Glomerulosclerose segmentar e focal

PorFrank O'Brien, MD, Washington University in St. Louis
Reviewed ByNavin Jaipaul, MD, MHS, Loma Linda University School of Medicine
Revisado/Corrigido: modificado abr. 2025
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Visão Educação para o paciente

Glomerulosclerose segmentar e focal é a esclerose mesangial dispersa (segmentar) que começa em alguns, mas não em todos, os glomérulos e com o tempo envolve todos os glomérulos. Em geral, é idiopática, mas pode ser secundária à utilização de heroína, infecção pelo HIV obesidade, anemia falciforme, doença ateroembólica, ou perda de néfrons (p. ex., em nefropatia de refluxo, nefrectomia subtotal ou disgenesia renal). As manifestações surgem principalmente na adolescência, mas também em adultos jovens e de meia-idade. Os pacientes sofrem início insidioso de proteinúria, hematúria leve, hipertensão e uremia. O diagnóstico é confirmado por biópsia renal. O tratamento é feito com inibidores de angiotensina e, para doença idiopática, corticoides e, eventualmente, outros agentes imunossupressores.

A glomerulosclerose segmentar e focal (GESF) é a causa mais comum de síndrome nefrótica idiopática (ou primária) entre adultos nos Estados Unidos. É especialmente comum em homens negros (1, 2). Embora geralmente idiopática, a GESF pode ocorrer em associação com outros fatores (GESF secundária), incluindo

  • Medicamentos e drogas ilícitas (p. ex., heroína, lítio, interferon alfa, pamidronato, ciclosporina ou fármacos anti-inflamatórios não esteroides [causando nefropatia por analgésicos])

  • Doença ateroembólica afetando os rins

  • Obesidade

  • Infecção por HIV (ver nefropatia associada ao HIV)

  • Distúrbios que causam perda de néfrons (p. ex., nefropatia de refluxo, nefrectomia subtotal, disgenesia renal [p. ex., oligomeganefronia: hipoplasia renal com número diminuído de néfrons])

Existem casos familiares.

Na glomerulonefrite segmentar e focal, as barreiras de filtração glomerular quanto ao tamanho e à carga molecular são defeituosas e a proteinúria é tipicamente não seletiva, afetando proteínas de alto peso molecular (p. ex., imunoglobulinas), bem como albumina. Os rins tendem a ser pequenos.

Referências gerais

  1. 1. McDonnell T, Storrar J, Chinnadurai R, et al. The epidemiology of primary FSGS including cluster analysis over a 20-year period. BMC Nephrol 2023;24(1):365. Publicado em 2023 Dez 10. doi:10.1186/s12882-023-03405-w

  2. 2. Kitiyakara C, Kopp JB, Eggers P. Trends in the epidemiology of focal segmental glomerulosclerosis. Semin Nephrol 2003;23(2):172-182. doi:10.1053/snep.2003.50025

Sinais e sintomas da glomerulosclerose segmentar e focal

Os pacientes com glomerulosclerose segmentar e focal (GESF) comumente se apresentam com proteinúria maciça, hipertensão e disfunção renal, edema, ou uma combinação. Às vezes, o único sinal é proteinúria assintomática que não está no intervalo nefrótico ( 3 g/dia). Ocasionalmente, encontra-se hematúria microscópica.

Diagnóstico da glomerulosclerose segmentar e focal

  • Biópsia renal, quando possível, com coloração imunitária e microscopia eletrônica

Suspeita-se de glomerulosclerose segmentar e focal (GESF) em pacientes com síndrome nefrótica, proteinúria ou disfunção renal sem causa óbvia, particularmente em pacientes com doenças ou uso de medicamentos ou de drogas ilícitas associados à GESF.

Realiza-se urinálise e medem-se os níveis de nitrogênio da ureia sanguínea (BUN), creatinina e proteinúria de 24 hora ou medição pontual da relação proteína urinária:creatinina.

O diagnóstico é confirmado por biópsia renal, que mostra hialinização focal e segmentar dos glomérulos, a imunocoloração geralmente mostra IgM e depósitos de complemento (C3) em um padrão nodular disperso. A microscopia eletrônica revela apagamento dos processos podais dos podócitos em casos idiopáticos, mas mostram apagamento irregular nos casos secundários. Pode ser visível a esclerose global, juntamente com glomérulos atróficos secundários. A biópsia pode ser falsamente negativa caso não haja amostras das áreas de alterações focais.

Glomerulosclerose segmentar e focal
Glomerulosclerose segmentar e focal
Glomerulosclerose segmentar e focal

A imagem superior mostra o lado direito do glomérulo. O glomérulo com esclerose segmentar é formado pela luz dos capilares obliterados e aumento da quantidade de matriz mesangial. O restante do glomérulo é normal (coloração prata de Jones, × 400). Na imagem inferior, a matriz da cartilagem hialina, definida como material liso e de aparência vítrea, resulta da insudação (o oposto da exsudação) das proteínas plasmáticas. Ocorre com frequência e não é diagnóstica (coloração prata de Jones, × 400).

A imagem superior mostra o lado direito do glomérulo. O glomérulo com esclerose segmentar é formado pela luz dos capila

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Image provided by Agnes Fogo, MD, and the American Journal of Kidney Diseases' Atlas of Renal Pathology (see www.ajkd.org).

Glomeruloesclerose segmentar e focal (IgM no mesângio)
Glomeruloesclerose segmentar e focal (IgM no mesângio)

A imunofluorescência anti-IgM revela a existência de IgM no mesângio ou nas áreas da hialinose (coloração globular homogênea à direita). Acredita-se que a IgM fique presa nas áreas de expansão e esclerose do mesângio (× 200).

A imunofluorescência anti-IgM revela a existência de IgM no mesângio ou nas áreas da hialinose (coloração globular homo

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Glomeruloesclerose segmentar e focal (embotamento e apagamento dos processos do pododactilo)
Glomeruloesclerose segmentar e focal (embotamento e apagamento dos processos do pododactilo)

Pode-se observar extenso embotamento e apagamento dos pedicelos à microscopia eletrônica (× 3.000).

Pode-se observar extenso embotamento e apagamento dos pedicelos à microscopia eletrônica (× 3.000).

Image provided by Agnes Fogo, MD, and the American Journal of Kidney Diseases' Atlas of Renal Pathology (see www.ajkd.org).

Glomerulosclerose segmentar e focal (esclerose global)
Glomerulosclerose segmentar e focal (esclerose global)

O glomérulo central nessa amostra de biópsia revela esclerose global. O achado é inespecífico e pode ocorrer em resposta a lesões ou ao envelhecimento (coloração prata de Jones, × 100).

O glomérulo central nessa amostra de biópsia revela esclerose global. O achado é inespecífico e pode ocorrer em respost

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Glomerulosclerose segmentar e focal (lesão da ponta)
Glomerulosclerose segmentar e focal (lesão da ponta)

A lesão da ponta é a esclerose segmentar localizada no polo glomerular onde o túbulo se origina. Pode ser um marcador de melhor prognóstico (coloração prata de Jones, × 200).

A lesão da ponta é a esclerose segmentar localizada no polo glomerular onde o túbulo se origina. Pode ser um marcador d

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Tratamento da glomerulosclerose segmentar e focal

  • Inibição da angiotensina

  • Corticoides e, às vezes, outros agentes imunossupressores para GESF idiopática

  • Transplante de rim para pacientes com insuficiência renal

Em geral, o tratamento não é eficaz. Pacientes com GESF devem ser tratados com inibidores da angiotensina (com inibidores da enzima conversora de angiotensina [ECA], ou bloqueador de receptor da angiotensina II [BRA]), a menos que contraindicados por angioedema ou hiperpotassemia (1). Os pacientes com síndrome nefrótica devem ser tratados com uma estatina.

Na GESF idiopática, indica-se um curso de terapia imunossupressora se a proteinúria alcançar o intervalo nefrótico ou se a função renal piorar, especialmente se a biópsia renal revelar uma lesão da ponta. Em comparação, pacientes com GESF secundária, GESF colapsante, ou fibrose tubulointersticial avançada na biópsia renal não são geralmente tratados com imunossupressão porque tendem a não responder; em vez disso, a doença primária é tratada.

Terapia imunossupressora

Altas doses de corticoides são recomendados por pelo menos 2 meses, apesar de alguns especialistas recomendarem por até 9 meses (2). Relataram-se taxas de resposta de 30 a 70% com tratamento prolongado e variam de acordo com a classificação da glomerulonefrite segmentar e focal (3). Após remissão da proteinúria por 2 semanas, o corticoide é lentamente reduzido. Casos secundários ou familiares, GESF e fibrose tubulointersticial avançada apresentam maior probabilidade de serem resistentes aos corticoides.

Se ocorrer apenas uma leve melhora ou recidiva com corticoide, a remissão pode ser induzida com um inibidor de calcineurina (p. ex., ciclosporina ou tacrolimo) por pelo menos 6 meses. Embora outros inibidores da calcineurina tenham sido mais estudados do que o tacrolimo para glomerulonefrite segmentar e focal, alguns médicos preferem o tacrolimo porque este é comumente utilizado para outras doenças glomerulares e há menor risco de efeitos colaterais cosméticos (p. ex., hirsutismo, hiperplasia gengival). Em casos selecionados, micofenolato de mofetila pode ser utilizado como alternativa (3).

Em pacientes com contraindicações a altas doses de corticoides (p. ex., diabetes, osteoporose), pode-se administrar inibidores da calcineurina associados a uma dose menor de corticoides.

Uma alternativa é troca plasmática em combinação com imunossupressão.

Referências sobre tratamento

  1. 1. Beer A, Mayer G, Kronbichler A. Treatment Strategies of Adult Primary Focal Segmental Glomerulosclerosis: A Systematic Review Focusing on the Last Two Decades. Biomed Res Int 2016;2016:4192578. doi:10.1155/2016/4192578

  2. 2. Korbet SM. Treatment of primary FSGS in adults. J Am Soc Nephrol 2012;23(11):1769-1776. doi:10.1681/ASN.2012040389

  3. 3. Kidney Disease: Improving Global Outcomes (KDIGO) Glomerular Diseases Work Group. KDIGO 2021 Clinical Practice Guideline for the Management of Glomerular Diseases. Kidney Int 100(4S):S1-S276, 2021. doi:10.1016/j.kint.2021.05.021

Prognóstico para glomerulosclerose segmentar e focal

O prognóstico é reservado. A remissão espontânea ocorre em < 10% dos pacientes. A insuficiência renal ocorre em cerca de metade dos pacientes em 8 anos; em alguns, particularmente aqueles com fibrose tubulointersticial significativa, a insuficiência renal ocorre muito mais rapidamente, apesar do tratamento (1). A doença tem progresso mais rápido em adultos do que em crianças.

A presença de esclerose segmentar e focal persistente no polo glomerular em que se origina o túbulo (lesão da ponta) pode prever uma resposta mais favorável ao tratamento com corticoides. Outra variante, na qual as paredes capilares estão enrugadas ou colapsadas (GESF colapsante, que está geralmente associada ao abuso de drogas intravenosas ou infecção pelo HIV), sugere doença mais grave e de progressão rápida para falência renal. Gestação pode exacerbar a GESF.

A GESF reincide após transplante de rim: a proteinúria algumas vezes retorna horas após o transplante. Dos pacientes cujo transplante foi devido à insuficiência renal causada por GESF, até 40% perdem o enxerto por recidiva da GESF em 5 anos; o risco é maior em pacientes mais jovens, pacientes que não são negros, pacientes que desenvolvem insuficiência renal < 3 anos após o início da doença, pacientes com proliferação mesangial e pacientes com transplantes repetidos quando o diagnóstico antes do primeiro transplante foi GESF primária (2). As formas familiares de glomerulonefrite segmentar e focal raramente recidivam após o transplante.

Pessoas que utilizam heroína e desenvolvem síndrome nefrótica devido à glomerulonefrite segmentar e focal podem experimentar remissão completa se cessarem o consumo de heroína no início da doença.

Referências sobre prognóstico

  1. 1. Korbet SM. Clinical picture and outcome of primary focal segmental glomerulosclerosis. Nephrol Dial Transplant 1999;14 Suppl 3:68-73. doi:10.1093/ndt/14.suppl_3.68

  2. 2. Uffing A, Pérez-Sáez MJ, Mazzali M, et al. Recurrence of FSGS after Kidney Transplantation in Adults. Clin J Am Soc Nephrol 2020;15(2):247-256. doi:10.2215/CJN.08970719

Pontos-chave

  • Suspeita-se de glomerulosclerose segmentar e focal em pacientes com síndrome nefrótica, proteinúria ou disfunção renal sem causa óbvia, particularmente pacientes com doenças ou uso de medicamentos ou de drogas ilícitas associados à GESF.

  • Quando possível, confirmar GESF por biópsia renal com coloração imunitária e microscopia eletrônica.

  • Considerar o tratamento com corticoides e, possivelmente, um inibidor da calcineurina (p. ex., ciclosporina ou tacrolimo) ou, alternativamente, micofenolato de mofetil, se a GESF for idiopática e a proteinúria alcançar a faixa nefrótica ou se a função renal piorar.

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