Transtorno dismórfico corporal

PorKatharine Anne Phillips, MD, Weill Cornell Medical College;
Dan J. Stein, MD, PhD, University of Cape Town
Revisado/Corrigido: jun 2023
Visão Educação para o paciente

Transtorno dismórfico corporal é caracterizado pela preocupação com defeito percebido na aparência física que não é aparente ou aparece apenas ligeiramente para outras pessoas. A preocupação com a aparência deve causar sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento. Os pacientes também apresentam comportamentos excessivamente repetitivos (p. ex., olhar no espelho) em resposta à preocupação com a aparência. O diagnóstico baseia-se na história. O tratamento consiste em terapia farmacológica [especificamente, inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs) ou clomipramina], psicoterapia (especificamente, terapia cognitivo-comportamental) ou ambos.

O transtorno dismórfico corporal geralmente começa na adolescência e pode ser um pouco mais comum em mulheres. A qualquer dado momento no tempo, entre 1,7% e 2,9% das pessoas têm esse transtorno (1).

Referência geral

  1. 1. Hartmann AS, Buhlmann U: Prevalence and Underrecognition of Body Dysmorphic Disorder. In Body Dysmorphic Disorder: Advances in Research and Clinical Practice, edited by Phillips KA. New York, NY, Oxford University Press, 2017.

Sinais e sintomas do transtorno dismórfico corporal

Os sintomas do transtorno dismórfico corporal podem ocorrer de forma gradual ou súbita. Embora a intensidade dos sintomas possa variar, o transtorno é considerado crônico, a menos que os pacientes recebam tratamento adequado.

Os sintomas comumente envolvem a face ou cabeça, mas podem envolver qualquer parte do corpo ou várias partes, podendo mudar de uma parte para outra ao longo do tempo. Por exemplo, os pacientes podem se preocupar com perda de cabelo percebida, acne, rugas, escaras, marcas vasculares, cor da fisionomia, excesso de pelos faciais ou corporais. Ou pode focar em forma ou tamanho de uma parte do corpo, como nariz, olhos, orelhas, boca, mamas, região glútea, pernas ou outras partes do corpo. Homens (e raramente mulheres) podem ter uma forma do transtorno chamada dismorfia muscular, que envolve a preocupação com a ideia de que seu corpo não é suficientemente magro e musculoso. Os pacientes podem descrever as partes do corpo eles de que não gostam como repugnantes, feias, deformadas, abdomináveis ou monstruosas.

Os pacientes costumam passar muitas horas por dia se preocupando com os defeitos percebidos e, muitas vezes, acreditam erroneamente que as pessoas zombam ou dão atenção especial a eles por causa desses defeitos percebidos. Muitos checam a si mesmos, com frequência, em espelhos, outros evitam espelhos e outros ainda alternam entre os 2 comportamentos.

Outros comportamentos compulsivos comuns incluem comparar sua aparência com a de outras pessoas, higiene excessiva, escoriação da pele (para remover ou corrigir defeitos cutâneos percebidos), puxar ou arrancar cabelos, busca de tranquilização (sobre os defeitos percebidos) e troca de roupas. A maioria tenta camuflar seus defeitos visíveis— p. ex., deixando crescer a barba para esconder cicatrizes ou utilizando chapéu para cobrir leve perda de cabelos. Muitos procuram tratamentos dermatológicos, dentários, cirúrgicos ou outros tratamentos cosméticos para corrigir seu defeito percebido, mas esse tratamento geralmente não tem sucesso, o que pode intensificar suas preocupações. Homens com dismorfia muscular podem utilizar esteroides anabolizantes androgênicos e vários suplementos para construir músculos e/ou perder gordura, o que pode ser perigoso.

Como as pessoas com transtorno dismórfico corporal sentem-se inseguras sobre sua aparência, elas podem evitar aparecer em público. Para a maioria, funcionamento social, ocupacional, acadêmico e outros aspectos são substancioalmente comprometidos pelas suas preocupações com a aparência. Alguns deixam suas casas apenas à noite; outros nem assim. Isolamento social, depressão, hospitalização psiquiátrica e comportamento suicida são comuns. Em casos muito graves, o transtorno dismórfico corporal é incapacitante.

O grau de percepção varia, mas geralmente é fraco ou ausente. Ou seja, a maioria dos pacientes realmente acreditam que a parte malvista do corpo provavelmente (má avaliação) ou definitivamente (ausência de avaliação ou convicções delirantes) parece anormal, feia ou pouco atraente.

Ao longo da vida, cerca de 80% das pessoas com transtorno dismórfico corporal experimentam ideação suicida, e cerca de um quarto a quase 30% tenta o suicídio (ver Comportamento suicida). O transtorno dismórfico corporal apresenta níveis significativamente mais altos de suicídio do que outros transtornos psiquiátricos (1, 2)

Referências sobre sinais e sintomas

  1. 1. Angelakis I,  Gooding PA, Panagioti M: Suicidality in body dysmorphic disorder (BDD): A systematic review with meta-analysis. Psychol Rev 49:55-66, 2016. doi: 10.1016/j.cpr.2016.08.002

  2. 2. Snorrason I, Beard C, Christensen K, et al: Body dysmorphic disorder and major depressive episode have comorbidity-independent associations with suicidality in an acute psychiatric setting. J Affect Disord 259:266-270, 2019. doi: 10.1016/j.jad.2019.08.059

Diagnóstico do transtorno dismórfico corporal

  • Critérios do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª edição, Texto Revisado (DSM-5-TR)

Como muitos pacientes se sentem envergonhados e embaraçados demais para revelar seus sintomas, o transtorno dismórfico corporal pode não ser diagnosticado por anos. O transtorno é diferente de preocupações normais com a aparência, pois consome tempo e causa desconforto significativo, prejuízo no funcionamento ou ambos.

O diagnóstico do transtorno dismórfico corporal baseia-se na anamnese. Se a única preocupação é a forma e o peso corporal e o comportamento alimentar é anormal, um transtorno alimentar pode ser o diagnóstico mais preciso; se a única preocupação é a aparência das características físicas sexuais, deve-se considerar o diagnóstico de disforia de gênero.

Os critérios diagnósticos do transtorno dismórfico corporal são:

  • Preocupação com um ou mais defeitos percebidos na aparência que não são observáveis ou são sutis para os outros

  • Comportamentos repetitivos (p. ex., olhar no espelho, cuidados excessivos com a aparência) em resposta às preocupações com a aparência em algum momento durante o transtorno

  • A preocupação causa sofrimento significativo ou comprometimento do funcionamento social, ocupacional ou de outras áreas

Tratamento do transtorno dismórfico corporal

  • Inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS) ou clomipramina mais, em alguns casos, aumento da medicação

  • Terapia cognitivo-comportamental

ISRSs ou clomipramina (um antidepressivo tricíclico com efeitos serotonérgicos potentes) são frequentemente muito eficazes em pacientes com transtorno disfórmico corporal. Em geral, prefere-se um ISRS à clomipramina como terapia farmacológica inicial. Os pacientes frequentemente precisam de doses maiores do que aquelas normalmente necessárias para depressão e a maioria dos transtornos de ansiedade. Embora os dados sejam limitados, alguns pacientes que não melhoram substancialmente com tentativas adequadas com esses fármacos podem se beneficiar da adição de um agente potencializador, como um neuroléptico atípico (p. ex., aripiprazol), buspirona ou um modulador do glutamato (p. ex., N-acetilcisteína ou memantina).

A terapia cognitivo-comportamental adaptada a sintomas específicos do transtorno dismórfico corporal é a terapia de escolha. Abordagens cognitivas (p. ex., reestruturação cognitiva), exposição e prevenção de rituais são elementos essenciais da terapia. Os médicos incentivam os pacientes a enfrentar gradualmente as situações que eles temem ou evitam (que geralmente são situações sociais) enquanto se abstêm de realizar seus rituais, como olhar no espelho, higiene excessiva e comparar sua aparência com a de outras pessoas.

A terapia cognitivo-comportamental também abrange outros elementos como retreinamento perceptual e treinamento de reversão de hábitos de dermatotilexomania (escoriação) ou tricotilomania, se presentes. O treinamento de reversão de hábitos inclui:

  • Treinamento de conscientização (p. ex., automonitoramento, identificação dos gatilhos para o comportamento)

  • Controle de estímulos (modificar as situações — por exemplo, evitando gatilhos — para reduzir a probabilidade de deflagrar o comportamento)

  • Treinamento de resposta alternativa ou competitiva (ensinar os pacientes a substituírem os rituais por outros comportamentos, como cerrar os punhos, fazer tricô ou crochê ou sentar sobre as próprias mãos, para o comportamento excessivo)

Como a maioria dos pacientes tem pouco ou nenhum senso crítico, muitas vezes são necessárias técnicas motivacionais para aumentar seu engajamento e permanência no tratamento.

Muitos especialistas acreditam que a combinação da terapia cognitivo-comportamental de rituais ao tratamento farmacológico seja melhor para os casos graves.

Tratamento cosmético não é recomendado. É quase sempre ineficaz, e os médicos que fornecem esse tratamento podem estar em risco de ameaças físicas ou legais por pacientes insatisfeitos.

Pontos-chave

  • Os pacientes estão preocupados com 1 defeito percebido na aparência física que não são visíveis ou aparecem apenas ligeiramente para outras pessoas.

  • Em dado momento durante o transtorno, os pacientes respondem às suas preocupações com a aparência executando comportamentos repetitivos (p. ex., olhar no espelho, cuidados excessivos com a aparência).

  • A maioria dos pacientes toma medidas para camuflar ou remover o defeito percebido.

  • Em geral, os pacientes têm uma má percepção ou mesmo nenhuma.

  • Tratar com terapia cognitivo-comportamental especificamente adaptada ao transtorno disfórmico corporal e/ou utilizar farmacoterapia como um ISRS ou clomipramina, quase sempre em doses relativamente altas.

  • O tratamento cosmético, que quase sempre é ineficaz, deve ser evitado.

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