A proteinose alveolar pulmonar é o acúmulo de surfactante nos alvéolos. A etiologia é quase sempre desconhecida. Os sintomas são dispneia, fadiga e mal-estar. O diagnóstico baseia-se no lavado broncoalveolar, embora ocorram anormalidades características na radiografia e nos exames laboratoriais. O tratamento é com lavagem pulmonar total ou, em alguns casos, fator estimulador de colônias de granulócitos e macrófagos recombinantes. A sobrevida em 5 anos é de cerca de 80% com o tratamento.
Etiologia da proteinose alveolar pulmonar
Com frequência, a proteinose alveolar pulmonar é idiopática e ocorre em homens e mulheres aparentemente sadios entre 30 e 50 anos de idade. Acredita-se que haja uma preponderância masculina e uma associação com tabagismo (1). Estima-se que a prevalência da população seja cerca de 7 a 10 por milhão (2). Formas secundárias raras ocorrem em pacientes com:
Cânceres hematológicos
Imunossupressão por medicamentos
Exposições significativas por inalação a pó de alumínio, titânio, cimento e celulose
Também existem formas congênitas raras que causam insuficiência respiratória neonatal.
Não está esclarecido se os casos idiopáticos e secundários compartilham fisiopatologia comum.
Referências sobre etiologia
1. Trapnell BC, Nakata K, Bonella F, et al. Pulmonary alveolar proteinosis. Nat Rev Dis Primers 2019;5(1):16. doi:10.1038/s41572-019-0066-3
2. McCarthy C, Carey BC, Trapnell BC. Autoimmune Pulmonary Alveolar Proteinosis. Am J Respir Crit Care Med 2022;205(9):1016-1035. doi:10.1164/rccm.202112-2742SO
Fisiopatologia da proteinose alveolar pulmonar
Acredita-se que a proteinose alveolar pulmonar seja decorrente de distúrbios da depuração ou produção do surfactante. Admite-se que o processamento indevido de surfactante do macrófago alveolar decorrente da sinalização anormal do fator estimulador de colônias de granulócitos e monócitos (GM-CSF) contribua para a enfermidade, talvez em virtude da redução ou da ausência de função da cadeia beta comum do receptor de GM-CSF/interleucina (IL)-13/IL-5 das células mononucleares (observado em algumas crianças, mas não em adultos com a doença). Anticorpos anti-GM-CSF também foram encontrados na maioria dos pacientes. Suspeita-se de lesão tóxica dos pulmões, mas não há comprovação nas causas inalatórias secundárias, como silicoproteinose.
Os alvéolos encontram-se preenchidos por surfactante lipoproteináceo acelular positivo para ácido periódico de Schiff (PAS, periodic acid-Schiff). As células alveolares e intersticiais permanecem normais. Os segmentos pulmonares posterobasais são os mais comprometidos. A pleura e o mediastino não são afetados.
Sinais e sintomas da proteinose alveolar pulmonar
A maioria dos pacientes com proteinose alveolar pulmonar desenvolve dispneia progressiva durante o esforço, perda ponderal, fadiga, mal-estar ou febre baixa. Ocorre tosse, que ocasionalmente provoca expectoração grossa ou viscosa, mas é menos comum. Baqueteamento dos dedos e cianose são incomuns. Estertores inspiratórios são raros porque os alvéolos estão preenchidos com líquido; quando existem estertores, eles sugerem infecção.
Diagnóstico da proteinose alveolar pulmonar
Radiografia de tórax e tomografia computadorizada de alta resolução (TCAR)
Lavado broncoalveolar
Às vezes, biópsia
A proteinose alveolar pulmonar geralmente é suspeitada primeiramente quando uma radiografia de tórax é realizada devido a sintomas respiratórios inespecíficos. A radiografia revela opacidades em campos pulmonares médios e inferiores bilateralmente, com distribuição em borboleta e hilos normais.
By permission of the publisher. De Lynch III J, Myers J. In Bone's Atlas of Pulmonary and Critical Care Medicine. Edited by J Crapo. Philadelphia, Current Medicine, 2005.
O diagnóstico requer lavado broncoalveolar, com ou sem biopsia transbrônquica. O líquido do lavado é leitoso ou opaco e é positivo para coloração com ácido periódico-Schiff (APS). O líquido é caracterizado por macrófagos dispersos e repletos de surfactante, aumento de células T e níveis elevados do surfactante apoproteína-A.
Efetua-se biópsia pulmonar aberta ou por toracoscopia quando há contraindicação à broncoscopia ou quando as amostras do líquido do lavado não são diagnósticos. Os testes normalmente feitos antes do início do tratamento incluem
Amostra da gasometria arterial
Exames laboratoriais
Testes de função pulmonar
As gasometrias arteriais podem revelar hipoxemia durante esforço leve a moderado ou em repouso, se a doença for mais grave.
A TC de alta resolução (TCAR) revela opacificação em vidro fosco, espessamento de estruturas intralobulares e septos interlobulares em formatos poligonais típicos (“pavimentação irregular”). Entretanto, esse achado não é específico, uma vez que também pode ocorrer em pacientes com a síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA), pneumonia viral, pneumonia lipoide, carcinoma de células broncoalveolares e pneumonia por Pneumocystis jirovecii.
Imagem cedida por cortesia de Talmadge E. King, MD.
Os testes de função pulmonar revelam redução da capacidade de difusão do pulmão do monóxido de carbono (DLCO) desproporcional à diminuição da capacidade vital, do volume residual, da capacidade residual funcional e da capacidade pulmonar total.
Anormalidades nos testes laboratoriais incluem policitemia, hipergamaglobulinemia, aumento dos níveis de lactato desidrogenase (LDH) sérica e das proteínas séricas surfactantes A e D. As anormalidades são sugestivas, mas não são diagnósticas. Exames laboratoriais para autoanticorpos contra o fator estimulador de colônias de granulócitos e macrófagos (GM-CSF) podem ajudar a sustentar uma etiologia autoimune à proteinose alveolar pulmonar.
Tratamento da proteinose alveolar pulmonar
Lavagem pulmonar total
O tratamento da proteinose alveolar pulmonar é desnecessário para pacientes assintomáticos ou para aqueles apenas com sintomas leves.
Efetua-se lavagem pulmonar total em pacientes com dispneia incapacitante, utilizando-se anestesia geral e tubo endotraqueal com luz dupla. Lava-se um pulmão até 15 vezes, com 1 a 2 L de soro fisiológico, enquanto o outro pulmão é ventilado. Em seguida, inverte-se o procedimento.
O transplante de pulmão não é feito com frequência porque a doença reaparece no pulmão transplantado.
Os glicocorticoides sistêmicos não têm qualquer papel no tratamento e podem elevar o risco de infecção secundária. O papel do GM-CSF (inalado ou subcutâneo) no tratamento de rotina não foi determinado, mas pode ser benéfico em casos selecionados. Um estudo multicêntrico e autocontrolado de fase 2 em nove centros pulmonares no Japão mostrou uma taxa de resposta geral de 62% (24/39) (1).
Referência sobre tratamento
1. Tazawa R, Trapnell BC, Inoue Y, et al. Inhaled granulocyte/macrophage-colony stimulating factor as therapy for pulmonary alveolar proteinosis. Am J Respir Crit Care Med 2010;181(12):1345-1354. doi:10.1164/rccm.200906-0978OC
Prognóstico para proteinose alveolar pulmonar
Sem tratamento, a proteinose alveolar pulmonar regride de modo espontâneo em até 10% dos pacientes (1). Quando os pacientes são tratados com lavagem pulmonar total, a taxa de sobrevida em 5 anos é de 95% (1).
Ocasionalmente, desenvolvem-se infecções pulmonares secundárias por bactérias (p. ex., Mycobacteria, Nocardia) e por outros organismos (p. ex., Aspergillus, Cryptococcus e outros fungos oportunistas) por causa da função prejudicada dos macrófagos; essas infecções exigem tratamento.
Referência sobre prognóstico
1. Campo I, Mariani F, Rodi G, et al. Assessment and management of pulmonary alveolar proteinosis in a reference center. Orphanet J Rare Dis 2013;8:40. doi:10.1186/1750-1172-8-40
Pontos-chave
Considerar proteinose alveolar pulmonar em pacientes normalmente saudáveis entre 30 e 50 anos se a radiografia revela opacidades em campos pulmonares médios e inferiores bilateralmente, com distribuição em borboleta e hilos normais.
Fazer um lavado broncoalveolar e exames laboratoriais; se contraindicado ou quando os resultados não forem diagnósticos, realizar biópsia pulmonar.
Se a dispneia for moderada ou grave, tratar com lavagem pulmonar total.
