(Ver também Visão geral das doenças tubulointersticiais.)
Etiologia
As causas comuns da necrose tubular aguda são:
Outras causas da necrose tubular aguda são
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Queimaduras de terceiro grau abrangendo > 15% da superfície corporal
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Pigmentos heme da mioglobina e hemoglobina (causados por rabdomiólise ou hemólise maciça)
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Outras toxinas endógenas resultantes de perturbações como lise tumoral ou mieloma múltiplo
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Venenos, como etilenoglicol
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Fármacos herbais ou da cultura popular, como ingestão de vesícula biliar de peixe no sudoeste da Ásia
Nefrotoxinas comuns incluem as seguintes:
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Aminoglicosídeos
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Anfotericina B
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Cisplatina e outros fármacos quimioterápicos
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Radiocontraste (particularmente agentes iônicos com osmolalidade alta administrados IV em volumes > 100 mL — ver Nefropatia por contraste)
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AINEs (especialmente quando concomitantes com perfusão renal ruim ou outros agentes nefrotóxicos)
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Colistimetato
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Inibidores de calcineurina (p. ex., ciclosporina, tacrolimus, utilizados de modo sistemático)
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Vancomicina (particularmente com dose acima da terapêutica) (1)
Perda maciça de volume, particularmente em pacientes com choque séptico ou hemorrágico, pancreatite ou cirurgia de grande porte aumenta o risco de NTA isquêmica; pacientes com comorbidades graves têm maior risco.
Cirurgia de grande porte e doença hepatobiliar avançada (2) aumentam o risco de toxicidade aos aminoglicosídeos. Certas combinações de fármacos (p. ex., aminoglicosídios e anfotericina B) podem ser especificamente nefrotóxicas. AINEs podem causar diversos tipos de doença renal intrínseca, incluindo NTA.
A exposição a toxinas causa oclusão irregular, segmentar, tubular luminal com cilindros e debris celulares ou necrose tubular segmentar.
É mais provável que necrose tubular aguda se desenvolva em pacientes com:
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Doença renal crônica preexistente
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Hipovolemia preexistente ou má perfusão renal
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Idade avançada
Referências sobre etiologia
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Stokes MB: Vancomycin in the kidney—A novel cast nephropathy. J Am Soc Nephrol 28(6):1669-1670, 2017. doi: 10.1681/ASN.2017010091.
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Aniort J, Poyet A, Kemeny J-L, et al: Bile cast nephropathy caused by obstructive cholestasis. Am J Kidney Dis 69(1):143-146, 2017. doi: 10.1053/j.ajkd.2016.08.023.
Sinais e sintomas
Necrose tubular aguda costuma ser assintomática, mas pode causar sinais ou sintomas de lesão renal aguda, no início tipicamente oligúria, se a NTA é grave. Mas o débito urinário pode não ser reduzido se a NTA for menos grave (p. ex., comum na NTA induzida por aminoglicosídeos).
Diagnóstico
Suspeita-se de necrose tubular aguda quando a creatinina sérica sobe ≥ 0,3 mg/dL/dia (26,5 micromole/litro) acima do valor inicial ou aumento 1,5 a 2,0 vezes da creatinina sérica após um gatilho aparente (p. ex., evento hipotensivo, exposição a alguma nefrotoxina); a elevação da creatinina pode ocorrer 1 a 2 dias após certas exposições (p. ex., radiocontraste IV), mas pode ser tardia após exposição a outras nefrotoxinas (p. ex., aos aminoglicosídeos).
A NTA deve ser diferenciada da uremia pré-renal, pois o tratamento é diferente. Na uremia pré-renal, a perfusão renal está diminuída o suficiente para elevar o nitrogênio ureico sanguíneo (BUN) desproporcionalmente à creatinina, mas não o suficiente para causar lesão isquêmica das células tubulares. A uremia pré-renal pode ser causada por perda direta de líquidos intravasculares (p. ex., devido a hemorragia, perdas do trato gastrintestinal, perdas urinárias) ou por uma diminuição relativa do volume circulante efetivo sem perda de líquido total corporal (p. ex., na insuficiência cardíaca, hipertensão portal com ascite). Caso a perda de líquido seja a causa, a expansão de volume utilizando soro fisiológico intravenosaa (IV) aumenta o débito urinário e normaliza o nível de creatinina sérica. Se a causa for NTA, a infusão IV de soro fisiológico tipicamente não provoca aumento do débito urinário e nenhuma alteração na creatinina sérica. Azotemia pré-renal não tratada pode progredir para NTA isquêmica.
Achados laboratoriais também ajudam a diferenciar necrose tubular aguda de uremia pré-renal (ver tabela Diferenciação dos achados laboratoriais entre necrose tubular aguda e azotemia pré-renal).
Diferenciação laboratorial entre necrose tubular aguda e uremia pré-renal
Prognóstico
O prognóstico a curto prazo é bom em pacientes saudáveis sob outros aspectos quando a agressão subjacente for corrigida; a creatinina sérica tipicamente retorna ao normal ou quase ao normal dentro de 1 a 3 semanas. Em pacientes enfermos, mesmo com lesão renal aguda leve, a morbidade e a mortalidade estão aumentadas. O prognóstico é melhor em pacientes não hospitalizados em unidade de tratamento intensivo (32% de mortalidade) do que naqueles em unidade de tratamento intensivo (72% de mortalidade). Preditores da mortalidade incluem principalmente:
Os pacientes que sobrevivem à NTA têm maior risco de doença renal crônica.
A causa da morte geralmente é a infecção ou a doença de base.
Tratamento
O tratamento é de suporte com suspensão das nefrotoxinas sempre que possível, manutenção da euvolemia, suporte nutricional e tratamento das infecções (preferencialmente com fármacos não nefrotóxicos). Pode-se usar diuréticos para manter o débito urinário na necrose tubular aguda oligúrica, mas não têm benefício comprovado e não alteram o curso da lesão renal; não existem evidências que respaldem o uso de manitol ou dopamina. O tratamento geral da lesão renal aguda é discutido em outras partes.
Prevenção
A prevenção inclui os seguintes:
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Manutenção da euvolemia e da perfusão renal em pacientes criticamente enfermos
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Evitar fármacos nefrotóxicos quando possível
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Monitorar rigorosamente a função renal quando se utilizarem fármacos nefrotóxicos
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Tomar medidas para prevenir a nefropatia por contraste
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Nos pacientes com diabetes, controlar os níveis sanguíneos de glicose
Não há evidências de que diuréticos de alça, manitol ou dopamina previnam ou alterem o curso da necrose tubular aguda estabelecida.
Pontos-chave
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A necrose tubular aguda (NTA) pode se desenvolver após várias doenças ou gatilhos que diminuem a perfusão renal ou expõem os rins a toxinas.
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Exceto oligúria em casos graves, os sintomas só se desenvolvem depois que a insuficiência renal se desenvolve.
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Diferenciar NTA de azotemia pré-renal pela resposta à expansão do volume e por testes urinários e substâncias químicas no sangue e pelos cálculos derivados deles.
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Corrigir a causa da NTA o mais rápido possível para alcançar um bom prognóstico a curto prazo.
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Interromper nefrotoxinas, manter euvolemia e tratar a infecção e desnutrição.