Etiologia
A etiologia é mais frequentemente autoimune. Os fatores de risco de desenvolvimento de autoimunidade incluem
Os fatores genéticos incluem mutação do gene AIRE, que causa o tipo 1, e certos subtipos do antígeno leucocitário humano (HLA), que são importantes no desenvolvimento dos tipos 2 e 3. Os gatilhos ambientais incluem infecções virais, fatores dietéticos e outros riscos ainda desconhecidos.
Fisiopatologia
A reação autoimune subjacente envolve autoanticorpos contra tecidos endócrinos, autoimunidade mediada por células ou ambos, e causa inflamação, infiltração linfocitária e destruição parcial ou completa da glândula. Mais de uma glândula endócrina é envolvida, embora as manifestações clínicas nem sempre sejam simultâneas. Reação autoimune e disfunção associada do sistema imunitário também podem lesar tecidos não endócrinos.
Classificação
Foram descritos três padrões de insuficiência autoimune na síndrome de deficiência poliglandular (ver tabela Características das síndromes de deficiência poliglandular), que provavelmente refletem diferentes anomalias autoimunes. Alguns especialistas combinam o tipo 2 e tipo 3 em um único grupo.
Deficiência poliglandular tipo 1
A deficiência poliglandular tipo 1 geralmente começa na infância. Ele é definido pela presença de ≥ 2 do seguinte:
-
Insuficiência adrenal (doença de Addison)
A candidíase costuma ser a manifestação inicial, mais comum em pacientes com < 5 anos. O hipoparatireoidismo ocorre a seguir, geralmente em pacientes com < 10 anos. Por último, a insuficiência adrenal ocorre em pacientes com < 15 anos. Doenças endócrinas e não endócrinas concomitantes (ver tabela Características das síndromes de deficiência poliglandular) continuam a surgir até os pacientes terem cerca de 40 anos de idade.
Deficiência poliglandular tipo 2 (síndrome de Schmidt)
A deficiência poliglandular tipo 2 geralmente ocorre em adultos; a maior e incidência é aos 30 anos de idade. É 3 vezes mais frequente em mulheres. Tipicamente manifesta-se com o seguinte:
-
Diabetes melito tipo 1 (etiologia autoimune)
Características mais raras também podem ocorrer (ver tabela Características das síndromes de deficiência poliglandular).
Deficiência poliglandular tipo 3
O tipo 3 é a insuficiência glandular que costuma ocorrer em adultos, particularmente nas mulheres de meia-idade Caracteriza-se por
-
Pelo menos uma das variedades de outras doenças (ver tabela Características das síndromes de deficiência poliglandular)
O tipo 3 não envolve o córtex adrenal.
Características das síndromes de deficiência poliglandular
Característica |
Tipo 1 |
Tipo 2 |
Tipo 3 |
Demografia |
|||
Idade de início |
Infância (3–5 anos) |
Adulto (ápice aos 30 anos) |
Adulto (particularmente mulheres na meia-idade) |
Mulheres/homens |
4:3 |
3:1 |
Dados não disponíveis |
Genética |
|||
Tipos de antígeno leucocitário humano (HLA) |
Pode influenciar o desenvolvimento de componentes específicos da doença |
Primariamente B8, DW3, DR3, DR4 Outros em doenças específicas |
DR3, DR4 |
Hereditariedade |
Mutação autossômica recessiva do gene AIRE |
Poligênica |
Poligênica |
Glândulas afetadas |
|||
Comum |
Paratireoide Adrenais Gônadas |
Adrenais Tireoide Pâncreas |
Tireoide Pâncreas |
Menos comum |
Pâncreas Tireoide |
Gônadas |
Variável |
Clínica |
|||
Insuficiência adrenal (doença de Addison) |
73–100% |
100% |
Não encontrada |
26–32% |
Não encontrada |
* |
|
Rara |
Incidência incerta |
* |
|
Hepatite crônica ativa |
20% |
Não encontrada |
Dados não disponíveis |
73–97% |
Não encontrada |
Dados não disponíveis |
|
Diabetes melito (tipo 1) |
2–30% |
52% |
* |
Insuficiência gonadal |
Em homens, 15–25% Em mulheres, 60% |
3,5% |
* |
76–99% |
Não encontrada |
Não encontrada |
|
22–24% |
Não encontrada |
Dados não disponíveis |
|
Não encontrada |
Incidência incerta |
* |
|
13–30% |
< 1% |
* |
|
Não encontrada |
Não encontrada |
* |
|
Doença tireoidea† |
10–11% |
69% |
100% |
4–30% |
5–50% |
N/D |
|
*Associada; incidência incerta. |
|||
†Geralmente tireoidite linfocítica crônica, mas também contempla a doença de Graves. |
|||
Dados de Husebye ES, Perheentupa J, Rautemaa R, Kampe O: Clinical manifestations and management of patients with autoimmune polyendocrine syndrome type 1. Journal of Internal Medicine 265: 519–529, 2009; Trence DL, Morley JE, Handwerger BS: Polyglandular autoimmune syndromes. American Journal of Medicine 77(1):107–116, 1984; Leshin M: Polyglandular autoimmune syndromes. American Journal of Medical Sciences 290(2):77–88, 1985; Dittmar M, Kahaly GJ: Polyglandular autoimmune syndromes: immunogenetics and long-term follow-up.Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism 88:2983–2992, 2003; e Eisenbarth GS, Gottlieb PA. Autoimmune polyendocrine syndromes. New England Journal of Medicine 350:2068–2079, 2004. |
Sinais e sintomas
O aspecto clínico dos pacientes com síndrome de deficiência poliglandular é a soma das deficiências endócrinas individuais e das doenças não endócrinas associadas; seus sinais e sintomas são discutidos em outros locais deste Manual. As deficiências nem sempre surgem ao mesmo tempo e podem levar anos para se manifestar; nesses casos, não seguem uma sequência em particular.
Diagnóstico
Suspeita clínica de síndrome de deficiência poliglandular com diagnóstico confirmado pela detecção da deficiência hormonal. Outras causas de deficiências endócrinas múltiplas incluem disfunções hipotalâmico-hipofisárias e disfunções endócrinas coincidentes de causas distintas (p. ex., hipoadrenalismo por tuberculose e hipotireoidismo não autoimune no mesmo paciente). A detecção dos autoanticorpos do tecido glandular afetado pode ser útil para diferenciar disfunção poliglandular autoimune de outras causas e concentrações elevadas de hormônios tróficos (p. ex., TSH) sugerem que o eixo hipotálamo-hipófise está intacto (embora alguns pacientes com disfunção poliglandular autoimune tipo 2 apresentem insuficiência hipotalâmico-hipofisária).
Como podem se passar décadas antes do aparecimento de todas as manifestações, é prudente fazer acompanhamento por toda a vida; hipoparatireoidismo ou insuficiência adrenal não percebidos podem causar risco de morte.
Os parentes devem estar cientes do diagnóstico e se submeter à triagem quando apropriado. Ensaios de acompanhamento de parentes dos pacientes com diabetes tipo 1 para o desenvolvimento de autoimunidade estão atualmente sendo estudados.
Tratamento
O tratamento das várias deficiências glandulares é discutido em outros capítulos deste Manual; o tratamento de deficiências múltiplas pode ser mais complexo que o tratamento de uma deficiência endócrina isolada. Por exemplo, o tratamento do hipotireoidismo com reposição hormonal tireoidiano pode precipitar uma crise adrenal em pacientes com insuficiência adrenal não diagnosticada.
A candidíase mucocutânea crônica geralmente requer tratamento com terapia antifúngica por toda a vida (p. ex., fluconazol ou cetoconazol).
Os ensaios clínicos das intervenções para desacelerar o processo autoimune no diabetes tipo 1 foram em parte promissores para retardar a destruição completa de células beta produtoras de insulina. Os tratamentos que foram avaliados incluem imunoterapia e transplante de sangue do cordão umbilical. Outros tratamentos continuam experimentais (1–3).
Referências sobre tratamento
-
1. Cai J, Wu Z, Xu X, et al: Umbilical cord mesenchymal stromal cell with autologous bone marrow cell transplantation in established type 1 diabetes: A pilot randomized controlled open-label clinical study to assess safety and impact on insulin secretion. Diabetes Care 39:1 149–157, 2016.
-
2. Haller MJ, Gitelman SE, Gottlieb PA, et al. Anti-thymocyte globulin/G-CSF treatment preserves β cell function in patients with established type 1 diabetes. J Clin Invest 125(1):448–455, 2015.
-
3. Kroger CJ, Clark M, Ke Q, and Tisch RM: Therapies to suppress beta cell autoimmunity in type 1 diabetes. Front Immunol 9:1891, 2018. doi: 10.3389/fimmu.2018.01891
Pontos-chave
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As síndromes de deficiência poliglandular envolvem deficiências na função de várias glândulas endócrinas, o que pode ocorre de maneira simultânea ou sequencial.
-
Os órgãos não endócrinos também podem ser afetados.
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A maioria dos casos é autoimune; os gatilhos muitas vezes são desconhecidos, mas podem envolver vírus ou substâncias dietéticas.
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Diferenciam-se as síndromes de deficiência poliglandular pelas glândulas afetadas.
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O tratamento envolve reposição dos hormônios deficientes.