Bolhas são elevações contendo líquido com diâmetro ≥ 10 mm.
Penfigoide bolhoso ocorre mais frequentemente em pacientes > 60 anos, mas pode ocorrer em crianças. Autoanticorpos IgG se ligam a certos antígenos hemidesmossomais (BPAg1 [BP230], BPAg2 [BP180]), resultando na ativação do complemento para formar uma bolha subepidérmica (ver figura Níveis de clivagem cutânea no pênfigo e penfigoide bolhoso Níveis de clivagem cutânea no pênfigo e penfigoide bolhoso ).
Níveis de clivagem cutânea no pênfigo e penfigoide bolhoso
Bolhas do pênfigo foliáceo se formam nas camadas superficiais da epiderme. Bolhas do pênfigo vulgar podem se formar em qualquer nível epidérmico, mas tipicamente se formam nos aspectos inferiores da epiderme. Bolhas no penfigoide bolhoso se formam na região subepidérmica (lâmina lúcida da zona da membrana basal). Nessa figura, a zona da membrana basal está desproporcionalmente maior para exibir suas camadas. |
Etiologia do penfigoide bolhoso
Não comprovou-se nenhuma causa de penfigoide bolhoso; mas os gatilhos a seguir foram sugeridos:
Medicamentos [como furosemida, espironolactona, omeprazol, anticorpos monoclonais PD-1 e PD-L1 (p. ex., durvalumabe, nivolumabe, pembrolizumabe), sulfassalazina, penicilina, penicilamina, etanercepte, antipsicóticos e inibidores da dipeptidil peptidase 4]
Gatilhos físicos (incluindo trauma, radioterapia para câncer de mama, radiação UV e antralina)
Doenças de pele (incluindo psoríase Psoríase É uma doença inflamatória cuja manifestação mais comum são as pápulas ou placas eritematosas bem delimitadas, recobertas por escamas prateadas. Vários fatores contribuem, incluindo a genética... leia mais , líquen plano Líquen plano O líquen plano (LP) é uma erupção inflamatória, recorrente e pruriginosa, caracterizada por pequenas pápulas poligonais, aplanadas e violáceas, que podem coalescer formando placas descamativas... leia mais , e algumas infecções)
Doenças (diabetes mellitus Diabetes mellitus (DM) O diabetes mellitus caracteriza-se pela alteração da secreção de insulina e graus variáveis de resistência periférica à insulina, causando hiperglicemia. Os sintomas iniciais são relacionados... leia mais , artrite reumatoide Artrite reumatoide Artrite reumatoide é uma doença crônica autoimune sistêmica que envolve principalmente as articulações. A artrite reumatoide produz lesões mediadas por citocinas, quimiocinas e metaloproteases... leia mais , colite ulcerativa Colite ulcerativa Colite ulcerativa é uma doença inflamatória ulcerativa crônica que surge na mucosa do cólon, caracterizada com mais frequência por diarreia com sangue. Sintomas extraintestinais, particularmente... leia mais e esclerose múltipla Esclerose múltipla (EM) Caracteriza-se por áreas de desmielinização localizada disseminadas no cérebro e na medula espinal. Os sintomas comuns são: anormalidades visuais e oculomotoras, parestesias, fraqueza, espasticidade... leia mais )
Fatores genéticos e ambientais podem influenciar.
Os gatilhos podem induzir uma reação autoimune mimetizando sequências moleculares na membrana epidérmica basal (mimetismo molecular, por exemplo, com fármacos e possivelmente infecções), expondo ou alterando antígenos normalmente tolerados pelo hospedeiro (p. ex., com gatilhos físicos e certas doenças) ou por outros mecanismos. Disseminação de epítopos se refere ao recrutamento de linfócitos autorreativos contra antígenos normalmente tolerados pelo hospedeiro, o que contribui para a cronicidade e curso da doença.
Certas doenças do sistema nervoso central (SNC) e transtornos psiquiátricos podem preceder o penfigoide bolhoso, especialmente na esclerose múltipla e na esquizofrenia, mas também nas demências, sangramentos intracranianos, acidente vascular encefálico, transtornos delirantes e da personalidade, e na doença de Parkinson. Em menor grau, esses transtornos podem ser precedidos pelo penfigoide bolhoso. A hipótese das causas compartilhadas engloba a resposta imunitária cruzada reativa entre antígenos neurais e cutâneos (o BPAg1 é expresso no SNC), bem como o deflagrada por certos fármacos utilizados para tratar os transtornos (como antipsicóticos fenotiazínicos, espironolactona); no entanto, o mecanismo de deflagração farmacológica não foi elucidado.
Sinais e sintomas da penfigoide bolhoso
Prurido é o primeiro sintoma de penfigoide bolhoso. Pode não ocorrer lesão de pele durante vários anos. Mas frequentemente bolhas tensas características se desenvolvem na pele do tronco e nas áreas flexurais e intertriginosas. Bolhas podem se desenvolver na pele de aparência normal ou podem ser precedidas por placas eritematosas ou com aparência de urticária. Pode ocorrer doença localizada em regiões de trauma, estomas, e áreas anogenitais e do membro inferior. Penfigoide disidrótico é uma forma rara do penfigoide bolhoso que afeta mãos e pés e pode se parecer com dermatite disidrótica (uma forma da dermatite de mãos e pés Dermatite de pés e mãos A dermatite de pés e mãos é uma dermatite que afeta as mãos e/ou os pés. Pode ser decorrente de dermatite de contato (alérgica ou irritante) ou de dermatite atópica. As manifestações são eritema... leia mais ) nas palmas das mãos. As bolhas geralmente não se rompem, mas aquelas que se rompem, quase sempre cicatrizam rapidamente.
Podem ocorrer lesões polimórficas, anulares, edematosas e vermelho-escuras, com ou sem vesículas periféricas. Raramente, pequenas bolhas se desenvolvem nas mucosas. Leucocitose e eosinofilia são comuns, mas febre é rara. O sinal de Nikolsky, em que as camadas superiores da epiderme se movem lateralmente a uma leve pressão ou atrito da pele adjacente a uma bolha, é negativo.
Manifestações do penfigoide bolhoso
Biópsia de pele e títulos de IgG
Se houver bolhas, o penfigoide bolhoso precisa ser diferenciado do pênfigo vulgar Pênfigo vulgar É uma doença incomum, potencialmente fatal e autoimune, caracterizada por bolha intraepidérmica e extensas erosões na pele e mucosas aparentemente sadias. O diagnóstico é por biópsia de pele... leia mais , uma doença bolhosa com prognóstico pior; a diferenciação normalmente é possível utilizando critérios clínicos (Diferenciação entre penfigoide bolhoso e pênfigo vulgar Diferenciação entre penfigoide bolhoso e pênfigo vulgar ).
Resultados de testes ajudam a diferenciar pênfigo vulgar de doença IgA linear Pênfigo vulgar É uma doença incomum, potencialmente fatal e autoimune, caracterizada por bolha intraepidérmica e extensas erosões na pele e mucosas aparentemente sadias. O diagnóstico é por biópsia de pele... leia mais , eritema multiforme Doença da imunoglobulina A (IgA) linear É uma doença bolhosa incomum, que se distingue do penfigoide bolhoso e da dermatite herpetiforme por depósitos lineares de IgA na zona da membrana basal. O diagnóstico é por biópsia da pele... leia mais , erupções induzidas por fármacos Eritema multiforme O eritema multiforme é uma reação inflamatória, caracterizada por lesões de pele em “íris” ou em “alvo”. A mucosa oral pode estar envolvida. O diagnóstico é clínico. As lesões regridem de forma... leia mais , penfigoide benigno da mucosa Erupções e reações a fármacos Os fármacos podem causar diversas reações e erupções na pele. As mais graves dessas são discutidas em outra parte deste Manual e incluem síndrome de Stevens-Johnson e necrólise epidérmica tóxica... leia mais , penfigoide paraneoplásico Penfigoide da mucosa Penfigoide da mucosa é a designação dada a um grupo heterogêneo de doenças autoimunes crônicas raras que tendem a causar lesões bolhosas gradualmente progressivas e ascendentes das mucosas,... leia mais , dermatite herpetiforme Dermatite herpetiforme Dermatite herpetiforme é uma erupção cutânea crônica, autoimune, papulovesicular e intensamente pruriginosa fortemente associada à doença celíaca. Os achados típicos são aglomerados de lesões... leia mais e epidermólise bolhosa adquirida Epidermólise bolhosa adquirida Epidermólise bolhosa adquirida é uma doença hereditária rara e crônica caracterizada por bolhas subepidérmicas. O diagnóstico é por biópsia da pele e imunofluorescência direta. O tratamento... leia mais .
Se houver suspeita de penfigoide bolhoso, biópsia de pele para histologia e teste de imunofluorescência direta. Amostras do interior e arredores da própria lesão muitas vezes são utilizadas para histologia, mas utilizam-se amostras da pele não envolvida (geralmente cerca de 3 mm da borda de uma lesão) para imunofluorescência direta. A bolha no penfigoide bolhoso é subepidérmica, muitas vezes contendo muitos neutrófilos e eosinófilos. Imunofluorescência direta mostra depósitos complementares lineares de IgG ao longo da zona da membrana basal (junção dermo-epidérmica). Imunofluorescência indireta mostra depósitos circulantes de IgG no lado epidérmico de uma preparação dividida por sal da pele normal (isto é, substrato de teste).
Testa-se o soro à procura de anticorpos IgG contra BPAg1 e BPAg2 utilizando um ensaio de imunoadsorção enzimática (ELISA). Anticorpos IgG na circulação estão presentes em aproximadamente três quartos dos pacientes.
Prognóstico para penfigoide bolhoso
O penfigoide bolhoso é uma doença crônica potencialmente fatal, sobretudo sem tratamento. Embora tratamentos tópicos e sistêmicos sejam úteis, podem ter efeitos adversos.
Em geral, a remissão ocorre em meses, mas às vezes é necessário tratamento por vários anos.
Tratamento do penfigoide bolhoso
Corticoides tópicos ou orais
Fármacos anti-inflamatórios
Fármacos imunossupressores ou biológicos
Corticoides tópicos de alta potência (p. ex., creme de clobetasol a 0,05%) devem ser utilizados para doença localizada e podem reduzir a dose necessária de fármacos sistêmicos.
Pacientes com doença generalizada costumam exigir tratamento sistêmico com prednisona, 60 a 80 mg por via oral uma vez ao dia, que pode ser reduzida para a dose de manutenção de ≤ 10 a 20 mg/dia após várias semanas. A maioria dos pacientes alcança remissão após 2 a 10 meses, mas o tratamento pode precisar ser mantido por vários anos antes de o processo da doença apresentar remissão suficiente para permitir a descontinuação. Se for necessária terapia a longo prazo, uma nova bolha a cada poucas semanas não exige aumentar a dose de prednisona.
Penfigoide bolhoso algumas vezes responde à atividade anti-inflamatória de certos fármacos, como uma combinação de tetraciclina ou minociclina e nicotinamida. Outras opções de tratamento incluem a monoterapia com dapsona, sulfapiridina ou eritromicina. A imunoglobulina IV é utilizada ocasionalmente.
Para pacientes com doença recalcitrante ou generalizada, e algumas vezes para aumentar a dose de corticoides na doença crônica, imunossupressores como metotrexato, azatioprina, ciclofosfamida, micofenolato de mofetila e ciclosporina podem ser utilizados. Entre os biológicos, pode-se utilizar rituximabe e omalizumabe.
Pontos-chave
Penfigoide bolhoso geralmente afeta pacientes > 60 anos e é autoimune e idiopático.
Prurido pode preceder em anos o desenvolvimento de um exantema, e o envolvimento de mucosas é raro.
Fazer biópsia da pele para realizar testes histológicos e de imunofluorescência e medir autoanticorpos circulantes.
Tratar os pacientes com corticoides tópicos de alta potência, quando possível, para evitar ou minimizar o uso de corticoides sistêmicos.
Pode-se utilizar terapia anti-inflamatória, imunossupressora, e biológica para diminuir a dose de corticoides.
Os sintomas geralmente diminuem em meses, mas às vezes o tratamento é necessário por vários anos.