Anomalias da junção craniocervical

PorMichael Rubin, MDCM, New York Presbyterian Hospital-Cornell Medical Center
Revisado/Corrigido: jan 2022
Visão Educação para o paciente

Anomalias da junção craniocervical são anormalidades congênitas ou adquiridas do osso occipital, do forame magno ou das duas primeiras vértebras que diminuem o espaço para a porção inferior do tronco encefálico e parte cervical da coluna vertebral. Essas anomalias podem resultar em dor cervical; siringomielia; deficits cerebelares, dos pares cranianos mais inferiores e da medula espinal; bem como isquemia vertebrobasilar. O diagnóstico é por ressonância magnética (RM) ou tomografia computadorizada (TC). O tratamento geralmente envolve redução seguida por estabilização com cirurgia ou dispositivo externo.

O tecido nervoso é flexível e suscetível à compressão. Vários tipos de anomalias craniocervicais podem causar ou contribuir para a compressão da parte cervical da medula espinal ou do tronco encefálico; algumas anormalidades e suas consequências clínicas estão incluídas a seguir:

  • A fusão do atlas (C1) com o osso occipital: compressão da medula espinal quando o diâmetro anteroposterior do forame magno atrás do processo odontoide tem < 19 mm

  • Invaginação basilar (abaulamento superior dos côndilos occipitais): protusão do processo odontoide através do forame magno, normalmente encurtando o pescoço e causando compressão que pode afetar o cerebelo, o tronco encefálico, os nervos cranianos inferiores e a medula espinal

  • Subluxação ou luxação atlantoaxial (deslocamento do atlas, geralmente anteriormente em relação ao eixo, mas às vezes posteriormente, lateralmente, verticalmente ou rotacionalmente): compressão da medula espinal aguda ou crônica

  • Malformação de Klippel-Feil (fusão das vértebras cervicais superiores ou do atlas com o occipúcio): deformidade e movimento limitado do pescoço geralmente sem consequências neurológicas, mas às vezes com compressão da medula cervical após um pequeno trauma

  • Platibasia (achatamento da base do crânio de modo que o ângulo formado pela intersecção entre os planos clival e da fossa anterior seja > 135°), observada em radiografias em incidência lateral do crânio: pescoço curto e geralmente assintomática, a menos que seja acompanhado de invaginação basilar

Etiologia

As anomalias da junção craniocervical, da quais há muitas, podem ser congênitas ou adquiridas.

Congênito

Anormalidades congênitas podem ser anormalidades estruturais específicas ou distúrbios sistêmicos ou gerais que afetam ao crescimento e o desenvolvimento esquelético. Muitos pacientes têm múltiplas anormalidades.

As anomalias ósseas estruturais são:

  • Assimilação do atlas (fusão congênita do atlas com o osso occipital)

  • Hipoplasia do atlas

  • Invaginação basilar

  • Malformação congênita de Klippel-Feil (p. ex., na síndrome de Turner ou de Noonan), geralmente associada a anomalias atlanto-occipitais

  • Os odontoideum (osso anômalo que substitui total ou parcialmente o processo odontoide)

  • Platybasia, frequentemente com invaginação basilar, malformações de Chiari (descida das tonsilas ou do verme do cerebelo para a região cervical do canal vertebral) e outras anomalias

As doenças sistêmicas que afetam o crescimento esquelético e desenvolvimento e envolvem a junção craniocervical incluem as seguintes:

  • Acondroplasia (deficiência de crescimento ósseo epifisário, que resulta em ossos curtos e malformados), o forame magno às vezes estreita-se ou funde-se com o atlas, comprimindo assim a medula espinal ou o tronco encefálico.

  • Síndrome de Down, síndrome de Morquio (mucopolissacaridose IV) ou osteogênese imperfeita podem causar subluxação ou deslocamento atlantoaxial.

Adquirida

As causas adquiridas incluem lesões ou doenças.

  • As lesões podem envolver ossos, ligamentos, ou ambos, e geralmente são causadas por acidentes com veículos ou bicicletas e quedas, principalmente durante mergulhos; algumas dessas lesões são imediatamente fatais.

  • Artrite reumatoide (a causa patológica mais comum) e doença de Paget na parte cervical da coluna vertebral podem causar deslocamento ou subluxação atlantoaxial, invaginação basilar ou platibasia.

  • Tumores metastáticos que afetam os ossos podem causar deslocamento ou subluxação atalantoaxial.

  • Tumores de crescimento lento na junção craniocervical (p. ex., meningioma, cordoma) podem comprimir o tronco encefálico ou a medula espinal.

Sinais e sintomas

Os sinais e sintomas das anomalias da junção craniocervical podem ocorrer após pequena lesão cervical ou espontaneamente e podem variar quanto à progressão. A apresentação varia com o grau de compressão e as estruturas afetadas.

As manifestações mais comuns

  • Dor cervical geralmente com cefaleia

  • Sinais e sintomas de compressão da medula espinal

A dor cervical muitas vezes propaga-se para os membros superiores e pode ser acompanhada de cefaleia (geralmente cefaleia occipital que se irradia para o vértice do crânio); é atribuída à compressão da raiz de C2 e do nervo occipital maior e à disfunção musculoesquelética local. A dor cervical e a cefaleia geralmente pioram com os movimentos da cabeça e podem ser deflagradas por tosse ou inclinação da cabeça para a frente. Quando os pacientes com malformação de Chiari apresentam hidrocefalia, a posição ereta pode agravar a hidrocefalia e resultar em cefaleia.

A compressão da medula espinal envolve a porção cervical da medula espinal. Os deficits incluem

  • Paresia espástica nos membros superiores, pernas, ou em ambos, causada por compressão dos tratos motores

  • Comumente, sentidos de posição articular e vibração prejudicados (função da coluna posterior)

  • Sensação de formigamento, que desce pelo dorso até as pernas, com flexão do pescoço (sinal de Lhermitte)

  • Incomumente, sensibilidades dolorosa e térmica prejudicadas (função do trato espinotalâmico) em um padrão de “meia e luva”

O aspecto do pescoço e a amplitude de movimentos, ou ambos, podem ser afetados por algumas anomalias (p. ex., platibasia, invaginação basilar, malformação de Klippel-Feil). O pescoço pode ser curto, apresentar uma prega cervical (que se estende aproximadamente do esternocleidomastoideo ao ombro), ou estar em posição anormal (p. ex., torcicolo na malformação de Klippel-Feil). Pode haver limitação na amplitude de movimentos.

Compressão encefálica (p. ex., em decorrência de platibasia, invaginação basilar ou tumores craniocervicais) pode causar deficits no tronco encefálico, pares cranianos e cerebelares. Os deficits no tronco encefálico e nos nervos cranianos incluem

  • Apneia central do sono

  • Oftalmoplegia internuclear (fraqueza ipsilateral da adução do olho mais nistagmo horizontal contralateral no olho que abduz com olhar lateral)

  • Nistagmo com batimento para baixo (componente de batimento para baixo rápido)

  • Rouquidão

  • Disartria

  • Disfagia

Os deficits cerebelares geralmente prejudicam a coordenação.

A isquemia vertebrobasilar pode ser desencadeada pela mudança da posição da cabeça. Os sintomas podem incluir

  • Síncope intermitente

  • Desmaios

  • Vertigem

  • Confusão ou consciência alterada

  • Fraqueza

  • Distúrbio visual

Siringomielia (cavidade na região central da medula espinal) é comum em pacientes com malformação de Chiari. Pode causar

  • Fraqueza flácida segmentar e atrofia, que aparece primeiro ou mais grave na porção distal dos membros superiores

  • Perda da sensibilidade térmica e álgica em uma distribuição semelhante a uma capa no pescoço e na região proximal dos membros superiores

Mas a sensibilidade tátil é preservada.

Diagnóstico

  • RM ou TC do cérebro e da porção superior da medula espinal

Há suspeita de anomalia craniocervical quando os pacientes apresentam dor no pescoço ou na região occipital e associados a deficits neurológicos referentes à porção inferior do tronco encefálico, à porção cervical superior da medula espinal ou ao cerebelo. Em geral, os distúrbios da porção cervical inferior da medula espinal podem ser caracterizados clinicamente (com base no nível da disfunção medular) e por exames de imagem neurológica.

Neuroimagem

Quando há suspeita de anomalia craniocervical, realiza-se RM ou TC da porção superior da medula espinal e do cérebro, em particular da fossa posterior do crânio e da junção craniocervical. Deficits agudos ou de progressão súbita constituem uma emergência, necessitando de imagens imediatas. RM sagital é a que melhor identifica lesões neurais associadas (p. ex., medula, ponte, cerebelo, medula espinal e anomalias vasculares; siringomielia) e lesões de tecidos moles. A TC permite a visualização de estruturas ósseas de modo mais nítido que a RM e pode ser mais facilmente realizada em uma emergência.

Se RM e TC não estiverem disponíveis, realizam-se radiografias simples (vista lateral do crânio mostrando os processos espinhosos das vértebras cervicais, incidências anteroposteriores e incidências oblíquas dos processos espinhosos das vértebras cervicais).

Se a RM não estiver disponível ou não for conclusiva e a TC não for conclusiva, fazer mielografia por TC (TC após injeção intratecal de contraste radiopaco). Se a RM ou a TC sugerirem anomalias vasculares, realiza-se a angiorressonância magnética ou a angiografia vertebral.

Tratamento

  • Redução e imobilização

  • Algumas vezes descompressão cirúrgica, fixação ou ambos

Quando há compressão de estruturas neurais, o tratamento consiste em redução (tração ou alterações na posição da cabeça para realinhar a junção craniocervical e, consequentemente, interromper a compressão neural). Após a redução, a cabeça e o pescoço são imobilizados. A compressão medular aguda ou subitamente progressiva requer redução emergencial.

Para a maioria dos pacientes, a redução envolve tração com um halo craniano e peso de até 4 kg. A redução com tração pode levar de 5 a 6 dias. Se a redução for alcançada, o pescoço é imobilizado com um halo-colete por 8 a 12 semanas; em seguida, radiografias devem ser obtidas para confirmar a estabilidade.

Se a redução não aliviar a compressão neural, há necessidade de descompressão cirúrgica por meio de acesso ventral ou dorsal. Se a instabilidade persistir após a descompressão, há necessidade de fixação posterior (estabilização). Para algumas anormalidades (p. ex., decorrentes de artrite reumatoide), a simples imobilização externa raramente tem sucesso; quando não tiver sucesso, portanto, há necessidade de fixação posterior ou descompressão anterior e estabilização.

Diferentes métodos de instrumentação (p. ex., placas ou hastes com pinos) podem ser utilizados para estabilização temporária até que haja fusão dos ossos e a estabilidade seja permanente. Em geral, todas as áreas instáveis devem ser fundidas.

Doenças ósseas

A radioterapia e o colete cervical muitas vezes ajudam os pacientes com tumores ósseos metastáticos.

Calcitonina, mitramicina e bisfosfonatos podem ajudar os pacientes com doença de Paget.

Pontos-chave

  • Anomalias da junção craniocervical são anormalidades congênitas ou adquiridas do osso occipital, do forame magno ou das duas primeiras vértebras que diminuem o espaço para a porção inferior do tronco encefálico e parte cervical da coluna vertebral.

  • Suspeitar de anomalia na junção craniocervical se os pacientes apresentarem dor no pescoço ou na região occipital e deficits neurológicos referentes à porção inferior do tronco encefálico, à porção cervical superior da coluna ou ao cerebelo.

  • Diagnosticar anomalias craniocervicais usando RM ou TC do cérebro e da porção superior da medula espinal.

  • Reduzir e imobilizar as estruturas neurais comprimidas.

  • Tratar a maioria dos pacientes com tração, imobilização ou, se a redução não for bem-sucedida, cirurgia.

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