Visão geral da hepatite viral aguda

PorSonal Kumar, MD, MPH, Weill Cornell Medical College
Revisado/Corrigido: ago 2022
Visão Educação para o paciente

É a inflamação hepática difusa causada por vírus específicos hepatotrópicos que apresentam diversos modos de transmissão e epidemiologia. Um pródromo viral não específico é seguido de anorexia, náuseas e, com frequência, febre ou dor em hipocôndrio direito do abdome. Em geral, há aparecimento de icterícia quando os outros sintomas começam a desaparecer. A maioria dos casos tem resolução espontânea, mas alguns progridem para hepatite crônica. Ocasionalmente, a hepatite viral aguda progride para insuficiência hepática aguda (indicando hepatite fulminante). O diagnóstico é feito por meio de testes de função hepática e sorologia, para identificar o vírus. Higiene adequada e precauções universais podem prevenir a hepatite viral aguda. Dependendo do tipo específico de vírus, é possível a profilaxia pré e pós-exposição, utilizando-se vacinas ou imunoglobulinas. O tratamento é geralmente de suporte.

(Ver também Causas da hepatite e Infecção neonatal pelo vírus da hepatite B.)

A hepatite viral aguda é uma doença comum em todo o mundo e tem diferentes causas; cada tipo compartilha características clínicas, bioquímicas e morfológicas. O termo hepatite viral aguda geralmente se refere à infecção hepática por um dos vírus da hepatite. Outros vírus (p. ex., virus de Epstein-Barr, vírus da febre amarela, citomegalovírus) também podem causar hepatite viral aguda, mas são menos comuns.

Etiologia da hepatite viral aguda

Pelo menos 5 vírus específicos parecem causar hepatite viral aguda (ver tabela Características dos vírus da hepatite):

Outros vírus ainda não identificados provavelmente também causam hepatite viral aguda.

Tabela

Sinais e sintomas da hepatite viral aguda

Algumas manifestações de hepatite aguda são específicas do vírus (ver discussão sobre vírus de hepatite individuais), mas, geralmente, infecção aguda tende a se desenvolve em fases previsíveis:

  • Período de incubação: o vírus se multiplica e se dissemina sem causar sintomas (ver tabela Características dos vírus da hepatite).

  • Fase prodrômica (pré-ictérica): sintomas inespecíficos; anorexia intensa, mal-estar, náuseas e vômitos, uma aversão recente por cigarros (em fumantes) e frequentemente febre ou dor no hipocôndrio direito. Podem ocorrer urticária e artralgia, especialmente na infecção por vírus da hepatite B.

  • Fase ictérica: após 3 a 10 dias, ocorre escurecimento da urina, seguido de icterícia. Os sintomas sistêmicos frequentemente regridem e o paciente sente-se melhor, apesar da piora da icterícia. O fígado geralmente aumenta de tamanho e torna-se sensível, mas suas bordas mantêm-se suaves e macias. Esplenomegalia leve pode ocorrer em cerca de 15 a 20% dos pacientes. A icterícia normalmente alcança um pico entre 1 a 2 semanas.

  • Fase de recuperação: durante esse período de 2 a 4 semanas, a icterícia desaparece.

Em geral, há retorno do apetite após a primeira semana dos sintomas. A hepatite viral aguda geralmente resolve-se de maneira espontânea depois de 4 a 8 semanas.

Hepatite anictérica (hepatite sem icterícia) ocorre mais frequentemente do que a hepatite ictérica em pacientes com infecção por HCV e em crianças infectadas por HAV. Ela normalmente se manifesta como uma doença semelhante à gripe secundária.

Em alguns pacientes, ocorre a hepatite recrudescente, em que há manifestações recorrentes durante a fase de recuperação.

Manifestações da colestase podem ocorrer durante a fase ictérica (chamada de hepatite colestática), mas geralmente regridem. Quando há persistência dessas manifestações, apesar da regressão da inflamação, causam icterícia por tempo prolongado, elevação da fosfatase alcalina e prurido.

Diagnóstico da hepatite viral aguda

  • Testes hepáticos [aspartato aminotransferase (AST) e alanina aminotransferase (ALT) elevados de forma desproporcional à elevação na fosfatase alcalina, geralmente com hiperbilirrubinemia]

  • Sorologia viral

  • Medição do tempo de protombina (TP)/razão normalizada internacional (RNI)

Diagnóstico inicial da hepatite aguda

A hepatite aguda deve primeiro ser diferenciada a partir de outras patologias que causam sintomas semelhantes. Na fase prodrômica, a hepatite mimetiza diversas outras doenças virais não específicas, sendo difícil de diagnosticar. Pacientes anictéricos, com suspeita de terem hepatite por fatores de risco, devem ser testados inicialmente com testes hepáticos, incluindo aminotransferases, bilirrubina e fosfatase alcalina. A hepatite aguda frequentemente se manifesta na fase ictérica e, portanto, deve ser diferenciada de outras doenças que causam icterícia (ver figura Abordagem diagnóstica simplificada para possível hepatite viral aguda).

Hepatite aguda deve ser diferenciada de outras doenças que causam icterícia por

  • Elevações acentuadas nos níveis séricos de AST e ALT: tipicamente ≥ 400 UI/L (6,68 microkat/L)

A ALT eleva-se mais que a AST, mas os valores absolutos têm pouca relação com a gravidade clínica. Os níveis dessas enzimas elevam-se precocemente na fase prodrômica e seu pico tende a aparecer antes da icterícia, com queda gradual, durante a fase de recuperação. A colúria geralmente precede a icterícia. A intensidade da hiperbilirrubinemia na hepatite aguda varia conforme a gravidade e a aferição de suas frações não tem utilidade clínica. A elevação da fosfatase alcalina é geralmentemoderada; grandes elevações sugerem colestase extra-hepática e indicam investigação com exames de imagem (p. ex., ultrassonografia).

Na maioria dos casos não há necessidade de biópsia hepática, a menos que o diagnóstico seja incerto.

Se os resultados laboratoriais sugerem hepatite aguda, especialmente se os níveis de ALT e AST são > 1.000 UI/L (16,7 microkat/L), deve-se medir o TP/RNI para avaliar a função hepática.

Manifestações de encefalopatia portossistêmica combinada com diátese hemorrágica ou prolongamento da relação normalizada internacional (RNI) sugerem insuficiência hepática aguda, indicando hepatite fulminante.

Se houver suspeita de hepatite aguda, deve-se tentar a identificação de sua causa. A história de exposição anterior pode ser o único indício de hepatite tóxica ou por fármacos. A história também deve identificar fatores de risco de hepatites virais.

Um quadro de dor de garganta prodrômico e adenopatia difusa sugere mononucleose infecciosa e não hepatite viral.

Abordagem diagnóstica simplificada para suspeita de hepatite viral aguda

*Solicitar exames laboratoriais adicionais para hepatite A (ver tabela Sorologia para hepatite A), hepatite B (ver tabela Sorologia para hepatite B) e hepatite C (ver tabela Sorologia para hepatite C).

ALT = alanina aminotransferase; anti-HCV = anticorpo contra o vírus da hepatite C; AST = aspartato aminotransferase; HBsAg = antígeno de superfície da hepatite B; anti-HAV IgM = anticorpo IgM contra o vírus da hepatite A.

Sorologia

Em pacientes com achados sugestivos de hepatite viral aguda, os seguintes estudos são realizados como forma de triagem para hepatites virais A, B e C:

  • Anticorpo IgM para HAV (IgM anti-HAV)

  • Antígeno de superfície da hepatite B (HBsAg)

  • Anticorpo central da hepatite B (IgM anti-HBc)

  • Anticorpo para HCV (anti-HCV)

  • PCR (polymerase chain reaction) para RNA da hepatite C (RNA-HCV)

Se algum resultado for positivo, pode ser necessário fazer outras sorologias para diferenciar infecção aguda de infecção passada ou crônica (ver tabela Sorologia para hepatite A, Sorologia para hepatite B e Sorologia para hepatite C).

Se confirmado sorologicamente que a infecção por HBV é grave, deve-se medir o nível de HDV.

Se um paciente viajou recentemente para uma área endêmica ou está imunossuprimido, deve-se medir o anticorpo IgM anti-HEV (IgM anti-HEV) se o teste estiver disponível.

Biópsia

Biópsia geralmente é desnecessária, mas, se feita, costuma revelar histopatologia semelhante, independentemente do vírus específico:

  • Descarte de célula irregular

  • Necrose hepatocelular acidofílica

  • Infiltrado inflamatório mononuclear

  • Evidência histológica da regeneração

  • Preservação da estrutura reticulina

A infecção por HBV pode ocasionalmente ser diagnosticada pela presença de hepatócitos em vidro fosco (causados pela repleção do citoplasma por HBsAg) e pelo uso de colorações especiais para os componentes virais. Entretanto, esses achados são raros na infecção aguda por HBV, sendo muito mais comuns na infecção crônica por HBV.

Tratamento da hepatite viral aguda

  • Cuidados de suporte

  • Tratamento da hepatite C aguda, em parte para prevenir a transmissão a outros

Nenhum tratamento atenua a hepatite viral aguda. Deve-se evitar a ingestão de álcool, pois pode haver piora da lesão hepática. Não existem evidências científicas que apoiem o uso de restrições dietéticas ou de atividades, incluindo o repouso no leito habitualmente prescrito.

Deve-se tratar os pacientes com infecção aguda por HCV com terapia antiviral no diagnóstico inicial, sem esperar a resolução espontânea, para prevenir a transmissão a outros. Devido à alta eficácia e segurança, os mesmos esquemas recomendados para a infecção crônica pelo HCV são recomendados para a infecção aguda (1).

Para a hepatite colestática, o uso de colestiramina, 8 g por via oral uma ou duas vezes ao dia, pode melhorar o prurido.

Deve-se relatar a ocorrência de hepatite viral às autoridades de saúde locais.

Referência sobre o tratamento

  1. 1. American Association for the Study of Liver Diseases (AASLD) and Infection Diseases Society of America (IDSA): HCV Guidance: Recommendations for testing, managing, and treating hepatitis C. Management of acute HCV infection. Accessed July 6, 2022.

Prevenção da hepatite viral aguda

Uma vez que os tratamentos disponíveis têm eficácia limitada, a prevenção das hepatites virais tem um papel muito importante.

Medidas gerais

Hábitos de higiene pessoal ajudam a prevenir a transmissão, particularmente a fecal-oral, como ocorre em HAV e HEV.

Sangue e outros líquidos orgânicos (p. ex., saliva e sêmen) de pacientes com infecções agudas por HBV e HCV e as fezes de pacientes com infecção por HAV são consideradas infectantes. Recomenda-se proteção de contato, mas o isolamento tem pouca efetividade para pacientes com HAV e nenhum benefício em pacientes com HBV ou HCV.

Minimiza-se as infecções pós-transfusão evitando transfusões desnecessárias e testando todos os doadores para as hepatites B e C. O rastreamento diminuiu a incidência das hepatites B e C pós-transfusão, que agora são extremamente raras nos Estados Unidos.

Imunoprofilaxia

A imunoprofilaxia pode envolver tanto a imunização ativa utilizando vacinas quanto a imunização passiva.

Vacinas contra hepatite A e hepatite B estão disponíveis nos Estados Unidos.

A vacinação de rotina para a hepatite A e B é recomendada nos Estados Unidos para todas as crianças e adultos de alto risco (ver Adult Immunization Schedule).

A vacina contra a hepatite E não está disponível nos Estados Unidos, mas está disponível na China.

Imunoglobulina padrão preveni ou diminui a gravidade da infecção por HAV e deve-se administrá-la para familiares e contatos próximos não imunes dos pacientes. A HBIG provavelmente não previne a infecção, mas previne ou atenua a evolução da doença clínica.

Não existe qualquer produto para imunoprofilaxia para HCV e HDV. Mas a prevenção da infecção por HBV também previne a infecção por HDV. A propensão do HCV em mudar seu genoma dificulta o desenvolvimento de uma vacina.

Pontos-chave

  • A transmissão é via fecal-oral para a hepatite A e parentérica ou através do sangue para hepatite B e C.

  • Hepatites B e C, ao contrário da hepatite A, predispõem a hepatites crônicas e câncer do fígado.

  • Pacientes com hepatite viral aguda podem ser anictéricos ou mesmo assintomáticos.

  • Fazer teste sorológico viral (IgM anti-HAV, HBsAg, anti-HCV) se os achados clínicos são consistentes com hepatite viral aguda e os níveis de AST e ALT são elevados e fora de proporção para fosfatase alcalina.

  • O tratamento dos pacientes é de suporte. Tratar hepatite C aguda para prevenir a transmissão.

  • A vacinação de rotina para a hepatite A e B é recomendada nos Estados Unidos para todas as crianças e adultos de alto risco.

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