Angioedema hereditário e adquirido

(Deficiência adquirida do inibidor de C1)

PorJames Fernandez, MD, PhD, Cleveland Clinic Lerner College of Medicine at Case Western Reserve University
Revisado/Corrigido: out 2022
Visão Educação para o paciente

Angioedema hereditário e angioedema adquirido (deficiência adquirida do inibidor de C1) são causados por deficiência ou disfunção no inibidor do complemento 1 (C1), uma proteína envolvida na regulação da ativação das vias clássica e da lectina do complemento e das vias da cinina, da coagulação e fibrinolítica. O principal sintoma é edema, em geral, da face, boca e vias respiratórias superiores, que pode ser grave; prurido e urticária não ocorrem. O diagnóstico é feito medindo os níveis do complemento. O inibidor de C1 é usado para tratar crise agudas. A profilaxia é com andrógenos atenuados, que aumentam os níveis do inibidor de C1.

(Ver também Visão geral dos distúrbios alérgicos e atópicos, Angioedema, e US HAEA [Hereditary Angioedema Association] Medical Advisory Board 2020 Guidelines for the Management of Hereditary Angioedema [2020]).)

A deficiência ou disfunção do inibidor de C1 não apenas afeta a ativação do complemento como também resulta em aumento dos níveis de bradicinina porque o inibidor de C1 inibe a calicreína ativada (necessária para a produção de bradicinina) na via das cininas.

Vias de ativação do complemento

As 3 vias de ativação convergem para uma via comum quando a C3 convertase cliva o componente C3 em C3a e C3b. Ac = anticorpo; Ag = antígeno; C1-INH = inibidor de C1; MAC = complexo de ataque à membrana; MASP = protease serina associada a MBL; MBL = lectina ligante de manose. A barra superior indica a ativação.

Angioedema hereditário

O angioedema hereditário tem 3 tipos:

  • Tipo 1 (80% a 85%): caracterizado por deficiência do inibidor de C1

  • Tipo 2 (15 a 20%): caracterizado por disfunção do inibidor de C1

  • Tipo 3 (raro): caracterizado por função e níveis normais do inibidor de C1

Os tipos 1 e 2 envolvem mutações do gene que codifica o inibidor de C1. A herança no tipo 1 é autossômica dominante. A apresentação clínica normalmente ocorre durante a infância ou adolescência; 75% dos pacientes com o tipo 1 têm um episódio até os 15 anos de idade.

O tipo 2 decorre de um inibidor de C1 disfuncional. A herança é autossômica dominante, embora mutações de novo ocorram em aproximadamente 25% dos casos (1).

Tipo 3 é raro. É caracterizada por inibidor de C1 normal e, às vezes, é decorrente de mutações genéticas que resultam em formas anormais do fator XII, plasminogênio, angiopoietina 1 ou cininogênio. O tipo 3 ocorre mais frequentemente em mulheres.

Deficiência adquirida do inibidor de C1

A deficiência do inibidor de C1 pode ser adquirida quando

  • O complemento é consumido em doenças neoplásicas (p. ex., linfoma de linfócitos B) ou em distúrbios de complexos imunes.

  • O autoanticorpo inibidor de C1 é produzido na gamopatia monoclonal.

  • Em casos raros, o autoanticorpo inibidor de C1 é produzido em doenças autoimunes (p. ex., lúpus eritematoso sistêmico, dermatomiosite).

A apresentação clínica geralmente ocorre em uma idade mais avançada, quando os pacientes têm uma doença associada.

Gatilhos

Em todas as formas de angioedema hereditário e adquirido, as crises podem ser deflagradas por

  • Trauma leve (p. ex., trabalho dentário, piercing na língua)

  • Doença viral

  • Exposição ao frio

  • Gestação

  • Tamoxifeno e fármacos contendo estrogênio

  • Ingestão de certos alimentos

O angioedema pode ser agravado por estresse emocional.

Referência geral

  1. 1. Pappalardo E, Cicardi M, Duponchel C, et al: Frequent de novo mutations and exon deletions in the C1inhibitor gene of patients with angioedema. J Allergy Clin Immunol 106 (6):1147–1154, 2000. doi: 10.1067/mai.2000.110471

Sinais e sintomas

Os sinais e sintomas do angioedema hereditário e adquirido são semelhantes aos das outras formas de angioedema mediado pela bradicinina, com edema assimétrico e levemente doloroso que muitas vezes acomete a face, os lábios e/ou a língua. O edema também pode ocorrer no dorso das mãos ou dos pés ou nos órgãos genitais.

O trato gastrintestinal frequentemente está envolvido, com manifestações que sugerem obstrução intestinal, incluindo náuseas, vômitos e desconforto com cólicas.

Prurido, urticária e broncoespasmo não ocorrem, mas pode haver edema da laringe, provocando estridor (e, às vezes, morte).

O edema desaparece em cerca de 1 a 3 dias depois do início do quadro. No angioedema hereditário, os sintomas desaparecerem à medida que os componentes do complemento são consumidos.

Diagnóstico

  • Medição dos níveis do complemento

Se o angioedema não é acompanhado de urticária e recorre sem nenhuma causa clara ou é desencadeado por trauma local, os médicos devem suspeitar de angioedema hereditário ou deficiência adquirida do inibidor de C1. Se os familiares tiverem esse tipo, os médicos devem suspeitar de angioedema hereditário.

Níveis de C4, inibidor de C1 e C1q (um componente de C1) são medidos. O angioedema hereditário (tipos 1 e 2) ou a deficiência adquirida do inibidor de C1 são confirmados por

  • Baixos níveis de C4, mesmo entre os episódios

  • Diminuição do nível ou função do inibidor de C1

Outros achados incluem

  • Angioedema hereditário tipo 1: baixos níveis de proteína inibidora de C1, diminuição da função do inibidor de C1 e níveis normais de C1q

  • Angioedema hereditário tipo 2: níveis normais ou aumentados da proteína inibidora de C1, diminuição da função do inibidor de C1 e níveis normais de C1q

  • Deficiência adquirida do inibidor de C1: níveis baixos de C1q

  • Angioedema hereditário tipo 3: nível e função normais do inibidor de C1 e níveis normais de C e C1q

Deve-se examinar todos os parentes de primeiro grau de um paciente com angioedema hereditário confirmado, com ou sem sintomas. A triagem deve incluir o nível de inibidores de C1 e o nível de C4 (1).

Referência sobre diagnóstico

  1. 1. Zuraw BL, Bernstein JA, Lang DM, et al: A focused parameter update: Hereditary angioedema, acquired C1 inhibitor deficiency, and angiotensin-converting enzyme inhibitor–associated angioedema. J Allergy Clin Immunol 131 (6):1491-1493, 2013. doi: 10.1016/j.jaci.2013.03.034

Tratamento

  • Para crises agudas, inibidor de C1, ecallantide, icatibant

Em crises agudas, os seguintes são considerados tratamento de primeira linha:

  • Inibidor de C1 esterase derivado de plasma humano

  • Inibidor de C1 recombinante obtido do leite de coelhas transgênicas

  • Ecalantida (uma proteína recombinante que age como um inibidor reversível da calicreína)

  • Icatibanto (um decapeptídeo sintético que age como um antagonista competitivo reversível do receptor de bradicinina tipo 2)

O inibidor de C1 recombinante tem atividade inibidora de protease semelhante, mas uma meia-vida mais curta do que o inibidor de C1 derivado de plasma (1).

Se nenhum desses fármacos estiver disponível, plasma fresco congelado ou, na União Europeia, ácido tranexâmico tem sido usado. Uma forma recombinante do inibidor de C1, o inibidor de C1 recombinante, também está disponível.

Se as vias respiratórios estão afetadas, manter uma via respiratória permeável é a prioridade mais importante. Adrenalina pode fornecer o benefício transitório em crises agudas quando as vias respiratórias estão envolvidas. Mas o benefício pode não ser suficiente ou pode ser temporário; assim, pode ser necessária entubação endotraqueal. Corticoides e anti-histamínicos não são eficazes.

Analgésicos, antieméticos e reposição de líquidos podem ser usados para aliviar os sintomas.

O tratamento dos pacientes com angioedema hereditário foca 4 princípios fundamentais (2):

  • Disponibilidade de terapia aguda eficaz sob demanda a todos os pacientes

  • Tratamento precoce para prevenir a progressão das crises

  • Tratamento das crises, independentemente do local do edema

  • Incorporação da profilaxia a longo prazo com base na tomada de decisão altamente individualizada, refletindo uma parceria entre o médico e o paciente

Com base nesses princípios, todos os pacientes com angioedema hereditário confirmado devem ter acesso a ≤ 2 doses padrão de uma medicação sob demanda para o tratamento de crises agudas (2).

Dicas e conselhos

  • Anti-histamínicos e corticoides não são eficazes para o angioedema hereditário ou adquirido.

Referências sobre o tratamento

  1. 1. Moldovan D, Bernstein JA, Cicardi M: Recombinant replacement therapy for hereditary angioedema due to C1 inhibitor deficiency. Immunotherapy 7 (7):739–752, 2015. doi: 10.2217/imt.15.44

  2. 2. Busse PJ, Christiansen SC, Riedl MA, et al: US HAEA Medical Advisory Board 2020 guidelines for the management of hereditary angioedema. J Allergy Clin Immunol Pract 9 (1):132–150.e3, 2021. doi: 10.1016/j.jaip.2020.08.046

Prevenção

Profilaxia a longo prazo

Os fármacos usados para profilaxia a longo prazo dos episódios hereditários de angioedema incluem

  • Inibidor de C1 derivado de plasma (humano)

  • Lanadelumab

  • Berotralstat

  • Andrógenos atenuados

  • Antifibrinolíticos (p. ex., ácido tranexâmico)

Pode-se administrar o inibidor de C1 derivado de plasma em infusões IV regulares ou injeções subcutâneas como profilaxia a longo prazo. Pode-se ensinar aos pacientes a autoadministração. O inibidor de C1 derivado de plasma está aprovado para prevenção a longo prazo do angioedema hereditário nos Estados Unidos, mas o inibidor de C1 esterase recombinante não.

O lanadelumabe é um anticorpo monoclonal humanizado recombinante que se liga à calicreína plasmática e bloqueia sua atividade. A dose habitual é 300 mg por via subcutânea a cada 2 semanas.

Berotralstat é uma pequena molécula sintética desenvolvida para inibir a calicreína plasmática. A dose é 150 mg por via oral uma vez ao dia

Andrógenos atenuados (p. ex., estanozolol, 2 mg por via oral 3 vezes ao dia, danazol, 200 mg por via oral 3 vezes ao dia) são usados para estimular a síntese hepática do inibidor de C1. O tratamento pode ser menos eficaz para a forma adquirida.

Antifibrinolíticos (p. ex., ácido tranexâmico) foram utilizados como fármacos de segunda linha para profilaxia prolongada em crianças e gestantes.

Profilaxia a curto prazo

Indica-se profilaxia a curto prazo para angioedema hereditário antes de procedimentos de alto risco (p. ex., procedimentos odontológicos ou das vias respiratórias) se o inibidor de C1 não está disponível para o tratamento de uma crise aguda. Os pacientes geralmente recebem andrógenos atenuados (p. ex., danazol, estanozolol) 5 dias antes do procedimento até 2 dias depois. Se o inibidor de C1 (recombinante ou derivado de plasma) está disponível, alguns especialistas defendem administrá-lo 1 hora antes de procedimentos de alto risco, em vez de andrógenos atenuados para a profilaxia a curto prazo. Produtos de plasma (p. ex., 2 unidades de plasma fresco congelado) antes de procedimentos também são uma opção (1).

Referência sobre prevenção

  1. 1. Prematta M, Gibbs JG, Pratt EL: Fresh frozen plasma for the treatment of hereditary angioedema. Ann Allergy Asthma Immunol 98 (4):383–388, 2007.

Pontos-chave

  • O início geralmente ocorre na infância ou adolescência para angioedema hereditário ou durante a vida adulta para angioedema adquirido, muitas vezes em pacientes com doença neoplásica ou autoimune.

  • Trauma leve, doença viral, exposição ao frio, gestação ou ingestão de certos alimentos podem desencadear as crises; estresse emocional pode agravá-las.

  • Medir os níveis de complemento; níveis baixos de C4 e diminuição na função do inibidor de C1 indicam angioedema hereditário ou deficiência adquirida do inibidor de C1.

  • Para crises agudas, usar inibidor de C1 purificado humano, inibidor de C1 recombinante, ecallantide, icatibant, ou icatibant para alívio dos sintomas, utilizar analgésicos, antieméticos e líquidos; anti-histamínicos e corticoides são ineficazes.

  • Para profilaxia a longo prazo, usar infusões regulares do inibidor de C1 derivado de plasma, lanadelumabe ou berotralstat.

  • Para profilaxia a curto prazo (p. ex., antes de procedimentos odontológicos ou das vias respiratórias), considerar inibidor de C1, andrógenos atenuados (p. ex., estanozolol, danazol) ou produtos de plasma como plasma fresco congelado.

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