Visão geral da função tireoidiana

PorGlenn D. Braunstein, MD, Cedars-Sinai Medical Center
Revisado/Corrigido: ago 2022
Visão Educação para o paciente

A glândula tireoide, localizada na porção anterior do pescoço, bem abaixo da cartilagem cricoide, consiste em 2 lobos ligados por um istmo. As células foliculares na glândula produzem os 2 principais hormônios tireoidianos:

  • Tetraiodotironina (tiroxina, T4)

  • Triiodotironina (T3)

Esses hormônios atuam em células em virtualmente todos os tecidos do organismo, associando-se a receptores nucleares e alterando a expressão de uma grande quantidade de produtos gênicos. O hormônio tireoidiano é necessário para o desenvolvimento normal dos tecidos cerebral e somático nos fetos e recém-nascidos e, em todas as idades, regula o metabolismo de proteínas, carboidratos e gorduras.

T3 é a forma mais ativa na ligação ao receptor nuclear; T4 tem somente atividade hormonal mínima. Entretanto, T4 tem efeito muito mais duradouro e pode ser convertida em T3 (na maioria dos tecidos) e, dessa forma, serve como um reservatório ou pró-hormônio para T3. Uma 3ª forma de hormônio tireoidiano, T3 reverso (rT3), não possui atividade metabólica; as concentrações de rT3 se elevam em certas doenças.

Além disso, as células parafoliculares (células C) secretam o hormônio calcitonina, que é liberado em resposta à hipercalcemia e reduz as concentrações séricas de cálcio (ver Regulação do metabolismo do cálcio).

Síntese e liberação dos hormônios tireoidianos

A síntese dos hormônios tireoidianos requer iodo (ver figura Síntese dos hormônios tireoidianos). O iodo, ingerido na alimentação e na água como iodeto, é ativamente concentrado pela tireoide e convertido em iodo orgânico (organificação) dentro das células foliculares pela peroxidase tireoidiana. As células foliculares circundam um espaço (folículo) preenchido por coloide, que consiste em tireoglobulina, uma glicoproteína que contém tirosina em sua matriz. A tirosina em contato com a membrana das células foliculares é iodada em 1 (monoiodotirosina) ou 2 (di-iodotirosina) locais e depois acoplada para produzir 2 formas de hormônio tireoidiano.

  • Di-iodotirosina + di-iodotirosina T4

  • Di-iodotirosina + monoiodotirosina T3

Síntese de hormônios tireoideos

T3 e T4 permanecem incorporados à tireoglobulina dentro do folículo, até que as células foliculares captem a tireoglobulina sob forma de gotas de coloide. Uma vez no interior das células foliculares, T3 e T4 são clivadas a partir da tireoglobulina.

T3 e T4 livres são então liberados na corrente sanguínea, onde se ligam às proteínas séricas para seu transporte. A proteína transportadora primária é a globulina ligadora tiroxina (GLT), com alta afinidade, porém baixa capacidade de ligação de T3 e T4. A TBG normalmente transporta 75% dos hormônios tireoidianos ligados.

As outras proteínas de ligação são

  • Pré-albumina de ligação a tiroxina (transtiretina), que tem alta afinidade, mas baixa capacidade para T4

  • Albumina, que tem baixa afinidade, mas alta capacidade de se ligar ao T3 e T4

Aproximadamente 0,3% da T3 sérica total e 0,03% da T4 sérica total se encontram na forma livre, em equilíbrio com os hormônios ligados. Apenas T3 e T4 livres estão disponíveis para atuar nos tecidos periféricos.

Todas as reações necessárias para a formação e liberação de T3 e T4 são controladas pelo TSH, que é secretado pelas células tireotróficas pituitárias. A secreção de TSH é controlada por um mecanismo de retroalimentação negativa na hipófise: o aumento das concentrações de T4 e T3 livres inibe a síntese e a secreção de TSH, ao passo que concentrações mais baixas incrementam a secreção de TSH. A secreção de TSH também é influenciada pelo TRH, que é sintetizado no hipotálamo. Os mecanismos precisos que regulam a síntese e liberação de TRH não estão claros, embora a retroalimentação negativa dos hormônios tireoidianos iniba a síntese de TRH.

A maior parte da T3 circulante é produzida fora da tireoide pela monodesiodação de T4. Apenas um quinto da T3 circulante é secretada diretamente pela tireoide.

Exames de laboratório da função tireoidiana

Medição do hormônio estimulante da tireoide (TSH)

Medições de TSH são a melhor maneira de determinar a disfunção tireoidiana (ver tabela Resultados de exames laboratoriais da função tireoidiana em várias situações clínicas). Resultados normais essencialmente descartam hipertireoidismo ou hipotireoidismo, exceto em pacientes com hipotireoidismo central por doença no hipotálamo ou na hipófise, ou em raros pacientes com resistência hipofisária ao hormônio tireoidiano. Os níveis séricos de TSH podem estar falsamente baixos em pessoas muito enfermas, especialmente naqueles que recebem glicocorticoides ou dopamina (ver Síndrome da doença eutireoidiana).

Alterações nos níveis séricos de TSH na presença de níveis séricos normais de T4, T4 livre, T3 e T3 livre definem as síndromes de hipertireoidismo subclínico (baixos níveis séricos de TSH) e hipotireoidismo subclínico (níveis séricos de TSH elevados).

Tabela

Mensuração da tiroxina (T4)

A medição de T4 sérica reflete o hormônio livre e ligado. Alterações nas concentrações de proteínas séricas ligadoras de hormônios tireoidianos produzem alterações correspondentes na T4 total, mesmo que as concentrações de T4 livre fisiologicamente ativa permaneçam inalteradas. Assim, um paciente pode ser fisiologicamente normal, mas apresentar concentração anormal de T4 sérica. A concentração sérica de T4 livre pode ser medida diretamente, evitando os erros de interpretação das concentrações totais de T4.

O índice de T4 livre é um valor calculado que corrige o T4 total para os efeitos de quantidades variáveis de proteínas séricas ligadoras de hormônios tireoidianos e, assim, fornece uma estimativa da T4 livre quando se mede a T4 total. A proporção de ligação de hormônios tireoidianos ou a captação de T4 por resina são utilizadas para estimar a ligação com proteínas. O índice de T4 livre está disponível imediatamente e comparável às medidas diretas de T4 livre.

Medição de tri-iodotironina (T3)

As concentrações de T3 total e T3 livre também podem ser medidas. Como T3 está firmemente ligada à TBG (embora 10 vezes menos que T4), as concentrações séricas totais de T3 são influenciadas pelas alterações das concentrações de TBG e por fármacos que afetam a ligação à TBG. As concentrações séricas de T3 livre são medidas pelos mesmos métodos direto e indireto (índice de T3 livre) descritos para T4 e utilizadas, principalmente, para avaliar tireotoxicose.

Globulina ligante de tiroxina (TBG)

TBG pode ser medida. Aumenta durante a gestação, por terapia com estrogênio ou uso de contraceptivo oral com estrogênio-progesterona, e na fase aguda da hepatite infecciosa. A TBG também pode aumentar por uma mutação ligada ao X no gene que codifica a TBG. É mais comum estar reduzida em decorrência de doenças que diminuem a síntese de proteínas pelo fígado, uso de esteroides anabolizantes, a síndrome nefrótica e uso excessivo de corticoides. Grandes doses de certos fármacos, como fenitoína e ácido acetilsalicílico e seus derivados, deslocam T4 de sua ligação nos sítios da TBG, o que reduz falsamente as concentrações séricas totais de T4.

Autoanticorpos para peroxidase tireoidiana

Os autoanticorpos para peroxidase tireoidiana estão presentes em quase todos os pacientes com tireoidite de Hashimoto (alguns dos quais também apresentam anticorpos antitireoglobulina) e na maioria dos pacientes com doença de Graves. Esses autoanticorpos são marcadores de doenças imunes, mas provavelmente não causam a doença. Entretanto, o autoanticorpo contra o receptor de TSH (thyroid-stimulating hormone) nas células foliculares tireoidianas é responsável pelo hipertireoidismo na doença de Graves. Anticorpos contra T4 e T3 podem ser encontrados nos pacientes com doenças tireoidianas autoimunes e podem alterar os valores das dosagens de T4 e T3, mas raramente com importância clínica.

Tireoglobulina

A tireoide é a única fonte de tireoglobulina, a qual é prontamente detectável no soro de pacientes normais e habitualmente está elevada em pacientes com bócio tóxico e não tóxico. A principal utilidade da medida de tireoglobulina sérica é a avaliação de pacientes após tireoidectomia total ou quase total (com ou sem ablação por Iodo-131) para câncer de tireoide diferenciado. A tireoglobulina sérica normal ou elevada indica a presença de tecido tireoidiano residual normal ou de tecido tireoidiano canceroso em pacientes que estão recebendo doses supressivas de levotiroxina, ou após a suspensão da levotiroxina. Entretanto, anticorpos antitireoglobulina interferem na medição da tireoglobulina.

Triagem para disfunção tireoidiana

Recomenda-se triagem à procura de tireoidite em todos os recém-nascidos para detectar hipotireoidismo congênito, que pode prejudicar o desenvolvimento normal se não for tratado.

Não se recomenda triagem de rotina em adultos assintomáticos, como gestantes sem fatores de risco conhecidos para tireoidite, devido a evidências insuficientes de um benefício. Para pacientes com fatores de risco, deve-se medir os níveis séricos de TSH; este é o melhor exame para triagem à procura de hiper e hipotireoidismo.

Por causa do aumento na prevalência de hipotireoidismo subclínico em idosos, alguns profissionais recomendam a triagem anual dentre aqueles > 70 anos, embora não esteja claro se o tratamento de idosos detectados com hipotireoidismo subclínico tem algum benefício.

Exames de imagem e captação de iodo radioativo

A captação de radioiodo pode ser medida. Uma quantidade muito pequena de radioiodo é administrada por via oral ou IV e um mapeamento detecta a quantidade de radioiodo captada pela tireoide. O radioisótopo preferido é o Iodo-123, que expõe o paciente a radiação mínima (muito inferior à do Iodo-131). A captação de Iodo-123 pela tireoide varia amplamente de acordo com a ingestão de iodo e é baixa em pacientes expostos a excesso de iodo.

O exame é útil para o diagnóstico diferencial de hipertireoidismo (alta captação na doença de Graves e baixa captação na tireoidite). Também pode ser útil para auxiliar o cálculo da dose de Iodo-131 necessária para o tratamento do hipertireoidismo.

As imagens podem ser obtidas utilizando uma câmera de cintilação após administração de radioisótopos (radioiodo e pertecnetato de tecnécio 99m) para produção da representação gráfica da captação do isótopo. As áreas focais de aumento (quentes) ou diminuição (frias) de captação auxiliam a diferenciar áreas de possível câncer (os cânceres de tireoide existem em < 1% dos nódulos quentes em comparação a 10 a 20% dos nódulos frios).

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