(Ver também Visão geral da doença pulmonar ambiental.)
Etiologia
A exposição ao berílio é causa comum de doen-ça, mas pouco reconhecida, em muitas indústrias, incluindo mineração e extração de berílio, produção de ligas, trabalho com máquinas que usam ligas metálicas, eletrônica, telecomunicação, armas nucleares, defesa, aviação, automotiva, aeroespacial e reciclagem de computadores e aparelhos eletrônicos. Como pequenas quantidades de berílio são tóxicas e são acrescentadas a muitas ligas de cobre, alumínio, níquel e magnésio, os trabalhadores muitas vezes desconhecem que estão expostos e os riscos disto.
Fisiopatologia
A beriliose aguda é uma pneumonite química, caracterizada por infiltrados inflamatórios difusos no parênquima e edema intra-alveolar inespecífico. Outros tecidos podem ser afetados (p. ex., pele e conjuntiva). Atualmente, a beriliose aguda é rara porque muitas indústrias reduziram os níveis de exposição, mas casos desta doença foram comuns entre 1940 e 1970 e muitos progrediram de beriliose aguda para crônica.
A beriliose crônica ainda é uma doença comum em indústrias que utilizam berílio e liga metálica de berílio. Difere da maioria das pneumoconioses porque é uma doença por hipersensibilidade mediada por célula. O berílio é apresentado às células T CD4+ pelas células apresentadoras de antígenos, principalmente em moléculas HLA-DP. As células T do sangue, dos pulmões e de outros órgãos, por sua vez, reconhecem o berílio, proliferam-se e formam clones de células T. Em seguida, esses clones de células T liberam citocinas pró-inflamatórias, como fator de necrose tumoral alfa (TNF-alfa), IL-2 e interferom-gama. Essas citocinas exacerbam a resposta imunitária, resultando na formação de infiltrados de células mononucleares e granulomas sem caseificação nos órgãos-alvo, em que há depósito de berílio.
Em média, 2 a 6% dos indivíduos expostos ao berílio desenvolvem sensibilização ao berílio (definida pela positividade da proliferação de linfócitos sanguíneos aos sais de berílio in vitro) e a maioria progride para a doença. Certas populações de alto risco, como trabalhadores de máquinas que usam liga ou metal de berílio, têm prevalência de beriliose crônica > 17%. Trabalhadores sob exposições passivas, como secretárias e guardas de segurança, também desenvolvem sensibilização e doença, mas em índices inferiores. A consequência patológica típica é a reação granulomatosa difusa dos linfonodos pulmonares, hilares e mediastinais, histologicamente indiferenciável da sarcoidose. Também é possível identificar a formação inicial de granulomas, com células mononucleares e gigantes. Encontram-se muitos linfócitos no lavado das células dos pulmões (lavado broncoalveolar [LBA]) durante a broncoscopia. Essas células T se proliferam quando expostas ao berílio in vitro, de modo semelhante às células sanguíneas [um teste chamado proliferação dos linfócitos ao berílio (TPLBe)].
Sinais e sintomas
Os pacientes com beriliose crônica frequentemente referem dispneia, tosse, perda ponderal e padrão radiográfico bastante variável, normalmente mostrando opacidades nodulares nas zonas pulmonares média e superior, frequentemente com adenopatia hilar e mediastinal. Os pacientes relatam dispneia de esforço insidiosa e progressiva, tosse, dor torácica, perda ponderal, sudorese noturna e fadiga. Os sintomas podem desenvolver-se dentro de meses a partir da primeira exposição ou > 30 anos após a interrupção da exposição. Algumas pessoas permanecem assintomáticas.
Diagnóstico
O diagnóstico da beriliose depende da história de exposição, de quadro clínico compatível e de resultados anormais de sangue e/ou LBA ou TPLBe.
Diferencia-se beriliose aguda de doença crônica pela história de uma exposição intensa seguida por início agudo de tosse seca e dispneia progressiva a esforços, além de sinais e sintomas sistêmicos (conjuntivite, dermatite, faringite, laringotraqueobronquite). Além disso, os achados radiográficos ocorrem em 1 a 3 semanas depois da exposição. Na beriliose crônica, os sinais e sintomas estão presentes há pelo menos um ano e a apresentação clínica pode variar de assintomática à tosse seca, dispneia progressiva, fadiga e sudorese noturna (1). O LBA e o TPLBe são bastante sensíveis e específicos, uma vez que ajudam a distinguir entre beriliose crônica e sarcoidose e outras formas difusas de pneumopatia. Como os níveis séricos da enzima conversora da angiotensina não são sensíveis e, quando positivos, não distinguem entre exposição e doença, esses níveis não são medidos rotineiramente (2).
A radiografia de tórax pode ser normal ou revelar infiltrados difusos, que podem ser nodulares, reticulares, ou aspecto em vidro fosco obscurecido, com frequência com linfonodopatia hilar e semelhante ao padrão observado na sarcoidose. Também é possível evidenciar padrão miliar. TC de alta resolução (seção fina) é mais sensível que a radiografia, embora casos da doença comprovada por biópsia ocorram mesmo em indivíduos com resultados normais de métodos de imagem.
Referências sobre diagnóstico
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1. Stoeckle JD, Hardy HL, Weber AL: Chronic beryllium disease: Long-term follow-up of sixty cases and selective review of the literature. Am J Med 46 (4):545–561, 1969.
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2. Newman LS, Orton R, Kreiss K: Serum angiotensin converting enzyme activity in chronic beryllium disease. Am Rev Respir Dis 146 (1):39–42, 1992.
Prognóstico
A beriliose aguda pode ser fatal, mas o prognóstico é habitualmente excelente para os pacientes que não progridem para a beriliose crônica. A beriliose crônica com frequência resulta em perda progressiva da função respiratória. As alterações iniciais envolvem obstrução do fluxo aéreo e diminuição da oxigenação na gasometria em repouso e durante o teste de esforço. Diminuição da DLco e restrição surgem mais tarde. A hipertensão pulmonar e a insuficiência cardíaca direita desenvolvem-se em cerca de 10% dos casos e os óbitos são consequentes ao cor pulmonale.
A sensibilização ao berílio progride para a beriliose crônica em um índice de cerca de 6% ao ano após a detecção inicial pelos programas de vigilância médica no local de trabalho. Os nódulos granulomatosos subcutâneos causados pela inoculação de poeira ou partículas de berílio habitualmente persistem até serem ressecados.
Tratamento
Na beriliose aguda, os pulmões com frequência tornam-se edemaciados e hemorrágicos. A ventilação mecânica é necessária para os pacientes bastante comprometidos.
Alguns pacientes com beriliose crônica nunca exigem tratamento porque a doença progride de forma relativamente lenta. O tratamento se faz com corticoides, resultando em melhora sintomática e melhor oxigenação. Em geral, o tratamento é iniciado apenas para os pacientes com sintomas significativos e evidências de troca gasosa anormal ou de declínio acelerado da função pulmonar ou da oxigenação.
Para os pacientes sintomáticos com função pulmonar anormal, prescreve-se prednisona, 40 a 60 mg VO 1 vez/dia ou em dias alternados, durante 3 a 6 meses. Então, repetem-se as medições da fisiologia pulmonar e trocas gasosas para documentar a resposta à terapia, e a dose é gradualmente reduzida até a dose mais baixa que mantém a melhoria sintomática e objetiva (geralmente cerca de 5 a 10 mg VO uma vez/dia ou em dias alternados). Habitualmente, é necessário o tratamento com corticoides por toda a vida. Existem evidências inconsistentes de que a associação de metotrexato (10 a 25 mg VO 1 vez/semana) tenha efeito poupador de corticoide na beriliose crônica, semelhante àquele observado na sarcoidose. Azatioprina, que também é usada na sarcoidose, não é recomendada na beriliose crônica.
Diferentemente dos casos de sarcoidose, a remissão espontânea da beriliose crônica é rara. Para os pacientes em estágio final de beriliose crônica, o transplante pulmonar pode salvar a vida. Se necessário, é possível empregar outras medidas paliativas, como oxigenioterapia, reabilitação pulmonar e fármacos para o tratamento de insuficiência cardíaca direita.
Prevenção
A supressão da poeira industrial é a base para a prevenção da exposição ao berílio. Deve-se limitar a exposição a níveis tão baixos quanto razoavelmente possível; 0,2 microgramas por metro cúbico de ar, média de 8 horas e exposição limitada a curto prazo a 2,0 microgramas por metro cúbico de ar, durante um período de amostragem de 15 minutos (ver OSHA Final Rule to Protect Workers from Beryllium Exposure).
Recomenda-se a vigilância médica, usando TPLBe no sangue e radiografia de tórax, para todos os trabalhadores expostos, incluindo aqueles com contato direto ou indireto. A doença aguda e a crônica devem ser imediatamente reconhecidas e os trabalhadores comprometidos removidos para evitar a exposição ulterior ao berílio.
Pontos-chave
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A doença do berílio ainda está sendo estudada e afeta trabalhadores de muitos setores da indústria.
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Considerar TC de alta resolução e o teste de proliferação dos linfócitos com berílio (usando sangue ou células do lavado broncoalveolar) para confirmar o diagnóstico.
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Tratar os pacientes sintomáticos com corticoides.
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A prevenção envolve a supressão de poeira do berílio e a vigilância dos trabalhadores expostos.