Avaliação da paciente obstétrica

PorRaul Artal-Mittelmark, MD, Saint Louis University School of Medicine
Revisado/Corrigido: mai 2021 | modificado nov 2022
Visão Educação para o paciente

Idealmente, as mulheres que estiverem planejando uma gestação devem procurar um médico antes da concepção; assim, elas podem aprender sobre os riscos da gestação e maneiras de reduzir os riscos. Como parte dos cuidados de pré-concepção, profissionais de medicina da família devem aconselhar todas as mulheres em idade reprodutiva a tomar uma vitamina que contém 400 a 800 mcg (0,4 a 0,8 mg) de ácido fólico, uma vez ao dia. O folato reduz o risco de defeitos do tubo neural. Se as mulheres tiveram um feto ou lactente com defeito no tubo neural, a dose diária recomendada é de 4.000 mcg (4 mg). Tomar folato antes e depois da concepção também pode reduzir o risco de outros defeitos congênitos (1).

Uma vez grávida, as mulheres necessitam de cuidados pré-natais rotineiros para ajudar a salvaguardar sua saúde e a do feto. Além disso, é necessária a avaliação dos sinais e sintomas de doenças. Sintomas comuns que frequentemente estão relacionados à gestação incluem

Distúrbios obstétricos e não obstétricos específicos em gestantes são discutidos em outras partes.

A consulta inicial do pré-natal deve ocorrer entre a 6ª e a 8ª semana de gestação.

Consultas de acompanhamento devem ocorrer em

  • Intervalos de cerca de 4 semanas até a 28ª semana

  • Intervalos de 2 semanas entre 28 e 36 semanas

  • Semanalmente, até o parto

Pode-se agendar as consultas pré-natais com mais frequência se o risco de um resultado ruim na gestação é alto ou com menor frequência se o risco é muito baixo.

Cuidados pré-natais incluem

  • Triagem para distúrbios

  • Precauções para reduzir os riscos fetal e materno

  • Aconselhamento

Referência geral

  1. 1. Shaw GM, O'Malley CD, Wasserman CR, et al: Maternal periconceptional use of multivitamins and reduced risk for conotruncal heart defects and limb deficiencies among offspring. Am J Med Genet 59:536–545, 1995. doi:10.1002/ajmg.1320590428

História

Durante a consulta inicial, deve-se obter a história clínica completa da paciente, incluindo

  • Doenças anteriores e atuais

  • Uso de fármacos (terapêuticas, sociais e ilícitas)

  • Fatores de risco de complicações na gestação (ver tabela Avaliação dos riscos da gestação)

  • História obstétrica, incluindo os resultados de todas as gestações anteriores e complicações maternas e fetais (p. ex., diabetes gestacional, pré-eclâmpsia, malformações congênitas, feto natimorto)

A história familiar deve incluir doenças crônicas em familiares para identificar possíveis fatores hereditários (avaliação genética).

Durante as consultas subsequentes, as perguntas devem focar a ocorrência de problemas recentes, em particular, sangramento vaginal ou perda de líquido, cefaleia, alterações visuais, edema facial ou digital e alterações na frequência ou intensidade dos movimentos fetais.

Gestação e paridade

A gestação é o número de gestações confirmadas; uma gestante é considerada uma grávida. Paridade é o número de partos depois da 20ª semana. A gestação multifetal é considerada como uma, em termos de gestação e paridade. Aborto é o número de gestações perdidas (abortos) antes da 20ª semana, não importando a causa (p. ex., aborto espontâneo, terapêutico ou eletivo; gestação ectópica). A soma de paridade e abortos é igual ao número de gestaçãoes.

Paridade é, geralmente, registrada como 4 números:

  • Número de partos a termo (depois da 37ª semana)

  • Número de partos prematuros (> 20ª e < 37ª sétima semana)

  • Número de abortos

  • Número de filhos vivos

Dessa forma, a mulher que está grávida e teve um parto a termo, gêmeos nascidos na 32ª semana e 2 abortos é considerada grávida 5, paridade 1-1-2-3.

Exame físico

Exame físico geral detalhado, incluindo pressão arterial (PA), altura e peso, é realizado primeiro. Deve-se calcular e registrar o índice de massa corporal (IMC). Deve-se aferir a PA e o peso em cada consulta pré-natal.

No exame obstétrico inicial, deve-se fazer exame pélvico bimanual e especular pelas seguintes razões:

  • Verificar para presença de lesões ou corrimento

  • Notar coloração e a consistência do colo

  • Obter amostras cervicais para testes

Além disso, deve-se avaliar os batimentos cardíacos fetais e, em pacientes em estado mais avançado de gestação, a posição do feto (ver figura Manobra de Leopold).

A capacidade pélvica pode ser estimada clinicamente por avaliação de várias medidas realizadas durante o toque bimanual. Se a distância da parte inferior da sínfise púbica ao promontório sacral for > 11,5 cm, a bacia é quase certamente adequada. Normalmente, a distância entre as espinhas isquiáticas é 9 cm, o comprimento dos ligamentos sacroespinais é de 4 a 5 cm e o arco subpúbico possui um ângulo 90°.

Durante as consultas subsequentes, é importante a avaliação da PA e do peso. O exame obstétrico deve focar a altura uterina, a altura do fundo (em cm acima da sínfise púbica), os batimentos cardíacos fetais, a dieta e o ganho de peso materno e o bem-estar geral. O toque bimanual e o exame especular geralmente não são necessários, a menos que haja corrimento ou sangramento vaginal, perda de líquido ou dor.

Exames

Exames laboratoriais

A avaliação pré-natal envolve testes de urina e exames de sangue. A avaliação laboratorial inicial dever ser minuciosa; alguns componentes são repetidos durante as consultas de acompanhamento pré-natal (ver tabela Componentes da avaliação pré-natal de rotina).

Tabela

Se uma mulher tem sangue Rh negativo, ela pode ter o risco de desenvolver anticorpos para Rho(D) e, se o pai tem sangue Rh-positivo, o feto pode ter o risco de desenvolver eritroblastose fetal. Deve-se medir os níveis de anticorpos para Rh(D) em gestantes na consulta pré-natal inicial e novamente em torno da 26ª à 28ª semana. Nesse momento, mulheres com sangue Rh-negativo recebem uma dose profilática de imunoglobulina Rho(D). Medições adicionais podem ser necessárias para prevenir o desenvolvimento de anticorpos anti-Rh maternos.

Também é testado se há proteínas na urina. Proteinúria antes de 20 semanas de gestação sugere doença renal. Proteinúria após 20 semanas de gestação pode indicar pré-eclâmpsia.

Em geral, as mulheres passam rotineiramente por triagem para detectar diabetes gestacional entre a 24ª e 28ª semana, utilizando o teste de tolerância à glicose 1 hora após dose de 50 g de glicose. Mas se a gestante tiver fatores de risco significativos para a doença, ela deve fazer o teste de triagem no 1º trimestre. Esses fatores de risco incluem

  • Diabetes gestacional ou um recém-nascido macrossômico (peso > 4.500 g ao nascer) em uma gestação anterior

  • Perdas fetais inexplicáveis

  • Forte história familiar de diabetes em parentes de 1º grau

  • História de glicosuria persistente

  • Índice de massa corporal (IMC) > 30 kg/m2

  • Síndrome do ovário policístico com resistência à insulina

Se o teste no 1º trimestre é normal, o teste de 50 g deve ser repetido em 24 a 28 semanas, seguido, se anormal, por um teste de 3 horas. Resultados anormais em ambos os testes confirmam o diagnóstico de diabetes gestacional.

Mulheres com alto risco de aneuploidia (p. ex., aquelas com > 35 anos, aquelas que tiveram filho com síndrome de Down) devem passar por triagem com DNA livre de células séricas maternas.

Em algumas gestantes, realizam-se exames de sangue para a triagem de distúrbios da tireoide (medição do hormônio estimulante da tireoide [TSH]). Essas mulheres podem incluir aquelas que

  • Têm sintomas

  • Vêm de uma área onde ocorre insuficiência de iodo moderada a grave

  • Têm história familiar ou pessoal de doenças da tireoide

  • Têm diabetes tipo 1

  • Têm história de infertilidade, parto prematuro ou aborto espontâneo

  • Passaram por radioterapia cefálica ou cervical

  • São obesas mórbidas (IMC > 40 kg/m2)

  • Têm > 30 anos

Ultrassonografia

A maioria dos obstetras recomenda pelo menos um exame de ultrassom durante a gestação, idealmente entre a 16ª e a 20ª semana, quando a DPP ainda pode ser confirmada com bastante exatidão e é possível avaliar a localização da placenta e a anatomia fetal. A estimativa da idade gestacional baseia-se nas medidas fetais da circunferência da cabeça, do diâmetro biparietal, da circunferência abdominal e do comprimento do fêmur. A medição do comprimento cabeça-nádega fetal durante o 1º trimestre é particularmente precisa para definir a DPP; a DPP pode variar em cerca de 5 dias quando se obtém as medições em < 12 semana de gestação e em cerca de 7 dias entre a 12ª e a 15ª semana. A precisão da ultrassonografia para definir a DPP, quando realizada no 3º trimestre, é de cerca de 2 a 3 semanas.

As indicações específicas para a ultrassonografia incluem

  • Investigação de anomalias durante o 1º trimestre (p. ex., indicada para resultados anormais de testes de triagem maternos não invasivos)

  • Avaliação de risco para anormalidades cromossômicas (p. ex., síndrome de Down), incluindo medição da translucência nucal

  • Necessidade de uma avaliação detalhada da anatomia fetal (geralmente em cerca de 16 a 20 semanas), possivelmente incluindo ecocardiografia fetal na 20ª semana se o risco de defeitos cardíacos congênitos é elevado (p. ex., em mulheres com diabetes tipo 1 ou que tiveram uma criança com defeito cardíaco congênito)

  • Detecção de gestação multifetal, mola hidatidiforme, poli-hidrâmnio, placenta prévia e gestação ectópica

  • Determinação da localização placentária, tamanho e posição do feto e tamanho do útero em relação às datas gestacionais dadas (muito pequeno ou muito grande)

A ultrassonografia também é utilizada para guiar a agulha na obtenção de amostras de vilo coriônico e na realização de amniocentese e de transfusão fetal. A ultrassonografia de alta resolução inclui técnicas que maximizam a sensibilidade para detectar malformações fetais.

Se a ultrassonografia for necessária durante o 1º trimestre (p. ex., para avaliar dor, sangramento, viabilidade da gestação), o uso de transdutor endovaginal maximiza a eficácia do diagnóstico; a evidência de uma gestação intrauterina (saco gestacional ou polo fetal) pode ser vista já na 4ª ou 5ª semana, sendo observada da 7ª à 8ª semana em > 95% dos casos. Com a ultrassonografia em tempo real, podem-se observar os movimentos e a função cardíaca do feto já na 5ª à 6ª semana.

Outros exames por imagem

Radiografias convencionais podem induzir aborto espontâneo ou malformações congênitas, em especial no início da gestação. O risco é remoto (até cerca de 1/milhão) com radiografias de uma extremidade ou do pescoço, cabeça ou tórax, se o útero estiver protegido. O risco é maior em radiografias abdominais, pélvicas e da região lombar. Desse modo, para todas as mulheres em idade reprodutiva, a radiografia deve ser substituída, sempre que possível, por outro exame com menor radiação ionizante (p. ex., ultrassonografia), ou, caso o exame radiográfico seja realmente necessário, o útero deve ser protegido (pois a gestação é possível).

Radiografias clinicamente necessárias ou outros exames de imagem não devem ser adiados por causa da gestação. Entretanto, as radiografias eletivas são adiadas até depois da gestação.

Tratamento

Os problemas identificados durante a avaliação devem ser controlados.

Aconselham-se as mulheres em relação à prática de exercícios e dieta e também a seguir as diretrizes do Institute of Medicine para ganho ponderal, que baseiam-se no índice de massa corporal pré-gestacional (IMC — ver tabela Diretrizes para ganho ponderal durante a gestação). Prescrevem-se suplementos nutricionais.

Deve-se explicar às gestantes o que evitar, o que esperar e quando procurar por mais avaliações. Os casais devem ser encorajados a frequentar cursos de orientação aos pais na gestação.

Tabela

Dietas e suplementos

Para a nutrição do feto, a maioria das mulheres necessita de cerca de 250 kcal extras diárias, e a maior parte das calorias deve vir de proteínas. Se o ganho de peso materno for excessivo (> 1,4 kg/mês nos primeiros meses) ou inadequado (< 0,9 kg/mês), a dieta precisa ser modificada. Não se recomenda dieta para perda ponderal durante a gestação, mesmo para mulheres com obesidade mórbida.

A maioria das gestantes necessita de suplementação diária de 300 mg de sulfato ferroso por via oral ou 450 mg de gliconato ferroso, que pode ser mais bem tolerado. Mulheres com anemia devem receber os suplementos duas vezes ao dia.

Todas as mulheres devem tomar vitaminas orais que contenham 400 mcg (0,4 mg) de folato, uma vez ao dia no período pré-natal; isso reduz o risco de defeitos no tubo neural. Para mulheres que já tiveram um feto ou lactente com defeito no tubo neural, a dose diária recomendada é de 4.000 mcg (4 mg).

Atividade física

O exercício durante a gestação tem riscos mínimos e demonstrou benefícios à maioria das gestantes, incluindo manutenção ou melhora do condicionamento físico, controle do ganho de peso gestacional, redução da dor lombar e, possivelmente, redução do risco de desenvolver diabetes gestacional ou pré-eclâmpsia. Exercícios moderados não são uma causa direta de qualquer desfecho adverso na gestação; contudo, gestantes podem ter maior risco de lesões articulares, quedas e trauma abdominal. O trauma abdominal pode resultar em descolamento prematuro da placenta, que pode levar à morbidade ou morte fetal.

A maioria dos especialistas concorda que o exercício durante a gestação é seguro e pode melhorar os desfechos da gestação [p. ex., redução do ganho de peso gestacional excessivo, diabetes gestacional (1)].

Também podem continuar a manter relações sexuais durante toda a gestação, a menos que ocorram sangramento vaginal, dor, perda de líquido amniótico ou contrações uterinas.

Viagens

O período mais seguro para viajar é entre a 14ª e a 28ª semana, porém, não há absolutamente nenhuma contraindicação em viajar, seja qual for o momento da gestação. A gestante deve utilizar cinto de segurança independentemente da idade gestacional e do tipo de veículo.

Viagens de avião são seguras até 36 semanas de gestação. A principal razão dessa restrição é o risco de trabalho de parto em um ambiente desconhecido.

Durante qualquer tipo de viagem, as gestantes devem esticar e estabilizar as pernas e tornozelos periodicamente para prevenir estase venosa e a possibilidade de trombose. Por exemplo, em voos longos, elas devem caminhar ou esticar as pernas a cada 2 a 3 horas. Em alguns casos, o médico pode recomendar tromboprofilaxia para viagens prolongadas.

Imunizações

Vacinas contra sarampo, caxumba, rubeola e varicela não devem ser administradas durante a gestação.

A vacina contra a hepatite B pode ser utilizada com segurança, se houver indicação, e prescreve-se a vacina contra influenza para mulheres no segundo ou terceiro trimestre de gestação durante a temporada de influenza. Recomenda-se imunização de reforço para difteria, tétano e coqueluche (Tdap) entre a 27ª e a 36ª semana de gestação ou no pós-parto, mesmo se as mulheres receberam todas as vacinas.

Embora as vacinas contra a covid-19 não tenham sido especificamente avaliadas em gestantes, o American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG) recomenda que as vacinas contra a covid-19 não sejam suspensas em gestantes que atendem aos critérios de vacinação com base nos grupos prioritários recomendados pelo Advisory Committee on Immunization Practices (ACIP). Várias vacinas contra a covid-19 receberam autorização para uso emergencial da Food and Drug Administration (FDA) e da Organização Mundial da Saúde (OMS), incluídas na Listagem de uso emergencial. (Ver também the Centers for Disease Control and Prevention: COVID-19 vaccination.)

Como as gestantes com tipo sanguíneo Rh negativo têm risco de desenvolver anticorpos para Rho (D), elas recebem imunoglobulina, 300 mcg IM para Rho (D) em qualquer uma das situações a seguir:

  • Depois de qualquer sangramento vaginal significativo ou outro sinal de hemorragia ou separação placentária (descolamento prematuro da placenta)

  • Depois de um aborto espontâneo ou terapêutico

  • Depois de amniocentese ou amostragem para vilos coriônicos

  • Profilaticamente na 28ª semana

  • Se o recém-nascido tem tipo sanguíneo Rho(D) positivo, após o parto

Fatores de risco modificáveis

Gestantes não devem utilizar álcool e tabaco e devem evitar a exposição passiva ao cigarro.

Elas também devem evitar:

  • Exposição a substâncias químicas ou vapores de tinta

  • Manipulação direta de resíduos de gatos (por causa do risco de toxoplasmose)

  • Elevação prolongada da temperatura (p. ex., em uma banheira de hidromassagem ou sauna)

  • Exposição a pessoas com infecções virais ativas [p. ex., rubeola, infecção por parvovírus (quinta doença), varicela]

Mulheres com sérios problemas de abuso de substâncias devem ser monitoradas por um especialista em gestações de alto risco. Deve-se fazer triagem para violência doméstica e depressão.

Deve-se desencorajar o uso de fármacos e vitaminas que não são clinicamente indicados (ver Fármacos na gestação).

Sintomas que requerem avaliação

As mulheres devem ser aconselhadas a procurar avaliação se apresentarem cefaleias incomuns, distúrbios visuais, dor ou cólica pélvica, sangramento vaginal, ruptura das membranas, edema importante de mãos ou face, diminuição do volume urinário, qualquer doença ou infecção prolongada, ou sinais e sintomas persistentes de trabalho de parto.

Multíparas com história de parto rápido devem avisar o médico ao primeiro sintoma de trabalho de parto.

Referência sobre o tratamento

  1. 1. Syed H, Slayman T, Thoma KD: ACOG [American College of Obstetricians and Gynecologists] Committee Opinion No. 804: Physical activity and exercise during pregnancy and the postpartum period. 2020. PMID: 33481513. doi: 10.1097/AOG.0000000000004266

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