Epidermólise bolhosa

(Epidermólise bolhosa hereditária)

PorDaniel M. Peraza, MD, Geisel School of Medicine at Dartmouth University
Revisado/Corrigido: jan 2022
Visão Educação para o paciente

A epidermólise bolhosa é um grupo de 4 doenças genéticas muito raras e seus subtipos. A fragilidade epitelial e a tendência à formação de bolhas na pele e mucosas geralmente se manifestam no nascimento ou na infância. Os fenótipos da doença variam de leve a potencialmente fatal. O diagnóstico é por biópsia da pele, imunofluorescência ou microscopia eletrônica de transmissão e análise genética. O tratamento é de suporte, sendo necessária a participação de uma equipe multidisciplinar especializada nos casos graves.

A epidermólise bolhosa ocorre em 20 para um milhão de nascidos vivos. Não há predileção por gênero. Ocasionalmente, a epidermólise bolhosa só é reconhecida na adolescência ou no início da idade adulta.

Epidermólise bolhosa adquirida é um grupo de transtornos hereditários que envolve várias mutações genéticas. Autoanticorpos contribuem. Esse grupo de doenças é distinto da epidermólise bolhosa adquirida, que é considerada uma doença autoimune, mas não é herdada.

Fisiopatologia da epidermólise bolhosa

Defeitos de mediação genética nas proteínas de adesão epitelial resultam em fragilidade da pele e mucosa, o que predispõe o epitélio à formação de bolhas após trauma menor ou, às vezes, espontaneamente. O mecanismo é autoimune, com produção de autoanticorpos contra um componente do colágeno tipo VII.

Tipos de epidermólise bolhosa

Definem-se quatro tipos principais de epidermólise bolhosa, de acordo com o nível ou os níveis de clivagem do tecido e a formação de bolhas (ver figura Níveis de clivagem cutânea na epidermólise bolhosa) em relação à zona da membrana basal da pele (junção dérmico-epidérmica):

  • Epidermólise bolhosa simples: epiderme

  • Epidermólise bolhosa juncional: lâmina lúcida da zona da membrana basal

  • Epidermólise bolhosa distrófica: sublâmina densa (derme superior, logo abaixo da lâmina densa da zona da membrana basal)

  • Síndrome de Kindler: variável intraepidérmica ou subepidérmica

Níveis de clivagem cutânea na epidermólise bolhosa

Nessa figura, a zona da membrana basal está desproporcionalmente maior para exibir suas camadas. Bolhas simples da epidermólise bolhosa (EB) se formam nos níveis da epiderme. As bolhas juncionais da EB se formam na lâmina lúcida. As bolhas distróficas da EB se formam na sublâmina densa (parte superior da derme). As bolhas na síndrome de Kindler podem se formar no nível intraepidérmico ou subepidérmico.

Diferentes tipos têm padrões hereditários distintos. (Ver tabela Algumas características dos principais tipos de epidermólise bolhosa.)

A epidermólise bolhosa simples é o tipo mais comum e mais leve, ocorrendo em cerca de 80% dos casos.

Vários subtipos são definidos de acordo com características como

  • Distribuição das lesões (localizada versus generalizada)

  • Gravidade relativa cutânea versus extracutânea

  • Outros achados cutâneos [p. ex., tecido de granulação exuberante, pigmentação manchada, pseudossindactilia (fusão da pele entre os dedos)]

  • Modo de herança (autossômica dominante versus autossômica recessiva)

  • Genes específicos comprometidos

(Ver tabela Algumas características dos principais tipos de epidermólise bolhosa.)

Tabela

Sinais e sintomas da epidermólise bolhosa

Todos os tipos de epidermólise bolhosa manifestam-se com bolhas dolorosas e inapropriadas. A gravidade dos sintomas está correlacionada à gravidade das bolhas e cicatrizes e varia de leve a grave.

Epidermólise bolhosa mucocutânea extensa de qualquer tipo pode causar dor de forte intensidade. Lesões cutâneas generalizadas causam desequilíbrios hídricos e perdas proteicas. Lesões cutâneas podem infectar e as infecções podem se tornar sistêmicas. O comprometimento da mucosa pode causar desnutrição e má evolução ponderal, dificuldades respiratórias e problemas geniturinários.

Epidermólise bolhosa (Mãos)
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Essa foto mostra as mãos de uma criança de 5 anos com cicatrizes, bolhas e perda das unhas da mão.
DR HAROUT TANIELIAN/SCIENCE PHOTO LIBRARY
Epidermólise bolhosa (Mão e Joelho)
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Essa imagem mostra fragilidade epitelial das unhas e locais de alto atrito na mão e no joelho resultantes de epidermólise bolhosa.
Imagem cedida por cortesia de Karen McKoy, MD.

Epidermólise bolhosa simplex

Um subtipo leve causa bolhas locais apenas nas palmas das mãos e nas solas dos pés.

Um subtipo generalizado e grave causa bolhas no tronco, braços e pescoço, e a mucosa oral pode ser comprometida.

As bolhas geralmente resolvem sem formar cicatrizes porque permanecem superficiais na epiderme. Com o tempo, ocorre hiperqueratose nas palmas das mãos e nas solas dos pés, como calos isolados ou espessamento difuso nos casos graves.

Epidermólise bolhosa juncional

Um subtipo leve acomete apenas os cotovelos, mãos, joelhos e pés (locais típicos de atrito) e, geralmente diminui após a infância. A hipoplasia do esmalte, malformações ungueais e alopecia também ocorrem. A remissão não gera formação de cicatrizes extensas.

A formação de bolhas mucocutâneas generalizada e grave pode acometer grandes áreas da pele e também a conjuntiva, a boca e os tratos gastrintestinal, respiratório e geniturinário.

Placas cutâneas eritematosas e úmidas típicas (cicatrização por formação de tecido de granulação) ao redor da boca e face central são patognomônicas.

Bolhas graves se curam com formação de cicatrizes porque ocorrem em níveis juncionais e dérmicos mais profundos. A cicatrização das lesões luminais pode causar estenose sintomática. Por exemplo, a estenose laringotraqueal pode causar estridor ou choro fraco ou rouco, o que indica comprometimento interno e prognóstico desfavorável. A cicatrização das lesões cutâneas pode resultar em contraturas articulares e pseudossindactilia.

Epidermólise bolhosa distrófica

Os subtipos leves e moderados acometem principalmente apenas os cotovelos, mãos, joelhos e pés. Geralmente ocorrem malformações ungueais e podem ser o único sinal nos casos leves.

Um subtipo grave se manifesta com bolhas mucocutâneas difusas ao nascimento. Toda a superfície da pele e da mucosa oral e gastrintestinal podem ser atingidas. Muitas vezes, grandes áreas da pele estão ausentes e descamadas ao nascimento. A cicatrização causa várias complicações externas e internas. A pseudossindactilia ocorre quase sempre.

Bolhas leves se curam com formação de cicatrizes não graves (piores na forma moderada) e millium. Bolhas graves tratadas apresentam formação de tecido cicatricial porque ocorrem em níveis mais profundos.

Síndrome de Kindler

A síndrome de Kindler não tem subtipos.

A formação de bolhas acomete particularmente o dorso das mãos e dos pés. Episódios repetidos levam à atrofia cutânea progressiva (pele fina e enrugada), que pode se espalhar para outras áreas.

A fotossensibilidade, que pode ser leve, diferencia a síndrome de Kindler dos outros 3 principais tipos de epidermólise bolhosa.

Poiquilodermia (constelação de atrofia da pele, alterações pigmentares e telangiectasias) é comum.

A cicatrização mucocutânea leva a estenoses esofágicas e geniturinárias, ectrópio e pseudossindactilia. As bolhas da síndrome de Kindler grave tratadas apresentam formação de cicatrizes porque ocorrem em níveis mais profundos.

Diagnóstico da epidermólise bolhosa

  • Biópsia e imunofluorescência ou microscopia eletrônica da pele

  • Análise das mutações genéticas

A suspeita de epidermólise bolhosa é pelo quadro clínico. História familiar pode indicar o modo de herança e, portanto, o tipo possível; herança autossômica dominante (epidermólise bolhosa simples e epidermólise bolhosa distrófica), ou herança autossômica recessiva (epidermólise bolhosa juncional, epidermólise bolhosa distrófica, síndrome de Kindler e, raramente, epidermólise bolhosa simples).

O diagnóstico diferencial é feito com bolhas comuns por fricção e epidermólise bolhosa adquirida.

O diagnóstico dos tipos e subtipos específicos se baseia na história familiar, na biópsia e na imunofluorescência ou na microscopia eletrônica de uma bolha recém-induzida (não das palmas das mãos ou das solas dos pés) e análise de mutação genética em uma amostra de sangue.

A imunofluorescência ou a microscopia eletrônica determinam o nível de clivagem e da formação das bolhas.

O teste genético geralmente é feito para confirmar o tipo específico de doença e orientar o aconselhamento genético. (Ver tabela Algumas características dos principais tipos de epidermólise bolhosa.)

Deve-se conversar sobre possíveis exames pré-natais com as famílias que têm historia de epidermólise bolhosa.

Prognóstico para epidermólise bolhosa

A epidermólise bolhosa juncional grave e a epidermólise bolhosa distrófica causam um número de óbitos significativo antes dos 2 anos de idade. A epidermólise bolhosa grave generalizada também pode ser fatal. A morte ocorre após complicações como infecção, desnutrição e desidratação.

A formação de bolhas tende a diminuir com a idade.

Pacientes com epidermólise bolhosa juncional, epidermólise bolhosa distrófica e síndrome de Kindler podem evoluir com carcinoma espinocelular na pele e nas mucosas na idade adulta.

A doença crônica pode ser debilitante e alterar a vida. Entretanto, alguns sintomas graves podem diminuir com o tempo à medida que o crescimento somático reexpande a luz interna dos órgãos estenosados por cicatrizes.

Tratamento da epidermólise bolhosa

  • Evitar fricção e trauma na pele e nas mucosas

  • Tratamento para promover a cicatrização das bolhas

  • Prevenção e tratamento de complicações

(Ver também Wound International's 2017 best practice guidelines for skin and wound care in epidermolysis bullosa.)

O tratamento da epidermólise bolhosa é sintomático; pode ser necessária a formação de uma equipe multidisciplinar tanto para a forma grave como para a forma crônica da doença (1).

Usam-se todos e quaisquer meios para reduzir a fricção da pele. Recém-nascidos e lactentes são manuseados com a maior delicadeza possível. Roupas macias, móveis acolchoados e temperatura ambiente baixa ajudam a reduzir a formação de bolhas.

Uma alimentação branda e emolientes fecais podem ser úteis se o trato gastrintestinal for atingido.

As bolhas devem ser perfuradas e cobertas com curativos, de acordo com as instruções de um especialista em tratamento de feridas, para evitar mais lesões e infecção na pele. Pode-se usar curativos e esparadrapos minimamente aderentes; frequentemente, ataduras cobertas com gel contendo vaselina são mantidas no lugar com gaze.

Sintomáticos para dor, prurido e antibióticos para infecção, conforme necessário.

O tratamento cirúrgico pode contemplar a colocação de sonda de gastrostomia, a dilatação esofágica e a correção da pseudossindactilia e de contraturas.

Referência sobre o tratamento

  1. 1. El Hachem M, Zambruno G, Bourdon-Lanoy E, et al: Multicentre consensus recommendations for skin care in inherited epidermolysis bullosa. Orphanet J Rare Dis 9:76, 2014. doi: 10.1186/1750-1172-9-76

Informações adicionais

O recurso em inglês a seguir pode ser útil. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo deste recurso.

  1. Wound International: Best practice guidelines for skin and wound care in epidermolysis bullosa (2017)

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