Lesão por inalação de gás irritante

PorCarrie A. Redlich, MD, MPH, Yale Occupational and Environmental Medicine Program Yale School of Medicine;
Efia S. James, MD, MPH, Yale School of Medicine;Brian Linde, MD, MPH, Yale Occ and Env Medicine Program
Revisado/Corrigido: out 2023
Visão Educação para o paciente

A lesão por inalação de gás irritante é resultante da inalação de gases que, quando inalados, se dissolvem na água da mucosa do trato respiratório e causam uma resposta inflamatória. As exposições a gases irritantes afetam predominantemente as vias respiratórias, causando traqueíte, bronquite e bronquiolite manifestadas por tosse, hemoptise, sibilos, vômito e dispneia. Alguns gases menos solúveis são absorvidos e têm efeitos sistêmicos. O diagnóstico é feito pela identificação do gás inalado, pela duração da exposição e pela avaliação dos resultados da radiografia de tórax e da oximetria. O tratamento inclui afastar o paciente da exposição, cuidados de suporte e medidas adicionais, dependendo da intoxicação específica e sua gravidade.

(Ver também Agentes pulmonares químicos de guerra e Visão geral da doença pulmonar ambiental e ocupacional.)

Substâncias potencialmente perigosas podem ser inaladas na forma de gases, vapores, névoas, aerossóis e fumaça. Tóxicos transportados pelo ar podem lesar o trato respiratório (efeitos locais) e também podem causar lesões sistêmicas. A maioria dos gases irritantes é solúvel em água e causa o início abrupto de sintomas irritativos nas superfícies mucosas com as quais entram em contato. Esses sintomas, que incluem lacrimejamento, rinorreia e ardor na boca e na face, podem servir como sinais de alerta para afastar-se da exposição se possível. Gases menos solúveis em água têm menor propensão a produzir sinais de alerta.

Além das exposições em ambientes ocupacionais, os médicos devem estar cientes do potencial de exposição em outros ambientes. Uma exposição domiciliar potencial comum envolve a mistura de amônia doméstica com produtos de limpeza contendo alvejante, levando à liberação do gás irritante cloramina.

Exposição aguda a gases irritantes

A exposição aguda a altas concentrações de gás tóxico durante curto período é característica de acidentes industriais, tais como os decorrentes de imperfeições em válvulas ou bombas de tanque de gás, ou durante o transporte de gás. A exposição pode ser restrita a trabalhadores específicos no local de trabalho ou afetar um grupo maior de pessoas. Exemplos notáveis de acidentes que causaram exposição generalizada foram a liberação de isocianato de metila de uma fábrica de produtos químicos em Bhopal, Índia, em 1984, resultando em milhares de mortes, e o descarrilamento de trem no East Palestine, Ohio, em 2023, que liberou cloreto de hidrogênio, fosgênio e outros produtos químicos na pequena cidade.

A lesão respiratória está relacionada com a concentração do gás, sua hidrossolubilidade e a duração da exposição. Exposições de alta intensidade podem levar a efeitos clínicos em segundos, minutos ou horas, dependendo da dose real da exposição. Além dos efeitos agudos, também pode haver efeitos de longo prazo.

Os gases mais solúveis em água (p. ex., cloro, amônia, dióxido de enxofre, cloreto de hidrogênio) dissolvem-se na via respiratória superior e provocam irritação de mucosas imediatamente, o que pode alertar as vítimas quanto à necessidade de fugir da exposição. Níveis mais altos de exposição, como quando a saída da fonte de gás é impedida, podem danificar permanentemente as vias respiratórias superiores, causando tosse e laringoespasmo, e o trato respiratório inferior, causando edema pulmonar e síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA).

Gases menos solúveis (p. ex., dióxido de nitrogênio, fosgênio) geralmente poupam as vias respiratórias superiores. Estes agentes são menos propensos a causar sinais de alerta imediatos; as lesões no trato respiratório inferior geralmente só produzem sintomas depois de várias horas.

Complicações

A exposição a curto prazo e de alta intensidade a certos gases irritantes também pode levar a efeitos de longo prazo, como o desenvolvimento da síndrome de disfunção reativa das vias respiratórias (SDRVR).

Em exposições graves, a complicação potencial imediata mais grave é síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA), que costuma se desenvolver rapidamente após uma exposição significativa das vias respiratórias inferiores, mas pode demorar até 24 horas.

Os pacientes com comprometimento importante das vias respiratórias inferiores podem desenvolver infecção bacteriana.

A bronquiolite obliterante é uma complicação menos frequente da exposição a certos gases tóxicos (p. ex., dióxido de nitrogênio e também amônia e dióxido de enxofre), ocorrendo 1 a 3 semanas após a lesão inicial. Pode ocorrer bronquiolite obliterante com pneumonia organizada quando o tecido de granulação se acumular nas vias respiratórias terminais e nos ductos alveolares durante o processo reparador corporal. Uma minoria desses pacientes desenvolve fibrose pulmonar tardia.

Sinais e sintomas da exposição aguda a gases irritantes

A gravidade dos sintomas depende da extensão da exposição, bem como das propriedades do gás irritante específico.

Gases irritantes solúveis causam queimaduras graves e outras manifestações de irritação de olhos, nariz, garganta, traqueia e brônquios principais. São comuns tosse intensa, hemoptise, sibilos, ânsia de vômito e dispneia. A via respiratória superior pode ser obstruída por edema, secreções ou laringoespasmo.

Gases não solúveis causam menos sintomas imediatos de irritação às vias respiratórias superiores, mas podem ter efeitos tardios quando penetram nas vias respiratórias inferiores.

Diagnóstico da exposição aguda a gases irritantes

  • História de exposição

  • Radiografia de tórax

A história geralmente é suficiente para identificar uma exposição a gases irritantes como sendo a causa de sinais e sintomas respiratórios. As características pertinentes da história incluem o agente ou agentes intoxicantes específicos envolvidos na exposição (se disponível), a duração da exposição, a descrição do espaço físico em que a exposição ocorreu e se houve perda de consciência.

Durante a avaliação inicial, os pacientes devem fazer uma radiografia de tórax e passar por uma avaliação da oxigenação com oximetria de pulso. A radiografia de tórax tem baixa sensibilidade para lesão por inalação, embora os achados de consolidação alveolar irregular ou confluente geralmente indiquem edema pulmonar e estejam associados a lesões mais graves.

A lesão por inalação pode ocorrer em qualquer ponto ao longo das vias respiratórias e pode ser classificada com base na área primária da lesão, como as vias respiratórias superiores, o sistema traqueobrônquico ou o parênquima pulmonar. A visualização direta das vias respiratórias pode ajudar a determinar a gravidade da lesão e confirmar o diagnóstico.

Se houver sintomas persistentes significativos após a exposição, testes de função pulmonar e TC de tórax podem ser úteis.

Testes de função pulmonar geralmente não são realizados no quadro agudo, mas podem ser úteis se os sintomas persistirem. As anormalidades obstrutivas são as mais comuns, mas podem predominar anormalidades restritivas depois da exposição a doses elevadas de cloro.

Tratamento da exposição aguda a gases irritantes

  • Remoção da exposição

  • Cuidados de suporte respiratório

  • Ventilação mecânica quando indicada

O tratamento depende da natureza e gravidade da exposição. Os cuidados de suporte respiratório são uma pedra angular do tratamento. Inicialmente, o paciente deve ser removido para ambiente com ar fresco e submetido à suplementação de oxigênio. O tratamento objetiva garantir a oxigenação adequada e a ventilação em um ambiente adequado. Pacientes que experimentam exposição de alta intensidade costumam ser atendidos inicialmente por socorristas e então transportados para um hospital para avaliação adicional e tratamento.

Broncodilatadores e oxigenoterapia podem ser usados em pacientes com exposição menos grave.

Trata-se obstrução grave das vias respiratórias com adrenalina racêmica por inalação, entubação endotraqueal ou traqueostomia e ventilação mecânica.

Pacientes com suspeita de comprometimento das vias respiratórias inferiores decorrente da exposição em altas doses ou exposição a um gás não solúvel em água devem ser observados quanto ao desenvolvimento de SDRA. Não há dados de alta qualidade sobre a eficácia dos corticoides para SDRA induzida pela lesão por inalação.

Após o manejo da fase aguda, os pacientes com sintomas persistentes devem ser monitorados quanto ao desenvolvimento de síndrome de disfunção reativa das vias respiratórias, bronquiolite obliterante com ou sem pneumonia organizada, e fibrose pulmonar.

Prognóstico da exposição aguda a gases irritantes

O prognóstico depende da natureza e da gravidade da exposição. A maioria dos pacientes com exposição menos grave se recupera totalmente, mas os pacientes podem desenvolver lesão pulmonar persistente com obstrução reversível das vias respiratórias (síndrome de disfunção reativa das vias respiratórias) ou, menos frequentemente, bronquiolite e/ou bronquiectasia.  

Em pacientes com exposição grave que leva à SDRA, a mortalidade é alta.

Prevenção da exposição aguda a gases irritantes

O cuidado no armazenamento, manuseio e transporte de gases e produtos químicos é a medida preventiva mais importante.

A disponibilidade de proteção respiratória adequada (p. ex., máscaras com suprimento de ar) para socorristas também é muito importante; socorristas sem equipamento de proteção que se precipitam para resgatar um paciente exposto a um gás irritante acabam eles próprios sofrendo lesões respiratórias.

Exposição crônica a gases irritantes

Além de exposições mais agudas, como aquelas associadas a acidentes, exposições repetidas a concentrações mais baixas também podem ter efeitos adversos à saúde.

Exposições crônicas a concentrações mais baixas ocorrem mais comumente do que acidentes graves. A exposição a gases irritantes, como o cloro liberado de alvejantes de limpeza, pode levar a asma induzida por irritante.

Na ausência de uma exposição clara, o diagnóstico de exposições crônicas pode exigir um maior grau de suspeita clínica para sua identificação. A história deve incluir a revisão dos ambientes domiciliar e ocupacional.

O tratamento envolve a eliminação da exposição e o tratamento sintomático para sintomas irritantes das vias aéreas superiores.

Exposição a fumaça

A fumaça é uma mistura complexa de gases e partículas. Fatores que influenciam os componentes da fumaça são o tipo de material consumido pelo fogo, a temperatura da combustão e a quantidade de oxigênio presente. Gases irritantes estão frequentemente presentes na fumaça, bem como em outros gases, como monóxido de carbono e partículas. Ver Inalação de fumaça para detalhes sobre diagnóstico e tratamento.

Pontos-chave

  • O local e a extensão da lesão inalatória dependem principalmente da solubilidade do gás em água e da magnitude da exposição.

  • O diagnóstico da exposição aguda baseia-se principalmente na história; a realização de testes adicionais depende da gravidade clínica.

  • O tratamento depende da natureza e gravidade da exposição. Exposições de baixa gravidade muitas vezes podem ser tratadas com medidas de suporte, ao passo que casos graves podem exigir tratamento de emergência e cuidados intensivos.

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