Leucoencefalopatia multifocal progressiva (LMP) é causada pela reativação do vírus JC. A doença costuma ocorrer em pacientes com imunidade celular prejudicada, especialmente em pacientes com infecção pelo HIV. A LMP resulta em desmielinização progressiva e subaguda do sistema nervoso central, deficits neurológicos multifocais e morte, geralmente em 9 meses. O diagnóstico é por RM e análise do líquido cefalorraquidiano utilizando teste de reação em cadeia da polimerase. Nos pacientes com aids, o HAART pode diminuir a velocidade da progressão, e pacientes que fazem uso de imunodepressores podem melhorar quando esses fármacos são interrompidos. Dados limitados sugerem que o tratamento com inibidores do checkpoint imune, que ativam a resposta imune contra o vírus JC, às vezes é útil. O tratamento é de suporte.
(Ver também Introdução a infecções encefálicas.)
Etiologia da leucoencefalopatia multifocal progressiva
A leucoencefalopatia multifocal progressiva é causada pela reativação do vírus JC, um papovavírus humano ubíquo tipicamente adquirido durante a infância e que permanece latente nos rins e possivelmente em outros locais (p. ex., células mononucleares, SNC). O vírus reativado tem tropismo por oligodendrócitos.
A maioria dos pacientes que desenvolvem leucoencefalopatia multifocal progressiva apresenta imunidade mediada por células deprimida decorrente de
AIDS (o fator de risco mais comum)
Doenças do sistema retículo-endotelial (p. ex., leucemia, linfoma)
Outras condições (p. ex., Síndrome de Wiskott-Aldrich, Transplante de órgão)
Na aids, o risco aumenta com a carga viral do HIV; a prevalência de leucoencefalopatia multifocal progressiva tem diminuído com a utilização de antirretrovirais mais eficazes.
Cada vez mais, a leucoencefalopatia multifocal progressiva ocorre como uma complicação da terapia imunomodeladora. Os fármacos mais frequentemente envolvidos são
O anticorpo monoclonal natalizumab
O conjugado anticorpo-fármaco brentuximabe vedotina
Mas a leucoencefalopatia multifocal progressiva ocorreu em pacientes que tomam outros fármacos (p. ex., rituximabe, fingolimode, dimetil fumarato). A medição de anticorpos séricos para o vírus JC (índice do vírus JC) pode ajudar a avaliar o risco de leucoencefalopatia multifocal progressiva em pacientes que tomam natalizumabe; níveis mais elevados indicam maior risco.
Sinais e sintomas da leucoencefalopatia multifocal progressiva
A falta de coordenação motora pode ser o primeiro sintoma da leucoencefalopatia multifocal progressiva. A hemiparesia é o achado mais comum. Afasia, disartria e hemianopsia também são comuns. O dano cortical multifocal produz deficiência cognitiva em dois terços dos pacientes. Deficits sensoriais, cerebelares e do tronco encefálico podem estar presentes.
Cefaleias e crises epilépticas são raras e ocorrem com mais frequência em pacientes com aids.
A progressão gradual e contínua culmina com a morte, geralmente em 1 a 9 meses após o início dos sintomas.
Diagnóstico da leucoencefalopatia multifocal progressiva
RM
Teste do líquido cefalorraquidiano para DNA do vírus JC
Suspeita-se de leucoencefalopatia multifocal progressiva em pacientes com disfunção cerebral progressiva inexplicável, particularmente naqueles com imunidade celular deprimida.
RM intensificada por contraste pode sugerir fortemente a presença de LMP, exibindo lesões únicas ou múltiplas da substância branca em imagens ponderadas em T2. Um agente de contraste intensifica, geralmente de modo débil e periférico, 5 a 15% das lesões. A TC pode mostrar lesões não intensificadas de baixa densidade, mas é significativamente menos sensível que RM.
Imagem fornecida por John E. Greenlee, MD.
O líquido cefalorraquidiano é analisado para o DNA viral JC pelo método de PCR; um resultado positivo com achados compatíveis de neuroimagem é quase patognomônico. A análise de rotina do líquido cefalorraquidiano costuma ser normal.
Os testes sorológicos não são úteis. A biópsia estereotáxica pode fornecer um diagnóstico definitivo, mas raramente se justifica.
Tratamento da leucoencefalopatia multifocal progressiva
Cuidados de suporte
O tratamento da leucoencefalopatia multifocal progressiva é principalmente de suporte.
O uso experimental de fármacos como cidofovir e outros antivirais não mostrou benefício. Terapia antirretroviral (TARV) em pacientes com aids pode melhorar os resultados em leucoencefalopatia multifocal progressiva, aumentando a taxa de sobrevida em 1 ano de 10% para 50%. Entretanto, os pacientes tratados com terapia antirretroviral agressiva podem desenvolver a síndrome inflamatória de reconstituição imunitária (IRIS). Na IRIS, o sistema imunitário em recuperação produz uma resposta inflamatória intensa contra o vírus JC, piorando assim os sintomas. Testes de imagens feitos depois do desenvolvimento da IRIS mostram aumento de contraste das lesões e podem mostrar edema cerebral significativo. Corticoides podem ser úteis. Dependendo da gravidade da IRIS e da aids, os médicos podem decidir interromper a TARV.
A suspensão dos imunossupressores pode resultar em melhora clínica. Mas os pacientes que param de tomar esses fármacos também têm risco de desenvolver IRIS.
Se a leucoencefalopatia multifocal progressiva se desenvolver em pacientes que tomam natalizumabe, outro fármaco imunomodulador, ou um imunossupressor, o fármaco deve ser interrompido, e troca plasmática deve ser feita para remover o fármaco residual na circulação.
Dados limitados sugerem que o tratamento com os inibidores da morte celular programada 1 (PD-1) pembrolizumabe ou nivolumabe (inibidores do checkpoint imune) pode diminuir a carga viral no LCR, aumentar a atividade imune celular antiviral e levar à melhora clínica (1, 2).
Referências sobre o tratamento
1. Cortese I, Muranski P, Enose-Akahata Y, et al: Pembrolizumab treatment for progressive multifocal leukoencephalopathy. N Engl J Med 380 (17):1597–1605, 2019. doi: 10.1056/NEJMoa1815039 Epub 2019 Apr 10.
2. Lambert N, El Moussaoui M, Maquet P: Immune checkpoint inhibitors for progressive multifocal leukoencephalopathy: Identifying relevant outcome factors. Eur J Neurol 2021 28 (11):3814–3819, 2021. doi: 10.1111/ene.15021 Epub 2021 Jul 26.
Pontos-chave
A reativação do vírus JC ubíquo, geralmente devido à imunidade mediada por células prejudicada, leva à leucoencefalopatia multifocal progressiva.
A leucoencefalopatia multifocal progressiva geralmente provoca inépcia psicomotora, hemiparesia, afasia, disartria, hemianopia e comprometimento cognitivo.
Fazer RM e teste do líquido cefalorraquidiano para DNA do vírus JC em pacientes com imunidade mediada por células prejudicada e disfunção progressiva inexplicável do cérebro.
O tratamento dos pacientes é de suporte, as doenças subjacentes devem ser tratadas como indicado (p. ex., interrompendo o natalizumabe, outro fármaco imunomodulador ou um imunossupressor ou, em pacientes com AIDS, iniciando a terapia antirretroviral e observando atentamente o desenvolvimento da síndrome inflamatória de reconstituição imunitária).
Dados limitados sugerem que o tratamento com pembrolizumabe ou nivolumabe pode diminuir a carga viral no LCR, aumentar a atividade imune celular antiviral e levar à melhora clínica.