Criptococose

PorPaschalis Vergidis, MD, MSc, Mayo Clinic College of Medicine & Science
Revisado/Corrigido: set 2023
Visão Educação para o paciente

Criptococose é uma infecção pulmonar ou disseminada, adquirida por inalação de solo contaminado com a levedura encapsulada Cryptococcus neoformans ou C. gattii. Os sintomas são os de pneumonia, meningite, ou de envolvimento cutâneo, ósseo, ou de vísceras. O diagnóstico é clínico e microscópico, confirmado por cultura ou coloração de tecido fixo. Tratamento, quando necessário, é feito com azóis ou anfotericina B, com ou sem flucitosina.

(Ver também Visão geral das infecções fúngicas.)

A distribuição do C. neoformans e C. gattii é mundial. C. neoformans está presente em solos contaminados com excrementos de pássaros, principalmente de pombos. C. gattii foi isolado de cavidades em decomposição de certas espécies de árvores.

Fatores de risco para criptococose são

Criptococose é uma infecção oportunista definidora de aids (tipicamente associada a uma contagem de CD4 < 100 células/mcL).

C. gattii está associado a mais de 50 espécies de árvores, especialmente o eucalipto na Austrália. Diferentemente de C. neoformans, C. gattii não está associado a aves e tem maior probabilidade de causar doenças em hospedeiros imunocompetentes. Mas em um pequeno estudo de infecções por C. gattii no Canadá, os resultados sugerem que a doença tem maior probabilidade de ocorrer em pessoas que estão imunocomprometidas (p. ex., pessoas com HIV/aids, história de câncer invasivo ou tratadas com corticoides) ou em pessoas que tiveram outros distúrbios pulmonares, tinham 50 anos ou mais, ou eram tabagistas (1).

Surtos de infecção por C. gattii ocorreram na província canadense da Colúmbia Britânica, no noroeste do Pacífico dos Estados Unidos, em Papua Nova Guiné, no norte da Austrália e na região mediterrânea da Europa.

Referência geral

  1. 1. MacDougall L, Fyfe M, Romney M, et al: Risk factors for Cryptococcus gattii infection, British Columbia, Canada. Emerg Infect Dis 17(2):193–199, 2011. doi: 10.3201/eid1702.101020

Fisiopatologia da criptococose

A criptococose é adquirida por inalação e, assim, tipicamente afeta os pulmões. Muitos pacientes apresentam-se frequentemente com lesões pulmonares primárias, assintomáticas e autolimitadas. Em pessoas imunocompetentes, essas lesões pulmonares isoladas algumas vezes se curam de forma espontânea, sem se disseminar, até mesmo sem terapia antifúngica.

Após a inalação, o Cryptococcus pode se disseminar, frequentemente para o cérebro e as meninges, tipicamente se apresentando como lesões intracerebrais multifocais microscópicas. Granulomas meníngeos e lesões focais maiores do cérebro podem ser evidentes. Embora o comprometimento pulmonar raramente seja perigoso, meningite criptocócica é potencialmente fatal e exige tratamento agressivo.

Lesões focais de disseminação também podem ocorrer em nódulos subcutâneos, em extremidades de ossos longos, articulações, fígado, baço, rins, próstata e em outros tecidos. Com exceção das lesões cutâneas, essas lesões geralmente causam poucos sintomas ou nenhum sintoma. Raramente, pielonefrite ocorre com necrose papilar renal.

Os tecidos envolvidos contêm tipicamente massas císticas de leveduras que parecem gelatinosas por causa de polissacarídios capsulares criptocócicos acumulados, mas apresentam alteração mínima ou nenhuma alteração de inflamação aguda, em especial no cérebro.

Sinais e sintomas da criptococose

Manifestações da criptococose dependem da área afetada.

Sistema nervoso central

Como a inflamação não é extensiva, a febre geralmente é baixa e pode estar ausente, não sendo comum haver meningismo.

Em pacientes com aids, a meningite por criptococos pode produzir mínimo ou nenhum sintoma, mas dores de cabeça frequentemente ocorrem e, às vezes, estado mental alterado lentamente progressivo.

Como a maioria dos sintomas de meningites por criptococos resulta de edema cerebral, geralmente não são específicos (p. ex., cefaleia, visão turva, confusão, depressão, agitação ou outras alterações de comportamento). Com exceção de paralisias oculares ou faciais, sinais focais são raros, mesmo relativamente mais tarde no curso. Cegueira pode se desenvolver em decorrência de edema cerebral ou envolvimento direto dos tratos ópticos.

Criptococose (sistema nervoso central)
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Em um hospedeiro com comprometimento imunitário, a infecção criptocócica causa meningite, que pode ser vista nos exames de imagem como grandes lesões cerebrais focais.
Imagem cedida por cortesia de www.doctorfungus.org © 2005.

Pulmões

Muitos pacientes com infecção pulmonar criptocócica são assintomáticos. Aqueles com pneumonia com frequência apresentam tosse e outros sintomas respiratórios não específicos. Entretanto, a aids associada à infecção pulmonar criptocócica pode se apresentar como pneumonia grave, progressiva, com dispneia aguda e um padrão de radiografia sugestivo de infecção por Pneumocystis.

Pele

Disseminação dermatológica pode se manifestar na forma de lesões pustulares, papulares, nodulares, ou ulcerativas, algumas vezes semelhantes a acne, molusco contagioso, ou carcinoma de células basais.

Criptococose (disseminada)
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A criptococose disseminada pode se manifestar como lesões cutâneas pustulosas, papulares, nodulares ou ulceradas. As lesões podem lembrar as da acne, do molusco contagioso ou do carcinoma basocelular.
Image courtesy of www.doctorfungus.org © 2005.

Diagnóstico da criptococose

  • Cultura de líquido cefalorraquidiano, escarro, urina e sangue

  • Coloração de amostra de tecido fixado

  • Sorologia e teste de líquido cefalorraquidiano para antígeno criptococo

Sugere-se o diagnóstico clínico da criptococose por sintomas de infecção indolente em pacientes imunocompetentes e infecção progressiva e mais grave em pacientes que estão imunocomprometidos.

O diagnóstico é confirmado pela identificação do organismo em culturas de escarro ou de LCR. As hemoculturas podem ser positivas, particularmente em pacientes com aids. Na criptococose disseminada com meningite, os criptococos são, na maioria das vezes, cultivados na urina (focos prostáticos da infecção ocasionalmente persistem, apesar da eliminação dos organismos do sistema nervoso central com sucesso). O diagnóstico é fortemente sugerido pela identificação de brotamentos encapsulados de leveduras em esfregaços de líquidos corporais, secreções, exsudatos, ou outras amostras, por observadores experientes.

Em amostras de tecidos fixados, leveduras encapsuladas podem ser identificadas e confirmadas também como criptococos pela coloração positiva de mucicarmina ou de Masson-Fontana.

Proteína elevada no líquido cefalorraquidiano e uma pleocitose de célula mononuclear são habituais na meningite por criptococos. A glicose é frequentemente baixa, e leveduras encapsuladas formando brotamentos de base estreita podem ser vistas em esfregaços de com tinta da Índia, especialmente em pacientes com aids (que normalmente apresentam uma carga fúngica maior do que aqueles sem infecção pelo HIV). Em alguns pacientes com aids, os parâmetros de líquido cefalorraquidiano são normais, exceto pela presença de leveduras na preparação com tinta da Índia.

O teste do látex para antígeno capsular criptocócico é positivo no líquido cefalorraquidiano e/ou em amostras séricas de > 90% dos pacientes com meningite, sendo geralmente específico; contudo, os resultados falso-positivos possam acontecer, na maioria das vezes com títulos 1:8, em especial na presença de fator reumatoide.

Tratamento da criptococose

  • Para meningite criptocócica, anfotericina B com ou sem flucitosina, seguida de fluconazol

  • Para criptococose não meníngea, fluconazol (que geralmente é eficaz)

(Ver também Antifúngicos.)

Pacientes sem aids

Pacientes assintomáticos com diagnóstico incidental de infecção criptocócica após ressecção de nódulo pulmonar com antígeno criptocócico sérico negativo podem não precisar de terapia antifúngica.

Pacientes com sintomas pulmonares devem ser tratados com fluconazol, 200 a 400 mg por via oral uma vez ao dia por 6 a 12 meses.

Na ausência de meningite, as lesões localizadas na pele, no osso, ou em outros locais requerem terapia antifúngica sistêmica, geralmente com fluconazol, em dosagem de 400 mg por via oral uma vez ao dia, durante 6 a 12 meses. Para doença mais grave, administra-se anfotericina B lipossomal, 3 a 4 mg/kg, IV, uma vez ao dia, com flucitosina, 25 mg/kg, por via oral, a cada 6 horas, seguida de consolidação com fluconazol.

Para pacientes com meningite, o esquema convencional é:

  • Indução com anfotericina B lipossomal 4 mg/kg, IV, 1 vez ao dia, mais flucitosina 25 mg/kg, VO, a cada 6 horas, durante 2 a 4 semanas (se formulações lipídicas de anfotericina B não estiverem disponíveis, deve-se usar anfotericina B em desoxicolato [0,7 mg/kg/dia])

  • A indução deve ser seguida de terapia de consolidação com fluconazol 400 mg por via oral uma vez ao dia por 8 semanas

  • Então terapia de manutenção com fluconazol, 200 mg por via oral uma vez ao dia por 6 a 12 meses

Punções lombares seriadas podem ser necessárias para reduzir a pressão intracraniana.

Pacientes com aids

Todos os pacientes com aids precisam ser tratados.

Para meningite ou doença pulmonar grave, o esquema padrão consiste em:

  • Indução com anfotericina B lipossomal, 3 a 4 mg/kg IV) uma vez ao dia, mais flucitosina, 25 mg por via oral a cada 6 horas, durante as 2 primeiras semanas de tratamento (terapia de indução mais longa pode ser necessária se a resposta clínica for lenta e as culturas permanecerem positivas) (se formulações lipídicas de anfotericina B não estiverem disponíveis, deve-se usar anfotericina B desoxicolato (0,7 mg/kg/dia).)

  • Indução alternativa com alta dose única de anfotericina B lipossomal 10 mg/kg IV (no dia 1) mais flucitosina 25 mg/kg por via oral a cada 6 horas e fluconazol 1.200 mg por via oral 1 vez ao dia (ambos os medicamentos orais durante as primeiras 2 semanas de tratamento) (1)

  • A indução deve ser seguida de terapia de consolidação com fluconazol 400 mg por via oral uma vez ao dia por 8 semanas

  • Uma vez concluída a terapia de indução e consolidação, a terapia supressiva (manutenção) de longo prazo é com fluconazol 200 mg por via oral uma vez ao dia

Punções lombares seriadas podem ser necessárias para reduzir a pressão intracraniana.

Os pacientes com sintomas leves a moderados de envolvimento pulmonar localizado (confirmado por parâmetros normais de líquido cefalorraquidiano, culturas negativas de líquido cefalorraquidiano e urina e nenhum sinal ou sintoma de lesões cutânea, óssea ou extrapulmonares) podem ser tratados com fluconazol, 400 mg por via oral uma vez ao dia, por 6 a 12 meses.

Quase todos os pacientes com aids precisam de terapia de manutenção até a contagem de CD4 estar > 150/mcL. Prefere-se empregar fluconazol, 200 mg por via oral uma vez ao dia, mas o itraconazol na mesma dose é aceitável; entretanto, os níveis séricos de itraconazol devem ser dosados para se ter certeza de que os pacientes estão absorvendo o medicamento.

Referência sobre pacientes com aids

  1. 1. Jarvis JN, Lawrence DS, Meya DB, et al: Single-Dose Liposomal Amphotericin B Treatment for Cryptococcal Meningitis. N Engl J Med 386(12):1109-1120, 2022. doi: 10.1056/NEJMoa2111904

Pontos-chave

  • C. neoformans e C. gattii estão presentes em todo o mundo.

  • A criptococose é adquirida por inalação e, assim, tipicamente afeta os pulmões.

  • Em pacientes imunocompetentes, a infecção costuma ser assintomática e autolimitada.

  • Em pacientes que estão imunocomprometidos, o Cryptococcus pode de disseminar para muitos locais, comumente para o cérebro e meninges, e para a pele.

  • Diagnosticar por meio de cultura, coloração e/ou sorologia no líquido cefalorraquidiano para o antígeno criptocócico.

  • Para doença pulmonar localizada, utilizar fluconazol.

  • Para meningite ou outra infecção grave, utilizar anfotericina B lipossomal com ou sem flucitosina, seguida de fluconazol.

Informações adicionais

O recurso em inglês a seguir pode ser útil. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo deste recurso.

  1. Infectious Diseases Society of America: Clinical Practice Guidelines for the Management of Cryptococcal Disease (2010)

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