Visão geral da função cerebral

PorJuebin Huang, MD, PhD, Department of Neurology, University of Mississippi Medical Center
Revisado/Corrigido: ago 2023
Visão Educação para o paciente

O cérebro é dividido por uma fissura longitudinal em 2 hemisférios, cada um contendo 6 lobos distintos:

Os lobos frontal, temporal, parietal e occipital cobrem a superfície do cérebro (ver figura Lobos do cérebro); a ínsula está oculta sob a fissura de Sylvius. O lobo límbico (sistema límbico) é uma região em forma de C na borda mais medial de cada hemisfério cerebral; abrange algumas partes dos lobos adjacentes.

Embora sejam atribuídas funções específicas a cada lobo, a maior parte das atividades requer coordenação de múltiplas áreas nos dois hemisférios. Por exemplo, embora o lobo occipital seja essencial para o processamento visual, partes dos lobos parietal, temporal e frontal, em ambos os lados, também processam estímulos visuais complexos.

Lobos cerebrais

A função cerebral é extensivamente lateralizada. Atividades visuais, táteis e motoras do lado esquerdo do corpo são controladas predominantemente pelo hemisfério direito e vice-versa. Funções complexas específicas manifestam-se dos dois lados, mas são controladas principalmente por um hemisfério (dominância cerebral). Por exemplo, o hemisfério esquerdo geralmente é dominante para linguagem e o direito para atenção espacial.

O córtex cerebral (ver figura Áreas do cérebro) contém

  • As áreas sensoriais primárias

  • O córtex motor primário

  • Múltiplas áreas de associação, incluindo as áreas de associação unimodais e heteromodais

Áreas do cérebro

As áreas sensoriais primárias recebem estímulos somestésicos, auditivos, visuais e gustatórios do tálamo, que recebe os estímulos de órgãos sensoriais especializados e de receptores periféricos. As vias olfativas contornam o tálamo e vão diretamente a áreas especializadas do córtex. Os estímulos sensoriais são processados em áreas de associação relacionadas com um ou mais sentidos.

O córtex motor primário produz movimentos corporais voluntários; as áreas de associação ajudam a planejar e executar atividades motoras complexas.

Cada área de associação unimodal é adjacente à sua área sensorial primária correspondente e processa informações daquela área em um nível mais alto do que a área sensorial primária.

Áreas de associação heteromodal não se restringem a nenhuma atividade sensorial ou motora isolada, mas recebem informações convergentes de múltiplas áreas sensoriais e motoras do cérebro. As áreas de associação heteromodais nos lobos frontal, temporal e parietal integram informações sensoriais, feedback motor e outras informações com as memórias instintiva e adquirida. Essa integração facilita o aprendizado e cria o pensamento, a expressão e o comportamento.

Lobos frontais

Os lobos frontais são anteriores ao sulco central. Eles são essenciais para planejamento e execução de comportamentos aprendidos e intencionais; também constituem o local de muitas funções inibitórias. Existem várias áreas funcionalmente distintas nos lobos frontais:

  • O córtex motor primário é a parte mais posterior do giro pré-central. O córtex motor primário em um dos lados controla todas as partes móveis no lado contralateral do corpo (mostrado em um mapa espacial denominado homúnculo — ver figura Homúnculo); 90% das fibras motoras de cada hemisférico cruzam a linha média no tronco encefálico e na medula espinal cervical superior. Assim, as lesões no córtex motor de um hemisfério causam fraqueza ou paralisia, principalmente na porção contralateral do corpo.

  • A área frontal medial (algumas vezes denominada área pré-frontal medial) é importante na atenção e na motivação. Se lesões extensas na área frontal medial que se estendem a parte mais anterior do córtex (polo frontal), os pacientes ocasionalmente se tornam abúlicos (apáticos, desatentos e acentuadamente lentos para responder).

  • A área do córtex orbitofrontal (às vezes chamada área orbital pré-frontal — ver figura Áreas do cérebro) ajuda a modular os comportamentos sociais. Os pacientes com lesões orbitofrontais podem se tornar emocionalmente instáveis, indiferentes às implicações de suas ações, ou ambos. Eles podem ser alternativamente eufóricos, divertidos, vulgares e indiferentes a pequenas diferenças sociais. O trauma agudo bilateral nessa parte das áreas pré-frontais pode tornar os pacientes ruidosamente faladores, agitados e socialmente inoportunos. Desinibição e comportamentos anormais que podem ocorrer com o envelhecimento em muitos tipos de demência provavelmente resultam da degeneração do lobo frontal, particularmente do córtex orbital frontal.

  • O córtex esquerdo posteroinferior frontal (às vezes chamado área de Broca ou área posteroinferior pré-frontal— ver figura Áreas do cérebro) controla a função da linguagem expressiva. Lesões nessa área causam afasia expressiva (expressão prejudicada da linguagem).

  • O córtex dorsolateral frontal (algumas vezes denominado área dorsolateral pré-frontal) manipula informações adquiridas muito recentemente — função denominada memória de trabalho. Lesões nesta área podem prejudicar a capacidade de reter informação e processá-la em tempo real (p. ex., soletrar palavras ao contrário, alternar sequencialmente entre letras e números).

Homúnculo

Partes específicas do córtex controlam funções sensoriais e motoras específicas na porção contralateral do corpo. A quantidade de espaço concedida a uma parte corporal varia; p. ex., a área do córtex que controla a mão, o ombro. O mapa dessas partes é chamado de homúnculo (“pessoa pequena”).

Lobos parietais

Várias áreas dos lobos parietais tem funções específicas.

  • O córtex somatossensorial primário, localizado na área pós-sulco central (giro pós-central) na porção anterior dos lobos parietais, integra estímulos somestésicos para reconhecimento e lembrança de forma, textura e peso. O córtex somatossensorial primário controla todas as funções somatossensoriais do lado contralateral do corpo (ver figura Homúnculo). Lesões no lobo parietal anterior podem causar dificuldade de reconhecer objetos pelo tato (astereognosia).

  • As áreas posterolaterais ao giro pós-central geram relações visuoespaciais e integram essas percepções com outras sensações para proporcionar consciência das trajetórias de objetos em movimento. Essas áreas também são mediadoras da propriocepção (consciência da posição das partes do corpo no espaço).

  • Partes do lobo parietal médio no hemisfério dominante estão envolvidas em habilidades como cálculo, escrita, orientação direita-esquerda e reconhecimento dos dedos. Lesões no giro angular podem causar deficits na escrita, no cálculo, na orientação direita-esquerda e na nomeação dos dedos (síndrome de Gerstmann).

  • O lobo parietal não dominante integra o lado oposto do corpo com o meio ambiente, possibilitando o indivíduo de estar ciente do ambiente espacial e é importante para habilidades como o desenhar. A lesão aguda no lobo parietal não dominante pode causar negligência do lado oposto do corpo (em geral, o esquerdo), resultando em diminuição da percepção daquela parte do corpo, seu meio ambiente e qualquer lesão associada àquele lado (anosognosia). Por exemplo, pacientes com grandes lesões no lobo parietal direito podem negar a existência de paralisia do lado esquerdo. Pacientes com lesões menores podem se tornar confusos quando realizam tarefas motoras familiares (p. ex., o ato de se vestir e outras atividades bem familiares) — um deficit manual-espacial denominado apraxia.

Lobos temporais

Os lobos temporais servem essencialmente para percepção auditiva, componentes receptivos da linguagem, memória visual, memória declarativa (factual) e emoção. Os pacientes com lesões do lobo temporal direito geralmente perdem a acuidade para estímulos auditivos não verbais (p. ex., música). As lesões do lobo temporal esquerdo interferem muito no reconhecimento, na memória e na formação da linguagem.

Lobos occipitais

Os lobos occipitais contêm

  • O córtex visual primário

  • Áreas de associação visual

Lesões no córtex visual primário levam a uma forma cegueira cortical; em uma das formas, chamada síndrome de Anton, os pacientes não conseguem reconhecer objetos pelo olhar e, geralmente, não percebem seus deficits, frequentemente confabulando descrições do que enxergam.

Epilepsias envolvendo o lobo occipital podem causar alucinações visuais, que geralmente consistem em linhas ou malhas de cores superpostas no campo visual contralateral.

Ínsula

A ínsula integra informações sensoriais e autonômicas das vísceras. Desempenha um papel em determinadas funções de linguagem, como pode ser demonstrado pela afasia em pacientes com algumas lesões insulares. A ínsula processa aspectos da sensação de dor e temperatura e, possivelmente, gustação.

Lóbulo límbico

O lobo límbico (sistema límbico) abrange estruturas que recebem informações de diversas regiões do cérebro e que participam de comportamentos complicados e inter-relacionados (p. ex., memória, aprendizagem e emoção). Lesões que afetam o sistema límbico costumam resultar em uma variedade de deficits.

Pacientes com focos epileptogênicos nas partes mediais límbico-emocionais do lobo temporal geralmente apresentam convulsões parciais complexas, caracterizadas por sentimentos incontroláveis e disfunção autônoma, cognitiva ou emocional. Às vezes, esses pacientes têm alterações de personalidade, caracterizadas por falta de humor, religiosidade filosófica e obsessão. Os pacientes podem ter alucinações olfativas e hipergrafia (um impulso irresistível de escrever).

Fisiopatologia da disfunção cerebral

A disfunção cerebral pode ser focal ou global. Processos focais e globais podem se manifestar como deficits ou se tornarem foco de atividade convulsiva. Esses processos também podem afetar os sistemas subcorticais, alterando a excitação (p. ex., causando estupor ou coma) ou a integração do pensamento (p. ex., causando delirium).

A disfunção focal geralmente resulta de

As manifestações dependem da localização, do tamanho e do grau de desenvolvimento da lesão. As lesões com < 2 cm de diâmetro e aquelas com desenvolvimento muito lento podem ser assintomáticas. As lesões maiores, lesões de desenvolvimento rápido (de semanas a meses, em vez de anos) e aquelas que afetam ao mesmo tempo ambos os hemisférios têm maior probabilidade de se tornarem sintomáticas. As lesões focais na substância branca podem interromper a conexão entre áreas encefálicas e causar a síndrome de desconexão (incapacidade de realizar uma tarefa que requeira atividade coordenada de 2 regiões encefálicas, apesar da conservação das funções básicas de cada região).

A disfunção global é causada por

  • Doenças tóxico-metabólicas, incluindo hipóxia e isquemia (comumente)

  • Inflamação difusa

  • Vasculopatia

  • Trauma importante

  • Câncer disseminado

  • Doenças degenerativas

Disfunção global também pode resultar de distúrbios que ocorrem em uma área específica do cérebro (p. ex., abscessos, tumores ou trauma) se aumentarem a pressão intracraniana ou causarem herniação.

Esses distúrbios afetam múltiplas dimensões da função cerebral.

Recuperação

A recuperação de uma lesão cerebral depende em parte das seguintes características do cérebro:

  • Plasticidade do cérebro remanescente

  • Redundância

A Plasticidade (capacidade de uma área do cérebro de alterar sua função) do cérebro varia de uma pessoa para outra e é afetada pela idade e saúde geral. A plasticidade é mais evidente no encéfalo em desenvolvimento. Por exemplo, se as áreas de linguagem do hemisfério dominante forem gravemente danificadas antes dos 8 anos de idade, o hemisfério oposto com frequência pode assumir a função quase normal da linguagem. Embora haja considerável capacidade de cura da lesão encefálica após a primeira década de vida, lesões graves resultam muitas vezes em deficits permanentes. A reorganização total da função encefálica após lesão é incomum, em adultos, embora a plasticidade permaneça localmente operante em muitas áreas encefálicas por toda a vida.

Redundância refere-se à capacidade de mais de uma área do cérebro de desempenhar a mesma função.

Síndromes de disfunção cerebral

Síndromes específicas incluem

Distúrbios psiquiátricos (p. ex., depressão, psicose, ansiedade) às vezes incluem elementos similares. Disartria, um distúrbio neuromotor, pode causar sintomas semelhantes aos da afasia.

Diagnóstico da disfunção cerebral

  • Avaliação clínica

  • Frequentemente, testes neuropsicológicos

Em geral, o diagnóstico da disfunção cerebral é clínico, geralmente auxiliado por testes neuropsicológicos. Esse exame padronizado fornece informações sobre a integridade estrutural e funcional do encéfalo. Avalia inteligência, função executiva (p. ex., planejamento, abstração, conceituação), atenção, memória, linguagem, percepção, funções sensorimotoras, motivação, humor e emoção, qualidade de vida e personalidade.

O diagnóstico da causa geralmente requer exames laboratoriais (análises de sangue e líquido cefalorraquidiano) e imagem do encéfalo, tanto estrutural (p. ex., TC, RM) como funcional tomografia com emissão de pósitrons (positron emission tomography [PET]), SPECT.

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