpos sejam detectáveis; culturas de urina são provavelmente positivas durante a semana 1 a 3 da doença. Deve-se notificar o laboratório sobre a suspeita de leptospirose porque meios especiais e incubação prolongada são necessários.

O diagnóstico também é confirmado por:

  • O título de anticorpos de aglutinação para Leptospira aumenta em ≥ 4 vezes (teste de aglutinação microscópica em amostras pareadas obtidas ≥ 2 semanas de intervalo).

  • Quando apenas uma única amostra está disponível, o título é ≥ 1:800 em pacientes com sinais e sintomas típicos (ou ≥ 1:200 ou até ≥ 1:100 em regiões onde a prevalência da leptospirose é baixa).

Ensaios moleculares, como a PCR, também podem confirmar o diagnóstico rapidamente durante a fase inicial da doença.

Ensaio de imunoadsorção enzimática (ELISA) detecta infecções em 3 a 5 dias (no início do curso da infecção quando a antibioticoterapia é mais eficaz), mas deve-se confirmar os resultados positivos por testes definitivos (p. ex., culturas, teste de aglutinação microscópica, PCR).

Tratamento da leptospirose

  • Penicilina

  • Doxiciclina

Terapia antibiótica é mais eficaz quando iniciada no começo da infecção.

Na doença grave, recomenda-se um dos seguintes:

  • Penicilina G 1,5 milhões de unidades IV a cada 6 horas durante 7 dias

  • Ampicilina 500 mg a 1000 mg IV a cada 6 horas por 7 dias

  • Ceftriaxona 1 g IV a cada 24 horas por 7 dias

Nos casos graves, cuidados de suporte, incluindo líquidos e terapia eletrolítica e, às vezes, terapia de reposição renal e/ou transfusão de sangue, também são importantes.

Nos casos menos graves, pode-se administrar um dos seguintes:

  • Doxiciclina 100 mg por via oral a cada 12 horas durante 5 a 7 dias

  • Ampicilina 500 a 750 mg por via oral a cada 6 horas durante 5 a 7 dias

  • Amoxicilina 500 mg por via oral a cada 6 horas durante 5 a 7 dias

O isolamento do paciente não é necessário, mas a urina deve ser manipulada e dispensada cuidadosamente.

Prevenção da leptospirose

Para prevenir a doença, administra-se doxiciclina, 200 mg, por via oral, 1 vez por semana, 1 a 2 dias antes e durante todo o período de exposição geográfica conhecida.

Pontos-chave

  • A leptospirose é uma zoonose que ocorre em muitos animais domésticos e selvagens (especialmente cães e ratos); infecções humanas são raras nos Estados Unidos e são adquiridas por contato com urina ou tecido infectado ou água ou solo contaminado.

  • Há 2 fases da doença: a septicêmica e a imunitária.

  • A fase septicêmica começa abruptamente com cefaleia, mialgia intensa, calafrios, febre a > 39° C, tosse, dor de garganta, sufusão conjuntival, e, às vezes, hemoptise; essa fase dura 4 a 9 dias.

  • A fase imunitária ocorre entre o 6º e 12º dia da doença quando os anticorpos aparecem no sangue; febre e outros sintomas se repetem, e alguns pacientes desenvolvem meningite.

  • A síndrome de Weil é uma forma grave com icterícia e normalmente azotemia, anemia, diminuição de consciência e, às vezes, manifestações hemorrágicas.

  • Diagnosticar usando culturas de sangue e líquido cefalorraquidiano (em pacientes com achados meníngeos), culturas de urina, sorologias e PCR (polymerase chain reaction).

  • Tratar a forma grave da doença com penicilina G parenteral, ampicilina ou ceftriaxona e os casos menos graves com doxiciclina, ampicilina ou amoxicilina oral.

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