Coccidioidomicose

(Febre de São Joaquim; febre do Vale)

PorPaschalis Vergidis, MD, MSc, Mayo Clinic College of Medicine & Science
Revisado/Corrigido: set 2023
Visão Educação para o paciente

Coccidioidomicose é causada pelo fungo Coccidioides immitis e C. posadasii; geralmente ocorrendo como uma infecção respiratória aguda, benigna, assintomática, ou autolimitada. O espectro da doença varia de pneumonia aguda a doença extrapulmonar disseminada (incluindo meningite). Os sintomas, quando presentes, são os mesmos de infecção do trato respiratório inferior ou de doença disseminada inespecífica de baixo grau. Suspeita-se do diagnóstico por características clínicas e epidemiológicas, confirmado por radiografia de tórax, cultura e sorologia. O tratamento, se necessário, normalmente é feito com fluconazol, itraconazol, novos triazóis, ou anfotericina B.

(Ver também Visão geral das infecções fúngicas.)

Na América do Norte, a área endêmica de coccidioidomicose engloa

  • O sudoeste dos Estados Unidos

  • O norte do México

As áreas afetadas do sudoeste dos Estados Unidos incluem o Arizona, o vale central da Califórnia, partes do Novo México e o Texas a oeste de El Paso. A área se estende pelo norte do México e focos ocorrem em partes da América Central e da Argentina. Coccidioides também ocorre em Utah, Nevada e no centro-sul de Washington.

A coccidioidomicose causa cerca de 15 a 30% dos casos de pneumonia adquirida na comunidade em áreas altamente endêmicas do Arizona, como nas regiões metropolitanas de Tucson e Phoenix (1). Nos Estados Unidos, foram notificados 20.003 casos de coccidioidomicose em 2019 (1).

Referência

  1. 1. Centers for Disease Control and Prevention (CDC): Valley Fever (Coccidioidomycosis) Statistics. Acessado em 3 de julho de 2023.

Fisiopatologia da coccidioidomicose

Coccidioidomicose é adquirida pela inalação de esporos. Os esporos estão presentes no solo e podem ser aereotransportados pela poeira que se move com o vento. Assim, certas ocupações (p. ex., agricultura, construção) e atividades recreativas ao ar livre aumentam o risco. As epidemias podem ocorrer quando chuvas fortes, que promovem o crescimento do micélio, são seguidas por seca e ventos. Por causa de manifestações clínicas de início tardio e viagens, as infecções tornam-se evidentes, algumas vezes, fora de áreas endêmicas.

Uma vez inalados, os esporos de C. immitis se convertem em grandes esferas invasivas. À medida que as esferas se tornam maiores e se rompem, cada uma libera múltiplos e pequenos endosporos que podem formar novas esferas.

A patologia pulmonar é caracterizada por uma reação granulomatosa aguda, subaguda, ou crônica, com vários graus de fibrose. As lesões podem cavitar ou formar lesões no formato de moedas.

Às vezes, a doença progride, com grande envolvimento pulmonar, disseminação sistêmica, ou ambos; lesões focais podem se formar em quase todos os tecidos, mais comumente na pele, tecido subcutâneo, ossos (osteomielite), articulações e meninges (meningite).

Fatores de risco de coccidioidomicose

Coccidioidomicose progressiva é mais incomum em pessoas do contrário saudáveis e ocorre mais provavelmente nos contextos a seguir:

  • Infecção pelo HIV

  • Uso de imunossupressores

  • Idade avançada

  • Segundo ou terceiro trimestre de gravidez ou pós-parto

  • Filipinos, negros, indígenas norte-americanos, hispânicos ou asiáticos (em ordem decrescente de risco relativo)

Sinais e sintomas da coccidioidomicose

Coccidioidomicose primária

A maioria dos pacientes com coccidioidomicose primária é assintomática, mas, algumas vezes, sintomas respiratórios inespecíficos lembram aqueles da influenza, bronquite aguda ou, com menos frequência, pneumonia ou derrame pleural agudos podem ocorrer.

Sinais e sintomas da coccidioidomicose primária, em ordem decrescente de frequência, são febre, tosse, dor no peito, calafrios, produção de escarro, dor de garganta e hemoptise.

Sinais físicos podem estar ausentes ou limitados a estertores dispersos, com ou sem áreas de macicez à percussão nos campos pulmonares. Alguns pacientes desenvolvem hipersensibilidade à infecção respiratória localizada, manifestada por artrite, conjuntivite, eritema nodoso, ou eritema multiforme.

Coccidioidomicose
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A hipersensibilidade aos antígenos do Coccidioides immitis pode se manifestar como eritema nodoso, artrite, conjuntivite ou eritema multiforme. Essa imagem é um exemplo de eritema multiforme por coccidioidomicose.
Imagem cedida por cortesia de www.doctorfungus.org © 2005.

Lesões pulmonares primárias deixam, algumas vezes, lesões nodulares em moeda, que necessitam ser distinguidas de tumores e tuberculose ou outras infecções granulomatosas. Algumas vezes, lesões cavitárias residuais se desenvolvem e podem variar de tamanho com o tempo e, com frequência, aparentar paredes finas. Uma pequena porcentagem dessas cavitações falha em fechar-se de forma espontânea. Hemoptise ou risco de ruptura para o espaço pleural pode necessitar, ocasionalmente, de cirurgia.

Coccidioidomicose progressiva

Sintomas não específicos desenvolvem-se em poucas semanas, meses ou, algumas vezes, anos após a infecção primária, incluindo febre baixa, anorexia, perda ponderal e fraqueza.

As manifestações cutâneas ocorrem por causa de erupções reativas induzidas imunologicamente, disseminação dos organismos pelos pulmões ou inoculação direta (infecção cutânea primária). O eritema nodoso é a erupção reativa mais frequentemente associada à coccidioidomicose. O eritema nodoso é caracterizado por múltiplos nódulos autolimitados, eritematosos, dolorosos e subcutâneos geralmente nos membros inferiores que aparecem 1 a 3 semanas após os sintomas respiratórios iniciais. Um exantema tóxico generalizado e eritema multiforme também foram relatados.

O comprometimento pulmonar extenso é incomum em pessoas saudáveis e ocorre principalmente naqueles que estão imunocomprometidos. Pode causar cianose e dispneia progressiva e escarro mucopurulento ou sanguinolento.

Coccidioidomicose disseminada (lesão única)
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A coccidioidomicose que se dissemina de uma infecção pulmonar primária pode se manifestar como lesão cutânea única.
Imagem cedida por cortesia de www.doctorfungus.org © 2005.

Os sintomas de lesões extrapulmonares dependem do local. A drenagem dos seios paranasais conecta, ocasionalmente, lesões mais profundas à pele. Muitas vezes, lesões extrapulmonares localizadas tornam-se crônicas e com frequência são recorrentes, às vezes longo tempo depois de a terapêutica antifúngica ter sido concluída com sucesso.

A coccidioidomicose não tratada é comumente fatal e, se meningite estiver presente, é uniformemente fatal sem tratamento prolongado e, possivelmente, por toda a vida. As taxas de casos fatais em pacientes com infecção avançada pelo HIV supera 70% no 1º mês depois do diagnóstico; não está claro se o tratamento pode alterar as taxas de mortalidade.

Diagnóstico da coccidioidomicose

  • Culturas (de rotina ou fúngica)

  • Exame de amostras por microscópio para observar esférulas de C. immitis

  • Exames sorológicos

A eosinofilia pode ser uma evidência importante na identificação de coccidioidomicose.

Suspeita-se do diagnóstico de coccidioidomicose com base na história e nas descobertas físicas típicas, quando aparentes; as descobertas pela radiografia de tórax podem ajudar a confirmar o diagnóstico, o qual pode ser estabelecido por cultura de fungos ou pela visualização de esferas de C. immitis em escarro, líquido pleural, líquido cefalorraquidiano, exsudato de drenagem das lesões ou amostras de biópsia. Esferas intactas geralmente apresentam de 20 a 80 micrômetros de diâmetro e paredes espessas e preenchidas por pequenos endosporos (de 2 a 4 micrômetros). Endosporos liberados nos tecidos das esferas rompidas podem ser confundidos com leveduras sem brotamentos. Como a cultura de Coccidioides pode representar um risco biológico importante para a equipe do laboratório, o laboratório deve ser notificado sobre a suspeita diagnóstica. As sondas de DNA podem identificar rapidamente o fungo quando o crescimento ocorre em laboratório.

Sorologias para anticorpos anticoccidioides são feitas por

  • Ensaio imunoenzimático, que é muito sensível e é comumente utilizado para diagnosticar coccidioidomicose

  • Imunodifusão (para detectar anticorpos IgM ou IgG)

  • Fixação do complemento (para detectar anticorpos IgG)

Títulos 1:4 no soro são consistentes com infecção atual ou recente e altos títulos ( 1:32) significam uma probabilidade aumentada de disseminação extrapulmonar. Pode-se utilizar títulos de fixação do complemento para estimar a gravidade da doença; títulos altos sugerem doença mais grave. Contudo, pacientes que estão imunocomprometidos podem apresentar títulos baixos. Os títulos devem cair durante uma terapêutica adequada.

A presença de anticorpos fixadores de complemento no líquido cefalorraquidiano é diagnóstica de meningite por coccidioides, sendo importante porque culturas de líquido cefalorraquidiano são raramente positivas.

Teste para antígeno na urina pode ser útil para diagnosticar coccidioidomicose em pacientes que estão imunocomprometidos com formas graves da doença, incluindo pneumonia e infecção disseminada.

O uso de uma técnica de reação em cadeia da polimerase (PCR [polymerase chain reaction]) para testar amostras de DNA do trato respiratório inferior pode fornecer um diagnóstico mais rápido. Entretanto, esse teste não está amplamente disponível.

Tratamento da coccidioidomicose

  • Para infecção leve a moderada, fluconazol ou itraconazol

  • Para doença grave, anfotericina B

(Ver também Antifúngicos.)

Pacientes com coccidioidomicose primária e fatores de risco de doença grave ou progressiva devem ser tratados.

O tratamento para coccidioidomicose primária é controverso em pacientes de baixo risco. Alguns especialistas administram fluconazol, uma vez que sua toxicidade é baixa e porque, mesmo em pacientes de baixo risco, há pequena chance de disseminação hematogênica, em especial para ossos ou cérebro. Além disso, os sintomas desaprecem mais rapidamente nos pacientes tratados do que naqueles não tratados com um antifúngico. Outros acreditam que a resposta imunitária pode ser mascarada pelo uso de fluconazol e os riscos de disseminação hematogênica são muito baixos na infecção primária para justificar o uso do fluconazol. Altos títulos de anticorpos fixadores de complemento indicam disseminação e necessidade de tratamento.

Envolvimento extrapulmonar não meníngeo, leve a moderado, deve ser tratado com fluconazol ou itraconazol. Comprimidos de liberação retardada de voriconazol ou posaconazol são alternativas, mas ainda não foram bem estudados.

Para doença severa, formulações lipídicas de anfotericina B são preferidas às convencionais anfotericina B. Em geral, os pacientes podem trocar para um azol oral quando estiverem estabilizados, o que geralmente acontece em várias semanas.

Pacientes com coccidioidomicose relacionada com HIV ou aids necessitam de terapia de manutenção para prevenir a recaída; fluconazol, 200 mg por via oral uma vez ao dia, ou itraconazol, 200 mg por via oral 2 vezes ao dia costuma ser suficiente, administrados até que a contagem de células CD4 seja > 250/mcL.

Em gestantes, deve-se evitar o uso de antifúngicos triazólicos no primeiro trimestre de gestação por causa do risco de teratogenicidade. Mulheres com doença leve a moderada no primeiro trimestre em geral não necessitam de tratamento. Em mulheres com doença grave ou extrapulmonar no primeiro trimestre de gestação, recomenda-se tratamento com anfotericina B. Depois do primeiro trimestre de gestação, pode-se considerar o uso de um antifúngico azólico. Mulheres que adquirem infecção no segundo ou terceiro trimestre de gestação ou 6 semanas após o parto têm risco de progressão da doença. Caso não sejam tratadas, devem ser monitoradas clinicamente e pela verificação dos títulos de fixação do complemento em série.

Todos os pacientes com infecção óssea e/ou articular devem receber terapia antifúngica. Itraconazol é preferível ao fluconazol (1).

Para coccidioidomicose meníngea, utiliza-se fluconazol. A dose ótima não está estabelecida; doses orais de 800 a 1.200 mg por dia podem ser mais eficazes do que 400 mg uma vez ao dia. Os pacientes devem continuar a terapia azólica de manutenção por toda a vida porque as recidivas são comuns e potencialmente fatais.

A remoção cirúrgica do osso envolvido pode ser necessária para curar a osteomielite.

Quando lesões pulmonares cavitárias residuais causam hemoptise ou podem se romper, cirurgia pode ser necessária.

Referência sobre o tratamento

  1. 1. Galgiani JN, Catanzaro A, Cloud GA, et al: Comparison of oral fluconazole and itraconazole for progressive, nonmeningeal coccidioidomycosis. A randomized, double-blind trial. Mycoses Study Group. Ann Intern Med 133(9):676–686, 2000. doi: 10.7326/0003-4819-133-9-200011070-00009

Pontos-chave

  • Coccidioidomicose é uma infecção fúngica comum adquirida pela inalação de esporos contidos na poeira.

  • É endêmica no sudoeste dos Estados Unidos e norte do México; a doença também ocorre em certas partes da América Central e do Sul.

  • A maioria dos pacientes tem infecção pulmonar assintomática ou leve, mas aqueles que estão imunocomprometidos ou têm outros fatores de risco podem desenvolver doença pulmonar progressiva grave ou infecção disseminada (normalmente na pele, nos ossos ou nas meninges).

  • Diagnosticar utilizando coloração, cultura e/ou sorologia.

  • Para infecção leve a moderada, utilizar fluconazol ou itraconazol.

  • Para doença grave, utilizar uma formulação lipídica da anfotericina B.

Informações adicionais

O recurso em inglês a seguir pode ser útil. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo deste recurso.

  1. Infectious Diseases Society of America: Clinical Practice Guideline for the Treatment of Coccidioidomycosis (2016)

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