A encoprese é um problema comum na infância que ocorre em cerca de 3 a 4% na faixa dos 4 anos e diminui em frequência com o avançar da idade.
Etiologia
A encoprese é mais comumente causada pela obstipação em crianças com fatores físicos e comportamentais predisponentes. Raramente ocorre sem retenção ou obstipação, mas, quando ocorre, devem ser considerados outros problemas psicológicos ou orgânicos (p. ex., doença de Hirschsprung, doença celíaca).
Fisiopatologia
A retenção de fezes e a obstipação levam à dilatação do reto e sigmoide, que, por sua vez, provocam mudanças na reatividade muscular e nervosa das paredes intestinais. Estas mudanças diminuem a eficiência da função excretora do intestino e posterior retenção. As fezes ficam retidas no intestino e a água absorvida torna as fezes endurecidas, dificultando a evacuação e provocando dores. Fezes amolecidas podem vazar ao redor do bolo fecal endurecido, resultando em hiperfluxo. Tanto o vazamento como a ineficácia do controle intestinal provocam acidentes fecais.
Diagnóstico
Deve-se considerar qualquer processo orgânico causador de obstipação (1, 2) que pode resultar em encoprese. Para a maioria dos casos rotineiros de encoprese, pode-se, história e exame físico, ajudar a identificar a causa. Entretanto, se outras preocupações surgirem, testes diagnósticos adicionais devem ser considerados (p. ex., radiografia de abdome, mais raramente biópsia retal e estudo da motilidade intestinal).
Referências sobre diagnóstico
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1. Koyle MA, Lorenzo AJ: Management of defecation disorders. Em Campbell-Walsh Urology, ed. 11, editado por Wein A, Kavoussi L, Partin A, Peters C. Philadelphia, Elsevier, 2016, pp. 3317–3329.
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2. Benninga M: Evaluation of constipation and fecal incontinence. Em Pediatric Incontinence, Evaluation and Clinical Management, editado por Franco I, Austin P, Bauer S, Von Gontard A, Homsy I. Chichester, John Wiley & Sons Ltd., 2015, pp. 121–130.
Tratamento
Toda doença de base deve ser tratada. Se não há uma patologia específica subjacente, deve-se abordar os sintomas (1). O tratamento inicial envolve a orientação dos pais e da criança sobre a fisiologia da encoprese, removendo o sentimento de culpa por parte da criança e as reações emocionais dos envolvidos. O próximo passo é aliviar qualquer retenção fecal.
A retenção fecal pode ser aliviada por uma série de regimes e fármacos ( Tratamento da obstipação em crianças); a escolha depende da idade da criança e outros fatores. Utilizam-se com frequência polietileno glicol (PEG) com eletrólitos mais um estimulante laxativo (p. ex., bisacodil ou sena) ou uma sequência de enemas de fosfato de sódio mais um esquema de 2 semanas de fármacos orais (p. ex., comprimidos de bisacodil) e supositórios.
Após a evacuação, o acompanhamento deve ser seguido para avaliar se esta foi bem-sucedida, assegurar-se de que a perda fecal foi resolvida e estabelecer um plano de manutenção. O plano inclui manutenção regular dos movimentos intestinais (geralmente com os laxativos) e intervenções sobre o comportamento para estimular a evacuação. Há muitas opções para a terapia com os laxativos ( Tratamento da obstipação em crianças), mas PEG sem eletrólitos é usado com mais frequência, de 1 a 2 doses de 17 g/dia titulada. Ocasionalmente, um laxativo pode ser mantido nos fins de semana para encorajar evacuações extras.
Tratamento da obstipação em crianças
Estratégias de comportamento incluem o uso do vaso sanitário (a criança deve sentar-se no vaso sanitário durante 5 a 10 minutos após cada refeição para aproveitar o reflexo gastrocólico). Se a criança tiver acidentes durante certas horas do dia, ela também deve sentar-se no vaso imediatamente antes dessa hora. Pequenas recompensas podem também servir de incentivo. Por exemplo, dar à criança figurinhas para colar em uma cartela cada vez que sentar-se no vaso sanitário (mesmo que não evacue) pode aumentar a adesão ao plano. Em geral, utiliza-se um programa passo a passo no qual crianças recebem fichas pequenas (p. ex., figurinhas) por terem se sentado no vaso sanitário e recompensas maiores por adesão consistente. As recompensas devem mudar de tempos em tempos para manter vivo o interesse da criança.
Na fase de manutenção, sessões regulares de higiene sentada no vaso sanitário ainda são necessárias para incentivar a evacuação de fezes antes de a sensação ser sentida. Essa estratégia diminui a probabilidade de retenção de fezes e possibilita que o reto volte ao tamanho normal. Durante a fase de manutenção, é essencial orientar os pais e o filho sobre como sentar no vaso sanitário para o sucesso do regime.
A reeducação intestinal é um processo longo de meses a anos e inclui suspensão gradual de laxativos, quando da resolução dos sintomas, e estímulo ao uso do vaso sanitário. Retreinamento intestinal é um processo longo que pode levar meses a anos e inclui interrupção lenta de laxantes depois que os sintomas desaparecem e incentivo contínuo de como sentar no toilete. Recaídas ocorrem frequentemente durante a interrupção do regime de manutenção, assim é importante dar suporte e orientação contínuas durante essa fase.
A encoprese pode recorrer em momentos de estresse ou transição, de forma que os familiares devem estar preparados para essa possibilidade. As taxas de sucesso são afetadas por fatores físicos e psicossociais; mas taxas de cura de 1 ano são cerca de 30 a 50%; as taxas de cura em 5 anos são aproximadamente 48 a 75%. A parte mais importante do tratamento é a educação da família, bem como manter o intestino limpo e utilizar as medidas de suporte.
Referência sobre o tratamento
Pontos-chave
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A encoprese é mais comumente causada pela obstipação em crianças com fatores físicos e comportamentais predisponentes.
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Para a maioria dos casos rotineiros de encoprese, pode-se, história e exame físico, ajudar a identificar a causa.
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Qualquer processo orgânico causador de obstipação pode resultar em encoprese.
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O tratamento é educação, alívio da impactação fecal, manutenção de fezes apropriadas e interrupção gradual dos laxantes com intervenção dietética e comportamental contínuas.
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A impactação fecal pode ser aliviada com vários regimes e fármacos.
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As estratégias comportamentais envolvem incluir horários pré-estipulados para se sentar no vaso sanitário.
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A encoprese pode recorrer em momentos de estresse ou transição, de forma que os familiares devem estar preparados para essa possibilidade.